A primeira Páscoa de Jerusalém

Revelações História

A VIDA DE JESUS CRISTO E DE SUA MÃE SANTÍSSIMA

A primeira Páscoa de Jerusalém

CLEMENS BRENTAN, BERNARD E.OVERBERG Y. WILLIAM WESENER

VISÕES E REVELAÇÕES DA VENERÁVEL

ANA CATARINA EMMERICK

TOMO IV

A VIDA DE JESUS CRISTO E DE SUA MÃE SANTÍSSIMA

A primeira Páscoa de Jerusalém

De acordo com as visões da Ven. Ana Catalina Emmerick

- Editado pela Revista Cristiandad.org -

Jesus jejua quarenta dias no deserto

Tentações interiores de Jesus

Jesus tentado por Satanás

 

Satanás tenta Jesus por meio de artifícios mágicos

Satanás leva Jesus ao pináculo do templo e sobre a montanha

Os anjos servem a Jesus

 

Jesus dirige-se ao Jordão e faz batizar ali

Jesus em Silo, Kibzaim e Thebez

Primeiro apelo oficial de Pedro

 

As bodas de Cana

Reflexões sobre as frutas e ervas. A comida do casamento.

Conclusão das bodas de Cana

 

Jesus em Cafamaum e no mar de Genesaré

Jesus manda batizar no Jordão

Jesus em Adummim e Nebo

 

Jesus em Phasael. Cura a filha de Jairo. Primeiro encontro com a Madalena

Jesus em Cafarnaum e Gennebris

Jesus em Kisloth-Tabor

 

Jesus em Sunem e em Ulama

Jesus em Cafarnaum

Jesus ajuda os náufragos

 

Jesus em Nazaré. Os três jovens. A festa de Purim.

Jesus em uma posse de Lázaro em Thirza

A primeira Páscoa em Jerusalém

 

