A VIDA DE JESUS CRISTO E DE SUA MÃE SANTÍSSIMA

Revelações História

Desde o início da vida pública de Jesus até a primeira Páscoa

Segundo as visões da Anda. Ana Catarina Emmerick

CLEMENS BRENTAN, BERNARD E.OVERBERG Y. WILLIAM WESENER

VISÕES E REVELAÇÕES DA VENERÁVEL

ANA CATARINA EMMERICK

TOMO III

A VIDA DE JESUS CRISTO E DE SUA MÃE SANTÍSSIMA

Desde o início da vida pública de Jesus até a primeira Páscoa

De acordo com as visões da Ven. Ana Catalina Emmerick

- Editado pela Revista Cristiandad.org -

I - Início da vida pública de Jesus

II - A família de Lázaro

III - Jesus em Hebrom, em Dotaim e em Nazaré 9

IV - Retorno de Jesus a Nazaré

V - Jesus vai, através do Líbano, a Sidom e a Sarepta

VI - Jesus em Betsaida e em Cafamaum

VI - Os endemoninhados de Séforis

VII - Jesus em Betulia

IX - Jesus em Kedes e Jezrael

X - Jesus entre os publicanos

XI - Jesus em Kisloth Tabor

XII - Jesus no lugar dos pastores chamado Kimki

XIII - Jesus com o essênio Eliud mistérios do Antigo Testamento e a encarnação

XIV - Jesus fala com Eliud de Joaquim e de Ana

XV - Novas conversas de Eliud com Jesus

XVI - Jesus em Nazaré

XVI - Jesus confunde os sábios de Nazaré

XVIII - Uma leprosaria no Rio Kisão

XIX - Jesus se transfigura diante de Eliud

XX - Jesus em Gofna

XXI - Jesus fala contra os vícios de Herodes

XXII - Jesus em Betânia

XXIII - Maria a Silenciosa

XXIV - Chegada de Maria e das santas mulheres

XXV - Jesus marcha com Lázaro ao batismo de João

XXVI - História de João Batista

XXVI - Pregação e viagens de João Batista

XXVII - Lugares onde João Batista batizava

XXIX - João Batista e Herodes

XXX - Comoção que produzia o batismo de João

XXXI - João recebe aviso de retirada para Jericó

XXXI - Herodes no batistério. Uma festa tradicional

XXXITI - Brota a ilha para o batismo de Jesus no Rio Jordão

XXXIV - Herodes novamente com João

XXXV - Jesus é batizado por João

XXXVI - A voz do pai após o batismo

XXXVI - Jesus prega na sinagoga da luz

XXXVII - Jesus em Ensemes

XXXIX - Jesus no Vale dos pastores de Belém

XL - A gruta do presépio, lugar de oração e de peregrinação para os pastores

XLI - Jesus visita as pousadas onde a Sagrada Família descansou em sua fuga Para o Egito

XLII - Jesus vai para Maspha para a casa de um parente de São José

XLIII - "Eis aí o Cordeiro de Deus"

XLIV - Jesus em Gilgal

XLV - O Sinédrio de Jerusalém

XLVI - Jesus em Corazim, Aruma e Betânia

Início da vida pública de Jesus

Jesus partiu de Cafarnaum, através de Nazaré, para Hebrom. Passou pela bela região de Genesaré, perto dos banhos quentes de Emaús.
Estes se encontram entre Magdala, em direção a Tiberíades, talvez a uma hora de estrada, e este último ponto na encosta de uma montanha. Nos campos, via-se muita grama alta e nas encostas das montanhas aldeias e casas entre fileiras de Figueiras, datileiros e laranjais. Junto à estrada celebrava-se uma festa popular. Grupos de homens e mulheres, separados uns dos outros, disputavam vários jogos com prêmios consistentes em frutos de várias classes. Ali Jesus viu Natanael de Chased entre o grupo de homens que estava debaixo de uma figueira. Natanael estava lutando contra uma forte tentação de sensualidade enquanto olhava para o grupo de mulheres. Jesus, ao passar, dirigiu-lhe um olhar de advertência. Natanael sentiu ao ponto uma forte impressão e, sem conhecer Jesus, pensou entre si: "este homem tem um olhar avassalador". Teve a impressão de que aquele homem era superior ao comum dos mortais. Sentiu-se comovido, reconcentrou-se em si mesmo, venceu a tentação e foi desde então mais severo consigo mesmo.
Pareceu-me que vi Naftali, chamado Bartolomeu, também ficou encantado com o olhar que Jesus lhes dirigiu. Jesus caminhava com dois companheiros de infância pela Judéia em direção a Hebrom. Estes companheiros e discípulos não lhe foram fiéis; separaram-se muito cedo dele, e só depois da Ressurreição e da aparição aos discípulos no monte Thebez, na Galileia, converteram-se de verdade e juntaram-se à comunidade cristã. Ao chegar a Betânia, Jesus dirigiu-se à casa de Lázaro. Lázaro parecia mais velho que Jesus; teria pelo menos oito anos a mais. Possuía uma grande casa com muita gente, fazenda, hortas e jardins. Marta tinha casa à parte, e outra irmã, que vivia sozinha como reconcentrada em si mesma, tinha também moradia separada do resto da casa. Magdalena residia naquele tempo em seu castelo de Magdala. Eu sabia que Lázaro era amigo da Sagrada Família há muito tempo. Em outras ocasiões, ajudara José e Maria com muitas esmolas e, desde o início até o fim, ajudara a comunidade cristã. Todo o dinheiro que Judas levava provinha de suas esmolas, assim como as despesas que precisavam fazer os discípulos de Jesus eram custeadas com as esmolas de Lázaro. De Betânia Jesus dirigiu-se ao templo de Jerusalém.

A família de Lázaro

O pai de Lázaro chamava-se Zarah ou Zerah e era de nobre linhagem originária do Egito. Tinha vivido também na Síria, nos confins da Arábia, e tinha parentesco e amizade com um rei da Síria. Por seus méritos em uma guerra, foi premiado pelo Imperador Romano com terras e posses perto de Jerusalém e na Galiléia. Era como um príncipe entre seus compatriotas e muito rico, e por seu casamento com uma mulher judia, da classe dos fariseus, aumentara seus bens materiais. Sua mulher se chamava Jezabel. Lázaro tornou-se judeu e era observador da lei, piedoso à maneira dos fariseus de seu tempo. Ele tinha um direito sobre parte da cidade, perto do monte Sião, onde a torrente corre através da ravina, ao lado da colina do templo. Mas a maior parte de seus direitos havia sido cedida ao templo. Contudo havia ficado na família um antigo direito sobre a parte onde vi mais tarde que os apóstolos subiam ao Cenáculo, apesar de não pertencer a suas posses. O terreno de Betânia era muito grande, com muitos jardins, poços e terraços, e estava rodeado por um fosso duplo. A família de Lázaro estava ciente das profecias de Simeão e Ana. Esperavam o Messias e na infância de Jesus tiveram amizade com a Sagrada Família, da maneira que ainda hoje se vêem famílias nobres amigas de outros humildes. Os pais de Lázaro tiveram quinze filhos, dos quais seis morreram cedo, nove atingiram a idade adulta e apenas quatro viviam em tempos da pregação de Cristo.
Estes quatro foram: Marta, de dois anos mais nova; uma Maria, chamada a Silenciosa, de dois anos mais nova que Marta, e Maria Madalena, de cinco anos menos que Maria, a Silenciosa, que era tida por alguem curta de mente. Esta Maria não é nomeada nas escrituras, mas valia muito diante de Deus.
Na família ficava isolada e por isso era desconhecida.
Madalena, a mais nova de todas, era muito formosa e desde os primeiros anos manifestou-se de aspecto cheio, vigoroso e esbelto; estava cheia de vaidade, de coqueteria e de seduções. Ao completar sete anos, seus pais já haviam morrido. Ela não os sofria, pelos severos jejuns que praticavam na casa.
Desde pequena era vaidosa, orgulhosa, doca e caprichosa e por demais gulosa. Não era fiel a ninguém e só procurava aquele que a lisonjeava. Era esbanjadora e movida por compaixão natural e dada a tudo o que era brilhante e às magnificências exteriores. Sua mãe tinha parte da culpa por seus mimos; ela também herdou dela sua compaixão natural e sensível. A mãe e a ama falsificaram a formação de Madalena, porque em toda parte a faziam aparecer para se exibir, deixavam aplaudir suas coqueterias e artes de sedução e costumavam ficar muito tempo com ela na janela e em público.
Esse hábito de sentar - se à janela para bisbilhotar foi o começo de sua ruína moral. Eu a vi na janela e no terraço de sua casa em um assento de tapetes e almofadas, para que ela pudesse ser vista da rua em toda a sua beleza e sedução. Roubava desde então guloseimas com que presenteava outras criaturas no jardim e desde os nove anos começou a fantasiar com carinhos e amores. Com o passar dos anos, à medida que seu talento crescia, crescia também o barulho em torno dela e a admiração das pessoas. Reunia muitos admiradores. Era instruída e sabia escrever versos de amor em pequenos rolos de pergaminho. Percebi que contava algo com os dedos enquanto escrevia. Enviava então estes escritos aos seus admiradores, e assim era conhecida em toda parte e se falava muito dela. Mas não vi nela que realmente amasse alguém ou que fosse amado por outro: em tudo procedia por vaidade, sensualidade, amor próprio e encantos. Era tida como escândalo para suas irmãs. Ela se desviava de suas irmãs pela vida simples que levavam. Quando, com a morte de seus pais, a herança paterna foi repartida por sorte, coube a Madalena o Castelo de Magdala, que era muito bonito. Desde criança tinha estado lá várias vezes e sentia pelo lugar especial predileção. Contava apenas onze anos quando se retirou para esse castelo com muito acompanhamento de criadas e de servidores da casa e grande pompa. Magdala era lugar de fortalezas e edifícios ameias formado de castelos, casas fortificadas, escritórios públicos, praças com pórticos, passeios e jardins. Distava oito horas de caminho ao Oriente de Nazaré, A Três de Cafarnaum e a uma e meia de Betsaida, por volta do meio-dia, a uma milha do lago de Genesaré, em uma altura, e em parte no vale que corria para o mar da Galiléia, terminando no caminho que se estendia ao redor do lago. Um dos castelos pertencia a Herodes, o qual possuía outro maior no fértil campo de Genesaré, por isso havia ali soldados de Herodes, que eram causa de maior licença de costumes: muitos oficiais tinham trato com Madalena. Fora destes soldados haveria em toda Magdala umas cem pessoas mais, a maior parte empregados, zeladores dos castelos, criados e mordomos. Não havia ali sinagoga, e o povo piedoso ia à de Betsaida. O Castelo de Madalena era o mais belo e estava situado em terreno mais elevado do que os outros do contorno: dos seus terraços podia-se contemplar a planície do mar da Galiléia até a margem oposta. A Magdala confluíam cinco caminhos: em cada um deles se via, a cerca de meia hora, o castelo correspondente, uma torre sobre uma abóbada como uma guarita de onde a sentinela podia observar o horizonte a muita distância. Essas torres estavam desunidas umas das outras e cercadas por jardins, prados e campos de pastagem. Madalena tinha criados e criadas, porque possuía ali campos com gado; mas a administração era defeituosa e tudo ia em decadência. Através do vale e dos desfiladeiros agrestes, de onde começava a edificação de Magdala para a altura, corria um riacho em direção ao mar, onde se refugiavam animais selvagens que chegavam lá para se esconder de três lugares desertos ligados ao Vale de Magdala. Herodes costumava ter grandes caçadas lá, além de fazê-lo no Castelo de Genesaré, onde possuía um parque de animais.
O campo de Genesaré começava entre Tiberíades e Tarichea, a cerca de quatro horas de Cafarnaum e se estendia do mar até três horas na região, e ao sul de Tarichea até a foz do Jordão. Este belo vale, como o lago artificial e o local de banhos de Betulia, formado por um riacho, faziam parte de um esplêndido conjunto de riachos que se lançavam no mar. Este fluxo de água formava várias cachoeiras artificiais e lagoas no belo vale, cheio de jardins, casas de veraneio, castelos, jardins zoológicos, quintas com árvores florestais e frutíferas de todos os tipos. Durante todo o ano se via vegetação e flores lá. Os ricos do país, especialmente de Jerusalém, tinham ali suas residências de verão, com jardins, parques e passeios. O lugar estava cheio de casinhas, passeios, enramadas, com caminhos de sebes verdes e com caminhos forrados de árvores em forma de pirâmides, figurando colinas e elevações de diferentes aspectos. Fora de Magdala não se via, nos arredores, outras populações. Os habitantes estáveis durante todo o ano eram, na maioria, jardineiros e guardiões dos castelos, e pastores que guardavam o gado das ovelhas e cabras de raças escolhidas. Vi também que cuidavam de todos os tipos de animais e pássaros raros nos jardins. Nenhuma estrada principal atravessa Magdala, mas era circundada por duas que vinham do mar e do Rio Jordão.

Jesus em Hebrom, em Dotaim e em Nazaré

Quando Jesus chegou a Hebron, despachou seus companheiros dizendo-lhes que ele deveria visitar um amigo. Zacarias e Isabel já não viviam, e Jesus dirigiu-se para o deserto onde Isabel tinha levado o menino João. Este deserto ficava entre Hebron e o sul do Mar Morto. Primeiro, atravessava-se uma alta montanha de pedras brancas e entrava-se num ameno Vale de palmas.
Jesus foi para lá e esteve na caverna onde João foi levado por Isabel. Depois o vi passando por um riacho pelo qual João também havia passado com Isabel. Vi-o solitário e em oração, como se se preparasse para a sua vida pública. Deste deserto voltou novamente para Hebron. Ajudava em todas as situações onde se fizesse necessário: vi-o junto ao Mar Morto ajudando as pessoas que passavam sobre balsas o mar e a estender uma lona sobre a barcaça, pois subiam sobre a balsa homens, animais e fardos de mercadorias. Jesus clamou a eles e desde a margem lhes alcançou um tirante até a embarcação e os ajudou a carregar e melhorar a barcaça. As pessoas não podiam imaginar quem ele era, pois, embora não se distinguisse dos outros por seu vestido exterior, mas seu porte era tão digno, tão amável seu tratamento e admirável sua pessoa, que todos se sentiam comovidos sem saber o porquê. A princípio acreditaram que fosse João Batista, que havia aparecido nesses lugares; mas logo se desiludiram, pois João era mais moreno e tinha mais curtido o rosto pela vida do deserto.
Estando em Hebrom, celebrou a festa do sábado e libertou seus companheiros de viagem. Entrava nas casas onde havia enfermos, e os consolava, e os servia, e os levantava, e lhes acomodava os leitos; mas não vi curá-los das suas doenças. Sua aparição era para todos uma bênção e admiravam-se de sua presença. Foi também aonde havia alguns possuídos do demônio, que em sua presença se inquietavam, ainda que não via que os livrasse dos espíritos malignos. Onde ele aparecia colaborava quando se apresentava a oportunidade: levantava os caídos, dava de beber aos sedentos e acompanhava os viajantes através de caminhos difíceis. Todos desejavam sua presença, o queriam bem e se admiravam de tal caminhante. De Hebrom foi para a foz do Jordão, no Mar Morto. Passou o rio e dirigiu-se pelo Oriente em direção à Galiléia. Eu o vi andando entre Pela a região de Gergesa. Fazia o caminho em pequenas etapas, ajudando, entretanto, onde se oferecia a ocasião. Visitava os doentes e os leprosos, consolava-os, levantava-os, acomodava-os nos seus leitos, exortava-os à oração e sugeria-lhes remédios e cuidados. Num desses lugares havia gente que sabia de Simeão e de Ana, e lhe perguntaram se era ele aquele menino de quem profetizaram. Geralmente o acompanhavam alguns voluntariamente, que o faziam por prazer de ir com ele. Esteve também no formoso riacho Hieromax que se lançava no Jordão, não muito longe daquele monte escarpado de onde ele mais tarde lançou os porcos no mar; este lugar estava sob o mar da Galiléia. Na margem havia uma certa quantidade de casinhas cavadas em terra, como cabanas de pastores, onde habitavam pessoas que trabalhavam com suas canoas e navios; e vi que não entendiam o ofício e adiantavam pouco. Jesus foi até eles, ajudou-os bondosamente levando-lhes postes e suspensórios, dando-lhes uma mão em suas tarefas e indicando-lhes certas conveniências no modo de trabalhar, enquanto os exortava à paciência e à caridade mútua na tarefa.
Mais tarde eu o vi em Dothaim, pequena aldeia isolada a nordeste de Séforis. Não havia sinagoga ali e as pessoas viviam despreocupadas, embora não fossem más. Abraão teve ali pastores para os animais do sacrifício. Também José e seus irmãos tiveram ali seus rebanhos, e ali foi vendido José. Nos tempos atuais, Dothaim era uma vila pequena, embora as pradarias fossem boas e houvesse gado até o mar da Galiléia. Havia neste lugar uma grande casa, espécie de manicômio, onde se encontravam muitos possuídos de demônios: estes ficaram extremamente furiosos e se batiam uns nos outros até parecerem que se matavam quando Jesus se aproximava. Os guardiões não podiam prendê-los nem com amarras. Jesus entrou na casa e falou com eles, e eles imediatamente se acalmaram. Exortou-os e admoestou-os, e vi que saíram dali completamente tranquilos, dirigindo-se cada um à sua casa. Os habitantes ficaram muito admirados ao ver este fato, não queriam deixá-lo partir de lá e acabaram por convidá-lo para assistir a um casamento. Naquela festa, ele não apareceu senão como um homem a quem se queriam honrar. Falou amigavelmente, e com sábias palavras exortou também aos esposos. Vi que estes, depois da aparição de Jesus em Thebez, entraram na comunidade cristã.

Retorno de Jesus a Nazaré

Quando Jesus voltou a Nazaré, visitou os conhecidos e parentes de seus pais, nos arredores, sendo recebido muito friamente por seus habitantes; de modo que, quando quis entrar na sinagoga para ensinar, não lho permitiram. Falou então na praça pública diante de muitas pessoas, saduceus e fariseus, referindo-se ao Messias que havia de aparecer, muito diferente do que eles imaginavam de acordo com seus desejos. Ele chamou João: "a voz que clama no deserto". Tinham-no seguido desde a região de Hebrom dois jovens vestidos com longas túnicas como as dos sacerdotes, embora nem sempre estivessem com ele. Celebrou aqui a festa de sábado.
Vi Jesus, na companhia de Maria, Maria Cléofas e os pais de Pármenas, no total cerca de vinte pessoas, abandonarem Nazaré e dirigirem-se a Cafarnaum. Eles tinham jumentos carregados de pacotes. A casa de Nazaré ficou limpa, adornada e revestida interiormente com tapetes e mantas, que me davam a impressão de uma capela: assim ficou esvaziada a casinha de Nazaré. O terceiro marido de Maria Cléofas, que trabalha na casa de Ana, cuidara da casa junto com seus filhos. Esta Maria Cléofas, seu filho mais novo José Barsabás e Simão, viviam agora muito perto da casinha que aquele homem chamado Levi deu a Jesus para sua moradia perto de Cafamaum. Os pais de Parmenas também viviam não muito longe dali.
Jesus foi de uma pequena aldeia para outra, visitando especialmente os lugares onde João tinha estado, quando voltou do deserto. Ele entrava nas sinagogas, ensinava, consolava e ajudava os doentes. Certa ocasião, enquanto ensinava na sinagoga de uma pequena aldeia sobre o batismo de João, sobre a proximidade do Messias e sobre a necessidade da penitência, os moradores murmuravam, dizendo: "há cerca de três meses vivia seu pai, o carpinteiro, e ele trabalhava com seu pai; depois deu-se a viajar um pouco, e agora já se vem se achando mestre".
Vi-o também em Caná, onde tinha parentes, a quem ele visitou, e vi-o a ensinar. Ainda não o vi com nenhum de seus futuros apóstolos: pareceria que se ocupasse de ir conhecendo os homens, e que ajudasse somente a obra em que João se empenhou. De uma cidade para outra, sempre lhe acompanhava um bom homem do lugar.
Uma vez vi quatro homens, entre eles um que foi apóstolo, esperando à sombra, no caminho entre Samaria e Nazaré, que Jesus passasse, o qual se aproximava precisamente na companhia de um discípulo.
Os homens saíram ao encontro dele e contaram-lhe como haviam sido batizados por João, que lhes falara da proximidade do Messias. Contaram-lhe que tinham falado severamente com os soldados e que deles tinha batizado alguns poucos. Disseram-lhe também que ele podia tomar pedras do Jordão e batizá-las, e lhe referiram outras coisas de João. Então eles continuaram o caminho em seu objetivo. Depois o vi caminhando pelo lago da Galiléia, para o Norte. Falava já mais claramente do Messias, e em vários lugares os possuídos do demônio clamavam atrás dele. Ele expulsou o demônio de um homem e ensinou na sinagoga. Saíram-lhe ao encontro seis homens, que vinham do batismo de João, entre eles Levi, chamado Mateus, e dois filhos de viúvas da parentela de Isabel. Conheciam algo de Jesus por parentesco e por ouvidos, e suspeitavam que pudesse ser aquele de quem falava João Batista, embora não estivessem seguros. Falaram-lhe de João, de Lázaro e de Maria Madalena, opinando que esta devia ter algum demônio. Por esta altura Maria já vivia em seu castelo de Magdala. Estes homens acompanharam Jesus, maravilhando-se dos seus ensinamentos. Os batizados que iam da Galileia para onde estava João, contavam a este o que sabiam de Jesus e o que tinham ouvido dizer, e os de Ainom, onde João batizava, iam a Jesus contando-lhe as coisas de João.
Depois vi Jesus caminhando sozinho junto ao mar, num lugar de pesca rodeado por uma cerca, onde estavam ancorados cinco barcos. Na costa havia várias cabanas habitadas por pescadores. Pedro era o dono daquele local de pesca. Dentro da cabana estavam Pedro e André; João e Tiago e seu pai, o Zebedeu, com outros, estavam no barco. No barco do meio estava o pai da mulher de Pedro com seus três filhos. Eu sabia os nomes de todos esses homens e os esqueci. O pai tinha o apelido de Zelotes, porque em certa ocasião havia disputado com os romanos sobre direitos de pesca no mar da Galiléia e ele ganhou o pleito. Vi uns trinta homens sobre os barcos. Jesus aproximou-se e andava entre as cabanas e os barcos pelo espaço cercado. Falou com André e outros pescadores; não sei se com Pedro também. Eles não deram sinais de saber quem ele era. Ele lhes falou de João e da proximidade do Messias. André era discípulo de João e tinha sido batizado por ele. Jesus disse-lhes que voltaria.

Jesus vai, através do Líbano, a Sidom e a Sarepta

Jesus dirigiu-se, desde a mrgem do mar da Galileia, para o Líbano, por causa das fofocas e do movimento em todo o país: muitos tinham João pelo Messias e outros falavam de outro indicado pelo próprio João. Acompanhavam-no agora, às vezes seis, às vezes até doze discípulos, que se afastavam ou se reuniam no caminho: alegravam-se com o seu ensinamento e suspeitavam que pudesse ser aquele de quem João falava. Jesus ainda não havia escolhido ninguém e andava sozinho, como se estivesse semeando e preparando o terreno para sua missão. Todos esses caminhos estavam relacionados com as viagens dos profetas, especialmente Elias. Jesus dirigiu-se com seus companheiros às alturas do Líbano, em direção à grande cidade de Sidom, às margens do mar. A partir dessas alturas, desfrutava-se de uma esplêndida vista panorâmica. A cidade parecia estar muito perto do mar, mas quando se estava dentro dela via que ainda fica a três quartos de hora de caminho da costa. Era uma cidade bastante grande e cheia de movimento: quando se olhava de uma altura para baixo, parecia que se via uma série interminável de barcos, porque nos telhados planos das casas havia como um bosque de paus de mastros com grandes bandeiras coloridas e de outros tons e umas tecidos sem pintura, colocados e pendurados, e embaixo uma multidão de homens que trabalhava. Nas casas vi que fabricavam todo tipo de recipientes brilhantes. Os arredores estavam cheios de pequenas hortas com árvores frutíferas. Havia grandes árvores e ao redor assentos. Alguns destes assentos estavam sobre os ramos das árvores, aos quais se subia por degraus, e ali repousavam sentadas muitas pessoas como em casas aéreas. A planície em que a cidade estava situada, entre o mar e a montanha, era bastante estreita. Pagãos e judeus traficavam na cidade, onde reinava muita idolatria. O Salvador ensinava e pregava, enquanto andava entre os pequenos povos, sob as grandes árvores, falando de João e do seu batismo e da necessidade de fazer penitência. Jesus foi bem recebido na cidade. Tinha estado lá outra vez. Falou na escola da cidade da proximidade do Messias e da necessidade de deixar a idolatria. A rainha Jezabel, que tanto perseguiu Elias, era desta cidade.
Jesus deixou seus companheiros em Sidom e mudou-se mais ao Norte para um lugar isolado do mar. Quis separar-se dos outros para entregar-se à oração. Este lugar é cercado de um lado por florestas; havia paredes grossas e muitas vinhas ao redor. Era Sarepta, a cidade onde Elias foi alimentado pela viúva. Os judeus associaram a este fato uma superstição da qual participavam os pagãos do lugar: procuravam habitar em torno dos muros das viúvas piedosas e com isso acreditavam que poderiam se entregar a toda sorte de pecados, certos de que nada de ruim lhes aconteceria. Nauele tempo habitavam ali homens idosos. Jesus habitou na propriedade daquela viúva, que agora pertencia a um homem de muita idade. Estes homens eram uma espécie de solitários que por antigo costume e por veneração a Elias se retiram vivendo ali entregues à meditação, à explicação e interpretação das profecias sobre a vinda do Messias e a oração. Jesus lhes falou do Messias e do batismo de João. Embora fossem piedosos, tinham ideias erradas e pensavam que o Messias chegaria com poder temporal e magnificência exterior. Jesus frequentemente se retirava para a floresta de Sarepta para se entregar à oração. Outras vezes ia à sinagoga e também se ocupava de instruir as crianças. Em lugares onde viviviam muitos pagãos, advertia-os para se manterem afastados dos costumes destes. Vi que havia ali gente boa e também alguns muito perversos.
Geralmente o via ir sozinho, a não ser que lhe acompanhasse algum dos vizinhos. Eu o via frequentemente ensinando sob a sombra das árvores, no sopé das colinas, cercado por homens e mulheres. O tempo do ano era tal que me parecia quando estamos aqui no mês de maio, porque nesta terra a segunda colheita é semelhante a de Maio, entre nós. Vi que não cortavam o trigo tão baixo como nós; cortavam-no debaixo das espigas com a mão e cortavam-no a um côvado de altura, e não o debulhavam. Deixavam em pé os pequenos feixes e passavam por cima um rolo puxado por dois bois. O trigo era muito mais seco e caia mais facilmente do que o nosso. O trabalho eles faziam em campo aberto ou sob um telhado de palha, aberto nas laterais. De Sarepta dirigiu-se Jesus para nordeste, para um lugar não distante do campo dos mortos visto por Ezequiel em visão, quando os ossos dos mortos se reuniram, tomando carne e nervos, e vindo um sopro receberam vida e movimento. Sobre isto tive uma explicação: como se pela pregação e batismo de João se cobriam os cadáveres de carne e de nervos, e pelo Espírito de Jesus Redentor, mais tarde pelo Espírito Santo receberiam vida e movimento. Jesus consolou aqui as pessoas que se mostravam abatidas, e falou-lhes e explicou a visão do profeta Ezequiel". Depois dirigiu-se mais para o Norte, para a região onde João havia se encaminhado ao sair do deserto. Havia ali uma pequena cidade onde Noemi e Rute haviam parado por algum tempo. A fama dessas mulheres era tal que ainda se falava delas com elogios. Mais tarde, retirou-se para Belém. O Senhor pregou aqui com muito zelo. Aproximava-se o tempo em que ele se retiraria para o sul, para seu batismo, através da Samaria.
Jacó também teve aqui campos de pastoreio. Através do Prado corria um riacho, atrás do qual estava o poço de João, bastante alto, do qual se abria um caminho que levava ao campo dos mortos visto por Ezequiel. Dali descia até o lugar onde Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, descendo sempre. Nesta descida as árvores se tornavam cada vez menores e atarracadas, até que chegaram no meio de arbustos espessos, onde tudo já era selvagem e deformado. O paraíso estava no alto, como o sol, e ia descendo como atrás de uma montanha, que parecia por sua vez levantar-se.
O Salvador andou pelo mesmo caminho que Elias fez quando foi do ribeiro de Carite a Sarepta. Ele estava de volta ao campo dos pastores em direção a Sarepta. Ensinava durante o trajeto e passava sem parar por Sidon. De Sarepta iria muito em breve para o sul para o batismo; mas parou em Sarepta para celebrar o sábado.
Depois do sábado eu o vi caminhando para Nazaré, ensinando em alguns lugares, sozinho ou acompanhado: sempre o via descalço. Ele usava suas sandálias, que ele calçava quando chegava a alguma população. Vi-o pelos vales, nas proximidades do Carmelo, e outra vez no caminho, muito perto de onde se ia para o Egito. De repente, dirigiu-se para o Oriente.
Vi também, caminhando para Nazaré, a mãe de Deus, Maria Cléofas, a mãe de Pármenas e duas de Jerusalém à Serafia (Verônica), a Joana Chusa e ao filho de Serafia, o qual mais tarde se uniu aos apóstolos. Estes iam reunir-se com Maria; eram conhecidos dela pelas idas anuais a Jerusalém. Haviam três lugares onde as piedosas famílias, com Maria e José, costumavam fazer suas devoções todos os anos: o templo de Jerusalém, a árvore do terebinto perto de Belém e no Monte Carmelo. A família de Ana e outras pessoas piedosas iam a este lugar geralmente em maio, quando voltavam de Jerusalém. Havia ali um poço e a caverna de Elias que parecia uma capela. Chegavam em diversos tempos piedosos judeus, que esperavam a vinda do Messias; havia outros que viviam ali como solitários, e mais tarde houveram cristãos. A leste do monte Tabor ensinou Jesus, na escola de uma pequena aldeia, sobre o batismo de João. Vi com Jesus cinco companheiros, entre eles alguns que mais tarde foram discípulos.
O Sinédrio de Jerusalém enviou cartas a todas as sinagogas e pontos principais da Palestina com mensageiros, para prevenir as pessoas contra aquele do qual João havia dito que era ele que devia vir e que logo iria ser batizado. Dizia-se aos chefes que ficassem atentos a essa pessoa, dassem conta de suas andanças, acrescentando que se fosse o Messias não necessitava do batismo. Estes escribas e fariseus estavam muito preocupados, desde que souberam que era o mesmo que quando criança os confundira no templo. Vi estes mensageiros chegarem a uma cidade situada a quatro horas do caminho de Hebrom para o mar; era a mesma de onde os mensageiros de Hebrom Moisés e Arão trouxeram aqueles grandes cachos de uvas. A cidade chamava-se Gaza. Vi ali uma longa fila de lojas e aposentos que chegavam até o mar, onde se vendiam sedas e outras mercadorias.
Jesus chegou ali e ensinou em vários lugares, até o poço de Jacó, e celebrou o sábado. Quando voltou a Nazaré, vi que a mãe de Deus lhe saiu ao encontro; mas ao ver que chegava com alguns discípulos, permaneceu a certa distância e voltou sem se aproximar para saudar Jesus. Fiquei admirada de seu espírito de sacrifício, ao privar-se desse gosto. Ao ensinar Jesus na sinagoga estavam ali as santas mulheres. Quando alguns dias depois, com seus cinco companheiros e uns vinte jovens ansiosos de sua infância, ensinou na sinagoga diante de muitos de Nazaré, já não estavam presentes as santas mulheres. Os ouvintes murmuravam contra ele dizendo que talvez ele quisesse tomar o lugar do batismo, abandonado por João, e batizando-se querer se passar como outro igual a João; mas que não o conseguiria, Porque João vinha do deserto, e que a ele bem o conheciam, e não conseguiria enganá-los.