XXV - Maria e os futuros Apóstolos vão para Jerusalém

Jesus expulsa os mercadores do templo

A celebração da Páscoa por jesus, Lázaro e seus discípulos

Jesus jejua quarenta dias no deserto

Jesus partiu antes do sábado acompanhado por Lázaro da estalagem deste para o deserto. Disse-lhe que voltaria depois de quarenta dias. Desde esta pousada andou sozinho e descalço e foi a princípio, não em direção a Jericó, mas ao Meio-dia, como quem vai a Belém, passando entre os lugares dos parentes de Ana e dos parentes de José, perto de Maspha; então ele se virou para o Jordão.
Andou por esses lugares, até o local onde estivera a Arca da Aliança e onde João havia celebrado aquela solene festa. A uma hora de Jericó subiu à montanha e entrou numa ampla gruta.
Esta montanha estendia-se desde Jericó, entre o Oriente e o Meio-dia, sobre o Jordão, para Midiã. Jesus começou seu jejum ali, em Jericó; prosseguiu-o em diversos lugares, do outro lado do Jordão, e o completou ali, aonde o diabo o trouxe quando o tentou.
Esta montanha oferecia, a partir do seu cume, uma vista muito extensa: em parte era coberta de plantas e em parte parecia íngreme e árida. A altura não era tão alta quanto a de Jerusalém, mas estava em uma região mais baixa e se erguia solitária. Quando olhava para as montanhas de Jerusalém, via a mais alta do Calvário, de modo que estava no mesmo nível da maior altura do templo. Em direção a Belém, ou seja, para o sul, estava Jerusalém, sobre um cume íngreme e perigoso; deste lado não havia entrada nenhuma e tudo estava ocupado com palácios e edifícios.
Jesus subiu já de noite a um dos cumes íngremes da montanha do deserto, que agora chamam de Quarentena. Haviam três encostas nesta montanha e três grutas, uma sobre a outra. Do Alto, onde Jesus subiu, via-se por detrás um abismo rochoso; toda a montanha estava cheia de falésias muito perigosas. Nesta mesma caverna habitou um profeta, de cujo nome não me lembro, 400 anos antes. Elias também ficou algum tempo escondido ali e ampliou a caverna. Sem que ninguém soubesse de onde vinha, descia às vezes até o povo, punha paz e profetizava. Cerca de 150 anos antes, eles tinham seu quarto ali cerca de 25 essênios. Ao pé deste monte estava o acampamento dos israelitas, quando a Arca da Aliança e as trombetas rodeavam em torno de Jericó. Neste mesmo lugar estava o poço cujas águas suavizaram o profeta Eliseu. Santa Helena arranjou estas cavernas em forma de capelas, e eu vi uma vez, numa destas capelas, um quadro que representava a cena da tentação. Na parte de cima havia também, em outros tempos, um convento. Eu não tinha acabado de compreender como puderam chegar os trabalhadores até a altura do monte onde estava esse convento. Vi que Santa Helena edificou muitas capelas nestes e em outros lugares santos. Ela também ergueu uma capela sobre a casa paterna de Ana, a cerca de duas horas de Séforis, onde seus pais tinham outra casa. Me causou muita tristeza ver que estes santos lugares foram devastados até se perderem a lembrança das igrejas e capelas ali existentes. Quando eu era criança e ia, antes do amanhecer, por entre a neve à Igreja de Koesfeld, via todos estes lugares, muito claramente; e via também que às vezes pessoas piedosas, para evitar que os soldados e guerreiros os devastassem, se interpunham e se lançavam no chão diante de suas espadas.
As palavras da Escritura: "foi levado pelo Espírito ao deserto", significam: "O Espírito Santo, que havia descido sobre ele no batismo (já que Jesus como homem deixava que tudo acontecesse nele como tal), moveu-o agora a ir ao deserto para preparar-se para sua missão e a sofrer como homem, diante de Seu Pai celestial".
Jesus orava naquela caverna ajoelhado, com os braços estendidos a Seu Pai celestial, para ter força e consolo em todos os sofrimentos que lhe estavam reservados. Via diante de si todos os futuros sofrimentos e pedia forças a seu pai para cada um deles. Tive naquela ocasião quadros de suas dores e vi que recebia força, constância e mérito para cada um delas. Uma grande nuvem branca, do tamanho de uma igreja, pousou sobre ele e por cada uma de suas orações desciam anjos que tomavam forma humana;  honravam, davam-lhe ânimo, consolo e promessa de ajuda. Conheci que Jesus pediu ali e obteve para cada um de nós toda ajuda, constância, vitória e consolo em nossas penas e tentações; que comprou para nós, com suas orações, o mérito e a vitória; que preparou ali todo o mérito das mortificações e jejuns; e que ofereceu a Deus Pai todos os seus combates e sofrimentos para dar mérito e valor a todos os sofrimentos e penas de espírito dos que creriam nele.
Conheci o tesouro que Jesus instituiu para a Igreja e que se abriu nos quarenta dias de seu jejum. Vi Jesus suar sangue nesta oração.
Jesus desceu novamente desta montanha para o Jordão, entre Gilgal e o lugar do batismo de João, que estava mais ao sul, a cerca de uma hora de carro. Passou sozinho numa jangada o rio, que era estreito neste ponto, e caminhou deixando à sua direita Bethabara e vários caminhos reais que levavam ao Jordânia. Seguia por caminhos de montanha através do deserto, entrando entre o leste e o Meio-dia. Chegou a um vale que ia para Kallirrohe, passando por um riacho, e dirigiu-se a uma encosta da montanha, mais a Oeste, onde estava Jachza, em um vale. Os israelitas venceram o rei amonita Sichom. Nesta guerra havia três israelitas contra dez e seis inimigos; mas aconteceu um prodígio. Veio sobre os amonitas uma tempestade e um ruído terrível, que os pôs em fuga e os derrotou. Jesus estava agora sobre uma montanha muito acidentada. Era tudo ali mais selvagem do que na montanha perto de Jericó, que estava do outro lado. Fica a nove horas do Jordão.

Tentações interiores de Jesus

Estava oculta de Satanás a divindade de Jesus e sua missão. As palavras; "Este é o meu Filho amado em quem me agradei", ele entendeu como ditas a um homem, a um profeta. Jesus estava agora aflito em seu interior. A primeira tentação que teve foi esta: "Este povo está demasiado pervertido. Terei eu que sofrer tudo isto por ele e não poder alcançar o pleno efeito da minha obra?..." Jesus venceu esta tentação, apesar de prever todos as suas dores, com imensa bondade e amor aos homens, Jesus rezava na caverna, às vezes de joelhos, às vezes de pé e às vezes prostrado deitado sobre o seu rosto. Estava com suas vestes habituais, mas as tinha mais soltas. Ele não levava sandálias e estava descalço. No chão estavam seu manto, algumas bolsas e o cinto. Cada dia era o labor de sua oração diferente, porque todos os dias nos obtinha outras graças; e assim via que não voltavam as coisas que já havia vencido. Sem esta luta e merecimento de Jesus por nós não teria podido ser meritória nossa resistência contra as tentações nem possível nossa vitória.
Jesus não comia nem bebia; mas vi que os anjos o confortavam e fortaleciam.
Ele não tinha emagrecido com o longo jejum: seu rosto parecia mais pálido.

Nesta caverna, que não estava em pleno cume, havia uma abertura pela qual entrava um ar gelado; e neste tempo do ano já estava frio e o dia estava nebuloso. O interior era de pedras coloridas, de modo que, se tivessem sido polidas, poderiam parecer pintadas de várias cores. Os arredores da caverna tinham muito pouca vegetação. Era tão ampla que Jesus podia estar sentado ou deitado em uma parte dela sem ficar debaixo dessa abertura.
Eu o vi deitado em seu rosto. Seus pés nus estavam sangrando, feridos pelas caminhadas que fizera, pois tinha ido ao deserto com os pés descalços. Às vezes ficava de pé; outras vezes se deitava sobre seu rosto. Estava rodeado de luz. De repente, houve dentro uma comoção e um barulho; a caverna encheu-se de luz e apareceu uma multidão de anjos que traziam diversos objetos. Eu me senti tão angustiada e oprimida que me parecia estar metida dentro da própria caverna; e tendo a impressão de que me afundava e me perdia, comecei a clamar: "eu estou me afundando; eu devo afundar-me junto ao meu Jesus!"
Agora via que os anjos se curvavam diante de Jesus, honravam-no e perguntavam-lhe se podiam apresentar-lhe os instrumentos de sua missão, e se era sua vontade ainda padecer pelos homens como homem, como tinha sido esta sua vontade quando desceu de seu pai e tomou carne no seio da Virgem. Como Jesus renovasse de novo Sua resolução, levantaram diante dele os anjos uma cruz muito grande cujas partes haviam trazido. Esta cruz tinha a forma que sempre vi e consistia em quatro partes, como vi também as prensas do vinho. A parte superior da cruz, que se erguia entre os dois pedaços de madeira dos lados, também estava à parte. Cinco anjos carregavam a parte inferior da cruz, três anjos a parte superior, Três o braço esquerdo e três o direito; três levavam o pedaço de madeira onde repousavam os pés de Jesus; três traziam uma escada; outro um cesto com cordas e utensílios; outro a lança, a cana, os açoites, a vara, a coroa de espinhos, os pregos, as vestes de escárnio e, enfim, todas as coisas que foram causa de suas dores em sua paixão. A cruz oca, de modo que se podia abrir como um armário, e dentro se via todo tipo de instrumentos de martírio. No meio dela, onde correspondia ao coração aberto de Jesus, via-se um entrelaçamento de figuras de tormento com os mais diversos objetos. A cor da cruz era de sangue que comovia. Deste modo, todas as partes da cruz eram de diversas cores, com as quais se podia conhecer as diversas dores que devia padecer Jesus; e os raios dessas partes iam para a imagem do coração, que estava no meio. Em cada parte havia instrumentos diversos que indicavam futuros sofrimentos. Também se via nessa cruz vasos com fel e vinagre; outros com mirra e aloés, que foram usados após a morte do Salvador. Havia também dentro de dela uma quantidade de bandas como fitas, da largura da mão, de várias cores, onde havia gravadas várias formas de sofrimentos e dores. As diferentes cores denotavam diferentes graus e formas de escuridão e trevas que deviam ser iluminadas e transparecidas pelas dores de Jesus. De cor preta aparecia o que se dava por perdido; pardo o que era triste, duro, seco, misturado e sujo; de cor vermelha aparecia o que era pesado, terreno, sensual; e amarelo o frágil, muito delicado e confortável.
Havia algumas bandas, entre amarelas e coloridas, que tinham que ser embranquecidas e iluminadas. Havia também outras faixas brancas, de um branco de leite, com escrituras luminosas e transparentes. Isso significava o ganhado, o vencido, o completado e aperfeiçoado. Essas bandas eram como sinais e representações, o relato de todos os combates e dores que Jesus teve que suportar em sua carreira mortal, com seus discípulos e com os homens. Também foram apresentadas ao Senhor todas aquelas pessoas que mais o deviam fazer sofrer: a obstinação dos fariseus, a traição de Judas e a crueldade dos judeus durante as dores de sua paixão e morte. Todas estas coisas eram desenvolvidas pelos anjos diante da vista de Jesus com muita reverência e em certa ordem, como procederia um sacerdote em e quando todo este aparato de dores lhe foi apresentado, vi Jesus, e os anjos com ele, derramando lágrimas.
Outro dia vi que os anjos representavam a Jesus a ingratidão dos homens, as dúvidas, as zombarias, as traições e negações de amigos e inimigos, até sua amarga morte e ainda depois; e tudo o que de suas dores e tristezas se perderia para os homens. Mostraram-lhe também o que se ganhava, para seu consolo. Tudo isso era representado em quadros e via os anjos apontando esses quadros e representações. Em todas estas representações eu via a cruz de Jesus, como sempre, de cinco tipos de madeiras, com os braços encaixados dentro, com as cunhas abaixo e uma madeira para descanso dos pés. O pedaço de madeira para colocar o título eu vi adicionado acima, porque não havia espaço sobre a cabeça para colocá-lo. Este pedaço de madeira estava sobreposto, como uma tampa sobre uma caixa.