Jesus em Betsaida e em Cafarnaum

Jesus deixou Nazaré para dirigir-se a Betsaida, onde queria despertar da sua letargia alguns com o seu ensinamento. As santas mulheres e outros acompanhantes permaneceram ainda em Nazaré. Jesus tinha estado na casa de sua mãe, onde se reuniram outros amigos, e declarou-lhes que pensava ausentar-se porque se haviam suscitado murmurações contra ele: que pensava ir a Betsaida, para voltar a Nazaré mais tarde. Estavam com Jesus um filho daquela que se chamou depois Verônica, de nome Amandor, outro filho de uma das três viúvas aparentadas com Jesus: seu nome soou para mim como Sirac, e um parente de Pedro, que mais tarde foi discípulo.
Na sinagoga de Betsaida pregou Jesus com muita energia na festa de sábado. Disse-lhes que deviam aceitar a confissão, ir ao batismo de João e purificar-se por meio da Penitência; caso contrário, viria um tempo em que eles clamariam: "Ai! Ai!" Havia muita gente na sinagoga; mas creio que nenhum dos futuros discípulos, exceto Filipe. Os outros apóstolos, que eram de Betsaida, me pareceu que estariam em outras sinagogas naquele sábado. Jesus vivia com seus homens em uma casa perto dos pescadores em Cafarnaum.
Enquanto Jesus pregava em Betsaida, eu orava para que as pessoas fossem ao batismo de João e se convertessem. Então tive uma visão onde vi João como lavava e tirava as manchas maiores e mais graves daquela gente, em caráter de precursor daquele que havia de vir. Vi como se esmerava com ardor em seu trabalho, de modo que às vezes lhe caía a pele de um ombro ao outro ombro; isto me parecia uma figura do que acontecia com os batizados, aos quais vi que caíam como tina e escamas, e de outros saía como uma fumaça negra; enquanto sobre outros mais dispostos chegavam raios de luz.
Ensinou também na escola de Cafarnaum. De todas as partes acudiam ouvintes: vi Pedro, André e muitos outros que já haviam sido batizados por João. Quando ele deixou Cafarnaum, eu o vi ensinando em um lugar a cerca de duas horas de caminho para o sul, cercado pela multidão.
Com ele estavam três discípulos. Outros apóstolos que o haviam seguido e ouvido em Cafarnaum voltaram-se para suas ocupações, não havendo Jesus ainda falado com eles em particular. O tema da pregação de Jesus foi, também aqui, o batismo de João e a proximidade da promessa cumprida. Depois o vi ao sul da baixa Galiléia, ensinando, e em direção a Samaria.
Celebrou o sábado numa pequena aldeia entre Nazaré e Séforis. Ali estavam as santas mulheres de Nazaré, a mulher de Pedro e outras mulheres dos que foram apóstolos mais tarde. O local era formado por poucas casas e uma escola, em um espaço separado da casa de Ana por um campo. Dos futuros apóstolos tinham ido ouvir a sua pregação Pedro, André, Tiago O Menor, Filipe, todos discípulos de João. Filipe era de Betsaida, tinha aspecto distinto e se ocupava de escrituras. Jesus não parou aqui nem tomou alimento: apenas ensinou. Possivelmente os apóstolos tinham celebrado o sábado em alguma sinagoga próxima. Era costume dos judeus visitar diferentes sinagogas. Esses discípulos partiram depois de terem ouvido Jesus, que ainda não havia falado com eles em particular.

Os endemoninhados de Séforis

Jesus saiu com três discípulos, através de uma montanha, para Séforis, a quatro horas de caminho de Nazaré. Ele entrou na casa de uma tia, a irmã mais nova de Ana, chamada Maraha. Esta tinha uma filha e dois filhos com vestes brancas e compridas: chamavam-se Arastaria e Cocharia, e foram mais tarde discípulos. A mãe de Deus, Maria, Maria Cleofas e outras mulheres se dirigiram ao mesmo ponto. Ali vi que lavaram os pés de Jesus e se fez uma refeição. Dormiu na casa de Maraha, que era dos antepassados de Santa Ana. Séforis era uma cidade bastante grande e tinha três comunidades: a dos fariseus, a dos saduceus e a dos essênios, e três escolas. Sofreu muito por causa de guerras, e naquela época não restava quase nada dela.
Jesus permaneceu vários dias ensinando e exortando ao batismo de João.
No mesmo dia, ele ensinou em duas sinagogas, uma superior à outra. Na primeira, os fariseus murmuravam contra ele; estavam presentes as santas mulheres. Na outra, dos essênios, não havia lugar para as mulheres, e lá foi bem recebido.
Quando ele começou a ensinar na sinagoga dos saduceus algo maravilhoso aconteceu. Havia em Séforis um lugar onde se reuniam muitos endemoninhados, retardados, loucos e desequilibrados. Reuniam-se num recinto, perto da escola, onde eram ensinados; e quando havia explicação para os demais na sinagoga, eram introduzidos para que a ouvissem. Eles estavam atrás dos outros e ouviam a pregação. Havia entre eles guardiões que os obrigavam com açoites a permanecerem quietos quando se debandavam. Vi estes desgraçados, antes que Jesus entrasse na sinagoga, inquietarem-se e irritarem-se uns aos outros, dilacerando-se, e atacados de convulsões, enquanto ensinavam os saduceus e os guardiães os sujeitavam à força de açoites. Ao entrar Jesus, todos emudeceram; mas logo começou um e outro a clamar: "este é Jesus de Nazaré, nascido em Belém, visitado pelos reis Magos do Oriente, e em Maraha está sua mãe. Começou a pregar uma nova doutrina, e não devem ouvi-la". Deste modo clamavam, enquanto narravam todos os acontecimentos da vida de Jesus, quer um, quer outro dos endemoninhados, apesar dos golpes dos guardiões. Então disse Jesus que se aproximassem deles, e enviou dois discípulos à cidade para que trouxessem os outros endemoninhados. Pouco tempo depois, cerca de cinquenta deles estavam reunidos, acompanhados de muitos curiosos. Os endemoninhados continuavam clamando mais do que antes, até que Jesus interveio e disse: "o espírito que fala por eles vem do fundo e deve voltar para o fundo de onde veio". Ao ponto que se encontraram todos sãos e bons, caindo alguns ao chão pela saída dos espíritos. Levantou-se um tumulto na cidade por este prodígio e Jesus e os seus se viram em grande perigo. Aumentou de tal maneira o alvoroço que Jesus fugiu para uma casa e à noite saiu da cidade, com os três discípulos e Arastaria e Cocharia, filhos da irmã de Ana. Também saíram as santas mulheres.
Maria ficou aflita e sofreu muito ali, porque viu pela primeira vez que perseguiam Jesus para prejudicá-lo. Fora da cidade, reuniram-se debaixo de árvores e dirigiram-se para Betúlia.

Jesus em Betúlia

A maioria dos que Jesus curou ali foram ao batismo de João e mais tarde seguiram Jesus como discípulos. Betulia era aquela cidade em cuja defesa Judite matou Holofernes. Estava situada ao meio-dia, a leste de Séforis, sobre uma altura, de onde se abrangia uma grande extensão.
Não havia muita distância dali para o Castelo de Magdala, onde Maria Madalena morava em todo o seu esplendor. Em Betulia havia um castelo e havia poços de água abundantes. Jesus e seus companheiros tomaram abrigo à entrada da cidade, e as santas mulheres voltaram a reunir-se ali. Ouvi dizer que Maria dizia a Jesus para não ensinar ali, pois estava muito temerosa de que se levantasse um tumulto. Jesus respondeu-lhe que já o sabia e que devia cumprir a sua missão. Maria perguntou: "Não devemos ir agora ao batismo de João?" Jesus respondeu com certa seriedade: "Por que devemos ir agora ao batismo de João? É acaso necessário?... Ainda tenho que caminhar e juntar discípulos. Já direi quando será necessário ir ao batismo de João". Maria calou-se, como nas bodas de Caná.
Só depois do Pentecostes vi as mulheres serem batizadas no Lago de Bethesda. Estas santas mulheres entraram na cidade de Betúlia, E Jesus ensinou na sinagoga no sábado. Muitas pessoas da região se reuniram para ouvir sua explicação. Também aqui vi muitos possuídos de demônios e outros fatuos nos caminhos, diante da cidade, e em algumas ruas por onde passava Jesus. Calavam-se em sua presença, estavam calados e Jesus os livrava de seu mal. As pessoas exclamavam:"este homem deve ter uma força prodigiosa, como os antigos profetas, porque estes furiosos se aquietam em sua presença". Estes sentiam-se aliviados, ainda que diretamente não os tivesse tocado nem falado, e aproximaram-se do albergue para lhe agradecer. Jesus ensinou, exortou com palavras severas e disse-lhes para irem ao batismo de João. O povo de Betúlia mostrou apreço por Jesus e não permitiu que ele continuasse vivendo fora da cidade: disputavam a honra de abrigá-lo em suas casas e os que não o conseguiram quiseram ao menos hospedar algum dos cinco discípulos que o acompanhavam. Estes não quiseram abandonar Jesus; então o Salvador disse aos convidados que ele iria às várias casas que lhe ofereciam. Este amor e entusiasmo por Jesus não estava isento de interesse e Jesus não deixou de fazê-lo notar durante os ensinamentos da sinagoga. Tinham a intenção, não confessada, de recuperar, com as atenções ao novo profeta, a fama que haviam perdido por seu comércio e sua mistura com pagãos e gentios.
Não havia, pois, neles verdadeiro amor à verdade.
Quando Jesus se retirou de Betúlia, eu o vi pregando em um vale próximo sob as árvores. Ele foi seguido pelos cinco discípulos e cerca de vinte pessoas no total. As santas mulheres partiram rumo a Nazaré. Jesus abandonou Betúlia porque lhe urgiam demasiado ali. Eles haviam reunido muitos possessos e doentes ao redor, e ele ainda não queria exercer seu poder de curar tão publicamente. Quando ele se afastou, ficou o mar da Galiléia atrás dele. O lugar de onde falava era um lugar destinado desde muito atrás para o ensino exercido pelos profetas aos essênios. Estava coberto de grama verde e tinha arquibancadas para sentar e ouvir mais descansadamente. Ao redor de Jesus havia então cerca de trinta pessoas. À tarde, vi-o com seus companheiros nas proximidades de Nazaré, a cerca de uma hora de uma pequena cidade com uma sinagoga, onde havia estado antes de partir para Séforis. Eles o receberam amigavelmente e o levaram para uma casa com pátio adjacente. Ali lavaram os pés a ele e a seus companheiros, tiraram-lhes os mantos e os limparam do pó, golpeando-os e escovando-os, enquanto lhes preparavam comida. Jesus ensinou na sinagoga, enquanto as santas mulheres chegavam a Nazaré.

Jesus em Kedes e Jezrael

Passados alguns dias, Jesus dirigiu-se, duas milhas mais longe, à cidade de levitas Kedes ou Kision. Seguiam-no uns sete possuídos do demônio, os quais, em voz ainda mais alta que os de Séforis, iam proclamando sua missão e sua história. Da cidade saíram ao seu encontro sacerdotes, anciãos e jovens com vestes brancas e compridas. Alguns dos discípulos o precederam anunciando sua chegada. Jesus não curou nem livrou os possessos ali e os sacerdotes os trancaram em um local para que não incomodassem. Ele curou e livrou esses infelizes apenas após seu batismo. Receberam-no muito bem e serviram-no; mas, quando quis ensinar, perguntaram-lhe que missão levava e com que autoridade, visto que era só conhecido filho de Maria e de José. Ele respondeu dizendo, em termos gerais, quem o enviava, quem, era Ele a quem enviava, e que no batismo saberiam melhor Quem o enviava. Ensinou muito tempo, acerca do batismo de João, sobre uma colina no meio da povoação, onde havia, como em Thebez, um lugar disposto coberto com um telhado de juncos e galhos. Dali Jesus passou ao lugar chamado dos pastores, onde mais tarde, depois da Segunda Páscoa, curou um leproso e ensinou em diversos lugares aos arredores. No dia de sábado chegou com seus acompanhantes a Jezrael, povoado com casinhas espalhadas entre jardins, prédios ruinosos e torres derrubadas.
Atravessou por meio de um caminho principal, chamado O Caminho do Rei. Alguns companheiros o haviam precedido, E Jesus ia com apenas três de seus discípulos.
Neste lugar viviam alguns judeus, rigorosos observantes da lei: não eram essênios, mas nasireos. Faziam votos por determinado tempo e viviam em certa continência. Eles possuíam uma escola com vários quartos. Os meninos viviam em comunidade em um desses edifícios e as meninas em outro. Os casados costumavam fazer votos de continência por algum tempo, durante o qual os homens residiam nas casas das crianças e as mulheres nas das meninas.
Todos usavam branco ou cinza. O chefe usava uma túnica longa de cor cinza, a roda com desenhos de frutas brancas e borlas, e usava um largo cinto cinza com letras brancas. Em um braço tinha uma fita de uma matéria tecida bastante grossa, cinza e branca, semelhante a um guardanapo dobrado. Pendia dela uma ponta terminada em franjas. Usavam também um manto curto ao redor do pescoço, como o do chefe dos essênios Arcos, de cor cinza, e em vez de estar aberto pela frente o estava por trás. No peito tinha um escudo brilhante fechado pelas costas com cordinhas. Sobre os ombros, eles usavam alguns retalhos de tecido. Todos usavam turbante de uma cor escura brilhante: na testa tinha letras e na coroa da cabeça se juntavam três bandas formando um botão semelhante à maçã. As bordas do turbante eram brancas e cinza. Os homens usavam barba longa e cabelos sem cortes.
Lembravam-me dos apóstolos, entre os quais julgava encontrar semelhança; mas especialmente lembravam-me de Paulo, que tinha os cabelos e as vestes como estes quando perseguia os cristãos. Mais tarde vi Paulo entre eles, porque era nasireo. Deixavam-se crescer os cabelos até cumprir o voto; depois os cortavam e os ofereciam queimando-os no fogo.
Eles também ofereciam pombos. Um podia entrar fazendo parte do voto de outro. Jesus celebrou o sábado no meio deles. Jezrael era separada de Nazaré por meio de uma montanha. Nas proximidades havia um poço, onde Saul esteve por um tempo com seu exército.
Jesus ensinou no sábado sobre o batismo de João. Disse-lhes, entre outras coisas, que a piedade era coisa muito boa; mas que o exagero oferecia algum perigo; que os caminhos da salvação eram diversos; que o afastamento uns dos outros poderia degenerar em seitas; que facilmente se olhava com orgulho e própria complacência para os outros irmãos e aos pobres não, os quais, no entanto, deveriam ser ajudados e levados pelos mais fortes.
Este ensinamento era muito oportuno, porque nos arredores viviam povos misturados com os gentios, sem guia nem conselheiros, porque os nasireos se afastavam deles. Jesus visitou esses pobres vizinhos e os exortou a irem ao batismo de João. Ele estava no dia seguinte em uma refeição de nasireos. Falaram da circuncisão relacionando-a com o batismo. Ali ouvi pela primeira vez Jesus tratar da circuncisão. Era impossível reproduzir suas palavras. Disse, mais ou menos, que o preceito da circuncisão tinha um fundamento que devia cessar muito em breve; isto é, quando o povo não estivesse já unido tão carnalmente à descendência de Abraão, mas que renascesse pelo batismo do Espírito Santo a uma vida espiritual. Dentre estes nasireos se fizeram muitos cristãos; mas em geral se atinham tanto ao judaísmo que muitos pretendiam misturar o cristianismo ao judaismo, e assim caíram na heresia e no erro.

Jesus entre os publicanos

Quando Jesus se despediu de Jezrael, dirigiu-se para o Oriente, contornou a montanha que estava entre Jezrael e Nazaré, e a duas horas de Jezrael permaneceu em um pequeno grupo de casas em ambos os lados da estrada real. Moravam ali muitos publicanos e outros judeus pobres um pouco mais afastados do caminho. O caminho que passava entre as casas estava guardado com grades e fechado à entrada e à saída. Havia ricos publicanos que tinham sob suas ordens outras estações de pagamento, que por sua vez subalquilavam esses postos a outros. Um desses publicanos subordinados era Mateus, que tinha seu posto em outro lugar. Ali viveu aquela Maria, filha de uma irmã de Isabel, que depois de viúva passou a Nazavete, depois a Cafarnaum e mais tarde esteve presente à morte de Maria Santíssima. Por aqui passava o caminho real que se dirigia da Síria, Arábia, Sidom para o Egito.
Conduziam por este caminho, sobre camelos e jumentos, grandes fardos de seda branca, em feixes, como linho, tecidos brancos e coloridos, tapetes grossos entrelaçados e muitas especiarias e ervas. Quando os camelos chegavam com suas cargas, eram detidos, trancados e obrigados a mostrar suas mercadorias.
Os passageiros tinham que pagar lá direitos em mercadoria ou dinheiro. As moedas eram peças triangulares ou quadradas amarelas, brancas ou avermelhadas com uma figura gravada de um lado em baixo-relevo e do outro em alto-relevo. Eu Vi outros tipos de moedas com torres, ou uma virgem, ou uma criança dentro de uma canoa.
As moedas finas trazidas pelos Reis Magos e oferecidas na manjedoura, voltei a vê-las entre alguns estrangeiros que iam ao batismo de João. Estes publicanos eram entendidos entre si e quando um deles conseguia enganar os viajantes em dinheiro ou especiarias, os lucros eram distribuídos. Eles eram ricos e viviam confortavelmente. As casas eram adornadas e providas de pátios, jardins e muros ao redor: lembravam-me as fazendas de nossos grandes camponeses. Seus moradores viviam afastados dos demais.
Eles tinham uma escola e um professor. Jesus foi bem recebido por eles. Chegaram algumas mulheres, entre elas a de Pedro, creio eu. Uma falou com Jesus e depois se retiraram de lá. Talvez viessem de Nazaré e trouxessem alguma mensagem de Maria para Jesus. Jesus já estava com um, já com outro dos publicanos e ensinava na escola. Ele lhes mostrou que às vezes extorquiam os viajantes levando mais do que era justo. Eles se mostraram envergonhados, sem saber explicar como Ele poderia saber. Apesar de tudo, receberam seus ensinamentos melhor do que outros e mostraram-se muito humilhados em sua presença.
Ele os exortou a irem ao batismo de João.

Jesus em Kisloth Tabor

Jesus deixou o lugar dos publicanos depois de ter ensinado a noite toda. Muitos deles queriam dar-lhe presentes, mas ele não aceitou os presentes. Alguns o seguiram com o propósito de ir ao batismo de João. Jesus chegou a Dotaim, perto da casa onde estavam aquelas pessoas furiosas que haviam morado na sua primeira viagem desde Nazaré. Ao passarem, começaram a gritar o nome de Jesus e tentaram sair. Jesus disse ao guardião para deixá-los ir, que Ele era o responsável pelas consequências.
Foram libertados, acalmaram-se, viram-se libertos do seu mal e seguiram-no.
Perto da tarde Jesus chegou a Kisloth, uma cidade próxima ao Monte Tabor. Muitos fariseus viviam ali e ficaram escandalizados ao ver Jesus na companhia de cobradores de impostos, de possuídos por demônios e de todo tipo de gente humilde. Jesus entrou na escola da cidade e ensinou sobre o batismo de João. Ele disse aos seus companheiros que pensassem bem antes de segui-lo, se pudessem, pois seu caminho e modo de vida certamente não eram confortáveis ​​nem agradáveis. Contou-lhes alguns exemplos de construtores: se alguém quisesse construir uma casa, deveria pensar se o dono do terreno permitiria; que antes fizesse amigos e fizesse penitência; e se alguém quisesse construir uma torre, teria primeiro de calcular o seu custo. Ele disse outras coisas que não agradaram aos fariseus. Eles não o ouviram, mas antes o perseguiram; Então eu os vi discutir entre si que lhe dariam uma refeição para espionar suas palavras e expressões. Na verdade, prepararam para ele um ótimo jantar em um local aberto. Havia três mesas juntas e à direita e à esquerda havia lâmpadas acesas. À mesa do meio estava Jesus com alguns do seu povo e os fariseus; O centro da sala tinha um teto aberto; Nas mesas laterais estavam outros companheiros de Jesus. Deve ter havido nesta cidade um antigo costume de que quando alguém preparava um banquete para um estrangeiro, eram convidados também os pobres, dos quais havia muitos esquecidos na cidade; pois quando Jesus se sentou à mesa perguntou imediatamente aos fariseus onde estavam os pobres que tinham o direito de participar. Os fariseus ficaram confusos e disseram que há muito tempo isso não era observado. Então Jesus ordenou aos seus discípulos Arastaria, Cocharia, filhos de Maraha, e Kolaya, filho da viúva Ceba, que fossem procurar os pobres da cidade. Isto causou grande escândalo entre os fariseus e admiração na cidade. Muitas dessas pobres pessoas já estavam dormindo. Vi os mensageiros acordarem estes pobres nas suas cabanas, e vi muitas expressões de alegria entre eles, que responderam ao chamado. Jesus e os discípulos os receberam e os serviram, enquanto ele lhes ensinava lindos ensinamentos.
Os fariseus ficaram muito chateados, mas não podiam fazer nada no momento, porque Jesus estava certo e o povo estava feliz com isso. Houve um grande movimento em toda a cidade por conta dessa novidade. Depois de comerem, estes pobres ainda levavam consigo alguma coisa para os que tinham ficado em casa. Jesus abençoou aqueles alimentos e depois de ter orado com eles, exortou-os a irem ao batismo de João.

Jesus no lugar dos pastores chamado Kimki

Jesus passava pela noite entre dois vales: via-o falar de vez em quando com os seus companheiros, outras vezes se atrasarem, ajoelharem-se e rezarem, e alcançarem seus discípulos. Na tarde do dia seguinte vi Jesus chegar a um lugar de pastores com casas espalhadas. Havia ali uma escola, embora não tivessem sacerdotes. Eles costumavam vir de outro lugar muito distante. A escola estava fechada. Jesus reuniu os pastores na sala de uma pousada e os ensinou. Como estava próxima a festa do sábado, compareceram à tarde sacerdotes e fariseus, alguns procedentes de Nazaré.
Jesus falou sobre o batismo de João e a proximidade do Messias. Os fariseus se mostravam contrários a Jesus: referiam-se à sua humilde origem e tratavam de desprestigiá-lo. Jesus passou ali a noite.
No sábado falou em parábolas: pediu uma semente de mostarda, e, havendo-a obtido, disse que se tivessem fé sequer como um grão de mostarda poderia conseguir jogar uma pereira no mar. Havia ali, de fato, uma grande pereira carregada de frutos. Os fariseus zombaram desses ensinamentos, que julgavam pueris. Jesus explicou melhor suas palavras; mas esqueci a explicação.
Ele também contou a eles sobre o mordomo infiel. O povo, ao contrário, tanto aqui como nos arredores, maravilhava-se de Jesus, e dizia como tinham ouvido de seus antepassados, que falavam dos profetas e suas doutrinas, parecendo-lhes que este era como aqueles profetas em seu modo de ser e em seus ensinamentos; mas mais bondoso que os antigos. Aquele lugar dos pastores era chamado Kimki. Dali viam-se as montanhas de Nazaré: estava a cerca de duas horas de caminho. As casas estavam espalhadas, apenas em torno da sinagoga havia um conjunto de casas. Jesus se abrigou entre os pobres. A dona da casa estava doente, hidrópica. Jesus teve pena dela, curando-a apenas colocando a mão sobre a cabeça e o estômago. De repente, encontrou-se bem completamente e pôs-se a servir a mesa. Jesus proibiu ela de falar sobre aquele prodígio até seu retorno do batismo. Ela perguntou por que não deveria contar a todos. Jesus respondeu:"Se falares disto, ficarás muda". Com efeito, ela emudeceu até à volta de Jesus do seu batismo.
Faltavam, creio eu, cerca de 14 dias para o seu batismo, porque estando em Betúlia ou Jezrael ele falou de um término de três semanas.
Jesus ensinou ali até o terceiro dia; os fariseus se mostravam contrários a ele.
Jesus falou da proximidade da vinda do Messias e disse-lhes: "vós esperais o Messias em esplendor mundano; mas ele já veio e apareceu como pobre; ele trará a verdade; recolherá mais desprezos do que louvores, pois ele ama a justiça. Não vos deixeis afastar dele, para que não vos percais como aqueles filhos de Noé que zombavam dele enquanto fabricava a arca que devia salvá-los do dilúvio universal". Então falou só para seus discípulos: "não vos aparteis de mim como se apartou Ló de Abraão, o qual, procurando os melhores pastos, se afastou para Sodoma e Gomorra; não olheis para o esplendor do mundo, que será destruído pelo fogo do céu, para que não sejais transformados em estátuas de sal. Permanecei comigo nas adversidades, que eu vos ajudarei em todas as necessidades". Estas e outras coisas disse-lhes. Os fariseus se mostravam cada vez mais contrariados, e diziam: "O que este pode prometer a eles, se não tem nada ele mesmo?... Não és tu de Nazaré, filho de Maria e de José?..."Jesus disse-lhes secretamente quem Ele era o Filho e como isso seria conhecido no Seu batismo. Os fariseus lhe disseram: “Como você pode falar do Messias aqui e em todos os lugares onde você ensinou, como descobrimos? Você acha, talvez, que devemos acreditar que você fala pelo Messias? ." Jesus contentou-se em dizer: "Não há resposta para esta pergunta por enquanto, mas esta: Sim, você pensa assim." Surgiu então um tumulto na sinagoga; Os fariseus apagaram as lâmpadas e Jesus e os discípulos deixaram o local e seguiram pela estrada real à noite. Mais tarde eu os vi descansando debaixo de uma árvore.
No dia seguinte, pela manhã, vi que muitas pessoas esperavam Jesus nos caminhos. Não tinha estado com ele no local anterior, em parte o tinham precedido. Vi Jesus se afastar com eles do caminho e, por volta das três da tarde, chegar a um prado onde havia algumas cabanas de palha habitadas por pastores em certas épocas do ano. Não vi mulheres. Os pastores saíram ao encontro dele. Eles certamente sabiam sua próxima chegada por aqueles que haviam chegado antes. Enquanto uns saíram ao encontro dele, outros mataram e prepararam aves, fizeram fogo e prepararam uma refeição em sua honra. Isso acontecia em um saguão aberto da pousada; dentro estava a lareira separada do resto da casa por uma parede. Ao redor havia assentos com costas cobertas de verde. Levaram Jesus para dentro, como também os seus companheiros, que eram uns vinte e outros tantos pastores. Todos lavaram os pés. Jesus tinha uma fonte à parte. Ele pediu um pouco mais de água e disse-lhes para não derramar. Quando se prepararam para a refeição, Jesus viu que estavam um pouco constrangidos e perguntou-lhes o que os preocupava, e se não faltavam alguns. Disseram-lhe que estavam aflitos porque tinham dois companheiros doentes de lepra; disseram que temiam que, por se tratar de doença impura, Jesus não quizesse aproximar-se e por isso ambos se tinham escondido. Então Jesus ordenou aos seus discípulos que trouxessem os dois enfermos. Vieram estes dois envoltos da cabeça aos pés em panos de modo que mal podiam andar, acompanhados cada um por dois companheiros. Jesus advertiu-os e disse-lhes que a sua lepra não vinha de dentro, mas de contágio exterior. Eu tinha então o conhecimento de que a lepra deles provinha não de sua maldade e perversidade, mas apenas por sedução. Ordenou que se lavassem na água que lhe haviam servido, e ao fazê-lo vi que caíam como escamas de seus corpos enfermos e só lhes restavam algumas manchas vermelhas. Essa água foi derramada em um buraco e coberta com terra. Jesus ordenou a essas pessoas que não dissessem nada do que aconteceu até que ele voltasse de Seu batismo. Depois falou-lhes de João e da proximidade do Messias. Perguntaram então, com toda simplicidade, a quem deviam seguir: a João ou a Ele, quem era o maior.
Ele explicou-lhes então que o maior era aquele que mais humildemente servisse; aquele que mais se humilhasse em amar, esse era o maior. Exortou-os também a irem ao batismo de João. Falou-lhes das dificuldades de o seguir e liberou todos os seus acompanhantes, menos os cinco discípulos. Ele levou os outros a um lugar no deserto, não muito longe de Jericó, pareceu-me nas proximidades de Ofra. Joaquim tinha nestes lugares um campo de pastoreio. Uma parte desse povo o abandonou definitivamente; outra parte foi ao batismo de João; e o resto foi antes para sua casa para se preparar para ir depois ao batismo de João, Jesus e os cinco se dirigiram a Nazaré já muito tarde, a apenas uma hora de caminho. Não entraram na cidade: aproximaram-se pela porta que dava para o leste, onde passava o caminho que conduz ao mar da Galileia. Nazaré tinha cinco portas; ali estava uma delas, pequena, a um quarto de hora da cidade, numa altura íngreme da qual pretendiam uma vez precipitar o próprio Jesus. Ao pé viam-se algumas cabanas. Jesus disse-lhes que buscassem refúgio em uma dessas casinhas, enquanto ele passava a noite em outra. Todos receberam água para lavar os pés, um pedaço de pão para comer e lugar para descansar. Ana tinha uma possessão nas proximidades de Nazaré, olhando para o Oriente. Vi que os pastores puseram pão sobre as cinzas, para cozê-lo ao fogo. Eles tinham um poço de água, mas não murado.

Jesus com o essênio Eliud mistérios do Antigo Testamento e a encarnação

O Vale através do qual Jesus andou durante a noite desde Kisloth Tabor, era chamado Aedron, e o campo dos pastores com a sinagoga onde os fariseus de Nazaré zombaram tanto de Jesus, era chamado Kimki.
As pessoas a quem Jesus falou perto de Nazaré eram essênios, amigos da Sagrada Família. Viviam em lugares ajardinados junto às ruinosas muralhas da cidade; habitavam homens solteiros e poucas mulheres, separadas deles. Eles cultivavam pequenas hortas; os homens usavam longas túnicas brancas e as mulheres usavam mantos. Moravam antes no Vale de Zebulom, junto ao Castelo de Herodes; mas, por amizade com a Sagrada Família, tinham-se mudado para estes lugares de Nazaré. O essênio junto ao qual Jesus se hospedou, chamava-se Eliud, um ancião de longa barba e de aspecto muito venerável. Ele era viúvo e era atendido por uma filha. Era filho de um irmão de Zacarias. Este povo vivia em retiro: ia à sinagoga de Nazaré, tinha amizade com a Sagrada Família, e lhes fora confiado o cuidado da casinha de Nazaré na ausência de Maria. Na manhã seguinte, os cinco discípulos de Jesus foram para Nazaré, visitando seus parentes e a escola local. Entretanto, Jesus permaneceu com Eliud, o essênio. Com este ancião parou orando e conversando familiarmente. Muitos segredos divinos haviam sido revelados a este ancião de extrema simplicidade.
Na casa de Maria estavam, além dela, quatro mulheres: sua sobrinha Maria Cleofas, prima de Ana, a do templo, Joana Chusa, parenta de Simeão, Maria Mãe de João Marcos e a viúva Lea. A Verônica não estava mais ali, nem a mulher de Pedro, que tinha visto no lugar dos publicanos.
Pela manhã vi Maria, com Maria de Cléofas, ao lado de Jesus. Jesus deu a mão a Maria, sua mãe. Seu comportamento com ela era cheio de amor, embora parecesse sério e quieto. Maria manifestou-se muito preocupada com Jesus, e disse-lhe que não convinha ir a Nazaré, pois ali havia muita animosidade contra ele. Os fariseus de Nazaré, que tinham estado em Kimki e o tinham ouvido na sinagoga, estavam muito irados contra ele e tinham predisposto o povo. Jesus disse a Maria que ia deixar seus companheiros, até que fosse ao batismo de João e que ele só iria a Nazaré. Disse várias outras coisas, pois Maria voltou no dia duas ou três vezes ao lado de seu filho. Disse-lhe também que ele iria três vezes à Páscoa a Jerusalém e que na última ela sentiria grande aflição. Ele revelou-lhe outros segredos, que eu esqueci neste momento. Maria de Cléofas era uma mulher de belo porte e atraente; falou com Jesus durante a manhã de seus cinco filhos, rogando-lhe que os fizesse seus discípulos. Um deles era escrivão, espécie de Juiz de paz, chamado Simão; dois eram pescadores, Tiago o menor, e Judas Tadeu; estes eram filhos do seu primeiro marido Alfeu, que lhe tinha dado um enteado chamado Mateus, de quem se lamentava muito por ser um publicano, cobrador de impostos. De seu segundo marido, Sabas, teve um filho chamado José Barsabas, pescador, e, finalmente, teve outro filho de seu terceiro marido, Jonas, pescador: este menino era Simeão. Jesus consolou-a dizendo-lhe que seus filhos viriam com ele, e sobre Mateus (que já tinha estado com Jesus no caminho para Sidom) disse-lhe que ele também viria e seria um dos melhores.
Maria, entretanto, partiu de Nazaré para sua morada em Cafarmnaum com algumas de suas amigas. Tinham chegado de lá alguns criados com jumentos para acompanhá-las. Levaram outros objetos que tinham ficado em Nazaré da última vez: mantas e pacotes com utensílios; tudo se tinha acondicionado em cestos de vime e carregado nos jumentos. A casinha de Maria em Nazaré parecia durante esta ausência uma capela bem adornada e o lar assemelhava-se a um altar. Sobre ela havia um pequeno caixão e sobre ele um vaso com imortelas. Durante a ausência de Maria habitavam a casa alguns essênios.
Durante o dia esteve Jesus em íntima conversa com o ancião Eliud.
Este perguntou a Jesus sobre sua missão e ele lhe declarou muitas coisas. Disse-lhe que era o Messias e falou de toda a linhagem de sua descendência, esclarecendo-lhe o mistério da Arca da Aliança. Ouvi como este mistério entrou na arca de Noé e como se perpetuou de geração em geração; como de tempo em tempo era subtraído e dado novamente. Explicou-lhe que Maria, com o seu nascimento, era a arca misteriosa da Aliança. Eliud consultava frequentemente seus rolos da Escritura e apontava pedaços dos profetas, que Jesus lhe esclarecia melhor. Eliud perguntou a Jesus por que Ele não havia vindo antes, e Jesus explicou-lhe que Ele não poderia ter nascido a não ser de uma Virgem que tivesse sido concebida da maneira que os homens concebem, mas sem a culpa original, e que ninguém foi encontrado desde Adão e Eva, tão pobres quanto Joaquim e Ana. Jesus desvendou isso e mostrou-lhes todos os impedimentos e dificuldades que causaram o atraso na sua vinda. Nesta ocasião compreendi muitos mistérios que continham a Arca da Aliança.
Quando a Arca caiu nas mãos dos inimigos, os sacerdotes já haviam retirado o mistério dela, como costumavam fazer em todo perigo. Apesar disso, a Arca era tão santa que os inimigos eram punidos por sua profanação, sendo forçados a devolvê-la aos israelitas. Vi que uma casta a quem Moisés havia confiado de maneira especial o cuidado da Arca, subsistiu até o rei Herodes. Quando Jeremias, no cativeiro de Babilônia, escondeu a Arca, com outras coisas sagradas, no monte Sinai, não a encontrou novamente; mas o mistério não estava mais lá dentro. Mais tarde, uma arca foi feita à semelhança da primeira, mas já não continha tudo o que antes havia contido. A vara de Aarão, como parte do mistério, estava com os essênios do monte Horebe, e o sacramento da bênção voltou para estar novamente nela, não lembro-me por ministério de qual sacerdote.
No lago, depois chamado de Bethesda, conservava-se o fogo sagrado. Muitas destas coisas que Jesus revelava a Eliud, parte eu as via em imagens e parte as ouvia em palavras; mas me é impossível reproduzir tudo o que que então eu entendi sobre esses mistérios. Jesus falou com Eliud explicando como ele tomou carne para se fazer Homem daquele germe de bênção que Deus havia dado a Adão e tirado dele antes de cair na culpa. Disse-lhe que aquele germe de bênção devia ter passado por muitas gerações, para que todo o Israel fosse participante dele, e que muitas vezes este germe de bênção foi turvo e retido pelos pecados dos homens. Vi estas coisas na realidade e vi como os patriarcas, ao morrerem, davam realmente a seus primogênitos esta bênção misteriosa, de um modo sacramental, e compreendi que o bocado e o gole do cálice que o anjo deu a Abraão quando prometeu ao filho Isaque era figura do Santíssimo Altar do Novo Testamento, e que essa força recebida por Abraão era em atenção à carne e sangue do futuro Messias. Vi como a linhagem de descendência de Jesus recebeu este Sacramento para cooperar na encarnação de Cristo e que Jesus instituiu esta mesma carne e sangue, recebidos de seus antepassados, num mais alto Sacramento e mistério para a união do homem com Deus.