Jesus tentado por Satanás

Satanás não tinha certeza do meu conhecimento da divindade de Cristo: ele o considerava um profeta. Observara a santidade de sua infância e juventude, e a santidade de sua mãe, a quem nunca pôde chegar com suas tentações, pois ela não as recebia. Não havia em Maria nenhuma matéria por onde Satanás pudesse tentar. Maria era a mais bela virgem; mas ela não tinha conscientemente relações com nenhum pretendente, fora da escolha que dela foi feita no templo pelo sinal da vara florida. Intrigava Satanás ver que Jesus, profeta segundo sua opinião,  não tinha os costumes farisaicos e a severidade da lei nos usos e costumes com seus discípulos; considerava-o um homem, pois via que certas coisas externas escandalizavam os fariseus.
Ao ver que Jesus muitas vezes se mostrava zeloso, quis tentá-lo, como se fosse um discípulo que quisesse segui-lo; e  ao vê-lo tão gentil, quis tentá-lo na forma de um velho fraco e discutir com ele como se fosse um essênio. É por isso que uma vez vi Satanás na entrada da caverna, na forma de um jovem filho de uma viúva, sabendo que Jesus amava aquele jovem. Satanás fez um barulho na entrada para desagradar a Jesus, assim que aquele discípulo chegou ao seu retiro contra o que Ele havia dito para não segui-lo. Jesus nem sequer virou o rosto para olhar para ele. Satanás caminhou pela caverna e falou de João Batista que, segundo ele, devia estar muito descontente com Jesus, a quem havia batizado em vários lugares, algo que não correspondia a Ele, mas somente a João.
Depois disso, Satanás enviou sete ou nove de seus discípulos, um após o outro. Um de cada vez, eles chegaram à caverna e disseram que Eustáquio lhes havia contado que Ele estava nesta caverna; que eles o procuravam com grande ansiedade; que Ele não deveria estragar a saúde naquele lugar, abandonando-os. Acrescentaram que se falava muito sobre Ele e que Ele não deveria permitir que tantas vozes se espalhassem sobre Sua maneira de proceder. Jesus nada respondeu a todas essas representações e, por fim, disse: “Vá embora daqui, Satanás; agora não é o momento”.
Mais tarde, Satanás apareceu novamente na forma de um velho essênio muito venerável, que estava cansado de escalar a montanha. apareceu tão cansado que eu mesma senti pena do velho aparentemente venerável. Ele se aproximou da caverna, caindo de exaustão na porta da mesma, dando gemidos de dor. Jesus nem olhou para aquele que acabara de entrar. Então o pretenso essênio levantou-se e disse que era um do Monte Carmelo, que tinha ouvido falar de Jesus e que, para vê-lo, tinha ido até lá, quase desmaiando de cansaço.
Pediu-lhe que se sentasse um momento em sua companhia, para conversar sobre coisas sobre Deus. Ele disse que sabia o que era jejuar e orar; e se unir dois em oração servia como edificação mútua. Jesus respondeu apenas algumas palavras, como: “Afasta-te de mim, Satanás, ainda não chegou a hora”.
Só então vi que tinha sido Satanás quem havia aparecido, pois ao se afastar e desaparecer ele ficou preto, sombrio e cheio de raiva. Me fez rir ver que ele caiu no chão como se estivesse desmaiando e finalmente teve que se levantar sozinho.
Quando Satanás apareceu novamente para tentar Jesus, ele apareceu na forma do idoso Eliud. Ele devia saber que Jesus tinha visto a cruz com todo o sofrimento que o esperava, porque começou dizendo que teve uma visão das graves dores que Jesus deveria sofrer e que teve a impressão de que não seria capaz de suportar tais sofrimentos. Ele disse que também não poderia jejuar quarenta dias e por isso veio vê-lo novamente e pediu-lhe que o deixasse compartilhar sua solidão e assumir uma parte de sua promessa e resolução. Jesus nem olhou para o tentador e, levantando as mãos para o céu, disse: “Meu Pai, afasta de mim esta tentação. Imediatamente Satanás desapareceu, cheio de raiva e rancor”.
Depois disso, Jesus se ajoelhou para orar; E depois de um tempo vi que apareceram ali aqueles três jovens que estavam com Ele desde o início em Nazaré, que queriam ser Seus discípulos e que depois O deixaram. Estes jovens lançaram-se aos pés de Jesus e disseram-lhe que não poderiam ter paz e tranquilidade se Ele não os perdoasse; Eles pareciam muito arrependidos e contritos. Pediram que ele os recebesse novamente e os deixasse jejuar em sua companhia, acrescentando que a partir dali queriam ser seus discípulos mais fiéis. Eles pareciam muito angustiados; e entrando na grande caverna, caminharam com todo tipo de barulho ao redor dele. Jesus então se levantou, ergueu as mãos ao céu, orou ao seu Pai e imediatamente a imagem daqueles jovens desapareceu.
Uma tarde, enquanto Jesus orava de joelhos, vi Satanás, com roupas luminosas, flutuando no ar e subindo a encosta íngreme da montanha. Esta encosta íngreme ficava a leste; Não havia entrada daquele lado, apenas alguns buracos nas rochas. Satanás parecia luminoso, semelhante a um anjo; mas Jesus nem olhou para ele. Vi que nestes casos a luz de Satanás nunca era transparente, mas com brilho superficial e imitado; e seu próprio traje dava uma impressão de dureza, enquanto via as vestes dos anjos transparentes, leves e luminosas. Satanás, na forma de um anjo, permaneceu na entrada da caverna e disse: “Fui enviado por seu Pai para confortá-lo. Jesus nem sequer olhou para ele”.
Depois disso, ele apareceu novamente em outra parte da montanha, próximo a uma abertura completamente inacessível, e disse a Jesus que considerasse como era um anjo, já que ele voava por aqueles lugares inacessíveis. Desta vez Jesus também não se dignou a olhar para ele. Então vi Satanás terrivelmente furioso e ele fez um gesto como se quisesse aterrorizá-lo com suas garras por aquela abertura; Seu rosto e aparência eram horríveis.
Jesus nem sequer olhou para ele. Satanás desapareceu.
Vi Satanás aparecer na forma de um velho eremita do Monte Sinai, todo desgrenhado e penitente, e entrar na caverna de
Jesus. Eu o vi subindo a montanha com cansaço; Ele tinha uma longa barba e apenas uma pele como roupa; mas apesar disso
Reconheci, porque não conseguiu esconder, algo tortuoso e pontiagudo na cara dele.
Disse que estivera com ele um essênio do Monte Carmelo, que lhe falara de Seu batismo, de sua sabedoria, de seus prodígios e agora do seu jejum rigoroso. Por isso tinha vindo, apesar da sua idade avançada, até ali; para que se dignasse falar com ele, que tinha também uma longa experiência em questão de jejuns e penitências. Disse-lhe que já o feito bastava, que deixasse o resto e que ele mesmo tomaria uma parte do que ainda faltava a fazer. Falou neste sentido muitas coisas, E Jesus, olhando apenas de um lado, disse:"Afasta-te de mim, Satanás". Vi Então Satanás precipitar-se como uma pedra, do monte abaixo, com estrondo, como um corpo escuro.
Eu me perguntei como poderia ser desconhecido para o Diabo que Jesus era Deus. Recebi então uma instrução e sabia claramente o grande benefício para os homens que Satanás, e o próprio homem, não entendessem e devesse acreditar. O Senhor me disse essas palavras: “O homem não sabia que a serpente que o tentava era Satanás; portanto, Satanás não devia saber que era um Deus que salvava ao homem”. Vi nesta ocasião que Satanás só reconheceu a Divindade de Cristo quando desceu ao inferno para libertar as almas dos santos sacerdotes.
Num destes dias seguintes vi Satanás aparecer na forma de um homem de aparência venerável que veio de Jerusalém e se aproximou da caverna de Jesus, que estava em oração. Ele disse que vinha porque estava muito interessado em saber se Ele estava destinado a dar liberdade ao seu povo de Israel. Ele contou tudo o que foi dito e relatado em Jerusalém sobre ele e acrescentou que tinha vindo para ajudá-lo e protegê-lo. Ele afirmou ser um mensageiro de Herodes, que o convidou para ir com ele a Jerusalém, se esconder no palácio de Herodes e reunir seus discípulos, até que ele colocasse em ordem seu plano de libertação. Ele insistiu que era aconselhável que fosse com ele imediatamente. Ele disse tudo isso em muitas palavras e extensamente. Jesus não olhou para ele. Ele orou fervorosamente; e de repente vi Satanás se afastando dali, virando seu rosto horrível e expelindo chamas e trevas de suas narinas.