Jesus fala com Eliud sobre Joaquim e Ana

Jesus falou muito com Eliud sobre a santidade de Joaquim e Ana e a concepção sobrenatural de Maria sob a Porta Dourada de Jerusalém.
Ele lhe declarou que não nasceu de José, mas, segundo a carne, é da Virgem Maria, e que Ela foi concebida daquele germe puro que foi tirado de Adão antes de cair na culpa, germe que veio através Abraão, desde José no Egito, e, através dele, até a Arca da Aliança e daí até Joaquim e Ana. Jesus declarou-lhe que para salvar os homens Ele havia aparecido em toda a fraqueza inerente ao homem, sentindo e testando tudo. como homem, e que seria elevado como a serpente de Moisés no deserto, no Monte Calvário, onde foi sepultado o corpo do primeiro homem. Disse-lhe o que deveria sofrer e quão ingratos seriam os homens para com o seu Redentor. Eliud perguntou com um espírito ingênuo e simples. Ele entendeu essas coisas melhor que os apóstolos no início e entendeu tudo mais espiritualmente. No entanto, ele não conseguia entender como os eventos se desenvolveriam. Por isso perguntou a Jesus onde seria o seu reino, se em Jerusalém, em Jericó ou em Engaddi. Jesus respondeu que onde Ele estivesse, também estaria o Seu reino, e que, além disso, Ele não teria um reino externo.
O Élder Eliud falou com Jesus de maneira muito simples e natural e contou-lhe muitas coisas sobre Maria, como se Jesus não as conhecesse. Jesus o ouviu com muito amor. O velho falou-lhe também de Joaquín e Ana, da sua vida santa e da sua morte. Jesus acrescentou nesta ocasião que nenhuma mulher até então tinha sido mais pura do que Ana, e que depois da morte de Joaquim ele se casou mais duas vezes por vontade do céu. Ele teve que cumprir e preencher o número estabelecido de frutos da bênção recebida. Quando Eliud se referiu à morte de Ana, tive uma visão. Vi Ana numa cama um tanto elevada, como mais tarde vi Maria, nos fundos de sua grande casa; Eu a vi muito animada, falando, como se não fosse morrer. Eu a vi abençoando suas filhinhas e as outras que estavam na parte da frente da casa. Maria estava na cabeceira da cama e Jesus aos pés. Vi como ela abençoou sua filha Maria e pediu a bênção de Jesus, que já era homem e tinha barba por fazer. Eu a vi depois conversando alegremente. Eu a vi olhar para cima: ficou branca como a neve e algumas gotas apareceram como pérolas em sua testa. Aí não me contive e exclamei: "Ela está morrendo, ela está morrendo...!" e na minha angústia tentei tomá-la nos braços. Parecia-me que ela vinha para os meus braços, e quando saí do meu êxtase pensei que ainda a tinha nos braços.
Eliud contou ainda muitas coisas da Juventude de Maria no templo. Eu Vi tudo isso em quadros e em figuras. Soube que sua professora Noemi era parente de Lázaro; esta mulher, de uns cinquenta anos, e todas as demais que estavam no templo, eram essênias. Maria aprendeu com ela a bordar e a tecer, desde pequena ia sempre com Noemi quando esta purificava os vasos do sangue do sacrifício e recebia parte da carne dos sacrifícios, que depois partia e preparava para as que serviam no templo e para os sacerdotes; pois estes recebiam o seu alimento dos sacrifícios. Mais tarde, Vi Maria ajudar em todas essas tarefas. Vi que Zacarias, quando estava de plantão no templo, visitava a menina Maria, e que Simeão a conhecia. Deste modo eu via o andar e servir de Maria no templo enquanto Eliud o contava a Jesus. Falaram também da concepção de Jesus e Eliud contou a visita de Maria a Isabel, e disse que Maria havia achado um poço, o qual eu podia ver também. Com efeito, Maria com Isabel, Zacarias e José foram a uma pequena possessão de Zacarias, onde faltava água. Maria afastou-se sozinha diante do jardim com uma varinha, e rezou; ao tocar a terra com a vara brotou um fio de água, que logo engrossou, rodeando uma pequena colina. Zacarias e José foram ao local, removeram a colinita com a pá, a água jorrou em maior quantidade e encontraram uma fonte e um poço de água excelente. Zacarias vivia a meio-dia de Jerusalém, a cerca de cinco horas de caminho para o Oriente.
Nestas e semelhantes conversas estiveram Jesus e Eliud, e este honrava a Jesus com alegria e simplicidade, mas apenas como um homem eleito e extraordinário. Uma filha de Eliud vivia numa gruta do lugar, afastada dali. Os essênios que viviam nesta montanha eram cerca de vinte: as mulheres viviam separadas, de cinco a seis, agrupadas entre si. Todos reverenciavam Eliud como seu chefe e se reuniam com ele todos os dias para a oração. Jesus comeu com ele pão, frutas, mel e peixe, tudo em pequena quantidade. Os essênios ocupavam-se no trabalho da horta e da tecelagem. A montanha que habitavam era a ponta mais alta do conjunto onde Nazaré estava edificada, embora ainda estivesse separada da cidade por um vale. Do outro lado havia uma encosta, cheia de vegetação e vinhas. No fundo da encosta, onde os fariseus pretendiam precipitar Jesus, havia uma quantidade de resíduos, ossos e lixo. A casa de Maria estava diante da cidade, sobre uma colinita, de modo que uma parte entrava como gruta na mesma colina. No entanto, Via-se a casa sobressair da colina, na qual se viam outras casinhas espalhadas. Maria e as santas mulheres, em companhia de Colaia, filho de Lia, chegaram à sua casa no Vale de Cafarnaum. As amigas saíram ao encontro. A casa de Maria em Cafarnaum pertencia a um homem chamado Levi, que morava não muito longe dali em uma grande casa. Por meio da família de Pedro foi alugada e deixada à Sagrada Família, pois Pedro e André já conheciam a Sagrada Família pela fama e por João Batista, de quem eram discípulos. A casa tinha outras dependências, onde discípulos e parentes podiam ser alojados; por isso parecia que a haviam escolhido.
À tarde Jesus saiu do quarto de Eliud e, acompanhado por ele, foi para Nazaré. Diante dos muros da cidade onde José teve sua oficina, viviam várias pessoas pobres e boas, conhecidas de José, com filhos que haviam sido companheiros de infância de Jesus. Deram aos viajantes pão e água fresca, pois Nazaré tinha água verdadeiramente boa. Vi Jesus sentado no meio dessas pessoas, no chão, enquanto os exortava a irem ao batismo de João. Essas pessoas se comportavam com Jesus com certa reserva, pois o conheciam como um deles, e agora o viam respeitado pelo ancião Eliud, a quem todos honravam pedindo-lhe conselho e direção. Eles sabiam que o Messias devia vir, mas não podiam conceber que pudesse ser aquele que havia vivido no meio deles.

Novas conversas de Eliud com Jesus

Jesus andava com Eliud de Nazaré ao meio-dia pelo caminho de Jerusalém que passava pelo vale de Esdrelão. Quando passaram pelo riacho Kisão, depois de duas horas, chegaram a um lugarzinho formado por uma sinagoga, uma pousada e poucas casas. Era um posto avançado da cidade vizinha de Endor, e não muito longe dali era um poço famoso. Jesus entrou na pousada; o povo mostrou-se frio com ele, embora não inimigo. Nem Eliud lhes mereceu muito respeito, pois eram ali mais farisaicos. Jesus disse ao chefe da sinagoga que desejava ensinar, e eles lhe responderam que não era costume permitir isso aos forasteiros. Ele declarou que tinha a missão de fazê-lo, e entrando na escola, falou do Messias:, que seu reino não era deste mundo e que ele não apareceria com brilho exterior; Depois falou do batismo de João. Os sacerdotes do lugar não lhe eram favoráveis. Jesus fez trazer alguns rolos da Escritura e esclareceu-lhes várias passagens dos profetas.
Fiquei particularmente emocionado ao ver o modo como confiante e familiar de falar de Jesus com Eliud, e como este acreditava na missão de Jesus e sua vinda sobrenatural; mas, aparentemente, não podia ter uma ideia de que Jesus era Deus. Contava a Jesus, com toda a naturalidade, enquanto passeavam juntos, muitos episódios da infância do próprio Jesus, O que Ana, a do templo, lhe contara e o que ela sabia das coisas contadas por Maria depois de sua volta do Egito, já que várias vezes a visitara em Jerusalém. Jesus, por sua vez, contou-lhe outras coisas que o ancião ignorava, tudo isto com profundas reflexões. Esta conversa foi conduzida de modo muito natural e comovente, como falaria um ancião venerável com um jovem amigo íntimo de confiança. Enquanto Eliud contava estas coisas eu as via em quadros e me alegrava muito ao comprovar que eram as mesmas que tinha visto e ouvido em outras ocasiões, exceto o que às vezes eu tinha esquecido em parte. Jesus falou também a Eliud de sua viagem ao batismo de João. Este tinha reunido muita gente, citando-a ao lugar de Ofra. Mas Jesus disse-lhe que pensava ir lá sozinho, atravessando Betânia, pois desejava falar com Lázaro antes. Nesta ocasião mencionou Lázaro com outro nome, que já esqueci, E falou do pai de Lázaro e do cargo que tinha tido em uma guerra. Ele disse que Lázaro e seu povo eram ricos e que ofereceriam todo o seu crédito para a obra da redenção. Lázaro tinha três irmãs: a mais velha, Marta, e a mais nova, Madalena, e outra mediana, que também se chamava Maria. Esta última vivia retirada, escondida em casa, porque era tida por boba: chamavam-na Maria a Silenciosa. Jesus disse a Eliud que Marta era boa e piedosa e que o seguiria com seu irmão Lázaro. De Maria, a Silenciosa, disse que tinha um espírito e grande entendimento para as coisas de Deus; que para o seu bem se lhe tinha tirado o entendimento das coisas do mundo; que ela não era para o mundo, que tinha vida interior e não cometia pecado. "Quando falar com ela, compreenderá ainda os grandes mistérios. Ela não viverá muito mais, depois que Lázaro e os demais me seguirem e deixarem todas as suas coisas para a comunidade". Ele acrescentou que a menor estava perdida agora, mas que voltaria e seria mais do que a própria Marta.
Eliud "falou também do batismo de João, embora ele ainda não estava batizado. Pernoitaram na pousada junto à sinagoga, de onde muito cedo no dia seguinte partiram marchando ao longo do monte Hermom para a cidade de Endor. Do albergue viam-se restos de muros tão largos que poderiam ter passado carros por cima; a própria cidade estava cheia de ruínas, rodeada de hortas e jardins. De um lado ainda se viam palácios e belas casas, e o outro aparecia arruinado como por uma guerra. Parecia-me que habitava aqui uma casta especial de israelitas, separados dos demais por seus costumes. Não havia sinagoga. Jesus dirigiu-se com Eliud a um lugar muito extenso, com três fileiras de edifícios e muitas peças em torno de um lago; havia ali um espaço cheio de vegetação; no lago, pequenas canoas para banhos e uma bomba de água era visível. Parecia um conjunto um balneário para doentes e as câmaras estavam ocupadas por eles.
Jesus entrou com Eliud numa dessas câmaras, onde os lavaram os pés e os serviram. Ele ensinou em um espaço aberto, mais elevado. As mulheres que habitavam outras câmaras ficaram atrás dele. Essas pessoas não eram inteiramente israelitas, mas uma espécie de escravos que deviam trabalhar e pagar algum tributo dos frutos de suas colheitas. Pareceu-me que eles ficaram lá depois de uma guerra e acho que seu chefe, Sisara, foi batido não muito longe e morto por uma mulher. Foram dispersos como escravos por todo o país, e ali ficaram cerca de quatrocentos, tendo que se ocupar em trabalhar pedras para o templo, sob Davi e Salomão. Eles costumavam usá-los no templo e em outras construções. O falecido rei Herodes também os havia empregado para construir um aqueduto muito longo, que ia para o monte Sião. Estavam muito unidos entre si: eram caridosos, usavam longas vestes com faixas e bonés em pontas que cobriam as orelhas e pareciam vestidos como eremitas. Não costumavam comunicar-se com os outros judeus, e embora pudessem mandar seus filhos para a escola comum, não o faziam, porque eram tão vexados, que preferiam abster-se. Jesus lhes teve muita compaixão e lhes disse que lhe trouxessem os enfermos. Estavam sobre espécies de camas, como a minha poltrona (pensei nela), porque debaixo dos braços daquelas poltronas havia madeiras, de modo que abaixando os os braços foram transformados em leitos.
Quando Jesus lhes falou do batismo e do Messias, exortando-os a ir para lá, replicaram, muito confusos, que eles não se atreviam a participar, porque eles não tinham direitos e eram desprezados pelos outros. Então falou-lhes numa parábola do injusto mordomo. Tive então um entendimento completo da mesma, que me preocupou o dia todo e depois esqueci a explicação. Espero recebê-la novamente. Também lhes contou a parábola do filho enviado à vinha, que costumava repetir quando falava aos gentios desprezados pelos judeus.
Quando prepararam uma refeição em honra de Jesus, sob o céu aberto, Jesus fez chamar os enfermos e pobres, e com Eliud lhes servia os manjares da mesa. Ao ver isso, eles ficaram muito comovidos. À tarde, Jesus voltou com Eliud à sinagoga, celebraram o Sábado e pernoitaram.
No dia seguinte, Jesus seguiu com Eliud até Endor, que distava apenas o caminho de um sábado do albergue que haviam tomado, e ensinou ali. Os habitantes eram cananitas, creio que de Siquém, pois ouvi o nome de siquemitas. Numa galeria subterrânea tinham escondido um ídolo, que por um engenhoso mecanismo saía para fora para ser visto sobre um altar ornamentado. Podiam fazê-lo desaparecer de repente apenas ao contato de uma mola. Este ídolo, que vinha do Egito, chamava-se Astarte, que eu ouvira ontem como Ester. A figura do ídolo tinha rosto redondo como lua; os braços à frente, e apresentava a figura de algo longo, envolto como uma boneca ou crisálida de borboleta, no meio largo e nas extremidades estreitas, como um peixe. Na parte de trás tinha uma proeminência sobre o qual havia uma espécie de cuba saliente da cabeça; dentro do recipiente parecia algo verde, como espigas com folhas verdes e frutas. Os pés, até a metade do corpo, estavam em uma banheira e ao redor havia vasos com plantas vivas. Embora eles tivessem esse ídolo escondido, Jesus os repreendeu em seu discurso. Antigamente tinham oferecido e sacrificado crianças deformadas. Pertencia ao ídolo Adônis, que vinha a ser como o marido desta deusa. O povo tinha sido vendido no tempo de seu chefe Sisara e dispersado entre os israelitas como escravos; por isso eram desprezados e tidos em menos. Haviam promovido, não muito antes de Cristo, sob Herodes, tumultos e por isso foram mais oprimidos.
À tarde, Jesus voltou com Eliud para a sinagoga, para terminar o sábado. Os judeus tinham visto com maus olhos a visita de Jesus a Endor, mas ele os repreendeu severamente por sua dureza para com este povo oprimido, ele os exortou a tratá-los com consideração e a deixá-los ir ao batismo de João, pois eles haviam decidido ir depois da exortação de Jesus. No final deste ensinamento, eles se mostraram mais benevolentes com Jesus.
Jesus voltou com Eliud a Nazaré e os vi a caminho da cidade em amena conversa, como outras vezes; às vezes eles paravam. Eliud contava muitas coisas da fuga para o Egito e eu via todas estas coisas em figuras.
A conversa chegou ao ponto de se seriam também os egípcios chamados para a salvação, como eles tinham sido comovidos com a sua presença quando ele fugiu. Nesta ocasião vi que a viagem de Jesus, depois da ressurreição de Lázaro, às terras pagãs da Ásia e do Egito, que eu tinha visto em visão, não tinha sido minha fantasia, porque Jesus disse que em toda parte onde tinha sido semeado haveria ele de colher os ramos. Eliud falou também do sacrifício de Melquisedeque, de pão e de vinho, e perguntou ingenuamente se Jesus era como Melquisedeque, já que não podia formar-se ideia completa da personalidade do seu parceiro. Jesus respondeu-lhe:"não; ele devia preparar o meu sacrifício; eu, porém, serei o próprio sacrifício".
Nessa conversa ouvi também que Noemi, a professora de Maria no templo, era tia de Lázaro, irmã da mãe de Lázaro. O pai de Lázaro tinha sido filho de um príncipe sírio; tinha servido na guerra e recebido em prêmio vastas posses. Sua mulher tinha sido uma distinta judia da família sacerdotal de Arão de Jerusalém, parente de Ana por meio de Manassés. Eles tinham três castelos: um em Betânia, outro em Heródion e um terceiro em Magdala, no mar de Tiberíades, não muito longe de Gabara. Falou-se do escândalo que Maria Madalena dava e da dor que causava à sua família. Jesus ficou com Eliud em uma casa onde encontraram os cinco discípulos, outros essênios e várias pessoas que pensavam em ir ao batismo de João. Reuniram-se ali outros publicanos de Nazaré, que queriam ir ao batismo de João. Alguns grupos partiram nessa direção.

Jesus em Nazaré

Jesus ensinou novamente pela manhã. Vieram dois fariseus de Nazaré, os quais o convidaram familiarmente a acompanhá-los à escola de Nazaré, já que haviam aprendido tantas coisas dele, rogando-lhe que lhes explicasse acerca dos profetas e das suas palavras. Jesus os seguiu até a casa de um fariseu, onde muitos outros estavam reunidos. Levava consigo seus cinco discípulos. Os fariseus se mostraram amigos e ele lhes falou em tão belas parábolas, que eles manifestaram grande alegria e o levaram à sua sinagoga, onde havia muitas pessoas. Ele falou-lhes de Moisés e explicou-lhes muitas palavras dos profetas sobre o Messias. Mas quando ele lhes deu a entender que ele era esse Messias, ficaram escandalizados. No entanto, prepararam-lhe comida e passaram a noite com seus discípulos em um albergue perto da sinagoga. No dia seguinte, ensinou a um grupo de publicanos que iam ao batismo de João e lhes expôs a parábola do grão de trigo que deve ser enterrado. Os fariseus voltaram a escandalizar-se e começaram a referir-se ao Filho do carpinteiro José. Puseram-lhe na cara a sua companhia com publicanos e pecadores, e ele lhes respondeu severamente. Falaram-lhe também dos essênios, dizendo que eram hipócritas que não viviam segundo a lei. Jesus respondeu-lhes que seguiam melhor a lei do que os fariseus, acrescentando que hipócritas podiam ser chamados de fariseus. Originou-se a conversa sobre os essênios, porque Jesus abençoava as crianças, e era costume dos essênios abençoar as coisas e pessoas. Quando Jesus saía ou entrava nas sinagogas, iam as mulheres apresentando-lhes suas crianças para que as abençoasse. As crianças permaneciam quietas e sossegadas quando eu as abençoava, embora chorassem antes desaforadamente. As mães pediam-lhe que abençoasse os seus filhos e observavam se se mostrava orgulhoso ao verem como se calavam. Traziam algumas crianças, que sofriam espasmos, e não podiam tranquilizar-se, e mal os abençoava se aquietavam. Eu vi isso saindo de alguns deles como uma névoa escura. Jesus lhes colocava as mãos sobre a cabeça e os abençoava, à maneira dos patriarcas, com três linhas, desde a cabeça e de ambos os ombros até o coração, onde convergiam as linhas. Abençoava as meninas sem pôr as mãos sobre elas: fazia-lhes um sinal sobre a boca. Eu pensava que era para que não falassem tanto, mas acho que devia encerrar algum mistério.
Dormiu com seus discípulos na casa de um fariseu.

Jesus confunde os sábios de Nazaré

Aos cinco discípulos foram acrescentados quatro parentes ou amigos da Sagrada Família. Um deles era descendente de Rute, que havia se casado com Boaz em Belém. Havia em Nazaré três jovens de famílias ricas, conhecidos de Jesus, delicados e bem educados. Os pais, que tinham ouvido a pregação de Jesus, convencidos de sua sabedoria, persuadiram seus filhos a fazer uma tentativa com Jesus; que oferecessem-lhe dinheiro para que ele os recebesse em sua companhia, pudessem ouvi-lo e aprender sua ciência. Esses pais estimavam muito seus filhos e pensavam que Jesus não teria escrúpulos em recebê-los como tutor e instrutor de seus filhos. Os jovens foram neste dia à sinagoga. Por meio dos fariseus e por estes mesmos jovens, foram à escola todos os que de distintos ou sábios haviam em Nazaré para presenciar uma prova da sabedoria de Jesus. Entre eles estava um advogado da lei e um médico. Este era um homem corpulento, de costas largas e barba longa; ele usava uma faixa com sinais na veste, na altura dos ombros.
Jesus entrou e vi-o abençoando as crianças que lhe traziam as mães; havia entre estes alguns leprosos, que ele curou. Quando pregava, os sábios o interrompiam, tentando envolvê-lo em suas perguntas e questões. Mas todos foram confundidos com suas respostas e esclarecimentos. As afirmações do advogado foram respondidas com citações de Moisés, e quando se tratou do divórcio, foi decisivo. Se o homem não pode viver com sua mulher, ou vice-versa, eles podem se separar, mas permanecem um único corpo e não podem se casar novamente enquanto viver um dos dois. Esta doutrina não agradou aos fariseus nem aos judeus em geral. O médico perguntou se Jesus sabia quem era de natureza úmida ou seca, em que constelação cada um nasceu, Que tipos de ervas deveriam dar a um e a outro segundo a sua temperatura, e como estava constituído o corpo humano. Jesus respondeu-lhe com grande sabedoria: falou das diversas complexidades dos presentes, das suas enfermidades e remédios, e referiu-se à composição do corpo humano em termos totalmente desconhecidos pelo novo médico. Falou da alma e como ela age sobre o corpo; tratou das doenças que só podem ser curadas com a oração e a melhoria da vida, e de outras que eles são curados com remédios humanos de ervas e medicamentos. Tudo isto o tratou com tanta profundidade e tanta graça que o médico declarou-se vencido, confessando que o ouvido excedia em muito os seus conhecimentos. Pareceu-me até que desejava seguir a Jesus Cristo.
Ele descreveu ao médico todo o corpo humano: seus membros, músculos, veias, nervos e entranhas; sua importância e suas propriedades, com tanta precisão e ao mesmo tempo tanta brevidade, que o pretenso sábio ficou completamente humilhado e admirado. Estava presente um astrólogo, e Jesus começou a falar do caminho das estrelas, de como um astro influía sobre outro, e de como os diversos astros exercem diferentes influências. Referia-se aos cometas e aos sinais do céu. Falou também com um arquiteto sobre edificação e lhe disse coisas muito significativas sobre o tema. Ao tratar do Comércio e do intercâmbio com países estrangeiros, disse coisas severas sobre as vaidades, modas e luxos provenientes de Atenas. Certos jogos e artes mágicas haviam sido introduzidos no país por meio desses estrangeiros, que também haviam passado por Nazaré e outros aldeias vizinhas. Acrescentou que certas artes más são imperdoáveis, porque não se têm por más e não se pede perdão nem se faz penitência por elas.
Todos ficaram maravilhados de sua sabedoria e começaram a dizer-lhe que ficasse entre eles, que lhe iam edificar uma casa e lhe proveriam tudo o que necessário. Perguntaram-lhe por que ele havia se estabelecido com sua mãe em Cafarnaum. Ele respondeu-lhes simplesmente que não pensava permanecer ali, falando-lhes da sua missão e do seu destino; que, além disso, tinha-se estabelecido em Cafarnaum porque desejava estar no centro do país. Eles não compreenderam a referência à sua missão, e ficaram ofendidos por não querer ficar. Acreditavam ter-lhe oferecido uma posição muito vantajosa e que recusava por orgulho e presunção. Ao entardecer, eles deixaram o local da escola.
Os três jovens, que tinham cerca de vinte anos, pediram para tratar com Jesus em particular, mas ele não os quis receber até que chegassem os nove discípulos que o haviam seguido: esta recusa os entristeceu. Jesus disse que procedia assim para que fossem testemunhas do que ia falar com esses jovens.
Eles, então, com todo o comedimento, disseram-lhe qual era a vontade de seus pais, que desejavam ser Seus discípulos, que seus pais lhe dariam dinheiro para as viagens, que eles queriam acompanhá-lo e ajudá-lo em todas as suas obras.
Jesus entristeceu-se por ter que lhes dar uma negativa, seja por si mesmos, seja por causa dos discípulos, pois devia expor motivos que eles não podiam compreender ainda. Disse-lhes que quem oferece dinheiro quer lucrar com esse mesmo dinheiro, e que, ao contrário, quem quisesse segui-lo devia renunciar a toda conveniência humana. Mais ainda: quem quisesse segui-lo devia renunciar até a seus parentes e amigos. Acrescentou que seus discípulos não buscavam nem pretendiam conveniências de casamentos. Disse-lhes coisas tão sérias que aqueles ficaram muito abatidos. Eles chegaram a dizer que os essênios também viviam em parte casados. Jesus respondeu-lhes que os essênios faziam bem seguindo suas leis, e que, de resto, eles preparavam o caminho para coisas que ele estava estabelecendo com maior perfeição. Despediu-os, recomendando-lhes que meditassem o que lhes convinha fazer. Os discípulos assustaram-se com as suas palavras, parecendo-lhes uma doutrina muito severa: não o podiam compreender e decaíram de ânimo.
Jesus andou com eles fora de Nazaré; dirigiu-se à casa de Eliud e, no caminho, disse-lhes que não desmaiassem nem se desanimassem; que as causas as quais falou assim a esses jovens eram secretas, e que alguns o seguiriam mais tarde e outros nunca; que eles o seguissem sem se preocupar.
Se provocou um grande tumulto em Nazaré. Eles não podiam perdoá-lo por não querer ficar entre eles, e diziam que tudo o que ele sabia aprendeu indo de um lado para o outro. Acrescentaram: "é verdade que é destro em responder e em ensinar, mas é demasiada soberba para o pobre filho de um carpinteiro". Vi os três jovens voltarem para casa. Os pais interpretaram muito mal as dificuldades que Jesus lhes pôs, e os jovens pensavam o mesmo: de modo que todo o mundo estava ali contra Jesus.
No entanto, os três jovens voltaram no dia seguinte e prometeram a Jesus obedecê-lo e servi-lo. Jesus os despediu novamente e ficou triste por não poderem compreender o motivo de sua recusa. Depois falou com seus nove discípulos, que o seguiram algum trecho, como lhes havia dito, para dirigir-se logo ao batismo de João. A respeito dos jovens acrescentou que eles pensavam tirar algum proveito, mas que não estavam dispostos a deixar tudo por amor, que os discípulos deixavam tudo e receberiam, em troca, muito mais. Disse-lhes coisas muito profundas sobre o batismo de João, e ordenou-lhes que fossem a Cafarnaum, para anunciar a sua mãe que ele se dirigia ao batismo de João, que conversassem com os discípulos João, Pedro e André, para ir ao batismo e que avisassem ao Precursor que ele também se colocava a caminho para ser baptizado.

Uma leprosaria no Rio Kisão

Vi Jesus andando à noite com Eliud na direção do Meio-dia e do Ocidente. Não faziam um caminho direto, porque Jesus queria ir a Chim, lugar de leprosos. Chegaram ao amanhecer, E vi que Eliud queria impedir que Jesus entrasse para que não contraísse impureza legal: que não o deixariam ir ao batismo se o seu procedimento fosse conhecido. Jesus respondeu-lhe que devia cumprir sua missão: que queria entrar porque havia ali um homem bom que desejava vê-lo. Para chegar deviam passar o rio Kisão, porque o lugar estava num lago que recebia as águas do Kisão onde se purificavam os leprosos. Essa água não voltava para o rio Kisão. O lugar estava completamente isolado e ninguém chegava até lá. Os leprosos viviam em cabanas isoladas. Fora das pessoas que os serviam, ninguém mais morava lá. Eliud ficou longe e esperou por Jesus, que entrou em uma cabana isolada onde um homem doente estava deitado no chão envolto em lençóis. Jesus falou com ele. Ele era um homem bom e não me lembro por que causa ele contraiu a doença. Ele se recompôs, extremamente comovido ao ver que Jesus queria visitá-lo. Jesus ordenou-lhe que se levantasse e se banhasse num recipiente que havia junto à sua casinha. O homem obedeceu e Jesus pôs as mãos sobre as águas. De repente, o homem encontrou-se saudável e flexível, vestiu-se com outras roupas, e Jesus ordenou-lhe que não falasse da sua cura até que ele voltasse de Seu batismo. Este homem acompanhou Jesus e Eliud por um trecho de caminho, até que Jesus o mandou voltar.
Mais tarde vi Jesus e Eliud caminhando pelo Vale de Esdrelon ao meio-dia. Muitas vezes falavam entre si; outras vezes andavam isolados, como que ocupados na meditação e na oração. O tempo não era bom: muitas vezes havia nevoeiros nesses vales e o céu estava nublado. Jesus não usava bastão; ele nunca o levava; os outros usavam bastão curvado para o uso dos pastores. Jesus calçava apenas umas solas, enquanto outros usavam um calçado mais completo feito de cascas de árvore ou tecidos. Uma vez, Ao meio-dia, eu os vi descansando ao lado de uma fonte, comendo pedaços de pão.

Jesus se transfigura diante de Eliud

À noite, voltei a vê-los andando. Vi então uma bela cena: enquanto Jesus caminhava diante de Eliud, este começou a maravilhar-se da correção de seus modos e da perfeição do seu corpo. Jesus disse-lhe: “Se você visse, dentro de alguns anos, este corpo, não encontraria nada de bonito nele: os homens irão deformá-lo e maltratá-lo.” Eliud não conseguia entender isso. Não podia imaginar como Jesus em tão curto tempo pudesse constituir seu reino, pois crendo sempre em um reino temporal, pensava que não podia fazê-lo senão em dez ou vinte anos, até dar-lhe forma e consistência. Enquanto caminhavam, disse Jesus a Eliud, que marchava pensativo atrás dele, que se aproximasse, pois queria mostrar-lhe o que ele era na realidade, o que era o seu corpo e como seria o seu reino. Eliud estava a poucos passos de Jesus. Jesus olhou para os céus, orando. De repente desceu uma nuvem que envolveu os dois em um turbilhão. Do lado de fora não se podia vê-los. Sobre suas cabeças se abriu o céu e parecia descer até eles a luz. Vi lá em cima uma cidade de muralhas luminosas, que era a Jerusalém celestial. O interior desta aparição estava rodeado de um esplendor semelhante ao arco-íris; dentro vi um rosto, como de Deus Pai, E Jesus com ele, em uma comunicação de luz e esplendor. Jesus estava resplandecente e transparente. Eliud ficou a princípio admirado, olhando para cima; depois lançou-se sobre seu rosto, até que a luz e a visão se foram perdendo.
Jesus seguiu seu caminho e Eliud permaneceu em silêncio, maravilhado com o que havia contemplado. Foi um quadro como o da Transfiguração; Mas Jesus não se elevou.
Eu acredito que Eliud não sobreviveu até a crucificação de Jesus. Jesus se mostrava mais familiar com ele do que com os próprios apóstolos, pois o ancião estava muito iluminado nas coisas do céu e nos segredos da Sagrada Família. Eliud honrava Jesus como um companheiro e amigo: deu-lhe tudo o que podia dar e fez muito pela comunidade de Jesus. Era um dos essênios mais instruídos. Os essênios, nos tempos de Jesus, já quase não viviam espalhados nos montes, mas sim em torno das cidades. Esta aparição e Transfiguração ocorreu à noite, por volta das onze horas. Na manhã seguinte, vi Jesus e Eliud chegando a um campo de pastores. Amanhecia e os pastores, já com os seus rebanhos, saíram ao encontro de Jesus, a quem conheciam, prostraram-se diante dele, e levaram ambos ao barraco onde tinham os seus utensílios. Ali lavaram-lhes os pés, prepararam-lhes um lugar para descansar e puseram-lhes diante pães e taças; assaram umas pipocas que tinham ninhos nas as mesmas cabanas e que andavam por toda parte familiarmente como as galinhas. Depois vi que Jesus despachou Eliud, abençoando antes o ancião, que estava de joelhos. Os pastores estavam presentes nesta cena. Disse-lhe que lhe convinha encerrar seus dias em paz e tranquilidade, pois sua missão era muito pesada e impossível que pudesse segui-lo. Disse-lhe que o considerava de sua comunidade, já que tinha feito sua parte na vinha do Senhor, e que receberia o prêmio em seu reino. Ele declarou isso com a parábola dos trabalhadores na vinha. Eliud estava muito sério e silencioso desde o início da noite. Creio que foi mais tarde batizado pelos apóstolos. Eliud acompanhou ainda a Jesus um trecho de caminho desde este lugar dos pastores; finalmente Jesus o abraçou e despediram-se com viril emoção. Pode-se ver a partir daqui o lugar para onde Jesus se dirige para passar o sábado. Em um tempo habitaram-no parentes de Jesus. O lugar para onde o Salvador está agora se encaminhando é chamado apenas de Gur e está acima de uma altura. Um irmão de José, que depois se retirou para Zebulom, muito relacionado com a Sagrada Família, estava habitando aqui. Jesus entrou inadvertidamente numa estalagem, onde lhe lavaram os pés e lhe deram comida.
Tinha uma peça só para ele; fez-se trazer um rolo da sinagoga e orou, lendo algumas vezes de pé, Outras curvado, olhando para cima, num lugar isolado. Ele não foi para a escola. Eu vi alguns tentando falar com ele, mas ele os demitiu.
Vi chegar a Cafarnaum os cinco discípulos mais íntimos que Jesus havia despachado. Falaram com Maria e dois foram a Betsaida para buscar Pedro e André. Tiago O Menor, Simão, Tadeu, João e Tiago O Maior também estavam lá. Os discípulos contavam muitas coisas da mansidão, bondade e sabedoria de Jesus. Os demais falavam elogiosamente de João, de sua austeridade e de seu ensinamento, acrescentando que jamais haviam ouvido outro semelhante expositor dos profetas e da Lei. O próprio João falava entusiasmado do Batista, embora já conhecesse Jesus, pois seus pais tinham vivido a poucas horas de Nazaré e Jesus o amava desde criança. Eles celebraram aqui no sábado. Alguns dias depois, vi os nove discípulos guiados pelos Antes nomeados, no caminho de Tiberíades, de onde se dirigiram, através de Ephron e o deserto de Jericó, onde estava João Batista.
Pedro e André falavam com maior entusiasmo do Batista: que era de estirpe sacerdotal; que foi instruído por essênios no deserto; que era tão severo quanto sábio e não podia tolerar desordem alguma. Os discípulos, ao contrário, louvavam a mansidão e sabedoria de Jesus. Outros alegavam que por sua indulgência se promoviam desordens e davam alguns exemplos.
Diziam que também ele havia sido instruído pelos essênios, quando tinha viajado. João não o ouvi falar nesta viagem. Nem sempre iam juntos: às vezes um trecho ou durante algumas horas. Eu pensava:"os homens eram então como são agora".

Jesus em Gofna

O lugar chamado Gur, onde Jesus orou solitariamente na pousada, não estava longe da cidade de Mageddo e lugar de mesmo nome. Eu tinha visto que no fim dos tempos haverá uma grande batalha neste lugar contra o Anticristo. Jesus levantou-se ao amanhecer, arregaçou o leito, cingiu a faixa, deixou uma moeda e saiu. Atravessou vários povoados e não tratou com a gente, nem entrou em povoação alguma: caminhava junto ao monte Garizim, em Samaria, à sua esquerda. Estava a caminho ao meio-dia. De vez em quando se alimentava de cerejas e outras frutas, e com o oco da mão ou com alguma folha bebia água da fonte. De tarde chegou a uma cidade, nas montanhas de Efraim, chamada Gofna, situada sobre um terreno irregular, baixo e alto, com muitos jardins e fazendas. Viviam ali alguns parentes de Joaquim que não tinham tido maiores relações com a Sagrada Família. Jesus ficou numa estalagem, onde lhe lavaram os pés e lhe deram uma refeição.
Em seguida, chegaram alguns parentes acompanhados pelos principais fariseus e o levaram para uma das melhores casas. A cidade era de certa importância e tinha a sede de uma circunscrição de aldeias. O parente de Jesus era empregado e se ocupava de escrituras. Eu acho que a cidade pertencia a Samaria.
Jesus foi tratado com respeito. Eles tomaram uma refeição enquanto caminhavam sob uma espécie de gazebo. Jesus passou ali a noite. De Jerusalém até ali havia um dia de caminho. Um riacho atravessava o local. Quando Maria e José perderam o menino no templo, haviam chegado a este lugar: acreditavam que Jesus poderia ter se adiantado para chegar à casa destes parentes desde que o perderam de vista em Michmas. Maria temia até que pudesse cair na água.
Jesus pediu alguns pergaminhos dos profetas e ensinou sobre o batismo e o Messias. Ele explicou uma profecia, segundo a qual o Messias já havia chegado.
Falou de acontecimentos que já se cumpriram e de outros que devian se cumprir em um termo de oito anos, não me lembro se de uma guerra ou que o cetro de Judá havia de ser tirado. Manifestou vários testemunhos de acontecimentos que deveriam preceder a vinda do Messias e falou das seitas em que estavam divididas e de muitas observâncias que se haviam convertido em vãs cerimônias. Ele disse que o Messias estaria entre eles e eles não o reconheceriam. Aludiu a João e acrescentou mais ou menos o seguinte: "ele indicará o Messias e não o reconhecerão por tal; quererão ver um triunfador, um guerreiro brilhante, rodeado de esplendor e de gente sábia e distinta; não quererão reconhecer por Messias aquele que aparecerá sem brilho, sem formosura, sem riquezas, sem aparato exterior; a um que andará entre os pobres, camponeses e artesãos e se misturará com os mendigos, aleijados, leprosos e pecadores".
Falou muito tempo referindo-se às profecias e declarou o que aconteceria com o Messias e com João. Em tudo isso nunca dizia: "eu", mas falava como de outra pessoa. Esses ensinamentos encheram quase todo o dia e as pessoas e seus parentes acabaram acreditando que ele seria um mensageiro, um enviado do Messias.
Quando Jesus voltou ao seu quarto, eles trouxeram um livro no qual haviam escrito o que havia acontecido no templo com Jesus, o filho de Maria, aos doze anos. Recordaram certas coisas ditas por ele então e as que dizia agora e ao notar a semelhança ficaram admirados e estranhados. O dono da casa era um velho viúvo, com duas filhas, também viúvas, que falavam entre si recordando o que tinham visto no desposório de José e Maria: como tinham sido lúcidas aquelas festas no templo de Jerusalém; ponderando as riquezas de Ana, e acrescentando como a família tinha decaído em esplendor. Estas coisas diziam, Como se costuma no mundo, com certo ar de reprovação e desprezo pelo decaimento social de tais famílias. Enquanto conversavam, como mulheres que eram, das bodas de Maria e de seus trajes, eu via um quadro admirável da cerimônia e do traje de bodas Maria, com seu significado. Os homens voltaram a ler as coisas escritas de Jesus menino no templo: como os pais do menino o haviam procurado com tanta ânsia. A notícia de como e quando o encontraram no templo se espalhou facilmente tanto mais quanto se tratava de pessoas aparentadas com eles.
Enquanto esses parentes se maravilhavam com a semelhança de seus ensinamentos e começavam a se entusiasmar, Jesus declarou que deveria deixá-los, e partiu, apesar dos muitos pedidos para que ficasse mais tempo. Vários homens o acompanharam. Passaram um riacho sobre uma ponte murada onde cresciam arvores. Durante algumas horas o acompanharam a um prado de pastoreio onde estivera o patriarca José quando seu pai Jacó o enviou para ver seus irmãos, em Siquém. Nesta região esteve também muito tempo Jacó. Muito tarde, Jesus retirou-se para um lugar de pastores, do outro lado do riacho, e seus acompanhantes o deixaram. Do outro lado estendia-se uma comarca mais extensa; a sinagoga ficava deste lado. Jesus se hospedou em uma pousada. Tinham-se reunido ali dois grupos de batizandos que iam pelo deserto ao batismo de João: estes tinham falado da vinda de Jesus. Ele conversou com eles à tarde e eles partiram pela manhã.
Lavaram os pés ao Salvador, que tomou uma refeição e se apartou para a oração e descanso.

Jesus falava contra os vícios de Herodes

Pela manhã foi Jesus à escola onde se reunira muita gente. Ele falou como de costume do batismo de João e da proximidade do Messias, a quem eles não queriam reconhecer. Jogou-lhes na cara a sua dureza de julgamento em questões de antigos costumes, que era a falta própria do lugar. Receberam bem a repreensão, pois eram de hábitos simples. Jesus fez-se levar pelo chefe da sinagoga para onde se achavam uns dez enfermos: não curou a ninguém, porque dissera a Eliude e aos seus discípulos que antes de Seu batismo não curaria doentes nas proximidades de Jerusalém. Esses doentes eram em sua maioria hidrópicos e artríticos, e havia entre eles algumas mulheres. Exortou-os a todos em geral e em particular disse, a cada um, o que devia fazer no espiritual, pois suas enfermidades eram, em sua maioria, castigo por seus desarranjos e pecados. A alguns ordenou que se purificassem para marcharem ao batismo de João.
Na estalagem preparou-se uma refeição à qual concorreram muitos homens do bairro. Antes da refeição falaram alguns deles da conduta de Herodes, repreendendo-o pelo mal proceder em seu casamento proibido e queriam saber o que Jesus pensava disso. Jesus condenou o mau proceder com palavras severas, mas acrescentou que cada um devia julgar-se a si mesmo antes e falou severamente acerca dos pecados que atentavam contra o matrimônio. Havia muitos pecadores, e Jesus falou em particular a cada um condenando seus pecados e infidelidades no casamento. Ele declarou a muitos seus pecados ocultos nesse sentido, de tal forma que ficaram impressionados e prometeram fazer penitência. Dali partiu para Betânia, cerca de seis milhas. Mais uma vez eu o vi andando pela montanha. Agora reinava o tempo de inverno; havia neblina, o céu estava nublado e à noite cairam geadas. Jesus cobria a cabeça com um pano. Eu o vi caminhando para o Oriente.
Vi Maria e as santas mulheres caminhando por um prado perto de Tiberíades, depois que saíram de suas casas. Levavam em sua companhia dois criados dos pescadores do lugar: um ia à frente e outro atrás. Elas carregavam suas bagagens que consistiam em dois sacos: um pendente no peito e outro nas costas, sustentados por uma bengala sobre os ombros. Entre elas vi Joana Chusa, Maria Cléofas, uma das três viúvas e Maria Salomé.
Dirigiam-se também a Betânia pelo caminho habitual de Sichar, à sua direita. Jesus deixou este lugar à sua esquerda. As santas mulheres marchavam geralmente em linha uma após a outra, separadas alguns passos, talvez porque os caminhos, fora dos reais, eram estreitos, às vezes montanhosos e com passos difíceis. Caminhavam bastante leveza, com passos seguros, não como hoje em dia andam as mulheres, porque então se acostumaram desde pequenas a longas viagens a pé. Vestiam os vestidos um pouco levantados, cingidos; as pernas enfaixadas; calçavam umas sandálias grossas e forradas, amarradas às solas dos pés; sobre a cabeça um véu, preso com um pano estreito e longo, que atravessava o peito e por trás chegava até a cintura. Às vezes, eles usavam as mãos descansando dentro desse tecido. O homem que marchava à frente removia os impedimentos do caminho, abre os cercados, removia as pedras e facilitava o trânsito como também a hospedagem para viajantes. Aquele que marchava atrás fechava as cercas e portas e deixava as coisas como antes.

Jesus em Betânia

Via Jesus na montanha seis milhas de caminho para Betânia. À noite chegou a uma cidade situada a poucas horas ao Norte de Jerusalém: tinha uma rua longa, cerca de meia hora de caminho, nessa mesma montanha. Betânia ficava a três horas deste lugar. Você podia ver o lugar à distância, porque estava em um vale. Da montanha estende-se para Nordeste um deserto de três horas até o deserto de Efron. Entre os dois desertos, vi Maria com seus companheiros acampando naquela noite em um albergue. Aquela montanha era a mesma em que Joabe e Abisai se refugiaram na perseguição de Abner, quando este lhes falou. O monte era chamado Amma, e ficava ao Norte de Jerusalém. O lugar onde Jesus estava tinha vista para o Oriente e o Norte: pareceu-me que se chamava Giah e olhava para o deserto de Gibeão que começava ao pé e ele enfrentava o de Efron. Era uma extensão de três horas de estrada. Jesus chegou à tarde e entrou em uma casa pedindo algum refresco. Lavaram-lhe os pés, deram-lhe de beber e puseram pequenos pães diante dele. Chegaram as pessoas e, sabendo que vinha da Galiléia, começaram a perguntar-lhe acerca dos ensinamentos do mestre de Nazaré, do qual tanto se falava e do qual falava também João no deserto.
Perguntaram se o batismo de João era bom. Jesus ensinou, como de costume; exortou-os a ir ao batismo de João e a fazer penitência. Referindo-se ao profeta de Nazaré e ao Messias, disse-lhes que apareceria entre eles, e que eles não o reconheceriam, mas o perseguiriam e maltratariam. Que olhassem bem e considerassem que os sinais já haviam se cumprido; que não apareceria com esplendor e magnificência exterior, mas pobre e que ele marcharia entre os simples. As pessoas não o reconheciam, embora o recebessem bem, e mantivessem certo temor e reverência em sua presença. Haviam passado por ali alguns que iam ao batismo de João e falaram de Jesus.
Depois de ter descansado cerca de duas horas, algumas pessoas o acompanharam um trecho de caminho. Jesus chegou a Betânia durante a noite. Lázaro, que havia estado dias antes em sua posse em Jerusalém, perto do monte Sião, a oeste do Monte Calvário, havia voltado para Betânia: tinha tido conhecimento da próxima vinda de Jesus por meio de alguns discípulos. O castelo de Betânia pertencia na verdade a Marta. Lázaro, porém, costumava ficar mais tempo ali e se dava bem na companhia de sua irmã. Eles esperavam por Jesus, com a comida já pronta. Marta costumava habitar os apartamentos situados ao lado do edifício principal. Haviam convidados na casa. Com Marta estavam Serafia, Maria de Marcos e outra mulher de Jerusalém: tinha estado com Maria no templo; teria ficado ali de boa vontade para sempre, mas por vontade de Deus teve que contrair matrimônio. Com Lázaro achavam-se Nicodemos, João Marcos, um filho de Simeão e outro homem de idade, Obede, um irmão ou filho de um irmão do marido de Ana, a do templo. Todos eram amigos, ainda que ocultos, de Jesus, em parte por João Batista, em parte por relações de família e em parte pelas profecias de Simeão e da Ana.
Nicodemos era um pensador que buscava a verdade, e tinha esperanças em Jesus. Todos tinham recebido o batismo de João e tinham ido, a convite de Lázaro, para ver Jesus. Desde então, Nicodemos serviu a Jesus e a sua comunidade secretamente.
Lázaro tinha enviado alguns servos para receber Jesus. Meia hora antes de chegar à casa, foi-lhe ao encontro o antigo e fiel criado de Lázaro, que mais tarde foi também discípulo de Jesus. Este servo lançou-se aos pés de Jesus e disse-lhe: "Eu sou um servo de Lázaro, e se encontrei graça na tua presença, peço-te que me acompanhes até a casa do meu senhor". Jesus disse-lhe para se levantar e seguiu-o. Ele se mostrou familiar com ele, mantendo a dignidade própria de sua pessoa. Era precisamente isto que atraía em Jesus: amavam-no como homem e sentiam algo da sua divindade. O servo levou Jesus à entrada do castelo, junto a um poço, onde estava tudo disposto.
Lavou os pés de Jesus e pôs-lhe outras sandálias. Vi as sandálias de Jesus: eram grossas, forradas e de cor verde. Deixou ali estas sandálias e calçou outras de couro duro, com amarras de couro também, que depois levou em suas viagens. O servo limpou as vestes de Jesus.
Quando se lavou, Lázaro chegou com seus amigos. Trouxeram então um copo de bebida e uma refeição. Jesus abraçou Lázaro e estendeu a mão aos outros. Todos o serviram amigavelmente e o acompanharam até a casa. Lázaro o acompanhou até o quarto de Marta. As mulheres, reunidas ali, deitaram-se à terra cobertas com o véu. Jesus levantou-as E disse a Marta que Maria, sua mãe, havia de chegar e esperaria sua volta do batismo. Depois disso, entraram na casa e se puseram à mesa. Eu vi um cordeiro assado e pombos, mel, frutas, pequenos pães, legumes e copos. Eles se deitaram à mesa, em assentos com apoios, dois a dois.
As mulheres comeram em uma ante-sala separada. Jesus orou antes da refeição e abençoou a comida. Mostrou-se com o rosto sério e triste. Disse que se aproximavam tempos difíceis, que começaria um caminho muito pesado e que o termo deste seria muito lamentável e amargo. Exortou-os a permanecerem fiéis, pois agora eram Seu consolo, anunciando-lhes que eles também teriam muito a sofrer. Ele falou com eles tão ternamente, que eles choraram, mas não entenderam tudo: eles não podiam imaginar que tal homem era Deus.
Eu Nunca poderia entender essa incompreensão de Sua divindade, pois tenho uma persuasão íntima e segura de Sua Pessoa divina. Pensava: "Por que não mostra a estas pessoas o que eu vejo tão claro e tão segura?...”
Eu pude ver como o homem foi criado por Deus, como tirou Eva do Homem, dando-lhe como companheira e como ambos caíram. Vi a promessa do Messias, a dispersão dos homens e a Providência admirável e o mistério de Deus até a formação da Virgem Maria. Vi o caminho da bênção do qual o Verbo se fez carne, como uma linha de luz que corria por todos os antepassados de Maria. Vi a mensagem do Anjo a Maria e o raio da divindade que a penetrou quando o Salvador se fez homem. E depois de tudo isto, é-me impossível conceber, a mim, criatura miserável, como estas santas pessoas, contemporâneas e amigas de Jesus, que estava em sua presença, a quem amavam e honravam, crendo ainda que seu reino seria temporário, tinhamêm amor e reverência por ele e o criam o Messias, e nem todos pensavam que era o próprio Deus que lhes falava.
Era para eles o filho de José e de Maria. Ninguém imaginava sequer que Maria era virgem; nada sabiam de uma imaculada e pura concepção; ignoravam o mistério encerrado na Arca da Aliança. Era já muito, porém, e sinal de eleição que o amassem e reconhecessem como Messias. Os fariseus, que conheciam as profecias de Simeão e de Ana no templo quando da apresentação, e que tinham ouvido a sua doutrina aos doze anos no templo, estavam completamente endurecidos pelo orgulho. Tinham-se interessado em conhecer a família do menino; mas tudo lhes parecia tão pobre e tão pequeno que o desprezaram: queriam um Messias com toda glória e majestade. O próprio Lázaro, Nicodemos e muitos de seus amigos acreditavam, sempre em silêncio, que ele estava chamado com seus discípulos a tomar Jerusalém, a livrá-la do jugo dos romanos e a estabelecer o esplendor do reino de Israel. Acontecia como agora que cada um imagina um Deus que deve dar à sua pátria liberdade e esplendor. Então, como agora, eles não sabiam que o reino que nos deve interessar não é este reino de penitência terrena. Eles se alegravam pensando que de uma forma ou de outra teriam de acabar com os eternos charlatães que o rodeavam. Mas ninguém ousava falar com ele abertamente: permaneciam com grande reverência e certo temor em sua presença, porque em suas palavras e em sua não viam nenhum sinal de que fosse empreender a empresa que eles haviam imaginado.
Após a refeição, eles foram para o local de oração. Jesus recitou uma ação de gracas, dizendo que seu tempo e sua missão já começavam. Ele disse isso em um tom tão comovente, que todos choraram. As mulheres estavam por trás, presentes no local. Rezaram algumas preces gerais e Jesus abençoou a todos.
Então Lázaro levou Jesus para seu quarto. Havia em uma grande sala lugares isolados onde os homens podiam descansar. Tudo estava bem arrumado:a cama não estava aqui, como em outros lugares, espalhada no chão, mas mais levantada e fixa, com uma borda de cerca onde havia ornamentos de cobertores e borlas. Na parede, onde a cama estava afirmada, havia um tapete muito delicado que podia ser abaixado ou levantado à vontade, formando um teto para esconder o leito vazio. Ao lado dele havia uma mesinha e em um buraco aberto na parede havia uma bacia e outro pequeno recipiente para levar água. Da parede pendia uma lâmpada e uma toalha, Lázaro acendeu a lâmpada, ajoelhou-se, pedindo a Jesus a bênção, e separaram-se.

Maria, a Silenciosa

Maria, a Silenciosa (irmã de Marta e de Lázaro), que era tida por lela, não apareceu em todo este tempo: nunca falava na frente dos homens. Quando estava sozinha em seu quarto ou no jardim, falava em voz alta consigo mesma relacionando suas palavras com o que a rodeava. Para ela as coisas pareciam ter vida: só diante dos homens calava-se, permanecia imóvel, olhava para o chão e ficava como extática e silenciosa como uma coluna, embora acenasse, inclinando-se e mostrando-se deferente. Quando estava sozinha, trabalhava nos vestidos e arrumava as coisas. Ela era piedosa, não frequentava escolas, orava em sua câmara sozinha. Eu acho que ela tinha visões e conversava com as pessoas que apareciam para ela. Ela sentia um grande amor por suas irmãs, especialmente por Madalena. Tinha sido assim desde criança e embora tivesse cuidadora, não precisava de ninguém, nem manifestava nenhum sinal de não estar em seu juízo cabal.
De Maria Madalena não se tinha falado até o presente na presença de Jesus: vivia agora no Castelo de Magdala no meio do esplendor e do fausto. Na mesma noite em que Jesus chegou à casa de Lázaro, vi Maria, Joana Chusa, Maria de Cléofas, a Viúva Lea e Maria Salomé numa estalagem, entre o deserto de Gibeá e o de Efraim, a cinco horas de Betânia, onde passaram a noite. Elas dormiram em um galpão fechado por todos os lados com divisórias muito leves. Estava dividido em duas partes: a parte anterior, em duas fileiras de camas, que as santas mulheres tomaram; a parte posterior, era a cozinha. Diante da casa havia um lugar aberto, como uma cabana, onde ardia fogo. Os homens que as acompanhavam passaram a noite lá, perto da casa do dono da pousada. No dia seguinte à sua chegada, Jesus ensinou ali andando pelos pátios e jardins do castelo. Falava com seriedade, muito enternecido; mostrava-se sempre digno, bondoso e reservado, sem dizer uma palavra inútil ou vã. Todos o amavam e seguiam, mas se mostravam tímidos e apocados em sua presença. Lázaro era-lhe mais familiar: os outros demonstravam respeito, misturado com certo temor reverencial.
Acompanhado por Lázaro, Jesus foi para onde estavam as mulheres e Marta o levou na presença de sua irmã Maria, a Silenciosa, pois Jesus queria falar com ela. Foram por uma porta aberta na parede da casa grande para outra menor, embora também espaçosa, com um pátio fechado e jardim, ao qual estava unida a sala de Maria, a Silenciosa. Jesus permaneceu no jardim e Marta foi buscar sua irmã. O jardim era muito bonito: no meio erguia-se uma datileira; tinha outras plantas e arbustos. Havia uma fonte com borda e no meio dela um assento de pedra, aonde Maria, a Silenciosa, costumava ir sempre, passando por ali se sentava rodeada da água, sob um telhado que cobria a fonte. Marta disse-lhe para entrar no pátio, pois alguém a esperava. Maria, a Silenciosa, que era muito obediente, cobriu-se com o véu e, sem dizer palavras, dirigiu-se sozinha ao pátio. Maria, a Silenciosa, era formosa e esbelta, cerca de trinta anos; quase sempre olhava para o céu, e quando por acaso olhava para onde estava Jesus, o seu era um olhar incerto, de lado, como se olhasse para longe.
Ao falar de si não dizia nunca eu, Mas tu, como se se visse em outra pessoa e se fale consigo mesma. Não falou a Jesus nem se lançou a seus pés. Jesus falou-lhe primeiro e assim caminharam pelo jardim conversando propriamente um frente ao outro. A Silenciosa falava sempre de coisas do céu, como se as visse, E Jesus, da mesma forma, falou de seu pai e com seu pai. Ela não olhava de frente para Jesus e às vezes de lado. Sua conversa era antes um louvor, uma oração a Deus, uma meditação, um esclarecimento de mistérios.
Maria parecia não se dar conta de que vivia neste mundo, mas em outro. Lembro-me de que ela falou da Encarnação de Cristo como se a estivesse vendo na adorável Trindade. É impossível para mim reproduzir sua conversa ingênua e, no entanto, profunda e misteriosa. Dizia como se o estivesse vendo:" o pai disse ao Filho que desça à terra e uma Virgem lhe seja por Mãe", acrescentando que todos os anjos se alegraram-se com isso e que Gabriel foi enviado à Virgem Maria. Falava como através dos anjos que via, como falaria uma criança diante de uma procissão, e se alegraria e se regozijaria com cada um dos que passavam, por sua piedade e devoção.
Depois, como se olhasse para a câmara de Maria, falava-lhe exortando-a a aceitar ser mãe de Deus, recebendo a mensagem do Anjo, e vendo o anjo descer e anunciar a encarnação, falava, como se tudo estivesse testemunhando a alguma distância, em voz alta, consigo mesma. Ele parou dizendo que Maria havia refletido antes de responder, e acrescentou: "você tinha um voto de virgindade; se você tivesse recusado, como tudo isso teria acontecido?... teria se achado outra Virgem digna de ser mãe de Deus"... Israel muito tempo teria tido, ó Israel, que chorar e suspirar pelo Messias!..."Voltou a referir-se à felicidade por haver Maria consentido; louvou a Virgem falou do nascimento de Jesus e, dirigindo-se ao menino, disse: "manteiga e mel hás de comer, menino". Recitou profecias, recordando as de Simeão e de Ana, tudo isto como se o visse diante de seus olhos e falasse com eles, como se estivesse presente nestes acontecimentos. Chegou assim até o presente e disse: "agora vais, Ó Jesus, começar o teu caminho amargo e doloroso...”. Em todas estas conversas estava como ausente do corpo e falava com pessoas invisíveis para os outros, e dirigindo-se a Jesus falava-lhe como fez com os outros que a rodeavam. Jesus interrompeu-a, finalmente, com orações e louvores a seu pai, rogando por todos os homens, desde o lugar onde haviam parado.
Esta cena foi comovente e misteriosamente bonita. Jesus a deixou e ela ficou imóvel, silenciosa, e lentamente se retirou para seu aposento. Quando Jesus voltou para onde estavam Lázaro e Marta, disse mais ou menos o seguinte: "ela goza de plena razão e entendimento; mas não pertence a este mundo não está neste mundo: sua alma está ausente. O mundo não a entende nem ela entende o mundo. Ela é feliz e está em estado de impecabilidade". Esta criatura silenciosa com o olhar posto no sobrenatural, não sabia na realidade o que se passava em torno, pois estava sempre como ausente em espírito.
Diante de ninguém havia falado como diante de Jesus; diante dos outros calava-se, não porque fosse orgulhosa ou mal criada ou desprezada, mas porque parecia não ver as pessoas ou não tinham relação com as coisas que via em espírito acerca da redenção e salvação. Algumas vezes lhe falavam pessoas piedosas e instruídas, e então dizia algumas palavras em voz alta; mas ninguém a entendia, porque o que dizia era uma continuação de uma conversa interior ou das coisas que via e que os próprios sábios não compreendiam. Por isso era tida como uma doente mental e encurralada, isolando-a dos demais seres. Ela não vivia com sua alma neste mundo, mas abstraída em esferas superiores e sobrenaturais. Fazia trabalhos manuais; tecia para o templo trabalhos que Marta lhe encarregava; era destra nestes trabalhos, que fazia enquanto sua mente se achava em piedosas considerações.
Quando não fazia essas tarefas, trabalhava no jardim e na horta. Rezava muito, com grande fervor, e padecia pelos pecadores com especial sofrimento. Muitas vezes sentia tal peso sobre sua alma como se os pecados do mundo a sobrecarregassem sozinha. Embora tivesse todos os confortos da casa, em camas, assentos e descansos, comia sempre sozinha e muito pouco. Morreu de dor e compaixão pelos sofrimentos de Jesus em sua paixão, que viu em visão antecipada".

Chegada de Maria e das santas mulheres

Marta falou nesta ocasião de Madalena, expondo sua grande aflição pelo extravio de sua irmã. Jesus a consolou dizendo-lhe que voltaria ao bom caminho; que não se cansassem de exortá-la, de rogar por ela e admoestá-la. Por volta das duas e meia chegou Maria Santíssima, com Maria Chusa, Lea, Maria Salomé e Maria de Cléofas. O servo que as precedia anunciou sua chegada, e Marta, Serafia, Maria de Marcos e Susana saíram ao encontro delas com o necessário e alimentos, e receberam-nas na antessala no início da entrada do castelo onde ontem foi recebido Jesus por Lázaro. Cumprimentaram-se e as da casa lavaram os pés das viajantes, que trocaram os vestidos e os véus. Elas tinham roupas brancas, amarelas ou acastanhadas. Tomaram algum alimento e retiraram-se para os aposentos de Marta.
Jesus e os homens foram cumprimentá-las, e Jesus permaneceu falando só com a mãe. Disse-lhe, cheio de amor e seriedade, que seu caminho pesado ia começar, que iria ao batismo de João e voltaria a vê-la algum tempo para estar com ela nas proximidades de Samaria; que então iria para o deserto para jejuar quarenta dias na solidão. Maria pediu a seu filho que não quisesse ir a esse lugar horrível, para não desmaiar de fome e miséria; mas Jesus pediu-lhe que não lhe fizesse representações de humanos cuidados, posto que devia cumprir sua missão; devia começar a fazer o que era necessário, porque começava seu caminho, e os que estavam com ele deviam sofrer com ele: deviam cumprir sua missão e renunciar a todas as conveniências humanas. Ele disse que a amava e sempre a amaria, mas agora pertencia a todos os homens. Pediu-lhe que fizesse o sacrifício, que o eterno Pai a recompensaria. Acrescentou que começava a realizar-se o profetizado por Simeão: que uma espada traspassaria seu coração e sua alma. Maria ficou triste e muito séria, mas resignada com a vontade de Deus, e forte e confiante em Deus. Jesus mostrou-se cheio de amor e bondade.
À noite houve ainda uma refeição na casa de Lázaro, à qual o fariseu Simão foi um dos convidados com outros fariseus. As mulheres comeram à parte numa sala dividida por uma cerca, de modo que podiam ouvir os ensinamentos de Jesus, que falou da fé, da esperança e caridade e obediência. Disse que os que quisessem segui-lo não deveriam voltar atrás, mas fazer o que ele dizia e ensinava, a padecer o que deveriam padecer; que ele nunca os abandonaria. Voltou a falar do pesado caminho que lhe tocava andar: como o maltratariam e o perseguiriam; que seus amigos deviam padecer e sofrer com ele. Todos o escutaram com respeito e admiração; mas o que ele dizia que seria perseguido e maltratado lhes parecia mais um modo de falar de profeta, não deve ser entendido à letra. Os fariseus Também não acharam sua fala escandalosa e inaceitável; mas mantiveram-se observando e ouvindo com mais curiosidade do que os outros.