Enquanto Jesus era atormentado pela fome e especialmente pela sede, Satanás apareceu na forma de um piedoso eremita, que lhe disse: "Estou com muita fome; por favor, dê-me algumas das frutas que estão ali na montanha, em frente à entrada ." "Bem, não quero levar nada sem a permissão do dono. Vamos sentar amigavelmente e conversar sobre coisas boas." Na verdade, não estavam na entrada, mas do lado, na nascente, a alguma distância da gruta, alguns figos e uma espécie de fruta parecida com nozes, mas de casca mole como as nêsperas, e também bagas. Jesus disse-lhe: “Afasta-te de mim; tu és mentiroso desde o princípio e não causes nenhum dano a esses frutos”. Então vi o pretenso eremita precipitar-se como uma sombra escura e distorcida vinda da montanha abaixo e expelir vapor negro.
Satanás apareceu na forma de um viajante e perguntou se ele não poderia comer das lindas uvas que avistava nas proximidades, que eram tão boas para matar a sede. Jesus não respondeu nada nem olhou para o lado onde falava. Alguns dias depois, ele o tentou mostrando-lhe uma fonte de água.

Satanás tenta Jesus por meio de artifícios de magia

Satanás foi novamente à caverna de Jesus, desta vez como um mestre de artifícios e como sábio. Disse que vinha a ele como tal, que algo podia mostrar do que sabia fazer e convidou-o a olhar dentro de um artefato que trazia. Dizendo isso, mostrou uma máquina parecida com uma bola, ou melhor, um cesto de pássaros. Jesus não olhou para ele, virou-lhe as costas e saiu da caverna.
Nesse caleidoscópio que Satanás trazia, via-se uma maravilhosa representação da natureza: um jardim delicioso, de vegetação exuberante, com sombra agradável, fontes frescas, árvores cheias de belas frutas e ubérrimos cachos de uva. Tudo isto parecia tão perto que se podia tomar com a mão e com numerosas mudanças de paisagens e de objetos deleitosos. Quando Jesus lhe deu as costas, Satanás fugiu dali com seu aparelho". Esta tentação se produziu neste momento para fazer quebrar o jejum a Jesus, que começava agora a sentir mais do que antes os estímulos do fome e sede.
Satanás não sabia o que fazer com Jesus. Conhecia as profecias que haviam sobre ele e sentia que tinha Jesus um poder que outros não tinham; mas não sabia que era Deus, nem sabia de fixo que o Messias que não podia ser atingido em suas obras; porque ele o via em muitas coisas tão humano; ele o via jejuar, sofrer tentações, ter fome e sede e sofrer como os outros homens. Satanás era nisso tão cego, em parte, como os fariseus. Tinha-no por um homem santo e justo, a quem convinha tentar para fazê-lo cair em falta e pô-lo em perturbação.
Jesus sofreu fome e sede. Eu o vi com frequência na frente da entrada da caverna. À noite apareceu Satanás na forma de um homem grande e forte, subindo a montanha. Tinha pego abaixo duas pedras do tamanho de pequenos pães, com ângulos; e enquanto subia tinha-lhes dado a forma de pães nas suas mãos. Havia nele algo de profundo ressentimento quando subia desta vez e entrou na caverna. Tinha uma pedra em cada mão e disse mais ou menos o seguinte: "tens razão de não ter comido alguma fruta; elas não servem senão de prazer. Mas se tu és o filho querido de Deus, sobre o qual veio o Espírito Santo no batismo, Olha: eu fiz estas pedras parecerem pães; faze agora que sejam pães". Jesus não olhou para Satanás; ouvi-lhe apenas estas palavras: "o homem não vive de pão". Eu entendi essas palavras claramente. Então Satanás ficou raivoso. Estendeu as garras contra Jesus e vi as duas pedras em suas mãos. Enquanto fugia dali não pude deixar de rir ao ver que teve que levar as pedras que tinha trazido.