Jesus marcha com Lázaro ao batismo de João

Depois da refeição e de um breve descanso, Jesus partiu com Lázaro, em direção a Jericó, ao batismo de João. Um servo de Lázaro os acompanhou por algum tempo com uma tocha, pois era noite. Depois de meia hora chegaram a um albergue, que pertencia a Lázaro, e onde mais tarde os discípulos faziam suas paradas e pausas. Não era a mesma pousada, mais distante, em outra direção, da qual falei outras vezes e que os discípulos usavam com frequência. A galeria onde Jesus e depois Maria foram recebidos por Lázaro, era a mesma onde jesus mais tarde permaneceu e ensinou, antes de ressuscitar a Lázaro, de onde saiu ao encontro de Madalena. Quando chegaram ao albergue, Jesus tirou as sandálias e ficou descalço, andando. Lázaro rogou-lhe que se calçasse, pelas pedras do caminho, Mas Jesus lhe disse: "Deixa que isto se faça assim. Eu sei que devo fazer isso". Desta forma, eles seguiram sua marcha.
Este deserto se estendia por um caminho de cinco horas, com desfiladeiros entre as montanhas, até Jericó, e depois, durante duas horas pelo rico Vale de Jericó, embora por lugares selvagens, de difícil trânsito. Dali restavam ainda duas horas até o lugar onde João batizava. Jesus andava muito mais leve que Lázaro, às vezes precedia-lhe uma hora de caminho. Um grupo de pessoas, entre elas publicanos, voltavam do batismo, ao qual o próprio Jesus lhes enviara: passavam perto de Jesus algum trecho de caminho através do deserto para Betânia. Jesus não entrou em lugar algum, e deixou à sua esquerda a cidade de Jericó. Havia algumas pequenas cidades no caminho, mas não entrou em nenhuma delas.
Os amigos de Lázaro: Nicodemos, filho de Simeão e João Marcos falavam pouco com Jesus; mas maravilhavam-se de sua sabedoria e de seus modos, ponderando as qualidades de sua alma e de seu corpo. Eles costumavam exclamar: "Que homem!... Ninguém apareceu igual até agora, nem ninguém haverá como ele... tão manso, tão doce, tão sério, tão simples ao mesmo tempo que digno...
Com profundidade ele sabe tudo!..."E acrescentavam:" não chego a compreender-lo em tudo, e, no entanto, devo acreditar. Não se pode olhar fixamente para o rosto porque lê os pensamentos. Que presença, que rosto, que porte, que maneira de andar tão leve e sem pressa!... Ninguém pode andar como ele! Como devora as distâncias e como ao chegar a um ponto, de repente prega e fala e volta a marchar! Que homem extraordinário!..."Depois falavam de sua infância, de seus ensinamentos no templo com os doutores da lei e o que tinham ouvido contar de sua primeira viagem pelo Mar morto, quando ajudava os boteiros e outras mil coisas. Mas ninguém suspeitava que Jesus era Deus. Achavam-no maior, mais sábio que todos os homens e o veneravam; mas mostravam-se esquivos em sua presença. Eles só o tinham por um homem extraordinário.
Obede era um homem de idade, filho de um irmão do marido da velha Ana do templo: ele era um dos anciãos do templo, do Sinédrio; era piedoso e foi discípulo oculto de Jesus, e enquanto viveu ajudou a comunidade de Jesus.

História de João Batista

João recebeu uma revelação sobre o batismo e, por causa dela, saindo do deserto, cavou um poço nas cercanias da Terra Prometida. Eu o vi na parte ocidental de uma montanha íngreme. À sua esquerda, havia um rio, talvez uma das fontes do Jordão que nascia numa gruta do Líbano, entre duas montanhas: não se via jorrar senão quando você estivesse perto. À sua direita estendia-se uma planície, rodeada pelo deserto, onde devia cavar uma fonte.
João estava curvado com um joelho; sobre o outro tinha um longo rolo de casca, no qual escrevia com um canuto. O sol brilhava ardentemente sobre ele; olhava para o Líbano à frente, para o Ocidente. Enquanto escrevia, pareceu-me que estava em êxtase. Quando o vi assim absorvido, um homem apareceu diante dele, que escreveu muitas coisas e desenhou sinais no rolo. Ao voltar a si, João pôde ler o que o homem havia escrito e começou a trabalhar na obra do poço com muita energia. Enquanto fazia o trabalho, tinha o rolo de casca escrito no chão, preso a duas pedras, para mantê-lo aberto, e olhava frequentemente para o desenho, pois me pareceu que ali estava desenhada a obra que devia fazer.
Em relação ao poço que João estava fazendo, tive uma visão sobre Elias. Vi-o contrariado por uma falta cometida, no deserto, desanimado e sonolento. Sonhava que um menino o empurrava com um bastonete a um poço, junto a ele e que estava prestes a cair; pois se viu como movido um trecho do lugar onde estava parado. Foi então que o anjo o acordou e lhe deu de beber. Isso aconteceu no mesmo lugar onde João ia fazer a fonte e o poço. Enquanto João trabalhava, conheci a explicação de cada camada de terra que tirava e o mistério de cada trabalho que fazia. Isto tinha relação com a dureza e a obstinação dos homens, e com os caracteres que devia dobrar para que a graça de Deus pudesse chegar até eles. Este trabalho era, como toda a sua obra e toda a sua vida, uma figura e antecipação que indicava não só que era guiado pelo Espírito Santo, mas na realidade, ele fazia o que deveria fazer e o que seu trabalho significava, pois Deus via a boa vontade que ele colocava em sua tarefa. Em todo este trabalho era conduzido, como os antigos profetas, pelo Espírito de Deus. Começou por cortar delicadamente a vegetação da superfície, em torno do poço, de forma redonda, e depois fez, cavando, um recipiente redondo bastante amplo, e cercou-o com pedras escolhidas, menos no meio, onde cavou até encontrar uma fonte de água. Com a terra que tirava ia engrossando a borda da fonte, deixando cinco lugares cortados. Na frente de quatro dessas aberturas, ele plantou quatro árvores a uma distância igual. Estas árvores tinham a copa verde, eram de quatro classes diferentes, com seu significado particular. No meio da fonte plantou uma árvore especial, de folhas finas e ramos piramidais com brotos e espinhos. Esta árvore estava há algum tempo ressecada diante de sua gruta. Os outros quatro pareciam arbustos e tinham bagas e fez-lhes em torno de um reforço, amontoando terra. Quando chegou com sua escavação até a água, onde plantou a árvore mencionada, passou a fazer um canal que partia do rio que corria ao lado de sua gruta até o poço cavado. Para isso eu o vi juntar no campo muitas canas que ia unindo umas às outras e as fazia chegar até o poço, e depois cobria estes canais com terra. Podia à vontade fechar estes canais ou abri-los. Tinha feito um caminho através dos matagais até a abertura de sua fonte, caminho que corria ao redor do poço, entre as quatro árvores e as aberturas. Diante da abertura deixada como entrada não havia plantado nenhuma árvore. Apenas este lado da fonte estava livre; os outros estavam fechados com matagais ou pedras. Em torno das quatro árvores plantou uma erva, que não me era desconhecida: tive-a desde criança por muito apreciada e quando a encontrava plantava-a perto da minha casa. Tinha um caule alto e suculento, com brotos vermelhos escuros, e era muito medicinal contra espinhas e dores de garganta, como hoje eu tenho entendido.
Plantou também outras árvores e várias ervas. Durante sua tarefa, ele olhava de vez em quando o rolo desenhado e media as distâncias com seu bastão.
Pareceu-me que tudo o que ele fazia e até as árvores foram desenhados no rolo escrito e desenhado. Lembro-me de ter visto a figura da árvore que ele colocou no meio da fonte. Trabalhou durante várias semanas e só ao terminar seu trabalho apareceu um pouco de água no fundo de sua fonte. A árvore do centro, que parecia murcha e seca, esverdeou. João foi buscar água de outra fonte e a derramou dentro. O recipiente que ele usou parecia feito de crostas grossas, em forma de saco e calafetado com peixe ou resina.
Essa água veio de uma fonte que surgia perto de sua gruta, que em outro tempo ele tinha feito brotar ferindo a pedra com seu bastonete em forma de cruz. Ouvi nesta ocasião que ele não poderia ter feito o poço naquele lugar, porque era tudo de pedra e isso tinha seu significado. Deixou entrar tanta água quanto era necessária; quando ultrapassava a medida era para sair pelas aberturas e regar as plantas ao redor do poço. Vi depois que João entrou na água até meio corpo; que se abraçava com uma mão à árvore erguida no meio da fonte e com a outra segurava um bastonete ao qual acrescentara uma cruz e uma bandeirinha e com a qual batia na água fazendo-a saltar sobre sua cabeça. Quando fazia isto vi que descia uma luz sobre ele e se derramava sobre ele o Espírito Santo, enquanto dois anjos apareciam à beira de sua fonte e falavam com ele.
Tudo isso foi a última coisa que ele fez no deserto. O poço estava em uso mesmo depois da morte de Cristo. Quando os cristãos fugiram pela perseguição, vi que continuavam trazendo os enfermos e os viajantes para serem batizados onde eles costumavam rezar suas preces. No tempo de Pedro, o poço estava cercado por um cerco. Depois desta obra, João saiu do deserto e foi para onde o povo o esperava. Sua presença era imponente: alto de estatura, embora magro e enxuto pelos jejuns; de forte musculatura; de porte nobre, atraente, puro, simples e compassivo; a cor do rosto bronzeado, o rosto magro e o semblante sério e enérgico; os cabelos castanhos escuros e crespos e a barba curta. A metade do corpo tinha um tecido que chegava até os joelhos. Ele usava um manto escuro, que parecia feito de três pedaços. Uma pele, presa com uma alça, cobria suas costas. Os braços e o peito estavam descobertos; o peito curtido pelo tempo e coberto de pelos da cor de seu manto. Ele carregava uma bengala com curvatura como a usada pelos pastores.

Pregação e viagens de João Batista

Ao retornar do deserto ele construiu uma ponte sobre um rio. Não lhe interessava que já existisse uma passagem a certa distância: fazia o seu trabalho onde convinha à sua missão. Uma antiga estrada real atravessava o local. Ele havia ensinado em Cidessa, cujos habitantes foram os primeiros pagãos a comparecer ao seu batismo. Essas pessoas viviam abandonadas e em cavernas. Eram descendentes de várias castas que ali se estabeleceram desde a destruição do templo. Um dos últimos profetas disse-lhes para se estabelecerem ali até que chegasse um, a quem ele apontou como João, que lhes diria o que deveriam fazer. Mais tarde, eles recuaram para Nazaré. João não se impressionou com nada que o cercava e só falou de uma coisa: fazer penitência, já que o Messias se aproximava. Todos o admiravam, permanecendo absortos em sua presença. Sua voz era penetrante como uma espada, poderosa e severa, mas ainda gentil. Ele se associava com todos os tipos de pessoas e com crianças. Em todos os lugares ele ia direto ao seu objetivo: não se importava com nada, não pedia nem precisava de nada de ninguém. Eu o vi vagar pelos desertos e penetrar nas florestas; Eu o vi cavar, remover pedras, arrancar árvores ou plantá-las, preparar assentos. Ele chamou os homens que o viram para ajudá-lo, e eles lhe obedeceram. Às vezes ele os tirava de suas cabanas. Todos o respeitavam. Ele não parava muito em lugar nenhum e mudava constantemente de lugar. Ele caminhou pelas estradas da Galiléia, ao redor do lago, sobre Tariqueia e o Jordão, através de Salém, no deserto em direção a Betel, e perto de Jerusalém, que ele não quis tocar em toda a sua vida, pois suas queixas e lamentações eram muitas vezes dirigidas contra a cidade depravada. Apareceu sempre cheio da sua missão e do seu destino: sério, severo, simples e zeloso, gritando a uma só voz: "Penitência! Preparai os caminhos do Senhor! O Salvador vem!" Depois voltou para o seu lugar pelo vale dos pastores. Seus pais já haviam morrido. Entre os seus primeiros discípulos estavam alguns jovens que eram parentes de Zacarias. após a morte de José, ele raramente saía, mas algumas pessoas de sua família ouviram suas palavras e até o acompanharam durante parte do caminho. Três meses antes de começar a batizar, João percorreu o país duas vezes, anunciando quem deveria vir depois  dele. Sua caminhada era rápida, com passos leves, sem descanso, mas sem agitação. Não lembrava a caminhada calma do Salvador onde ele não tinha nada para fazer, eu o via correndo de campo em campo para ensinar; pessoas nas praças e nas ruas para falar com eles, tenho visto que os fariseus e os nobres do povo às vezes o paravam, para impedir a sua pregação, mas depois ficavam maravilhados e admirados, e o deixavam sozinho. “Preparai os caminhos do Senhor” não eram apenas figuras de linguagem. Vi que João percorreu todos os caminhos que Jesus e os apóstolos percorreram depois, removendo obstáculos e suavizando dificuldades. Ele limpou arbustos e pedras das estradas e abriu novos caminhos. Colocou pedras em certos lugares de vau, limpou canais, cavou poços, consertou fontes entupidas, fez assentos e confortos, que o Senhor mais tarde utilizou em suas viagens. Ele construiu telhados onde Jesus mais tarde reuniu seus ouvintes ou onde ele descansou de seu trabalho.
Em todos os seus trabalhos, este homem simples e sério despertava a admiração de todos os que o observavam ou ajudavam, mesmo nas cabanas de onde os tirava para que lhe emprestassem ferramentas. Em toda parte era cercado, e sem medo os exortava à penitência pela proximidade do Messias, chamando a si mesmo o preparador de seus caminhos. Muitas vezes o vi indicando a direção por onde Jesus andava naqueles momentos. Contudo, nunca o vi junto com Jesus, embora às vezes não estivessem a mais que uma hora de caminho, um do outro, em suas viagens. Certa vez João disse às pessoas que ele não era o Salvador esperado; que não era mais que um humilde preparador e precursor, e que "ali" (indicava à pouca distância) estava o Salvador.
João, na verdade, viu apenas três vezes em sua vida o Salvador. A primeira, no deserto, quando a Sagrada Família, em sua fuga para o Egito, passou perto de onde estava João, e este, guiado pelo Espírito, se aproximou-se para saudar seu mestre que o santificara desde o seio de sua mãe; João sentiu a proximidade de seu Salvador, que tinha então sede: orou e tocou com a sua vara a rocha, da qual brotou abundante água. Naquela ocasião, correu adiante o menino João, e viu Maria, José e Jesus.
Eu o vi dançar e saltar de contentamento onde brotou a fonte, enquanto brincava com a bandeirinha que levava consigo. A segunda vez o viu ao batizá-lo. A terceira, quando passou junto ao Jordão e deu testemunho dele diante de seus discípulos.
Ouvi dizer que Jesus ponderava diante de seus discípulos a mortificação de João: que por ocasião do batismo realizou as cerimônias do rito apenas para cumprir seu dever, embora seu coração estivesse quebrantado de amor pelo seu Salvador, pelo desejo de estar com Ele e segui-lo. Disse também Jesus que João se afastava de sua presença por humildade e mortificação, porque seu gosto teria sido visitá-lo com frequência e permanecer com ele. Por outro lado, João via sempre o Salvador em espírito, pois estava frequentemente em estado sobrenatural e profético. Via em Jesus o cumprimento da promessa e a realização das profecias acerca de sua missão. Jesus era para ele, não um contemporâneo e um concidadão: ele era o Salvador do mundo, o Filho de Deus feito homem, o Eterno aparecido no tempo; e por isso ele não podia sequer pensar em viver com ele e se familiarizar em sua presença. Por outro lado, o próprio João sentia-se desvinculado dos homens e não estava enredado em nenhum de seus costumes.
Desde o seio materno foi prevenido e regido pelo Eterno, posto em relação sobrenatural pelo Espírito Santo com seu Redentor. Desde pequeno foi como que tirado do mundo e permaneceu no deserto, não sabendo nada além das coisas do seu Redentor, até que saiu, como novamente nascido, do deserto para cumprir sua missão seriamente, com entusiasmo, energicamente, sem se preocupar com o que acontecia no mundo. Seu deserto era agora a Judéia; e como antes tinha falado com animais, pássaros, pedras, plantas e árvores, enquanto vivia no meio deles, assim agora ele fazia isso com os homens e pecadores, sem cuidar de si mesmo ou do que estava acontecendo ao seu redor. Ele não falava, não sabia e não via outra coisa senão Jesus. Sua palavra era: "Ele vem. Preparem o caminho. Faça penitência e receba o batismo. Vede o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo". Puro e limpo, como uma criança no seio materno, saiu do deserto; puro e simples era agora, como uma criança nos seios de sua mãe. Ouvi Jesus dizer aos seus apóstolos: "Ele é puro como um anjo; nada impuro, nenhum pecado chegou a manchá-lo; nem uma mentira chegou aos seus lábios".

Lugares onde João Batista batizava

João batizou em vários lugares. Primeiro em Ainon, perto de Salém.
Em seguida, em On, em frente a Bethabara, na parte ocidental do Jordão, não muito longe de Jericó. O terceiro lugar foi a leste do Jordão, batizando mais ao Norte. Depois voltou a batizar em Ainon, onde foi capturado por Herodes. A água com que batiza pertencia a um afluente do Jordão, que para o Oriente fazia um desvio de uma hora de caminho. Este braço do Jordão era lá às vezes tão estreito que podia ser ultrapassado por um salto. O leito do rio parecia ter mudado de curso, pois via que alguns lugares estavam ficando sem água.
O desvio do Jordão formava fontes e poços que recebiam suas águas do afluente do Jordão. Uma dessas fontes era separada do braço principal: era o local do batismo chamado de Ainon. Sob essa vedação havia canais que podiam ser abertos e fechados à vontade, dispostos assim pelo próprio João.
Na margem havia como uma calha e várias sulcos de terra entravam nela. Os batizandos colocavam-se entre dois destes sulcos dentro da água até a cintura, apoiando-se sobre uma borda. Sobre uma língua de terra estava João, que recolhia e derramava a água com uma concha sobre a cabeça do batizando, enquanto na outra parte estava um dos já batizados, que colocava a mão sobre os ombros do neófito. A primeira dessas testemunhas o próprio João tinha colocado as mãos sobre os ombros. Os batizandos não tinham a parte superior do corpo completamente descoberta: colocava-se sobre eles um pano branco, deixando descobertos apenas os homens. Havia ali uma cabana onde se vestiam e se despiam. Não vi nenhuma mulher batizada ali. Quando João batizava, usava uma roupa longa e branca.
A região era uma região bonita e rica em água, chamada Salem, a população deste nome estava em ambos os lados do rio. Ainon estava localizada do outro lado do Jordão, ao Norte de Salém, mais perto do Jordão e era maior.
Vi muitos animais pacificamente nas pradarias, principalmente os burros. Rege em Salém e Ainon uma espécie de direito antigo, Segundo o qual ninguém pode ser expulso do lugar que ocupa, por ser declarado livre. João ergueu sua cabana em Ainon sobre as ruínas de um antigo edifício, cujas paredes já estavam cobertas de vegetação e se viam outras cabanas edificadas sobre ele. Estas ruínas eram os antigos fundamentos de tendas erguidas por Melquisedeque.
Sobre este lugar eu tive várias visões, de tempos antigos. Lembro-me de que Abraão teve ali uma visão e dispôs duas grandes pedras: sobre uma se inclinou para orar e a outra a ergueu em altar. Eu vi sua própria visão. Era uma cidade como a celeste Jerusalém, de onde partiam como raios de água brilhantes para baixo. Foi-lhe dito que ele deveria orar para o advento da cidade de Deus sobre a terra. Essa água, que vinha da Cidade celestial, se espalhava para todos os lados'". Abraão teve essa visão cinco anos antes de Melquisedeque levantar sua tenda. Este castelo era composto por uma série de quartos com galerias e escadas, semelhantes aos quartos do rei Mensor na Arábia; apenas os fundamentos eram de pedras. Pareceu-me reconhecer agora, no tempo de João, os quatro ângulos onde estavam plantadas as colunas do edifício. sobre estes muros, que pareciam uma fortaleza, João construiu sua cabana de juncos. Melquisedeque tinha edificado estas casas porque ali se reuniam muitos estrangeiros e viajantes, por ser lugar de abundantes águas. Creio que também Melquisedeque tinha edificado ali porque, como sempre o vi aparecer como guia e condutor de povos, os reunia para aconselhá-los e guiá-los e hospedá-los até sua partida. Desde então, porém, tinha já uma relação com o batismo de João, e era para Melquisedeque o lugar de onde ia para edificar a Jerusalém, e para ir para onde Abraão estava. A partir dali distribuíam as famílias e tribos que se hospedavam no local. Jacó também teve muito tempo em seu acampamento em Ainon. A cisterna do poço do batismo já existia e vi Jacó renová-la. Os restos dos edifícios de Melquisedeque estavam perto das águas e do lugar do batismo; e vi que nos primórdios foi construída, de Jerusalém, uma igreja no lugar onde João batizou. Esta igreja ainda subsistia quando Maria egípcia se dirigia ao deserto para fazer vida de penitente. Salém era uma bela cidade, devastada em guerras antes de Cristo, quando o templo foi destruído. O último profeta andou também por estes lugares.

João Batista e Herodes

João já era célebre por sua pregação há alguns meses quando vieram alguns mensageiros de Herodes, desde Kallirrohe, para vê-lo.
Herodes vivia no castelo a leste do Mar Morto, onde havia banhos de mar e banhos quentes. Herodes desejava que João fosse aonde ele estava; Mas João respondeu aos mensageiros que tinha muito que fazer; que se Herodes desejava vê-lo e falar com ele poderia se aproximar dele. Depois disso, vi Herodes viajando em uma carruagem, bastante baixa, de rodas, mas em um trono alto, do qual eu podia ver ao seu redor: este assento tinha um teto e em torno do carro havia soldados que guardavam o rei. Ia a uma aldeia a cerca de cinco horas de viagem ao sul de Ainon e mandou dizer a João que podia chegar até aquele lugar. João acedeu e fora da cidade, numa cabana, esperou por Herodes, que concorreu sem acompanhamento. Lembro-me de Herodes lhe perguntando por que ele habitava uma cabana tão miserável em Ainon; que ele, o rei, queria fazer dela uma boa casa. João respondeu que não desejava casa alguma, que tinha tudo o que necessitava e cumpria assim a vontade daquele que é superior aos reis. Ele falou sério e vigorosamente e voltou ao seu lugar. Falou a certa distância de Herodes, com o olhar voltado para o outro lado.
Vi os filhos do falecido Alfeu e de Maria Cléofas: Simão, Tiago, O Menor e Tadeu, e o filho de seu segundo casamento com Sabas, José Barsabas. Todos estes foram batizados por João em Ainon. Também André e Filipe foram batizados em Ainon. Mais tarde, eles voltaram às suas ocupações. Os demais apóstolos e muitos discípulos já tinham o batismo. Um dia, muitos anciãos, sacerdotes dos povos vizinhos de Jerusalém, compareceram para pedir-lhe a razão de quem era para pregar, quem o enviara, qual era a sua doutrina, e outras coisas semelhantes. Respondeu-lhes referindo-se à proximidade do Messias e à sua vinda e repreendeu-os, lançando-lhes com coragem a sua hipocrisia e a sua obstinação em não fazer penitência.
Algum tempo depois, compareceram todos os anciãos, sacerdotes, fariseus de Nazaré, Jerusalém e Hebrom para inquirir sobre sua missão, queixando-se também de que se apropriara do lugar onde batizava. Vi muitos publicanos serem batizados por João, depois de os ter repreendido por suas injustiças. Entre eles estava o publicano Levi, mais tarde Mateus, filho do primeiro casamento do viúvo Alfeu, que foi marido de Maria de Cléofas. Partiu dali muito comovido, e melhorou de vida: até então tinha estado em grande desprestígio entre seus parentes. Muitos publicanos foram rejeitados por João como impenitentes.

Comoção que produzia o batismo de João

Em Dothaim, onde Jesus aquietara o endemoninhado furioso, viviam misturados com os judeus muitos pagãos desde o tempo do cativeiro da Babilônico. Os infiéis tinham em uma altura nas proximidades um ídolo com altar. Os judeus, ouvindo falar da proximidade da vinda do Messias, não queriam mais viver misturados com esses idólatras. Este movimento foi despertado desde que João percorreu toda aquela região e quando voltaram os batizados de João. Um príncipe de Sidom teve que enviar soldados para proteger os pagãos. Herodes também enviou soldados para apaziguar o povo. Esses soldados eram da pior classe. Vi que foram primeiro a Kallirrohe, onde se encontrava Herodes, para lhe dizer que queriam ser batizados por João. Eles faziam isso mais por política e para causar boa impressão entre as pessoas. Herodes respondeu-lhes que não era necessário fazer-se batizar, que João não fazia milagre algum e que não se podia provar a sua missão divina; que em tudo perguntassem em Jerusalém o que convinha fazer. Já os vi em Jerusalém. Estiveram com três chefes perguntando sobre o particular, pelo que soube que estavam divididos em três seitas. Tudo isso aconteceu no pátio do tribunal, onde mais tarde Pedro negou a Cristo. Havia ali muitos sentados diante do juiz, rodeados de espectadores. Os sacerdotes responderam com soma que podiam fazê-lo ou deixar de fazê-lo, que era o mesmo. Vi que cerca de trinta deles foram a João, o qual os repreendeu com severidade, porquanto não tinham desejo de converter-se; deles batizou alguns de boa vontade, depois de lhes ter afugentado porsua hipocrisia e mal proceder.
As multidões que chegavam a Ainon eram muito grandes. Alguns dias deixava João de batizar, e os empregava em pregar e repreender com energia. Vi muitos grupos de judeus, de samaritanos e de pagãos, sentados separadamente nas colinas, nas pradarias, sob telhados, ou à sombra, ao ar livre, ouvindo a pregação de João. Eram muitas centenas. Escutavam a sua palavra, faziam-se batizar e partiam depois. Uma vez vi muitos pagãos, alguns da Arábia e de outras regiões orientais, que traziam muitos jumentos e ovelhas, porque tinham parentes nestes lugares e como deviam passar por ali, foram ouvir a pregação de João.
Houve em Jerusalém uma importante reunião do Sinédrio por causa de João Batista. Foram enviados nove homens, três por cada uma das três autoridades, para que fossem interrogar João. Anás enviou José de Arimatéia, o mais velho dos filhos de Simeão e outro sacerdote que cuidava dos sacrifícios e ofertas. Pelo Conselho foram enviados três mensageiros, e outros três civis estavam representando o povo. Deviam perguntar a João quem ele era e dizer-lhe para aparecer em Jerusalém. Se a sua missão era verdadeira, devia apresentar-se antes no templo. Lhe perguntavam a respeito de sua maneira de vestir, e por que batizava também os judeus quando só se acostumava fazê-lo com os pagãos. Não faltava quem acreditasse que João era Elias voltando ao mundo.
Vi agora André e João Evangelista com João. Estiveram também com João a maioria dos futuros apóstolos; muitos discípulos, além de Pedro, que se fez batizar agora, e Judas, o traidor, que tinha estado em Betsaida com os pescadores e tinha ouvido tudo o que se dizia de Jesus e de João. Quando os enviados do Sinédrio chegaram, já fazia três dias que João não batizava, e começava de novo a fazê-lo. Os enviados queriam que ele os ouvisse imediatamente. Ele lhes disse que os escutaria quando tivesse terminado seu trabalho, e com palavras curtas e severas os deixou esperando. Repreenderam-no por ter tomado ele mesmo a autoridade; que devia apresentar-se em Jerusalém e que não devia vestir-se tão selvaticamente.
Quando se afastaram-se estes mensageiros, permaneceram José de Arimatéia e o filho de Simeão e receberam o batismo das mãos de João. Havia muitas pessoas que João não queria batizar. Estas se uniram aos mensageiros do Sinédrio, acusando João de parcialidade e de animosidade contra eles. Os futuros apóstolos voltavam agora para suas casas, falavam de João e prestavam atenção em Jesus, de quem ouviram falar por João, o Precursor.
José de Arimatéia, voltando a Jerusalém, encontrou Obede, parente de Serafia, que era servo do templo. José contou a Obede muitas coisas sobre João, E Obede foi também batizar-se. Como servo do templo, ele era um dos discípulos secretos de Jesus e mais tarde se declarou cristão.

João recebe aviso para se retirar para Jericó

Vi mais tarde que João passou para batizar alguns doentes.
Ele usava seu pano de veste e seu manto pendente dos ombros. De um lado tinha uma vasilha com água batismal e do outro trazia a concha que usava para batizar.
Eles trouxeram muitos doentes sobre macas portáteis e sobre carrinhos de mão, dispondo-os ao longo da margem, do outro lado do Jordão onde João batizava. Como não podiam ser levados para a margem oposta, rogaram a João para ir para fora aonde se encontravam. João foi com alguns discípulos.
Ele havia preparado ali uma bela fonte cercada por uma cerca feita por ele mesmo. Levava consigo uma pá. Ele deixou entrar água por um canal que fez e misturou-a com a que trazia em seu recipiente. Catequizou os enfermos e os batizou, depois de ordenar que os dispusessem à beira da fonte, enquanto ele passava derramando a água sobre eles. Depois de os ter batizado, voltou para o outro lado do Jordão, para Ainon.
Ali eu vi um anjo aparecer para ele e dizer-lhe para voltar para o outro ao lado do Jordão, para Jericó, pois se aproximava aquele que devia vir, a quem devia anunciar, João e os seus discípulos levantaram as suas tendas, caminharam algumas horas pela parte oriental do Jordão, para cima, e passaram para a outra margem, por onde fizeram um trecho. Ali se viam locais de banhos, cavados e cercados, de tijolos brancos, com canais que se abriam e fechavam à vontade para trazer a água do Jordão; ali o rio não tinha Ilha. Este segundo lugar de batismo estava entre Jericó e Betagla, na parte ocidental do Jordão, em frente a Betabara, na parte oriental do rio. Estava a cerca de cinco milhas de Jerusalém.
O caminho reto passava por Betânia, através do deserto, até chegar a um albergue, um pouco fora do caminho, lugar entre Jericó e Bethagla. As águas do Jordão ali eram muito claras, calmas. Sentia-se o aroma delicioso das plantas aromáticas e das flores, cujas pétalas caiam na água. Em alguns pontos, o rio era tão estreito e raso que você podia ver o fundo; nas margens se via fendas cavadas pela água com o tempo.
Alegrei-me muito quando me encontrei na terra Santa; mas me surpreenderam as mudanças do tempo comparadas com as do nosso. Quando ali era inverno, lá tudo florescia, e quando ali era verão, já estvam lá brotando as plantas para a segunda colheita. Depois vinha um tempo em que havia muita neblina e chovia muito.
Ao lado de João, vi cerca de cem pessoas, entre elas seus discípulos e muitos pagãos. Eles trabalhavam para melhorar o Batistério e consertar a cabana. Eles traziam coisas de Ainon. Os doentes eram transportados em angarilhas. Este era o lugar do Jordão onde Elias feriu com o seu manto as águas, para passar para o outro lado, e onde fez o mesmo Eliseu quando voltou a passar. Eliseu descansou ali de sua viagem. Por ali passaram também os filhos de Israel quando entravam na Terra Santa.
De Jerusalém foram enviados novamente a João, o povo do templo, fariseus e saduceus. Um anjo anunciou isso ao Batista. Quando chegaram perto do Jordão, enviaram um mensageiro a João para lhe dizer que se aproximasse. Sem abandonar sua obra respondeu que se quisessem falar com ele podiam fazê-lo aproximando-se onde ele batizava. Aproximaram-se, mas João não deixou de prosseguir sua pregação e seu batismo na presença dos enviados. Quando João terminou seu trabalho atendeu aos mensageiros e mandou seus discípulos que os abrigassem sob um telhado, chegando-se a eles acompanhado por diversos ouvintes. Os mensageiros perguntaram quem era aquele de quem dizia sempre que havia de vir, que segundo as profecias era o Messias e que se dizia haver já chegado. João respondeu-lhes que um havia se levantado contra eles, a quem não conheciam. Acrescentou que ele também não o tinha visto, mas que desde antes de ter nascido lhe tinha ordenado preparar o seu caminho e que devia batizá-lo. Disse-lhes que voltassem em certo tempo em que ele devia vir para ser batizado. Falou-lhes então severamente, dizendo-lhes que não tinham vindo para o batismo, mas para espioná-lo. Responderam-lhe que agora sabiam quem ele era: que batizava sem missão recebida; que era um hipócrita ao vestir-se tão estranhamente e voltaram a Jerusalém. Pouco tempo depois chegaram outros mensageiros do Sinédrio de Jerusalém, em número de cerca de vinte: sacerdotes procedentes de várias cidades, com seus mitras, largas faixas e longas fitas que pendiam dos braços. Disseram-lhe que vinham do Grande Sinédrio, que se apresentasse diante dele para dar conta de sua missão e de sua conduta; que era uma sinal de que não tinha missão ao não obedecer ao Sinédrio. Ouvi então a João que lhes disse que esperassem um pouco, que viria aquele que o enviara, assinalando claramente a Jesus: que era nascido em Belém, educado em. Nazaré, que tinha fugido para o Egito e ele ainda não o tinha visto. Lançaram-lhe na cara que ele estava entendido com Jesus; que se enviavam reciprocamente mensageiros. João respondeu-lhes que os mensageiros que se enviavam não podiam mostrar-lhes, porque eram cegos. Os mensageiros foram-se desgostosos e contrariados. Multidões de judeus e pagãos vinham de toda parte. O próprio Herodes mandou gente para ouvir a sua pregação com o encargo de que lhe contassem o que ouvissem dele. Vi que estava melhor organizado o lugar do batismo. João levantou com seus discípulos um grande telhado onde eram agasalhados os enfermos e os fatigados pela viagem e onde se reúniam para ouvir sua pregação. Às vezes cantavam salmos; assim, por exemplo, ouvi o salmo que falava da passagem do Mar Vermelho pelos filhos de Israel. Às vezes parecia que haviam improvisado uma pequena população de tendas e cabanas; estas casinhas estavam cobertas de peles e juncos que cresciam nas margens do rio. Notava-se muita afluência de viajantes provenientes das regiões dos Reis Magos: vinham em camelos, em jumentos e em cavalos bonitos e muito ágeis. Estavam a caminho do Egito. Agora todos se reuniam em torno de João, ouviam sua pregação sobre o Messias e recebiam o batismo. Dali costumavam ir em grupos até Belém. Não muito longe da gruta da manjedoura, em frente ao campo dos pastores, havia um poço, onde Abraão havia vivido com Sara, e estando doente desejou vivamente beber água; tendo-lhe trazido num recipiente água do poço, não quis logo beber, deixando-a por Deus, e em recompensa, o livrou Deus do seu mal. Por causa de sua grande profundidade, era muito difícil tirar água do poço. Havia uma árvore muito grande lá e não muito longe estava a gruta de Maraha. Sendo a enfermeira muito idosa, costumava levá-la em suas viagens sobre um camelo. Por estes fatos se converteu este em um lugar de peregrinação para os piedosos israelitas, como o eram o Monte Carmelo e o monte Horebe. Neste lugar rezaram também os santos Reis Magos.
Da Galiléia não tinham vindo muitos para ver João, além dos que foram seus discípulos. Mais gente chegava de Hebrom, entre eles muitos gentios.
Por isso, enquanto Jesus passava pela Galiléia, exortava os habitantes a irem ao batismo de João.

Herodes no batistério. Uma festa tradicional

O lugar onde João ensinava ficava a cerca de meia hora do Batistério.
Era um lugar sagrado cheio de lembranças para os hebreus e estava cercado como um jardim. No interior havia cabanas e no meio uma grande pedra que indicava por onde passaram os filhos de Israel com a Arca da Aliança, e onde eles a haviam depositado para oferecer um sacrifício de ação de Graças. Sobre esta pedra tinha levantado João o assento de onde ensinava; tinha construído um grande galpão com teto de juncos; ao pé da pedra havia a cátedra de João. Estava rodeado de seus discípulos ensinando, quando chegou o rei Herodes; mas João não se perturbou por isso em sua pregação.
Herodes tinha estado em Jerusalém, onde se uniu com a mulher de seu irmão, que tinha uma filha, chamada Salomé, de cerca de dez e seis anos. Tinha a intenção de unir-se a esta mulher e tinha em vão tentado obter o beneplácito do Sinédrio. Por isso, houve uma viva discussão entre eles. O rei temia, por outro lado, a voz do povo e pensou em esconder-se com alguma palavra de permissão da parte de João. Pensava que o Batista, para agradar-se com o rei, diria algo de acordo com seu plano. Vi agora Herodes com a jovem Salomé, filha de Herodias e suas empregadas, na companhia de cerca de trinta pessoas em viagem para o Jordão. Ele estava indo com as mulheres em uma carruagem e tinha enviado um mensageiro para João ' o Batista não queria receber o rei no lugar sagrado, como ele estava vindo com essas mulheres. Deixou, então, de batizar e retirou-se com seus discípulos para onde costumava pregar, e falou energicamente do assunto que Herodes queria saber. Disse-lhe que esperasse por aquele que devia vir; que não permaneceria muito tempo batizando, que devia ceder o lugar àquele de quem era só o seu precursor. Falou de tal maneira a Herodes que este entendeu que tratava seu assunto e conhecia sua intenção. Herodes apresentou-lhe um rolo muito grande que continha seu procedimento; mas João não quis manchar suas mãos de batizador tocando o escrito. Vi então Herodes, muito contrariado, deixar o lugar com seu séquito. Vivia naquela ocasião perto dos banhos de Kallirrohe, a poucas horas do Batistério. Herodes tinha deixado alguns delegados com o rolo para que João o lesse, mas inutilmente: João voltou ao lugar do batismo. Vi as mulheres que iam com o rei: estavam vestidas luxuosamente, mas com decência. Madalena estava mais fantasticamente adornada nessa época.
Celebrava-se agora uma festa de três dias junto à Pedra da passagem dos hebreus. Os discípulos de João adornaram o lugar com plantas, coroas e flores. Vi entre eles Pedro, André, Filipe, Tiago Menor, Simão e Tadeu e muitos dos futuros discípulos de Jesus. O lugar era ainda sagrado para os piedosos israelitas; mas esta veneração estava muito decaída e João voltou a renová-la. Vi João e alguns dos seus com vestes que pareciam sacerdotais. O Batista tinha, sobre uma veste escura, outra branca, longa; estava cingido com uma faixa amarela, entrelaçada com faixas brancas, da qual pendiam borlas. Sobre os dois ombros carregava uma grande pedra preciosa onde estavam gravados seis nomes de cada lado das doze tribos de Israel. No peito tinha um escudo quadrado, amarelo e branco, preso das quatro pontas com correntes de ouro. Sobre o escudo havia também doze pedras gravadas com os nomes das doze tribos. Do ombro pendia-lhe uma faixa como estola entrelaçada de amarelo e branco que chegava muito abaixo e terminava em borlas. Sobre a veste exterior na parte inferior havia costurado brotos de frutas em seda branca e amarela. Tinha a cabeça descoberta, mas nas costas pendia-lhe uma espécie de capuz que podia levantar sobre a cabeça até à testa e terminava em ponta. Diante da pedra onde estava a Arca da Aliança havia um altar pequeno, quase quadrado, vazio no meio e coberto com uma grade; abaixo um buraco para as cinzas e nos quatro lados bicos ocos como chifres. João e vários discípulos estavam com vestes que me lembravam as que vi quando os apóstolos celebravam os mistérios nos primeiros tempos.
Estes ajudavam no sacrifício. O lugar foi incensado e João queimou várias ervas aromáticas, plantas e creio que também grãos de trigo sobre o altar, que era transportável. Haviam-se reunido muitos que esperavam ser batizados. As vestes sacerdotais foram preparadas neste lugar do batismo, porque agora moravam mulheres nos arredores do Jordão e elas faziam todos os tipos de ornamentos e utensílios para João. No entanto, eles não eram batizados lá. Parecia como se João começasse uma nova igreja com um culto próprio. Já não o via trabalhar como antes com as próprias mãos e vestia para batizar uma longa veste branca. Vi-o ainda preparar sozinho o lugar do batismo de Jesus, enquanto os discípulos lhe traziam o necessário.
João disse neste dia de festa um grande sermão muito animado. Estava, com suas vestes sacerdotais, sobre a tenda, que tinha uma galeria em torno como tinha visto nas tendas no país dos Reis Mágicos. Ao redor tinham levantado arquibancadas onde se colocava a gente, nesta festa; era uma incontável multidão. Falou do Salvador que o enviara, e a quem ele ainda não tinha visto, e falou da passagem do Jordão pelos israelitas. Depois, no interior da tenda, houve novamente oferta de incenso e queimaram-se ervas. De Maspha até a Galiléia, havia se espalhado a notícia de que João ia proferir um grande sermão, e foi assim que se congregou uma multidão tão grande. Os essênios estavam todos presentes. A maioria dos ouvintes usava vestes longas e brancas. Vinham homens e mulheres, as mulheres geralmente montadas em jumentos, no meio de alforjes, com pombas e comestíveis, enquanto os homens guiavam os animais. Os homens ofereciam pães em sacrifício, e as mulheres, pombas. João estava atrás de uma grade e recebia os pães: eram depositados sobre uma mesa com grelha, purificavam com farinha e depois, amontoados, eram abençoados por João e elevados ao alto em oferta. Estes pães eram então divididos em pedaços e repartidos: aos que vinham de mais longe tocava partes maiores por estarem mais necessitados. A farinha que caía e os pedaços de pães desprendidos eram passados através da grelha e queimados no altar. Os pombos eram distribuídos entre os necessitados. Isso durou quase meio dia. Toda a festa durou, com o Sábado, três dias. Depois voltei a ver João no batistério.

Brota a ilha para o batismo de Jesus no Rio Jordão

O Batista falou aos seus discípulos sobre a proximidade do batismo do Messias. Afirmou novamente que ainda não o tinha visto, mas acrescentou: "Eu quero mostrar-vos o lugar do seu batismo. Olhai: as águas do Jordão se dividirão e se formará uma ilha". Naquele momento, as águas do Jordão se dividiram em duas e uma pequena Ilha redonda e esbranquiçada se ergueu sobre a superfície. Era o mesmo lugar por onde os filhos de Israel passaram o Jordão com a Arca da Aliança e onde Elias dividiu as águas com o seu manto. Houve uma grande comoção entre os presentes: oravam e davam graças a Deus. João e seus discípulos trouxeram grandes pedras, que puseram na água, e então, com galhos, árvores e plantas, acomodaram uma ponte até a ilha e eles cobriram a passagem com pequenas pedras brancas.
Quando eles terminaram o trabalho, a água foi vista correndo Debaixo da ponte. João e seus discípulos plantaram doze árvores ao redor da ilha e uniram suas copas para formar um teto com a folhagem. Entre essas árvores colocaram cercas de várias plantas que nasciam muitas nas margens do Jordão. Eles tinham brotos brancos e coloridos, e frutos amarelos, com uma pequena coroa, como nisperos. A ilha que havia surgido no lugar onde havia sido depositada a Arca da Aliança em sua passagem pelo Jordão, parecia de rocha, e o fundo do rio, mais elevado do que nos tempos de Josué. A água, ao contrário, pareceu-me mais profunda; de modo que não saberia dizer se a água se retirou mais ou se a ilha se levantou sobre a água, quando João compareceu para formar o Batistério de Jesus. À esquerda da ponte, não no meio, mas na borda da ilha, ele fez uma escavação, para a qual uma água clara fluía.
Levavam a esta fonte alguns degraus; na superfície da água havia uma pedra triangular, plana, de cor vermelha, onde devia estar Jesus duante Baptismo. À direita erguia-se uma esbelta palmeira com frutos, a qual haveria de abraçar Jesus. A borda desta fonte era delicadamente trabalhada e todo o conjunto apresentava uma aparência formosa.
Quando Josué levou os israelitas para através do Jordão, vi que o rio estava muito aumentado. A Arca da Aliança foi levada bastante distante do povo para o Jordão. Entre os Doze que a conduziam e acompanhavam estavam Josué, Calebe e outro personagem, cujo nome soava como Enoi. Chegando ao Jordão, tomou um só a parte dianteira da Arca que costumavam levar dois; os outros seguravam por detrás e no instante em que o pé da Arca tocou as águas, estas aquietaram-se, parecendo gelatinas que subiam umas sobre as outras, formando uma muralha ou antes uma montanha que podia ser visto da cidade de Zarthan. As águas que corriam para o Mar Morto foram perdidas no mar, e foi possível passar a pé pelo leito do Jordão. Assim os israelitas que estavam distantes da Arca atravessaram o leito do rio. A Arca foi levada pelos levitas para o interior, onde havia quatro pedras quadradas colocadas regularmente. Eram estas pedras de cor de sangue e de cada lado havia duas fileiras de seis pedras triangulares, planas e trabalhadas. Os doze levitas deixaram a Arca da Aliança sobre as quatro pedras do meio e passaram doze de cada lado sobre as outras pedras triangulares que tinham o seu cone afundado nas águas. Outras doze pedras triangulares foram colocadas à distância: eram muito grossas, de cores diversas, gravadas com figuras e desenhos com flores. Josué escolheu doze homens das doze tribos para levar sobre as costas nuas estas pedras e à distância uma série de duas fileiras para lembrança da passagem. Mais tarde, uma população se levantou lá. Foram gravados nas pedras os nomes das doze tribos e os nomes dos que levaram as pedras. As pedras sobre as quais estavam os levitas eram maiores, e quando passaram o rio, as pedras foram viradas com as pontas para para cima.
As pedras que haviam estado fora da água já não eram visíveis nos tempos de João Batista: não sei se foram destruídas pelas guerras ou eles estavam simplesmente cobertos por terra e escombros. João levantou sua tenda no lugar delas. Mais tarde, houve uma igreja lá, acho que no tempo de Santa Helena.

O lugar onde estava a Arca da Aliança é exatamente o mesmo da ilha e da fonte onde Jesus foi batizado. Quando os israelitas passaram com a Arca e ergueram as doze pedras, o Jordão voltou a seguir seu curso como antes. A água da fonte do batismo de Jesus era de tal profundidade que da margem só se podia ver do peito quando estava um homem dentro. A profundidade um tanto escalonada e essa fonte octogonal, medindo cerca de um metro e meio de diâmetro, era cercada por uma borda, cortada em cinco lugares, de onde algumas pessoas podiam testemunhar o ato. As doze pedras triangulares sobre as quais estavam os levitas erguiam-se em ambos os lados da fonte batismal de Jesus com suas pontas para cima fora da água. Na fonte do batismo jaziam aquelas quatro pedras quadradas coradas, sobre as quais repousara a Arca da Aliança, Debaixo da superfície da água. Estas pedras apareciam com suas pontas fora da água em épocas de downspouts. Muito perto da borda da fonte havia uma pedra triangular, em forma de pirâmide, com a ponta para baixo, sobre a qual estava Jesus quando o Espírito Santo veio sobre, ele. À sua direita estava a palmeira, junto à borda, à qual Jesus se segurou com a mão, enquanto à sua esquerda estava o Batista. A pedra triangular onde Jesus estava, não era das doze: parece-me que João a trouxe da margem. Havia ali um mistério porque vi que estava assinalada com desenhos de flores e estrias'". As outras doze pedras eram também de várias cores, desenhadas com flores e ramificações. Eram maiores que as levadas à terra: parece-me que eram no princípio pedras preciosas que Melquisedeque plantou desde pequenas, quando o O Jordão não passava por cima delas.
Tenho visto que em muitos lugares fazia isto; colocava os fundamentos de obras que vinham logo a ser lugares sagrados ou onde aconteciam fatos notáveis, embora por muito tempo ficassem em pântanos ou escondidas entre matagais. Creio também que as doze pedras que João usava na festa no escudo do peito eram pedaços daquelas doze pedras preciosas plantadas por Melquisedeque.

Herodes novamente com João

Quando João voltou ao Batistério foi vê-lo novamente um grupo de cerca de vinte pessoas para lhe pedir conta de sua missão. Vieram de Jerusalém. Esperaram no lugar onde tinha ocorrido a festa e convidaram João; mas este não se mexeu. No dia seguinte, voltei a vê-los a meia hora do lugar onde João batizava; Mas João não os deixou entrar no recinto das tendas que estava cercado. Vi então que João, quando terminou o seu trabalho, lhes falou de certa distância: disse-lhes as coisas de sempre, referindo-se àquele que logo ia vir ao batismo, àquele que era mais do que ele, e a quem ainda não tinha visto pessoalmente. Algumas de suas perguntas, ele não respondeu.
Mais tarde vi Herodes, montado numa cavalgada, acomodado numa espécie de assento de caixote, e a mulher de seu irmão, com quem vivia, também montada sobre uma cavalgada, orgulhosa e atrevida, vestida com luxo e despudorada, que se aproximavam-se do lugar onde João estava batizando. A mulher parou a uma certa distância, enquanto Herodes desceu de sua cavalgada e se aproximou de João e começou a falar com ele. Herodes litigava com João porque este o havia excomungado, proibindo-lhe participação no batismo e na salvação do Messias se não deixasse escandalosa companhia. O rei apresentou-lhe novamente aquele escrito em defesa do seu proceder. Herodes perguntou-lhe se sabia alguma coisa de um certo Jesus de Nazaré, de quem se falava muito no país e de quem, segundo ouvira, recebia mensagens; se esse Jesus era o Esperado, já que sempre falava dele. Exigia-lhe que lhe dissesse claramente, pois queria tratar seu assunto com o Messias. João respondeu-lhe que Jesus não o escutaria, como ele não lhe escutava a sua demanda; que era adúltero e como tal seria tratado; que por mais que de uma forma ou de outra, tratava-se sempre de um adultério. Quando Herodes lhe perguntou por que lhe falava à distância e não se aproximava, Respondeu-lhe João: "tu és cego, e pelo adultério cometido te tornaste-te ainda mais cego, e quanto mais me aproximar de ti, mais cego te tornarás. Quando eu estiver em teu poder, farás comigo o que mais tarde sentirás muito ter feito". Com isso anunciava profeticamente sua próxima morte. Herodes e a mulher voltaram muito contrariados.
Aproximava-se o momento do batismo de Jesus. Vi João muito triste.
Parecia que seu tempo ia acabar muito em breve: já não o viaejo tão veemente em sua obra e o vejo perseguido por todos lados. Vieram de Jericó, de Jerusalém, da parte de Herodes, para expulsá-lo do lugar do batismo.
Seus discípulos ocuparam uma parte bastante considerável dos arredores do batismo e por isso pediram a João que se retirasse dali e passasse para o outro lado do Jordão. Os soldados de Herodes chegaram a desfazer até certo ponto o cerco, expulsando o povo; contudo não chegaram a incomodar a tenda de João, entre as doze pedras. João falou muito contristado, com o ânimo decaído, com seus discípulos: desejava já que viesse Jesus ao batismo; logo se retiraria de sua presença do outro lado do Jordão e não permaneceria muito tempo em seu posto. Seus discípulos estavam muito tristes com as coisas que ele lhes dizia e não queriam que ele os deixasse abandonados.

Jesus é batizado por João

Quando João recebeu aviso de que Jesus se aproximava, recobrou nova coragem para batizar. Vieram grupos daqueles a quem Jesus havia exortado a ir ao batismo, entre eles publicanos, e vi Parmenas com seus parentes de Nazaré. João falou aos seus discípulos sobre o Messias e humilhou-se diante dele de tal maneira que aqueles ficaram entristecidos. Chegaram também a João aqueles discípulos a quem Jesus havia rejeitado em Nazaré: vi estes falando com João de Jesus e suas obras. João ardia de tal amor por Jesus que quase se manifestava impaciente de que o Messias não se declarasse mais abertamente. Quando João os batizou, ele recebeu a garantia de que Jesus estava se aproximando. Viu uma nuvem luminosa que envolvia Jesus e os seus, e viu-os em visão que se aproximavam. Desde então, mostrava-se extraordinariamente contente e ansioso e olhava com frequência para o lado de onde viria. A ilhota com a fonte batismal estava toda verde e ninguém ia a ela fora João, quando tinha algo a consertar: o caminho que levava a ela ficava normalmente fechado.
Jesus caminhava mais leve que Lázaro e chegou duas horas antes dele ao lugar do batismo. Era a alvorada quando Jesus chegou ao mesmo tempo que outros. Estes não o conheciam e caminhavam ao lado dele; mas olhavam-no com estranheza, porque viam nele algo admirável que não podiam explicar-se.
Havia uma multidão extraordinária de pessoas. João pregava com maior entusiasmo da proximidade do Messias e da necessidade de fazer penitência.
Dizia que logo ele desapareceria. Jesus estava no meio dos ouvintes.
João sentiu a sua proximidade, viu-o e mostrou-se muito contente e animado; mas não deixou por isso de falar, e começou então a batizar. Ele já havia batizado muitos e eram cerca de dez da manhã, quando foi a vez de Jesus, que desceu à fonte. Então João se inclinou diante dele e disse: "eu devo ser batizado por você, e você vem a mim?... Jesus respondeu-lhe: "Deixa agora que se faça isto; é devemos cumprir toda a justiça: que tu me batizes, e eu seja batizado por ti". Jesus acrescentou:"você deve receber o batismo do Espírito Santo e do sangue". Então João disse-lhe para segui-lo até a pequena ilha. Jesus disse que assim o faria acrescentando que desejava que as águas com que eram batizados os demais se deixassem fluir para aquele lugar, que todos os que deveriam ser logo batizados fossem ali batizados, e que a árvore que ele ia abraçar fosse transplantada para onde eram batizados os outros e que todos a tocaram ao serem batizados. O Salvador passou com João e seus discípulos André e Saturnino sobre a Ponte da ilha. Jesus retirou-se para uma pequena tenda, junto à fonte, no lado oriental, para vestir-se e despir-se. Os discípulos o seguiram para a ilha. Até a ponte havia grande multidão de pessoas e na margem do rio ainda mais.
Na ponte podiam permanecer até três homens: entre eles estava Lázaro. A fonte batismal era feita em uma escavação escalonada, de forma octogonal e tinha abaixo uma borda de igual forma com cinco canais no que comunicavam com as águas do Jordão. A água enchia a fonte por meio de entradas cortadas nas bordas. Três dessas entradas eram visíveis na parte Norte, por onde as águas entravam e duas saídas eram cobertas na parte sul da fonte; por ali se passava e por este lado não se via a água rodeando a fonte. Do lado sul subiam umas arquibancadas de ervas verdes. A própria ilha não era de todo plana, mas um pouco mais elevada no meio, preenchida com pedras e partes moles, toda coberta de vegetação. Os nove discípulos de Jesus, que nos últimos tempos estavam com ele, aproximaram-se da fonte e permaneceram na orla. Jesus deixou na tenda seu manto, sua faixa e sua veste de lã amarela aberto na frente e fechada com fitas, uma faixa de lã mais estreita cruzada sobre o peito, que levantava sobre a cabeça à noite ou ao ar livre, e ficou com uma veste escura, com a qual saiu da tenda, para entrar na água, onde, pela cabeça, tirou também esta peça de roupa. Ele tinha, dentro da água, apenas uma faixa do meio do corpo aos pés. Todas as suas vestes foram recebidas por Saturnino, que as passou a Lázaro, que estava à beira da fonte. Jesus desceu à fonte, onde ficou coberto pelas águas até o peito. Com a mão esquerda, agarrou-se à palmeira e colocou a direita no peito, enquanto a faixa branca flutuava sobre as águas. João estava na parte sul da fonte; tinha na mão um recipiente de borda larga do qual saía a água por três aberturas. Inclinou-se, tomou água com o recipiente e derramou-a em três linhas sobre a cabeça do Salvador. Uma linha de água caiu sobre a frente da cabeça e do rosto; outra, no meio da cabeça, e a terceira na parte de trás. Não me lembro bem das palavras que João disse ao batizar, mas foram mais ou menos estas: "O Senhor, por meio dos serafins e querubins, derrame a sua bênção sobre Ti, com ciência, inteligência e força". Não me lembro bem se foram estas três últimas palavras; mas eram Três Graças ou dons para o Espírito, a alma e o corpo, e ali estava contido tudo o que cada um necessitava para apresentar ao Senhor um espírito, uma alma e um corpo renovados.
Enquanto Jesus saía da água, os discípulos Saturnino e André, que estavam à direita do Batista, sobre a pedra triangular, seguravam um pano, que puseram sobre ele para que se secassee e uma túnica longa e branca.
Quando Jesus parou sobre a pedra triangular vermelha, à direita da entrada da fonte, puseram os seus mãos sobre seus ombros, e João sobre sua cabeça.
Até então, colocava-se aos batizados apenas um pano pequeno; mas depois do batismo de Jesus ele usou outro mais extenso.

A voz do Pai após o batismo

Quando estavam prestes a subir as escadas para sair da fonte ouviu-se a voz de Deus sobre Jesus, parado apenas na pedra em oração. Ela veio como uma rajada de vento do céu e um trovão; de modo que todos os presentes ficaram assustados e olharam para cima. Desceu uma nuvem branca luminosa, e eu vi uma figura alada sobre Jesus, que o encheu como uma torrente. Vi o céu aberto, e vi a aparição do Pai celestial em forma e rosto comum, e ouvi a voz que ressoava: "este é o meu filho amado, em quem tenho minhas complacências". Era uma voz como dentro do trovão. Jesus estava completamente rodeado de luz e mal se podia olhar para ele: seu rosto era transparente. Eu vi anjos em torno dele.
A certa distância, sobre as águas do Jordão, vi Satanás em figura escura, como nuvem negra, onde se agitava uma confusão de vermes e de répteis de todas as classes: era a representação de como todo o mal, todo o pecaminoso, todo o pecaminoso da região se concentrava ali, em sua origem, fugindo da presença do Espírito Santo que se difundira em Jesus.
Era uma coisa espantosa e horrível, que contrastava totalmente com a claridade e a luz que se difundia em torno de Jesus e do lugar do batismo. A mesma fonte brilhava até o fundo; tudo estava como transfigurado. Viam-se as quatro pedras, sobre as quais estava a Arca da Aliança, resplandecendo com brilho de regozijo no fundo da fonte, e nas doze pedras onde estavam os levitas apareceram anjos em oração, porque o espírito de Deus tinha dado testemunho diante de todos os homens sobre aquele que devia ser a pedra viva, a pedra preciosa escolhida, a pedra angular da Igreja. Deste modo nós devemos, como pedras vivas, formar um sacrifício espiritual e um espiritual sacerdócio, para poder oferecer a Deus sacrifícios aceitáveis, como sobre um altar, por meio de Seu Filho divino em quem só encontra suas complacências.
Depois disso, Jesus foi até a tenda. Saturnino trouxe-lhe as suas vestes, que Lázaro tinha mantido em custódia, E Jesus voltou a vesti-las. Já vestido, Jesus saiu da Tenda e, rodeado de seus discípulos, colocou-se no lugar livre da ilha ao lado da pequena árvore central. Então João falou com vivacidade e grande alegria ao povo, dando testemunho de Jesus, dizendo que era o Filho de Deus e o prometido e esperado Messias.

Para confirmar seu testemunho, ele lembrou as profecias dos patriarcas e profetas e observou seu cumprimento, dizendo o que ele tinha visto e o que todos tinham ouvido agora, acrescentando que assim que Jesus voltasse, depois de uma ausência, ele, João, desapareceria do lugar. Disse também que naquele lugar havia estado a Arca, quando Israel recebeu em herança a terra prometida e que agora se produzia o cumprimento de aliança, da qual dava testemunho o próprio Deus Pai em seu filho divino. Recomendou-lhes que seguissem a Jesus, chamando feliz o dia do cumprimento da promessa para Israel.
Enquanto isso, outras pessoas chegaram, entre elas amigos de Jesus: Nicodemos, Obede, José de Arimatéia, João Marcos e vários outros que tinha visto entre a multidão. João disse a André que falasse na Galiléia do batismo de Jesus como Messias. Jesus, por sua vez, deu testemunho de João, afirmando que havia falado a verdade; acrescentou que se afastaria por algum tempo; mas que logo viessem a Ele todos os enfermos e aflitos, pois queria consolá-los e ajudá-los; que se preparassem entretanto com penitência e boas obras.
Ele disse que se afastava-se por algum tempo para depois entrar no reino que seu pai lhe havia confiado. Jesus expressou isto como na parábola do Filho do rei, que antes de cumprir a vontade de seu pai, queria recolher-se, implorar Sua ajuda e prepare-se. Havia entre os ouvintes alguns fariseus, os quais tomaram estas palavras num sentido burlesco, dizendo: "talvez não seja o Filho do carpinteiro, como pensamos, mas o filho bastardo de algum rei, e agora quer ir lá, juntar gente e depois vir tomar Jerusalém". Parecia-lhes tudo isto muito curioso e insensato.
Quanto a João, Ele continuou naquele dia batizando os presentes na ilha da fonte de Jesus: eram, em sua maioria, dos poucos homens que mais tarde foram discípulos de Jesus. Eles entravam na água ao redor da fonte e João os batizava da borda. Jesus, com seus nove discípulos e outros que se juntaram a ele, partiram dali. Seguiram-no Lázaro, André e Saturnino.
Haviam enchido, por ordem de Jesus, um recipiente com a água do batismo de Jesus e o levaram consigo. Os presentes lançaram-se aos pés de Jesus, rogando-lhe que ficasse com eles. Jesus prometeu-lhes voltar muito em breve, e afastou-se.

Jesus prega na sinagoga da Luz

Jesús dirigiu-se com seus companheiros para um pequeno lugar a um par de horas de Jerusalém: o nome parecia Bethel. Havia um hospital com muitos doentes. Jesus entrou e tomou algum alimento com seus discípulos. Muitas pessoas vieram, que o saudaram cerimoniosamente como a um profeta, pois já se sabia o que João dizia dele. Jesus percorreu os leitos dos enfermos, consolou-os e disse-lhes que voltaria de novo e os curaria se acreditassem Nele. Curou apenas um enfermo que estava na terceira câmara: achava-se este enfermo muito consumido, tinha na cabeça chagas e espinhas. Jesus o abençoou e mandou que ele se levantasse. O homem levantou-se pontamente e curvou-se diante do Salvador. Saturnino e João batizaram algumas pessoas ali. Jesus mandou trazer um grande recipiente de água, onde podia caber um menino, e o fez colocar sobre um estrado da sala; abençoou a água, e com um galho espalhou algo dentro dela: creio que foi a água trazida da fonte de Jesus. Os batizandos cobriam-se até ao peito, inclinavam-se para a fonte, e Saturnino batizava-os. Dizia palavras que Jesus lhe tinha ensinado; mas já não as lembro claramente.
Jesus celebrou ali o Sábado e depois enviou André a Galileia.
Jesus entrou em uma cidade chamada Luz; ele foi para a sinagoga, onde fez uma longa explicação declarando coisas escondidas da santo Escritura, que eram figuras das presentes. Lembro-me que disse, falando dos filhos de Israel, que depois de terem passado o Mar Vermelho andaram peregrinando tanto tempo no deserto por causa de seus pecados; mais tarde passaram o Jordão e entraram na terra prometida; que havia chegado o tempo em que isto era realidade no batismo do Jordão. Então era apenas uma figura: agora deviam permanecer e cumprir os mandamentos de Deus, para entrar na terra prometida da celestial Jerusalém e cidade de Deus. Eles pensavam em uma Jerusalém libertada do jugo dos romanos. Falou da Arca da Aliança e da severidade da antiga lei, pois quem se aproximava da Arca recebia a morte. Agora se cumprira o tempo da Lei e veio o tempo da Graça, que traz o Filho do Homem. Ele disse que agora era o tempo em que o anjo levava Tobias para a terra prometida, que havia tanto tempo vivia fiel aos mandamentos de Deus, como prisioneiro. Falou também da viúva Judite, que cortou a cabeça do bêbado Holofernes e livrou a oprimida Betúlia: agora haveria de crescer e prosperar aquela Virgem, que existia desde a eternidade, e muitos soberbos Holofernes que oprimiam Betúlia, haveriam de cair. Aludia à Igreja e ao seu triunfo sobre os príncipes soberbos deste mundo. Jesus recordou muitos fatos semelhantes que agora teriam cumprimento. Nunca dizia:"Eu sou esse". Falava sempre em terceira pessoa. Referia-se também às normas para seguir a Lei, de que modo deviam deixar tudo e não ter muita preocupação com o temporal, porque era muito mais importante ser regenerado e nascido de novo do que andar em busca da comida; que, de resto, se estavam regenerados pela água e pelo Espírito Santo, o mesmo que os fizera renascer cuidaria de seu alimento e vestido. Disse que os que quisessem segui-lo deviam deixar seus parentes e abster-se de mulheres, porque não era tempo de semear, mas de colher. Falou também do pão do céu.
Todos o escutavam respeitosos e admirados, mas tudo o entendiam de modo material e corporal. Lázaro despediu-se ali; os outros amigos de Jesus despediram-se no Jordão. As santas mulheres, que estavam em Jerusalém, na casa de Susana, partiram pelo deserto.
Jesus com seus discípulos partiu de Luz para o sul, atravessando o deserto.
Durante o catnino, enquanto Jesus e seus discípulos passavam entre uma fileira de tamareiras, hesitavam em colher e comer os frutos que haviam caído no chão. Jesus disse-lhes para comê-los com calma e não serem tão medrosos e meticulosos; que cuidasseem da limpeza da alma em suas conversas e ações, e não tanto nas coisas que servem para comer. Nesta viagem vi que Jesus visitou cerca de dez enfermos em algumas casinhas dispersas: alguns ele confortou e outros ele curou. Alguns deles o seguiram mais tarde.

Jesus em Ensemes

Vi Jesus chegar a um pequeno povoado chamado Ensemes, onde lhe saíram ao encontro algumas pessoas, já a espera do novo profeta. Muitos o cercaram, com suas crianças de mãos dadas, saudaram-no com solenidade e se curvaram a seus pés humildemente. Jesus os levantava familiarmente, com bondade. Ele foi levado para suas casas por pessoas de família nobre. Os fariseus o levaram para sua escola: eles eram bem-intencionados e se alegravam por ter um profeta entre eles. Mas quando souberam pelos discípulos que era filho de José, o carpinteiro de Nazaré, começaram a apontar-lhe detalhes que não lhes pareciam está bem. Eles acreditavam que ele era um profeta, e quando Jesus falou do batismo, eles perguntaram, para ter razão sobre o que murmurar, qual dos dois batismos era melhor: o de João ou o deles.
Jesus lhes repetiu o que o Batista havia dito de Seu batismo e do batismo do Messias, e acrescentou que aquele que desprezava o batismo de João, desprezava também o do Messias. Contudo, ele nunca dizia: "Eu sou", mas falava na terceira pessoa, ou como diz no Evangelho:"O Filho do homem". Na casa onde se hospedou, tomou seu alimento e orou com seus discípulos antes de ir para o descanso. De Ensemes partiu com seus companheiros através da torrente Cedrom, na Judéia. Quase sempre ia por caminhos poucos frequentados e cruzava os vales, que tinham percorrido Maria e José quando foram a Belém. Agora havia muita neblina no país e fazia bastante frio: vi às vezes neve ou orvalho e geada nos vales; mas na parte onde o sol feria mais tudo era apresentado verde e bonito. Ainda penduravam frutos das árvores. Ao longo do caminho, vi Jesus e seus discípulos comerem destes frutos.
Evitava entrar nas grandes cidades, porque em toda parte corria a fama das coisas acontecidas em seu batismo e do testemunho de João. Também em Jerusalém se via alarme por estes acontecimentos. Jesus queria apresentar-se somente depois de sua volta do deserto da Galiléia, e se andava agora por estes lugares era por amor aos enfermos ou para levar os outros ao batismo. Nem sempre ia com todos os seus discípulos: às vezes só via dois deles com ele, os outros se espalhavam pelas ruas por onde passavam e retificavam o que se diziam de Jesus. Em geral, estavam entusiasmados com João e acreditavam que Jesus era apenas um ajudante do Batista; e assim o chamavam seu ajudante. Os discípulos contavam-lhes a aparição do Espírito Santo e a voz que ouviram do Pai, e repetiam o que João disse de si mesmo: que ele não era senão o precursor e preparador dos caminhos, e por isso era tão duro e severo como quem dispunha o caminho. Por esta razão, os pastores e tecelões destes vales vinham às vezes a Jesus, que ouviam Jesus debaixo das árvores ou galpões, e se curvavam a seus pés, Enquanto Jesus os abençoava e os exortava ao bem. Enquanto caminhavam, Jesus explicava aos seus discípulos que as palavras que ouviram do Pai: "Este é o Meu Filho amado", dizessem-as também para todos os que recebiam sem pecado o batismo do Espírito Santo.
Esta região era a mesma que José e Maria percorreram quando foram a Belém. José conhecia melhor esses lugares porque seu pai tinha campos de pastoreio. José tinha-se afastado cerca de um dia e meio de Jerusalém para evitar as grandes cidades e por pequenas etapas preferia passar por estes lugares, onde as cabanas dos pastores estavam mais unidas. Muito custava a Maria estar cavalgando longo tempo, como também andar a pé. A principal população a que Jesus agora se dirigia era formada por duas casas de pastores, às quais José e Maria haviam chegado antes. Parou primeiro naquela casa onde a Virgem tinha sido mal recebida. O dono da casa era um velho rude. Agora também não queria receber Jesus. Tinha o ar como o de alguns dos nossos camponeses de hoje, que parecem dizer: "o que importa para mim tudo isto? Eu pago os direitos e vou para a Igreja". De resto, vivem depois como querem. Assim dizem aquelas pessoas: para que precisavam de tudo isto? Tinham a lei de Moisés, Esta a tinha dado Deus e não necessitavam mais. Jesus lhes falou da hospitalidade e da caridade com o próximo, que os antigos patriarcas haviam exercido. Onde, de fato, estariam a bênção e a Lei, se Abraão não tivesse recebido o anjo que as trazia?... Depois lhes expôs esta parábola: quem rejeita uma mãe, que traz o filho no seu seio, cansada, batendo à sua porta, e zomba do homem que amigavelmente lhe pede hospedagem, esse rejeita também a salvação que o Filho lhe traz. Jesus disse isso tão claramente que parecia um raio que feria o coração do homem duro. Esta era a casa onde José e Maria haviam sido despedidos impiedosamente. Reconheci muito bem a casa. Os velhos dela tiveram grandiosa confusão, porque sem que Jesus nomeasse José e Maria, deu-lhes a entender tudo o que tinham feito com a Sagrada Família. Então um deles se lançou aos pés de Jesus, e pediu-lhe que se hospedasse com eles, pois seguramente, disse, é um profeta aquele que sabe tudo o que aconteceu aqui trinta anos atrás. Jesus não tomou alimento em sua casa, como o homem desejava, e disse, ensinando aos pastores reunidos, que muitas coisas que se fazem são preparação semente de outras que se farão, e que o arrependimento e a penitência podem destruir as raízes dos maus sentidos pelo batismo do Espírito Santo, que faz renascer o homem e levar frutos de vida eterna.
Dali saiu percorrendo outros vales, ensinando em diversos lugares. Alguns possuídos gritavam em seu caminho, mas calavam-se quando ele o mandava. Jesus chegou a outra casa de pastores, sobre uma altura, onde também estivera a Sagrada Família em sua passagem a Belém. O dono tinha uma grande quantidade de gado. Ao longo do vale viviam pastores e fabricantes de tendas. Tinham colocado grandes lonas como toldos e trabalhavam ao ar livre de comum acordo. Havia gado e animais selvagens; os pombos andavam em grandes bandos, como as galinhas, ao redor da casa, como também outras aves grandes de cauda longa. No campo viam-se muitos corços com pequenos chifres: eram domésticos e misturavam-se com o gado. Ali Jesus foi recebido muito amigavelmente. As pessoas da casa, os vizinhos e as crianças saíram ao encontro dele e ajoelharam-se diante dele. Havia alguns jovens na casa, filhos do ancião que ainda vivia e que tinha hospedado José e Maria; era de pequena estatura, inclinado e andava com uma bengala. Jesus tomou alguns alimentos, frutas e verduras, que se molhavam em molho, e comeram pequenos pães ao fogo. Essas pessoas eram muito piedosas e instruídas.
Levaram Jesus à mesma câmara onde haviam hospedado Maria, que haviam convertido em lugar sagrado de oração. Constituía apenas uma repartição da casa, mas tinham-na isolado fazendo-lhe um caminho; tinham desfeito os quatro ângulos da casa, formando um octógono, e o telhado o havia recolhido em um cone truncado. Pendia uma lâmpada e no meio do teto havia uma abertura que podia ser aberta à vontade. Diante do candeeiro havia uma mesa estreita semelhante a um banco de comunhão, entre nós, onde se podia rezar apoiado ao banco. Tudo estava limpo e arrumado como uma capela. O ancião levou Jesus e mostrou-lhe o lugar onde sua mãe havia descansado e Onde sua avó Ana também havia ficado em sua passagem para Belém, quando foi visitar Maria na gruta de Belém. Essas pessoas sabiam do nascimento de Jesus, da adoração dos Reis Magos, da profecia de Simeão e Ana no templo, da fuga para o Egito e do ensinamento do Menino Jesus no templo. Alguns destes dias os festejavam com orações neste lugar, crendo, esperando e amando com fidelidade. Perguntavam a Jesus com simplicidade: "Como será isto? Em Jerusalém, entre os erandes, diz-se que o Messias será um rei dos judeus, que restituirá a grandeza do reino e o livrará do jugo dos romanos. Será assim como eles dizem?" Jesus lhes declarou tudo na parábola de um rei que manda seu filho ocupar o trono, restabelecer e livrar seus irmãos do jugo; mas que eles não reconheceriam o filho enviado, persegui-lo-iam e maltratariam... mas que ele seria levantado, e assim os atrairia a todos ao reino celestial de seu pai, se guardassem seus mandamentos. Foi muita gente com Jesus ao lugar de oração e ele ensinou e curou alguns enfermos. O velho pastor levou Jesus para a casa de uma vizinha, que há anos estava na cama doente de gota. Jesus tomou-a pela mão e ordenou-lhe que se levantasse. Ela imediatamente obedeceu, inclinou-se e o acompanhou até a porta. Andava curvada como a sogra de Pedro. Jesus se fez levar logo a um vale profundo onde havia muitos enfermos: curou alguns e consolou a todos. Os curados foram apenas dez.
João ainda batizava e muita gente ia até ele. A árvore que Jesus tocou durante o seu batismo foi transplantada para o meio da grande fonte e estava verde e bela. Esta pia batismal tinha degraus desde a margem e várias regos de terra que se estendiam até ao lago. As pessoas passavam uma após a outra; Eles entravam por um lado e saíam pelo oposto.
Quando Jesus deixou a casa do pastor, que ficava a cerca de cinco horas de Belém, acompanharam-no alguns homens, parentes daqueles pastores que tinham visitado Jesus na manjedoura. Por isso se mostraram tão bem dispostos com Jesus. O Salvador e seus discípulos caminharam por muitos recantos e reuniram, aqui e acolá, grupos de pastores e trabalhadores, a quem Ele ensinava com parábolas e comparações de seus próprios ofícios. Exortou-os ainda a irem ao batismo de João e à penitência, e falou-lhes da proximidade do Messias e da salvação. Em uma encosta do monte, em um bom lugar no caminho de Jesus, vi pessoas trabalhando em trabalhos de campo: nas vinhas e nos campos. Vi levarem trigo, arar e semear, pois essa região era muito fértil, embora em outras vi geadas e neve nos vales. O trigo não estava em feixes, mas era cortado sob a espiga um meio pé, e os feixes estavam amarrados de tal maneira que a ambos lados saíam as espigas. Estes amarrados estavam em pilhas juntos. Os camponeses não levavam estes atados às suas casas, como no tempo da colheita acabada: ficavam ali formando pequenas montanhas, e agora, que começava o tempo das chuvas, eram cobertas com feno enquanto preparavam de novo os campos. Os grãos eram cortados com uma lâmina curva, o feno amontoado e emparvado depois.
Quando eles o levavam para dentro, eles o faziam em carrinhos que eram puxados por quatro homens. O feno era colocado em fileiras e enrolado em pacotes, talvez para queimar. Em outros lugares, eles aravam com arados sem rodas e os homens o jogavam fora. O arado que vi era como um trenó com três vãos cortantes, agravados com pesos; entre eles estava o jugo; não era geralmente guiado, e era puxado por pessoas ou jumentos. Aravam dos lados e no centro. Seus rastros eram triangulares, com a parte larga à frente e marchavam muito bem. Onde a terra era pedregosa, eles aravam um pouco, e algo crescia lá também. Os semeadores tinham os sacos de sementes na frente e atrás, às vezes no pescoço com as duas pontas caídas no peito. Eu os vi semear alho e uma planta com folhas grandes, que eu acho que eles chamavam de durra. Os discípulos reuniam esses trabalhadores nos caminhos E Jesus lhes falava em parábolas sobre arar, semear e colher. Disse aos discípulos que deviam semear por meio do batismo, e designou alguns, entre eles Saturnino, para que batizassem no Jordão por algum tempo. Disse-lhes que isto será a semente e depois colheriam eles depois de dois meses, como as pessoas que semeavam ali. Falou da palha, que seria destinada ao fogo. Enquanto Jesus ensinava, veio uma multidão de trabalhadores de Sichar: tinham pás, machados e longos paus; pareciam escravos que trabalhavam numa das obras públicas e dirigiam-se agora para as suas casas. Eles ficaram muito impressionados, não ousando se juntar aos judeus e ouviram de uma certa distância. Jesus os chamou dizendo que seu Pai celestial os chamava a todos por meio dele, falando da igualdade de todos diante de Deus, dos que faziam penitência eram e batizados, estes pobres homens ficaram tão comovidos ao ver a mansidão e a bondade de Jesus, que lhe rogaram de joelhos ir com eles para Samaria para ajudá-los. Jesus respondeu-lhes que iria depois, que agora tinha que se isolar para preparar-se para entrar no reino ao que seu Pai celestial lhe havia ordenado. Os pastores o levaram por outros caminhos que sua Santa Mãe havia percorrido. Como Jesus conhecia estes caminhos melhor do que eles, diziam-lhe: "Senhor, Tu és um profeta e um bom filho, pois conheces bem os passos do Tua Santa Mãe e os vais percorrendo". Depois de ter ensinado e exortado, Jesus dirigiu-se ao povo de Bethabara. Era tarde quando chegou com seus discípulos, e ao ar livre subiu a uma tribuna para o ensino que estava à sombra das árvores. Juntaram-se muitos ouvintes e mostraram bons sentimentos com Jesus.

Jesus no Vale dos pastores de Belém

Jesus, acompanhado de muitos ouvintes, dirigiu-se ao Vale dos pastores, cerca de três horas e meia a caminho deste lugar. Eu o vi com seus discípulos sob um telhado onde eles comiam bagas coloridas e grãos que haviam colhido. Os discípulos se espalharam em diferentes direções E Jesus lhes indicou o lugar onde voltariam a reunir-se com ele. Os discípulos exortavam as pessoas ao batismo e lhes falavam de Jesus; alguns homens foram com eles até o lugar designado por Jesus. Jesus andava por caminhos e atalhos. Eu o vi muitas vezes passar a meia-noite em oração sobre colinas solitárias; assim ele ocupava o tempo de suas viagens. Ouvi que os discípulos diziam a Jesus que não se arruinasse a saúde com sua vida tão dura, com seu caminhar descalço, com seus jejuns e vigilias noturnas, naqueles frios e tempos húmidos. Jesus os ouviu com bondade,mas continuou sua vida mortificada como sempre. Na alvorada vi Jesus com seus discípulos subir a encosta de uma montanha no Vale dos pastores. Os moradores locais já tinham notícias de sua vinda. Todos eram batizados por João e alguns deles tinham tido como visões e prevenções da chegada de Jesus e vigiavam sempre por onde devia chegar o Salvador.
Viram-no resplandecente, cheio de luz, descer da montanha para o seu vale.
Muitas dessas pessoas simples tinham dons extraordinários. Tocaram imediatamente um chifre, chamando a atenção dos que viviam longe, para que se reunissem. Eles seguiam esse costume em todas as ocasiões solenes. Todos iam ao encontro do Senhor, e atiravam-se em seu caminho, avançando humildemente o pescoço em sinal de submissão, enquanto sustentavam nas mãos seus longos bastões de pastor. Vestiam gibões curtos de pele de ovelhas, alguns abertos no peito; chegavam-lhes até os joelhos. Sobre os ombros tinham sacos trespassados. Saudavam o Salvador com palavras dos Salmos, que se referiam à vinda do Messias e à ação de graças de Israel pelo cumprimento das profecias. Jesus mostrou-se muito bondoso com eles e lhes falou de seu estado feliz. Ensinava em uma ou outra das cabanas que estavam ao longo do Vale dos pastores; seus ensinamentos eram acompanhados de comparações do pastor e as ovelhas.
Depois, acompanhado por eles mesmos, foi até a torre dos pastores em Belém, construída no meio do Vale, sobre uma altura, com um fundamento de pedras grossas. Era composto por um parapeito bastante alto de tirantes e era reforçado com árvores de folhas perenes. Penduravam esteiras nele e tinha degraus do lado de fora para subir às galerias e de tanto havia pequenas guaritas de observação. À distância tinha o aspecto de um navio alto com velas estendidas e guardava semelhança com as torres que vi no país dos Reis Magos usados para observar as estrelas. Daquela torre viam toda a região, distinguia-se Jerusalém e ainda a montanha da tentação de Jesus. Os pastores observavam desde esta torre o caminho e o gado e vigiavam as possíveis irrupções de ladrões, pois dali davam aviso aos habitantes do Vale. Os outros pastores viviam com suas famílias em um circuito a cinco horas de caminho da torre; tinham seus campos, jardins e hortas. O lugar da torre era o das reuniões gerais; tinham ali o depósito de suas ferramentas e iam receber os alimentos. Ao longo da colina havia cabanas e casinhas e havia uma casa ou galpão muito ampla, onde viviam as mulheres que preparavam a comida para os pastores.
Essas mulheres não saíram com eles ao encontro de Jesus; mais tarde receberam a visita de Jesus e seus ensinamentos. Havia cerca de vinte pastores, aos quais Jesus falou de seu bem-aventurado estado e lhes disse que os visitava porque eles tinham querido visitá-lo em seu berço na manjedoura e haviam demonstrado amor a ele e a seus pais. Ele lhes falou em parábolas do pastor e das ovelhas, dizendo que ele também era pastor que tinha outros pastores que deveriam reunir as ovelhas, cuidar delas, curá-las e guiá-las até o fim dos tempos.
Os pastores, por sua vez, narravam coisas do anúncio dos Anjos, de Maria e José e da Criança recém-nascida. Também eles tinham visto na estrela que estava sobre a manjedoura, a imagem do Menino. Eles narraram sobre os Reis Magos e como eles de seu país tinham visto a torre nas estrelas e se referiram aos muitos dons que haviam deixado os reis em sua vinda; que tinham empregado muitas coisas das recebidas por eles aqui na torre, nas cabanas e em suas casas. Havia homens de idade que tinham intervindo em todos estes acontecimentos quando Jovens e tinham ido à manjedoura de Belém: estes contavam as coisas que tinham testemunhado.
Jesus e seus discípulos foram conduzidos pelos pastores perto de Belém, à casa dos filhos dos três pastores mais velhos, já falecidos, aos quais o anjo apareceu primeiro e que foram adorar o menino recém-nascido. Os sepulcros destes não estavam longe de suas casas, a cerca de uma hora a caminho da gruta do presépio. Três desses filhos, já de idade, moravam lá e eram muito respeitados. Esta família era como guardiã dos outros, como eram os Três Reis Magos entre o seu povo. Receberam Jesus com muita humildade e o levaram ao sepulcro de seus pais, num morrinho onde crescia a videira: levantava-se isolada e em baixo do qual se podia andar em subterrâneos; acima estava a sepultura dos anciãos, que recebia luz por uma abertura superior. As três sepulturas estavam no chão nestas posições, e tinham portas. Os pastores abriram as portas, e eu vi os cadáveres embrulhados e seus rostos ressecados e enegrecidos. O espaço entre as três sepulturas estava preenchido com pedrinhas bem dispostas. Dentro dos sepulcros estavam seus cajados de pastor. Os pastores mostraram a Jesus o tesouro que tinham guardado ali mesmo, consistindo em objetos de valor presenteados pelos Reis Magos, que ainda lhes tinha ficado. Consistia este tesouro comum em insertos de ouro e em gêneros entrelaçados de ouro. Perguntaram a Jesus se deveriam levá-lo ao templo, e Jesus lhes disse que o guardassem para a comunidade cristã, que seria o novo templo, acrescentando que um dia uma igreja seria erguida sobre aquele sepulcro. Isso foi feito por Santa Helena. A colina era o início de uma série de montanhas de vinhedos que se estendiam até Gaza e servia de sepultura comum para os pastores do lugar. Dali o levaram os pastores ao lugar de seu nascimento na gruta do presépio, cerca de uma hora de caminho, por um belo vale por onde corriam três caminhos entre árvores frutíferas. Durante o caminho contavam os pastores a cena do Gloria In excelsis. Desta vez eu vi essas cenas renovadas. Os anjos apareceram em três lugares: primeiro, aos três pastores; na noite seguinte, na torre dos pastores, e depois, no poço do lugar onde Jesus foi recebido pelos pastores. Ao lado da torre dos pastores apareceram em maior número anjos bonitos e grandes pessoas sem asas. Os pastores levaram Jesus também à gruta de Maraha, a ama de Abraão, junto ao grande terebinto.

A gruta do presépio, lugar de oração e de peregrinação para os pastores

O caminho para a gruta do presépio seguia pelo lado do Meio-dia, por não ser fácil chegar a Belém, porque não havia caminho direto. A cidade mal se via deste lado: era como se separada por grossas muralhas em ruínas e por escombros, onde havia profundas depressões entre ela e o Vale dos pastores. A entrada mais próxima da cidade ficava do lado da porta do meio que levava a Hebron. Deste ponto se devia caminhar para o Oriente em torno da cidade, se alguém quisesse chegar à Comarca da gruta, unida ao Vale dos pastores, e desde o qual, sem tocar em Belém, entrava nesta região. A gruta do presépio, como as grutas adjacentes, pertenciam aos pastores, e desde o início as usaram para refúgio dos animais e para seus utensílios de lavoura, e nenhum de Belém tinha neste lugar propriedades, nem direitos de trânsito, nem caminhos. José, que tinha tido a sua mansão na parte meridional, tinha tratado várias vezes quando menino com estes pastores, para se esconder das maldades de seus irmãos ou para entregar-se mais tranquilamente à oração.
Quando os pastores foram à gruta com Jesus, já estava bastante mudada. Haviam convertido o lugar em lugar de oração e devoção, ninguém devia entrar e por isso tinham feito ao redor do presépio um cerco de grade e a própria gruta foi ampliada. Desde a entrada haviam feito várias salas para dentro, na rocha, como as celas conventuais.
Pendiam das paredes algumas colchas dos Reis Magos e no chão havia tapetes da mesma proveniência; eles eram de várias cores e ornamentos, especialmente figuras de pirâmides e torres. A partir dessas passagens laterais da gruta, eles fizeram duas escadas que levavam ao telhado, de onde removeram a cobertura com duas janelas transformando-o em uma cúpula que deixava entrar a luz. De uma dessas escadas, eles podiam subir a montanha e seguir para Belém. Estas mudanças e comodidades foram feitas com os presentes que os Reis Magos lhes deixaram em sua passagem pela região.
Era o princípio da festa do sábado, quando levaram Jesus. Acenderam as lâmpadas que estavam na gruta. O presépio foi preservado como antes. Jesus lhes apontou o que eles não sabiam: o lugar exato onde nasceu. Teve ali mesmo uma conversa instrutiva com eles, e celebraram o sábado. Ele lhes disse que seu Pai celestial havia pré-escolhido desde a eternidade este lugar quando Maria o gerou, e eu tive conhecimento de vários fatos preanunciantes do Antigo Testamento, referentes a este lugar.
Abraão e Jacó tinham estado neste mesmo lugar, e Set, O filho prometido em lugar de Abel, nasceu nesta gruta de Eva, que tinha feito sete anos de penitência. Ali mesmo o anjo apareceu a Eva anunciando-lhe que seria dado Set por Abel. Set esteve aqui por muito tempo escondido pela inveja dos seus e foi mantido na gruta da ama de Leite Maraha e alimentado por muito tempo, porque seus irmãos o perseguiam, como os filhos de Jacó ao inocente José. Os pastores também levaram Jesus para a outra gruta onde Maria esteve oculta por algum tempo por temor dos soldados de Herodes. A fonte que havia brotado no nascimento de Cristo tinha-a arranjado e usavam das suas águas nas enfermidades. Jesus disse-lhes que levassem dessa água consigo. Depois disso, vi-o visitar cada uma das cabanas dos pastores.
Eu vi Saturnino batizar vários anciãos que não podiam ir ao batismo de João. Vi que à água da fonte do batismo de Jesus, na Ilha do Jordão, misturavam esta água da gruta da manjedoura. No batismo de João havia sempre antes uma confissão geral dos pecados. No novo batismo de Jesus confessavam-se os pecados em particular, arrependiam-se e recebiam o perdão. Os anciãos se curvavam e recebiam a água do batismo despidos até meio corpo. Inclinavam a cabeça sobre um grande recipiente, onde se derramava a água. Neste batismo usavam as palavras de João, porque ouvi o nome de Jeová e o dom das Três Graças, mas acrescentavam o nome do Messias.

Jesus visita as pousadas onde descansou a Sagrada Família em sua fuga Para o Egito

Jesus passava as noites em oração solitária. Quando se preparava para despedir-se dos pastores disse aos seus discípulos que desejava fazer uma visita às gentes que tinham abrigado e socorrido Maria e José quando fugiam para o Egito; que tinha que curar algum doente e converter algum pecador. Ele disse que nenhum passo de seus pais ficaria sem ser abençoado e visitado. A todos os que então os ajudaram, socorreram e mostraram amor, queria visitá-los e levar-lhes a salvação. Toda demonstração de benevolência era uma parte da obra da redenção e ficaria para a eternidade.
Ele acrescentou que, assim como ele agora visitava e agradecia aos que haviam demonstrado amor e benevolência para com Maria e José, assim mesmo seu Pai celestial pensará em todos aqueles que beneficiam a um dos menores de seus irmãos. Ele citou seus discípulos para se encontrarem em um lugar perto da montanha de Efraim, onde se reuniria a eles após sua jornada.
Eu vi Jesus caminhando sozinho pelos confins do território de Herodes, em direção ao deserto de Anim e em Enganim, a algumas horas do Mar Morto, atravessando uma região um tanto selvagem, mas não infrutífera nem estéril. Ali pastavam muitos camelos; contei cerca de quarenta e estavam como em currais.
Havia uma pousada para os viajantes que atravessavam o deserto, para onde Jesus estava indo. No trajeto vi galpões e cabanas, uns junto aos outros.
Este lugar tinha sido o último lugar de hospedagem no território de Herodes que usou a Sagrada Família em sua fuga Para o Egito, e ainda que fosse gente de mal viver e até mesmo houvesse ladrões entre eles, receberam bem a Sagrada Família.
Na cidade vizinha vivia também muita gente de Avaria, que se tinha retirado lá depois de uma guerra.
Jesus pediu hospedagem em uma casa cujo dono se chamava Rúben, homem de uns cinquenta anos, que na fuga para o Egito já havia estado lá. Quando jesus falou com ele e olhou para ele, foi como se um raio penetrasse em seu peito. A Palavra de Jesus foi para ele como uma bênção e a saudação como uma salvação.
O homem disse: "Senhor, parece-me que vem contigo à minha casa como a terra prometida". Jesus disse-lhe que se acreditasse no cumprimento da vinda do Messias e não rejeitasse a sua realidade, seria participante da terra prometida.
Falou-lhe das boas obras e suas consequências. Acrescentou que vinha a sua casa trazer-lhe a saúde, posto que tinha recebido bem a sua mãe e a seu pai adotivo naquela mesma casa trinta anos para trás, em sua fuga Para o Egito.
Assim como toda boa obra leva sempre sua recompensa, do mesmo modo as más levam suas más consequências. O homem lançou-se aos pés de Jesus humildemente, dizendo: "Senhor, como pode ser que tu venhas a minha casa sendo eu um homem perdido e miserável?..."Jesus declarou-lhe que vinha para tirar os pecados e purificar o homem. O outro continuava falando de sua miséria moral, e como todos os do lugar eram mais ou menos da mesma classe. Ele acrescentou que seus netos estavam doentes e contra-feitos e em estado miserável. Jesus respondeu-lhe que se acreditasse nele e se deixasse batizar, daria também a salvação aos seus netos. O homem lavou os pés de Jesus e apresentou-lhe o que tinha para que comesse. Quando seus vizinhos se aproximaram, ele lhes disse quem era Jesus e o que ele havia prometido. Havia entre eles um parente chamado Issacar. Depois levou Jesus para ver os seus netos, dos quais um estava leproso, e outro deficiente e mal formado. Ele também visitou algumas mulheres doentes. Ordenou a estas que se levantassem, e quando o fizeram encontraram-se sãs. Mandou preparar um banho; trouxeram um recipiente com água e puseram-no debaixo de um telhado. Jesus tomou água de um vaso, dos quais tinha dois, presos à correia de sua veste, e derramou um pouco dessa água do Jordão no recipiente grande, e abençoou-o. Os homens se lavaram ali, e saíram sãos e limpos das suas enfermidades, e deram graças ao Senhor. Jesus não os batizou: essa lavagem era como um batismo de necessidade, e os exortou a serem batizados no Jordão. Quando perguntaram se as águas do Jordão tinham a virtude de curar as enfermidades, respondeu-lhes: "o caminho do Jordão é medido e fundado, e todos os lugares santos desta terra estão predestinados, antes que existissem homens e antes que existissem o Jordão e a terra, por meu Eterno Pai".
Ele acrescentou coisas muito admiráveis a tudo isso. Com as mulheres falou do matrimônio: recomendou-lhes a continência e a pureza de costumes. Disse-lhes que a miséria do povo da região e as doenças das crianças eram consequências das más uniões. Falou da culpa e da responsabilidade dos pais nas misérias e males de seus filhos: ele afirmou que estas culpas e estes males devem ser evitados e eliminados com penitência. Depois falou do renascimento do homem por meio do batismo de penitência. Depois conversou com todos sobre o que seus pais haviam feito com a Sagrada Família quando passaram por ali e ensinou onde os haviam hospedado e alimentado. Tinham em sua fuga para o Egito um jumento e uma jumenta. Jesus mostrou-lhes estes fatos como sinais de sua atual passagem do pecado para a salvação.
As pessoas prepararam uma refeição para Jesus da melhor maneira possível. Eu vi que eles apresentaram um leite grosso como queijo fresco, mel, pequenos pães, aves e uvas.
Acompanhado por alguns moradores do local Jesus saiu de Anim por outro caminho e chegou à noite a um lugar montanhoso onde se estendia um vale agreste com muitos desfiladeiros. O lugar e a montanha eram chamados Efraim ou Efron. A montanha estava no caminho de Gaza. Jesus estava saindo da região de Hebrom.
Um pouco longe do caminho, via-se uma população meio em ruínas, com uma torre, chamada algo como Malaga. (Talvez seja Molada; Flávio Josefo a chama de Malatha). Ao redor do lugar, a cerca de uma hora de caminho, estava o bosque de Mambré, onde os anjos trouxeram a Abraão a promessa do filho Isaque.
Perto dali estavam a caverna que Abraão comprou de Efron Hetita, onde estava seu sepulcro, e o lugar onde ocorreu o combate de Davi contra o gigante Golias. Jesus, a quem já tinham deixado seus companheiros, andou pelo lado onde estava edificada a cidade, no lado onde a cidade foi construída, e no vale selvagem, os discípulos a quem ele havia designado o encontraram. Ele os levou para uma caverna selvagem, mas espaçosa, onde passaram a noite. Era a sexta parada da Sagrada Família em sua fuga para o Egito. Jesus dizia estas coisas aos seus discípulos, enquanto estes esfregavam uma madeira dura contra outra e tiravam faíscas para o fogo. Disse-lhes que aquele lugar era sagrado; que ali se detinha muitas vezes um profeta para orar: creio que Samuel. Davi guardara as ovelhas de seu pai e orara nesta caverna e recebera ali mandados de um anjo; e, enquanto estava em oração, chegou-lhe a ordem para matar o gigante Golias.
A Sagrada Família chegara muito cansada e oprimida; Maria estava tão triste que chorara. Padeciam de toda espécie de privações, porque fugiam por caminhos inóspitos, evitando as cidades e as pousadas dos caminhos públicos. Lá eles passaram um dia inteiro descansando de suas fadigas. Aconteceram ali alguns prodígios para seu consolo: saltou água de uma rocha da gruta e uma cabra silvestre aproximou-se deixando-se ordenhar. Jesus falou aos seus discípulos das grandes dificuldades que esperavam a eles e a todos os que o seguiam, dos sofrimentos que sua mãe passou e da bondade e misericórdia de seu Pai celestial. Anunciou-lhes que um dia se levantaria ali uma igreja, e abençoou o lugar como se o consagrasse. Eles tinham frutas e pequenos pães que os discípulos haviam trazido, e comeram.

Jesus vai a Maspha para a casa de um parente de São José

Quando Jesus e seus discípulos abandonaram a gruta, dirigiram-se em direção de Belém; entraram em algumas casas do outro lado de Ephron e em uma pousada tomaram alimento e descanso, lavando os pés. As pessoas eram boas e estavam curiosas. Jesus ensinou sobre a penitência, a vinda da salvação e seu seguimento. Eles lhe perguntaram por que sua Santa Mãe havia feito o caminho de Nazaré a Belém, podendo tê-lo passado tão bem em sua casa. Jesus lhes falou da promessa, de que ele devia nascer na pobreza em Belém, entre os pastores, como Pastor que era, que devia ajuntar as ovelhas; por isso andava agora ele mesmo por estas comarcas de pastores desde que seu pai tinha dado testemunho de sua pessoa. Dali passou ao centro de Belém, a poucas horas de caminho, encurtou o caminho do Vale dos pastores, passou a Oeste de Belém, deixando a casa nobre de José à sua direita. Ao anoitecer chegou à pequena cidade de Maspha, a poucas horas de Belém, que se via de longe. Nas ruas queimavam tochas colocadas dentro de recipientes de ferro. Tinha muros e torres e vários caminhos a atravessavam.
Esta cidade tinha sido por muito tempo lugar de oração. Judas Macabeu havia orado longamente aqui antes da batalha, apresentando à presença de Deus os decretos injuriosos do inimigo, desprezíveis do poder divino, lembrando a Deus Suas promessas de proteção. Ali também foram colocadas as vestes sacerdotais diante do povo. Na sequência de sua oração, cinco anjos apareceram diante da cidade, que lhe prometeram vitória completa sobre seus inimigos. Neste lugar se reuniu Israel contra a tribo de Benjamim para castigar o ultraje e a morte da mulher do levita viajante. Esta maldade aconteceu debaixo de uma árvore. O local estava cercado e ninguém se atrevia a se aproximar. Samuel julgava em Maspha e aqui estava o convento dos essênios, onde viveu Manahem, que predisse o reinado a Herodes quando criança. Um essênio chamado Charioth o havia construído. Este tinha vivido cerca de cem anos antes de Cristo; era um homem casado, da região de Jericó, mas tinha-se separado, por mútuo consentimento, e ambos edificaram várias comunidades de essênios, ele para homens e ela para mulheres. Não muito longe de Belém havia edificado outro mosteiro, onde morreu. Era um santo varão, e na morte de Jesus foi um dos primeiros que ressuscitou e apareceu em Jerusalém.
Em Maspha havia várias pousadas e as pessoas sabiam logo quando chegava um estranho. Assim que Jesus chegou à pousada, as pessoas se reuniram em torno dele. Ele foi levado para a sinagoga, onde explicou a Lei. Haviam espiões que procuravam surpreendê-lo em suas palavras: tinham ouvido que ele queria levar também os pagãos ao reino de Deus e da salvação, que tinha falado nesse sentido ao tratar dos Reis Magos com os pastores de Belém. Jesus falou com severidade dizendo que o tempo da salvação havia chegado, que o tempo da promessa havia se cumprido, que todos os que renascessem pelo batismo e cressem Nele, que foi enviado pelo Pai e guardassemm os seus mandamentos, seriam participantes do reino de Deus, e que eles seriam herdeiros desse reino. Ele acrescentou que, se os judeus não acreditassem, a promessa e a salvação passariam para os gentios, afastando-se deles. Não consigo reproduzir tudo o que ele lhes disse. Acrescentou que sabia que estavam espionando suas palavras; que fossem a Jerusalém e dissessem ali o que lhes havia dito. Falou também de Judas Macabeu e de outros fatos que ocorreram ali. Eles quiseram falar da grandeza do templo de Jerusalém e da preeminência dos judeus sobre os demais povos. Jesus lhes disse que o fim de ter sido escolhido, como também o objeto do templo, haviam dado fim à sua razão de ser, pois aquele a quem o Pai celestial enviava agora tinha vindo para fundar, segundo os profetas, o reino e o templo de Seu Pai celestial.
Depois desse ensinamento, Jesus deixou Maspha e retirou-se para o leste, a uma hora de caminho. Passou primeiro por uma fileira de casas e entrou numa que era de uma parente de José. Um enteado do pai de José, por meio de uma viúva, havia se estabelecido e casado, e seus descendentes moravam ali. Tinham filhos; tinham estado no batismo de João, e receberam Jesus com humilde coração. Outros vizinhos vieram. Jesus ensinou e tomou algum alimento. Após a refeição, ele caminhou com os dois homens sozinhos, que se chamavam Aminadab e Manases. Eles perguntaram se ele sabia as circunstâncias em que se encontravam e se deveriam segui-lo imediatamente. Jesus respondeu-lhes que não; que agora se contentassem em ser Seus discípulos ocultos.
Eles se curvaram, e ele os abençoou. Estes homens, mesmo antes da morte de Jesus, foram seus discípulos ostensivamente. Jesus passou a noite com eles.
Jesus andou com seus discípulos algumas horas mais adiante ao lugar que foi a penúltima pousada de Maria diante de Belém, da qual se distava cerca de quatro horas. Saíram-lhe ao encontro alguns homens, ajoelharam-se a seus pés e o convidaram a ir a suas casas. Eles o receberam com muita alegria. Essas pessoas muitas vezes foram ao lugar do batismo de João, e eles sabiam o que aconteceu no batismo de Jesus. Prepararam-lhe uma refeição, um banho morno e um lugar de repouso muito bem acomodado. Jesus ensinou ali. Vivia ainda a mulher que trinta anos atrás tinha recebido e servido a Maria e a José. Habitava a casa principal sozinha, e os filhos, do lado, lhe enviavam o alimento. Quando Jesus se lavou, foi para onde estava a mulher, cega e há vários anos paralizada e curvada. Jesus falou-lhe da misericórdia e da hospitalidade, das obras imperfeitas e do amor próprio e egoísmo, e manifestou-lhe que o seu estado miserável de agora em diante era um castigo por todas essas faltas. A mulher mostrou-se muito compungida, e confessou suas faltas. Jesus a curou de sua doença. Jesus mandou-o deitar-se na água que ele tinha usado para lavar-se. Ao ponto que recuperou a vista e se ergueu sã. Jesus mandou-o não publicar o fato. As pessoas perguntaram novamente, muito ingenuamente, quem era mais velho, se ele ou João. Ele respondeu: "Aquele de quem João dá testemunho". Falaram também da força e do zelo de João, e ponderaram o formoso e vigoroso rosto de Jesus. Jesus disse-lhes que ao término de quatro anos e meio não achariam nele formosura alguma e não o reconheceriam: de tal maneira fariam os homens a seu corpo. Falou da força e do zelo de João como de quem bate à porta de alguém que dorme e não atende à vinda do Senhor; como de quem prepara o caminho através de um deserto para que o rei possa passar e como da torrente que corre para tirar o lixo do leito de um rio.

"Eis aí o Cordeiro de Deus"

Pela manhã, ao despontar o dia, Jesus caminhou para o Jordão, que podia distar dali três ou mais horas, com seus discípulos e um grupo de pessoas que se haviam reunido com ele. O Jordão serpenteava em um amplo vale que subia por meia hora a caminho de ambos os lados. A Pedra da Arca da aliança que se encontrava naquele espaço fechado onde se celebrou a festa descrita, estava talvez a uma hora do lugar de batismo de João, indo para Jerusalém. A Cabana do Batista entre as doze pedras estava na direção de Bethabara, um pouco mais ao Norte do que a Pedra da Arca.
As doze pedras ficaram a meia hora do local do batismo em direção a Gilgal, local situado a Oeste da altura de onde começava um novo declínio. Uma bela vista se estendia desde a fonte de João até as encostas de ambas as margens que eram muito férteis e verdes. Uma faixa de verdura verdadeiramente formosa, cheia de frutos e de riqueza, bordeava o mar da Galileia; mas ali havia, como em Belém, mais hortas de alho, de pepinos, da planta durra e de prados, Jesus já tinha passado a Pedra da Arca e estava a cerca de um quarto de hora da cabana de João, onde este se achava de pé, ensinando. Passava naquele momento por uma estreita abertura, por onde se podia ver João de longe. Jesus só foi visível para João por alguns minutos.
João sentiu-se impelido pelo Espírito Santo, apontou para Jesus, que passava, e ele clamou:"Eis aí o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo". Jesus passou rodeado pelos seus discípulos, uns na frente, outros atrás. Aqueles que foram adicionados recentemente ficaram por último. A cena foi bem cedo pela manhã. Muitos correram para Jesus quando ouviram João clamar; Mas Jesus já havia passado e eles clamavam, davam vivas e o glorificavam, já sem poder alcançá-lo. Quando esse povo voltou, disseram a João que muitos seguiam a Jesus, que tinham ouvido que também os discípulos de Jesus haviam batizado, e o que significava isso. João voltou a dizer-lhes que ele logo deixaria esse lugar para Jesus, pois acrescentava que ele não era senão seu precursor e seu servo.
Isso não agradou muito a seus discípulos, que se mostravam um pouco ciumentos dos de Jesus. Jesus torceu o seu caminho para Noroeste, deixou Jericó à direita e dirigiu-se a Gilgal, que ficava a cerca de duas horas de Jericó. Ficou em alguns destes lugares, onde as crianças saíram ao seu encontro cantando louvores, e entrando nas casas, de onde tiravam os seus pais.

Jesus em Gilgal

Gilgal chamava-se toda a comarca alta que estava sobre o vale mais profundo do Jordão, rodeada de riachos que corriam para o rio em um espaço de cinco horas de estrada. Mas a cidade à qual Jesus chegou à tarde, estendia-se espalhada entre muitos jardins por uma hora a caminho do lugar onde batizava João. Jesus foi primeiramente a um lugar sagrado diante da cidade, onde costumavam levar os profetas e os grandes mestres. Foi ali que Josué comunicou aos filhos de Israel coisas que Moisés havia participado dele e de Elieser antes de sua morte. Eram seis bênçãos e seis maldições. O Monte da circuncisão dos israelitas estava perto deste lugar cercado por uma muralha.
Nesta ocasião, vi a morte de Moisés. Morreu sobre uma pequena colina íngreme que estava no seio das montanhas de Nebo, entre a Arábia e Moabe. As tendas dos israelitas estavam situadas longe dali; apenas alguns postos de vigia ficavam no vale que rodeava a montanha.
A colina estava coberta de vegetação, como de hera, que crescia ali como matas semelhantes ao zimbro. Moisés teve que subir ao alto agarrando-se a estas plantas. Josué e Elieser estavam com ele. Moisés teve ali uma visão que os outros não viram. Ele deu a Josué um rolo onde havia seis maldições e seis bênçãos que ele deveria fazer conhecer aos israelitas quando estivessem na terra prometida. Depois os abraçou e mandou-os afastar-se dali, sem voltar o rosto. Depois, curvou-se, levantou os braços em oração e caiu morto, inclinando-se de um lado. Vi que a terra se abriu ali mesmo e voltou a fechar-se numa bela sepultura. Quando Moisés apareceu ao lado de Jesus, na transfiguração, vi que saía deste lugar para dirigir-se ao Tabor.
As seis bênçãos e as seis maldições foram lidas por Josué ao povo.
Em Gilgal esperavam a Jesus muitos amigos: Lázaro, José de Arimatéia, Obede, filho da viúva de Nazaré e outros mais. Havia ali uma pousada onde lavaram os pés de Jesus e de seus companheiros e lhes prepararam comida. Jesus pregou às numerosas pessoas que ali se haviam reunido, entre as quais havia muitas que iam ao batismo de João. O local era um posto de banhos e de purificações construído na margem do rio, num terreno em forma de terraço. Estava coberto com uma tela e havia ali lugares de lazer, com árvores, matas e diversas plantas ao redor. Saturnino e mais dois discípulos, que o haviam sido de João, batizaram ali depois que Jesus lhes falou do Espírito Santo e lhes ensinou diferentes propriedades e dons e como se manifestava quando alguém o recebia.
O batismo de João costumava preceder uma exortação geral e uma declaração de arrependimento dos pecados com a promessa de emenda; mas no batismo de Jesus havia não só a confissão em geral, mas que cada um se confessava individualmente e reconhecia seus pecados principais e mais graves. Jesus exortava a isso, e aos que não queriam fazê-lo, por temor ou vergonha, dizia-lhes os seus pecados na sua própria cara, para que se arrependeram-se. Jesus ensinou sobre a passagem do Jordão e sobre a circuncisão que acontecera ali, pelo que se dava o batismo naquele lugar; e disse-lhes que deixassem-se circuncidar no coração renunciando ao pecado e cumprindo os mandamentos. Os batizandos não entravam ali na água; apenas inclinavam a cabeça, e não recebiam uma toalha inteira, mas apenas um pano branco sobre os ombros. Os discípulos que batizavam não tinham recipiente com três saídas para a água, como o que João usava, mas um vaso comum; e o derramavam três vezes, com a mão, sobre a cabeça. Jesus abençoara a água e lançara nela um pouco da mesma com que se lavara. Quando estes batizandos, que eram uns trinta, foram purificados, ficaram muito contentes e comovidos e diziam que sentiam em si mesmos o Espírito Santo.
Depois disto saiu Jesus, entre cânticos de louvor e com muitos companheiros, para Gilgal, para celebrar o sábado na sinagoga, que estava localizada na parte oriental da cidade e era bastante grande e antiga. Era quadrada, com os ângulos cortados e tinha três andares, onde estavam instaladas as três salas de aula da escola. Cada um desses andares tinha uma galeria externa para circular e as escadas corriam para cima ao lado das paredes externas. Na parte superior, e precisamente nos ângulos cortados, havia alguns nichos onde se podia ficar de pé e se podia ver a paisagem em grande distância. A sinagoga estava livre em ambos os lados e tinha jardins ao redor. Diante da entrada havia um vestíbulo com uma cadeira para ensinar, como no templo de Jerusalém, e depois um pátio com um altar ao ao ar livre, onde os sacrifícios costumavam ser oferecidos. Havia aqui Lugares cobertos para as mulheres e as crianças. Havia vestígios de que a Arca da Aliança havia estado e de que se ofereciam sacrifícios, pela semelhança dos arranjos com os do templo de Jerusalém. Na sala de aula da escola do primeiro andar, melhor arranjada, via-se uma coluna octogonal em um dos ângulos, com caixa em torno contendo vários rolos escritos.
Lembrava-se deste lugar o do Sancta Sanctorum do Templo. Na parte inferior havia, em torno da coluna, uma mesa e se via a abóbada onde estava a Arca da Aliança. Aquela coluna era muito bonita, de pedra branca polida.
Jesus ensinou na parte baixa da escola, na presença do povo, dos sacerdotes e dos anciãos e sábios. Ele lhes disse que os primeiros fundamentos do Reino prometido haviam sido colocados ali, e que então horríveis pecados de idolatria foram cometidos; de modo que havia apenas sete justos na cidade; que Nínive era cinco vezes maior, e cinco justos foram encontrados ali; que Gilgal foi perdoada por Deus, mas que não rejeitassem agora a realização da promessa e do Enviado prometido; que fizessem penitência e se deixassem renovar pelo batismo. Enquanto pregava, ele pegou alguns pergaminhos escritos e os leu e explicou. Depois passou a ensinar no segundo andar os mais jovens e depois as crianças no terceiro andar. Quando desceu ensinou também sob uma arcada, às mulheres, e depois às jovens. Falou da castidade e da continência, do vencimento dos desejos, da decência nas vestes, do cobrir a cabeça e os cabelos no templo e na escola. Falou da presença de Deus, especialmente nos lugares sagrados, e da presença dos anjos, que cobrem o rosto por reverência esses mesmos lugares. Disse que são muitos os anjos que estão no templo e na escola em torno dos homens ali presentes e explicou por que as mulheres devem cobrir os cabelos e a cabeça. As crianças tratavam Jesus muito familiarmente: ele as abençoava e as levantava, e eles se mostravam muito apegados a Ele. ali havia, em geral, grande alegria e contentamento com Jesus, e quando deixou a escola todo o povo clamava, tanto os que iam adiante como os que o seguiam: "cumpriu-se a promessa que permaneça conosco; que nunca se afaste de nós esta bênção".

O Sinédrio de Jerusalém

Depois que Jesus ensinou, as pessoas queriam trazê-lo enfermos. Jesus lhes disse que não era o lugar apropriado nem convinha por agora; que devia partir, porque era requerida sua presença em outro lugar. Lázaro e os amigos de Jerusalém voltaram, e Jesus disse a Maria Santíssima onde deveriam se encontrar antes de sua partida para o deserto. O Sinédrio de Jerusalém teve novamente uma longa sessão sobre Jesus. Ele havia estabelecido por toda parte espiões pagos que deviam referir tudo o que sabiam dele. Este Sinédrio era composto por 71 membros, entre sacerdotes e escribas; deles tinham sido eleitos cerca de vinte e distribuídos em grupos de cinco, com a missão de discutir e averiguar tudo o que se refere a Jesus e seu proceder. Buscaram os registros genealógicos e não puderam deixar de reconhecer que José e Maria descendiam de Davi e que a mãe de Maria era da raça e tribo de Arão; mas diziam que essas famílias haviam decaído e que Jesus se misturava com toda espécie de gente de mal viver; que se manchava tratando com publicanos e pecadores e bajulando os escravos. Sabiam já que Jesus havia tratado familiarmente pouco tempo antes, nas cercanias de Belém, com os escravos siquemitas que voltavam do trabalho; e eles presumiam se ele não estaria tramando alguma conjuração com essas pessoas. Alguns diziam entre si que talvez fosse um filho bastardo de algum rei e que por isso falava de um reino e da possibilidade de recuperá-lo. Outros opinavam que devia ter um ensinamento secreto que não podia provir senão do diabo, porque, diziam, se retira às vezes a sós e passa as noites no deserto ou em uma montanha. Tudo isso foi espionado e investigado. Entre estes havia uns vinte membros que conheciam melhor a Jesus e aos seus; já haviam sido tocados pelo seu trato e eram ocultamente seus amigos. Não se levantaram para contradizer os outros, para poder assim em segredo ajudar melhor os amigos de Jesus, por meio de mensagens e de avisos. Finalmente, o conselho dos vinte membros decidiu adotar uma conclusão definitiva: Jesus não podia ser senão amestrado pelo demônio.
Por outro lado, o batismo que se deu em Gilgal foi também anunciado a João como uma intromissão em seus direitos. Ele lhes respondeu, como sempre, com profunda humildade, que logo teria que deixar o lugar diante de seu Senhor, pois não era senão seu precursor e seu anunciador. Os discípulos de João não se deram por satisfeitos com esta resposta. Jesus deixou Gilgal com cerca de vinte companheiros e caminhou pelo Jordão passando depois o rio numa jangada de tábuas. No interior da jangada havia bancos para os passageiros e no meio uma grande calha destinada aos camelos; pois de outro modo poderiam cair na água através das tábuas. Até três camelos podiam ser colocados lá por vez, mas agora não havia nenhum. Só Jesus e os seus ocupavam a jangada. Era noite e por isso estava iluminada por tochas.
Jesus ensinou por meio da parábola do semeador, que continuou explicando à manhã próxima. A passagem do rio durou um quarto de hora, porque era correnteza neste ponto; dirigiram-se primeiro para cima e depois deixaram-se levar pela correnteza. O Jordão tinha particularidades curiosas: em alguns lugares não era possível passá-lo por não ter vão algum pelas rochas escarpadas de ambos os lados. Muitas vezes seguia de modo que parecia atravessar uma cidade e depois desviava seu curso. Corria entre rochas e pedras, algumas vezes turvas, outras claras, segundo o terreno que atravessava; e tinha muitas ilhotas em seu curso. Tinha também algumas cascatas. Suas águas eram suaves e temperadas. Na margem oposta havia casas habitadas por publicanos, porque uma rua principal vinha do Condado de Kedar, onde um vale se abria.
Jesus entrou em casas de publicanos que já haviam recebido o batismo de João. Muitos de seus acompanhantes ficaram surpresos com sua familiaridade com esse tipo de gente e se mantinham à distância por medo de se contaminarem. Jesus e os seus foram muito humildemente servidos por esses publicanos. As casas estavam situadas no caminho do Vale do Jordão; a alguma distância havia abrigos para os mercadores e os camelos. Estavam calmos porque no dia seguinte começava a festa dos Tabernáculos e não podiam partir nem viajar e embora fossem a maioria pagãos eles eram obrigados a observar o descanso. Os publicanos perguntaram a Jesus o que deveriam fazer com os lucros ilícitos que possuíam. Disse-lhes que os levassem ao templo; que deviam ser comhecedores espiritualmente de sua igreja e da Comunidade Cristã; disse-lhes que comprassem com eles um campo para as viúvas pobres perto de Jerusalém. Explicou-lhes o porquê disto, relacionando-o com a parábola do semeador que expôs novamente.
No dia seguinte foi Jesus com eles ao redor da praia ensinando diversas aplicações da parábola do semeador e da futura colheita. Ele disse isso porque era também uma festa da colheita de frutas e da colheita das uvas.
Jesus continuou seu caminho através do vale. Em ambos os lados se estendiam, por meia hora de caminho, no alto e no baixo, casinhas ou cabanas onde se celebrava a festa dos Tabernáculos. O caminho levava a Dibon, da qual parecia serem estas as primeiras casas. Ao lado delas viam-se por toda parte cabanas verdes erguidas com ramos de árvores, adornadas com folhas, frutos e cachos de uvas. De um lado do caminho estavam as cabanas para as mulheres, separadas, e do outro lado as cabanas para os sacrifícios de animais. Traziam todo tipo de comida e viam-se crianças em grupos que iam de uma a outra cabana, tocando instrumentos de música e cantando. Estavam adornados com coroas e flores e tocavam instrumentos triangulares com anéis que soavam; outros, um instrumento triangular com cordas e instrumentos de sopro que tinham canos retorcidos.
Jesus ia de um lado para o outro ensinando. Trouxeram-lhe, assim como a seus discípulos, alguns alimentos; por exemplo, uvas sobre paus levados entre dois. No final desta fileira de casas, Jesus entrou numa estalagem perto da grande e bela sinagoga de Dibon, que estava situada entre estas casas e a cidade, em um amplo lugar da estrada cercada por árvores. Alguns dias depois Jesus ensinou de novo com a parábola do semeador; falou do batismo e da proximidade do reino de Deus; da festa de Tabernáculos e do modo de festejá-la ali, dizendo-lhes que misturavam algumas coisas pagãs com o rito da festa. Com efeito, viviam ali moabitas e eles tinham-se misturado com essa raça. Quando Jesus saiu da sinagoga, descobriu que tinham trazido muitos enfermos em andas e carrinhos de mão. Esses doentes clamavam: "Senhor, você é um profeta. Você é um enviado de Deus. Você pode nos ajudar".
Ele curou muitos. À noite, Jesus e os seus receberam uma grande refeição na estalagem. Estavam presentes muitos mercadores pagãos, pois falava da vocação dos gentios e da estrela aparecida para chamar os Reis Magos que vieram adorar o menino recém-nascido. À noite, Jesus deixou o lugar e foi apenas orar em um monte. Ele chamou seus discípulos para se reunirem na manhã seguinte na estrada, do outro lado de Dibon. Esta localidade ficava a seis horas de distância de Gilgal: era uma região com muitas fontes de água e prados e por isso se viam muitos jardins e casas com terraços. Era no vale, mas se via edifícios nas encostas da montanha. De lá, Jesus foi para Sukkoth. Quando chegou à tarde a esta cidade reuniram-se muitas pessoas a ele e também muitos doentes dos arredores. Jesus ensinou na sinagoga e por meio de Saturnino e de outros discípulos fez batizar as pessoas. Esses batismos ocorreram na fonte de uma rocha que se abria em uma caverna que olhava para o Ocidente em direção ao Jordão. O rio não podia ser visto porque havia outra montanha no meio. Contudo, essa água era do Jordão, porque as suas águas corriam profundas até ali. Naquela gruta entrava luz por meio de uma abertura na parte superior. Em frente à gruta havia um lugar de lazer bastante amplo adornado com árvores, plantas e grama e uma pedra, lembrei-me de uma aparição de Melquisedeque ao patriarca Abraão. Jesus falou do batismo de João, dizendo que era de penitência, que devia ceder seu lugar ao outro batismo do Espírito Santo e do perdão dos pecados. Pediu-lhes antes uma espécie de confissão geral e depois particular a cada um. A alguns ele disse seus pecados para humilhar sua obstinação. Colocava as mãos sobre eles em sinal de absolvição. Os batizandos não eram submersos na água; havia sobre essa pedra um recipiente e eles, descobertos até os ombros, inclinavam as cabeças sobre a fonte e recebiam a água. O batizador derramava três vezes a água que tirava com as mãos da fonte. Foi assim que muitas pessoas foram batizadas.
Abraão viveu em Sukkoth com sua ama Maraha e teve campos em três lugares. Nesse mesmo lugar teve ocasião de dividir terras com seu parente Ló, e Melquisedeque veio pela primeira vez ver Abraão como os anjos eles costumavam vir até ele. Melquisedeque mandou-o fazer um sacrifício triplo de pombos, pássaros com bicos longos e outros animais. Anunciou-lhe também que voltaria a ele para oferecer um sacrifício de pão e vinho; ensinou-lhe coisas que devia pedir e pelas quais devia orar e anunciou-lhe o que ia acontecer com Sodoma e Gomorra. Eu vi que Jacó Também tinha suas tendas neste lugar.

Jesus em Corazim, Aruma e Betânia

Desde Sukkoth dirigiu Jesus seus passos para a grande Coração, que era o lugar onde havia citado Maria e a as santas mulheres, em um albergue nas proximidades. No caminho passou por Gerasa, onde celebrou o Sábado, e depois dirigiu-se a uma estalagem quase no deserto, a algumas horas de caminho do mar da Galileia. Aquela pousada era adornada para a festa dos Tabernáculos e os donos moravam ali perto. As santas mulheres já a haviam alugado de antemão e adornado. A comida era de Gerasa. Estavam ali presentes a mulher de Pedro com outras, entre elas Susana, de Jerusalém; mas não a Verônica. Jesus falou a sós com sua mãe dizendo-lhe que ia para Betânia e depois para o deserto. Maria estava preocupada e séria e rogou-lhe que não fosse a Jerusalém porque sabia o que o Grande Conselho maquinava contra ele. Mais tarde vi Jesus ensinando da altura de uma morrinho onde se acostumava a fazê-lo, para o qual haviam arranjado um assento. Havia muita gente reunida dos arredores e vi cerca de trinta mulheres que ocupavam um lugar separado. Depois do ensinamento disse aos seus que ele se afastaria deles por algum tempo; que podiam separar-se até que o vissem voltar. O mesmo disse às mulheres. Falou do batismo de João, que devia cessar muito cedo, e predisse as graves perseguições que ele e todos os que o seguiam sofreriam.
Jesus deixou esta pousada acompanhado por cerca de vinte e caminhou cerca de doze horas para o Sudoeste, em direção à cidade de Aruma, perto da qual já havia alugado definitivamente um albergue para ele e os seus. Marta, a quem pela primeira vez vi junto às santas mulheres nesta viagem a Gerasa, já tinha arranjado, de passagem. Os proprietários viviam nas proximidades e as despesas eram suportadas pelos amigos de Jerusalém. As mulheres indicaram a Jesus esta pousada antes de sua partida. Aruma está a cerca de nove horas de Jerusalém e a seis de Jericó. Em torno deste albergue tinham seus quartos alguns essênios, que vieram ver Jesus, falaram e comeram com ele.

Jesus foi para a sinagoga e ensinou sobre o batismo de João. Disse que era um batismo de penitência, uma primeira purificação, uma preparação e uma cerimônia das tantas que há na Lei; mas que era diferente do batismo daquele a quem João anunciava. Vi que os batizados por João não foram rebatizados senão depois da morte de Jesus e da vinda do Espírito Santo, no tanque de Bethesda.
Os fariseus perguntaram ali os sinais com os quais reconheceriam o Messias que devia vir e ele lhes disse. Neste lugar ele falou sobre casamentos mistos com os samaritanos. Ali eu vi Judas Iscariotes entre os ouvintes de Jesus. Ele veio apenas para ouvir sua pregação e não com os discípulos. Depois de ter ouvido por dois dias a pregação de Jesus e de ter conversado sobre ela com os fariseus que a contradiziam, foi a uma povoação um tanto desprestigiada, onde se entreteve em falar, a propósito de dita pregação, contra um homem piedoso que vivia neste lugar e que depois convidou Jesus para sua casa. Judas ocupava-se em diversos negócios e escrituras e fazia todo tipo de serviços por toda parte. Quando Jesus chegou com seus discípulos a este lugar desprestigiado, embora tivesse novas edificações, Judas não estava mais lá. Herodes tinha um castelo em seus arredores.
Deve ter acontecido alguma coisa ali com os benjamitas, pois havia uma árvore cercada por uma muralha, a qual ninguém ousava se aproximar. Ali haviam oferecido sacrifícios Abraão e Jacó, e Esaú e Jacó se separaram depois de suas diferenças por questão da primogenitura. Isaac viveu então em Sichar.
O homem que Jesus visitou agora chamava-se Jairo e era dos essênios casados, pois tinha mulher e vários filhos. Os homens chamavam-se Amon e Calebe. Tinha também uma filha a quem Jesus curou mais tarde. Este não era o Jairo a quem o evangelho se refere: era um descendente do essênio Chariot, que havia fundado os mosteiros de Belém e de Maspha; sabia muitas coisas sobre os pais de Jesus e a infância deste. Saiu ao encontro de Jesus com seus filhos, humildemente. Este homem era tido por chefe deste povo desprezado e o governava com amor. Cuidava dos enfermos; ensinava aos ignorantes em determinados dias, porque não havia ali nenhuma escola nem sacerdote encarregado. Cuidava também das crianças e dos pobres. Jesus falou ali como de costume do batismo de João, como um batismo de penitência, e da proximidade do reino de Deus. Depois foi com Jairo para onde estavam os enfermos e os consolou, embora não curou ninguém. Prometeu-lhes, porém, que voltaria dentro de quatro meses e os curaria de suas enfermidades. Recordou em seu ensinamento alguns fatos acontecidos ali, como a separação por ira de Esaú de seu irmão Jacó e as razões pelas quais era desprezado este lugar. Assinalou a bondade do Pai celestial, que prometeu a todos, e se cumpriu, a salvação para os que acreditassem no Enviado, se deixassem batizar e fizessem penitência, indicando como a penitência repara as consequências das más obras. À tarde, dirigiu-se com Jairo e seus filhos para Betânia. Jairo e seus filhos voltaram no meio do caminho e os discípulos seguiram Jesus.
Em um albergue perto de Betânia Jesus falou com seus discípulos longamente sobre os perigos e tribulações que o esperavam, assim como todos os que seguiriam mais tarde seus passos. Disse-lhes que agora podiam deixá-lo e, entretanto, pensassem seriamente se poderiam segui-lo e perseverar com ele no futuro. Lázaro veio ao seu encontro, quando já tinham partido para suas casas os companheiros de Jesus, menos Arão e Themeni, que foram com ele a Betânia. Ali muitos amigos de Jerusalém esperavam Jesus; também as santas mulheres, com Verônica. Aram e Themeni eram sobrinhos da mãe de José de Arimatéia. Eram discípulos de João e seguiram Jesus quando passou por Gilgal, junto ao lugar do batismo de João. Jesus ensinou na casa de Lázaro, falando do batismo de João e do Messias, da lei e de seu cumprimento, das seitas dos fariseus e de sua modo de ser. Dois amigos de Jesus trouxeram vários rolos de Escritura e ele explicou-lhes algumas passagens dos profetas que se referiam ao Messias. Nesta explicação não estavam presentes todos, mas Lázaro e alguns íntimos. Jesus falou de sua futura residência e os amigos lhe disseram para não se estabelecer em Jerusalém, onde se deturpava tudo o que ele dizia e ensinava. Eles propunham Salém, onde havia poucos fariseus. Jesus disse algo sobre estes lugares e sobre Melquisedeque, cujo sacerdócio devia agora ter o seu cumprimento; disse que este tinha medido e visitado todos os lugares que seu Eterno Pai havia estabelecido para serem percorridos por seu Divino Filho. Ele disse a eles que muitas vezes estaria à beira do lago Genesaré. Essa conversa ocorreu em um local aposentado, onde havia quartos e banheiros.
Jesus falou também com as mulheres em um quarto que tinha sido de Madalena, cujas janelas davam para a rua que levava a Jerusalém. Lázaro trouxe, por desejo de Jesus, Maria, a Silenciosa, e a deixou ali com as outras mulheres, retirando-se. As outras passeavam, entretanto, na antessala. A conduta da Silenciosa foi nesta ocasião diferente da anterior: lançou-se aos pés de Jesus e beijou-os. Jesus a deixou fazer e depois a levantou pela mão. Falou novamente, olhando para o alto, coisas muito elevadas e profundas, com um modo muito simples. Falou de Deus e de seu Filho e de seu Reino como falaria uma filha de camponeses do pai de seu Senhor e de sua herança. Seu falar era como uma visão, pois tudo o que dizia o via diante. Falou das grandes culpas e faltas cometidas pelos servos e servas, e como agora mandava o Pai a seu próprio filho para que reparasse e paguasse as de seus servos; como o receberiam mal e o fariam morrer com grandes dores, e como devia com seu sangue salvar e fundar seu reino, e pagando as dívidas de seus servos torná-los herdeiros do reino e filhos de Deus. Ela disse todas essas coisas de maneira muito natural. A Silenciosa alegrava-se, às vezes, e outras lamentava-se de ser também ela uma serva inútil e má, compadecendo-se dos erandes trabalhos do Filho do bondoso Deus que o enviava. Lamentava que os servos não entendessem isso, que era tão natural e que assim deveria ser.
Jesus falou da ressurreição: como o filho iria visitar os detidos nas prisões subterrâneas, para consolá-los e libertá-los, e uma vez resgatados, subir com eles ao Pai celestial, e como todos os que não queriam reconhecer esta redenção e continuavam a operar o mal seriam lançados ao fogo, quando vier novamente para julgar. Depois falou de Lázaro e de sua morte e ressurreição. Ele sairia deste mundo e veria tudo; os outros chorarão, como se ele não voltasse; mas o Filho de Deus o chamará novamente e ele voltará a trabalhar na vinha do Senhor.
Ele falou de Madalena dizendo: "a serva está no deserto mais terrível, onde os filhos de Israel estiveram, em um lugar mau onde as trevas reinam e onde não pisou planta de homem algum; mas ela sairá dessas trevas e remediará todos os seus erros em outro deserto solitário". Falando sobre Maria disse que seu corpo era como uma prisão; que ela não sabia o que era sua vida e desejava muito ir para a casa de seu pai; que a terra era-lhe estreita; que ninguém compreendia o seu modo de ser, porque estavam como cegos.
Acrescentou que não obstante queria ficar aqui por amor de Deus e esperar; que não merecia coisa melhor, por outro lado. Jesus falou-lhe, cheio de amor, e, consolando-a, Disse-lhe: "tu irás à casa de meu pai, depois da Páscoa, quando eu voltar aqui de novo". Ele a abençoou, enquanto ela se curvava; ele colocou as mãos sobre sua cabeça e acho que derramou algo sobre ela de uma garrafa, não sei se óleo ou água
Esta Maria, a Silenciosa, era uma pessoa muito santa. Ninguém a conhecia nem a entendia. Vivia em contínua visão sobrenatural sobre a obra da Redenção que ela entendia de modo muito simples e natural. Ela era considerada retardada ou pessoa simples. Jesus disse-lhe o tempo de sua morte e como iria à casa de Seu Pai celestial, e ungiu seu corpo para a sepultura. A partir disso, deve-se entender que convém ter mais atenção com o corpo do que com o que os homens pensam. Jesus recorreu a Maria, a Silenciosa, porque, sendo tida como retardada, talvez a privassem dos cuidados com que costumavam embalsamar os defuntos. A santidade dessa pessoa era oculta e misteriosa. Jesus deixou a Silenciosa e ela voltou para seus aposentos.
Jesus ainda falou com os homens sobre o batismo de João e o batismo do Espírito. Não me lembro de que houvesse grande diferença entre o batismo de João e o dos primeiros discípulos de Jesus: só este último tinha mais relação com o perdão dos pecados. Também não vi que voltassem a batizar os batizados por João, antes da vinda do Espírito Santo. Antes do sábado, esses amigos de Jesus voltaram para Jerusalém. Arão e Themeni partiram com José de Arimatéia. Jesus tinha-lhes dito que ia separar-se deles por um tempo, a fim de preparar-se para a sua difícil missão. Ele não falou com eles sobre seu jejum.