Satanás leva Jesus ao pináculo do templo e sobre a montanha

Na tarde do dia seguinte, vi Satanás voar para Jesus, como um anjo poderoso, com grande estrondo. Estava com vestes de guerreiro, como vejo com frequência São Miguel. Mas em Satanás sempre se descobre algo de repelente e de opaco, ainda em seu maior brilho. Ele se gloriava diante de Jesus e dizia: "quero te mostrar o que posso e quem sou e como os anjos me levam em suas palmas. Olhe para Jerusalém, olhe para o templo.
Eu quero colocá-lo no ponto mais alto. Mostra então o que tu podes e se os anjos te seguram em suas mãos". Enquanto dizia isso, vi a cidade de Jerusalém e o templo tão perto como se estivessem junto à montanha. Creio que tudo isso não era senão artifício de Satanás. Jesus não lhe respondeu. Satanás tomou-o pelas costas e levou-o pelo ar, voando baixo, até Jerusalém; pôs-o sobre a ponta de uma das quatro torres que havia sobre o templo e que eu até então não tinha notado.
Esta ponta estava no ângulo ocidental, em direção a Sião, em frente à torre Antonia. A encosta da montanha onde estava o templo era nesta parte muito íngreme. Estas torres eram como prisões e em uma delas estavam guardadas as preciosas vestes dos sacerdotes. Eram por cima planas, de modo que se podia caminhar nelas; erguia-se, porém, ainda no meio delas um cone oco que terminava com uma bocha tão grande que podiam estar ali dois homens de pé. A partir dali se podia ver o templo como um todo. Neste ponto mais alto colocou Satanás a Jesus, que nada disse até aquele momento. Satanás, então, de um vôo desceu à terra, e disse: "Se tu és o Filho de Deus, mostra o teu poder e deixa-te cair abaixo, pois está escrito: Mandará aos seus anjos que te segurem nas suas mãos, para que não tropeces em pedra alguma". Então disse Jesus: "Está escrito também: Não tentarás o teu Deus".
Então veio Satanás todo raivoso contra ele, E Jesus disse: "Usa do poder que foi dado a você". Então Satanás tomou-o pelos ombros e, furioso, voou com ele através do deserto, em direção a Jericó. Sobre aquela torre caiu à tarde luz vespertina do céu. Desta vez, ele voou mais devagar. Eu o via voar com raiva com Jesus, já no alto, já descendo, já culebreando, como alguém que quer desabafar sua raiva e não pode dominar o objeto de sua raiva.
Levou-o sobre o mesmo monte, a sete horas de Jerusalém, onde Jesus tinha começado o seu jejum. Vi que o levou junto a uma árvore de terebinto que se erguia grande e forte no meio de um jardim de um essênio que havia vivido há muito tempo neste lugar. Elias também viveu lá. Ele estava atrás da caverna, não muito longe da encosta íngreme. Estas árvores eram picadas e cortadas na casca três vezes por ano e davam cada vez uma certa quantidade de bálsamo. Satanás colocou Jesus sobre um pico da montanha, que era inacessível e mais alto que a própria caverna. Era noite; mas conforme Satanás apontava para um lado ou para outro, viam-se as mais belas paisagens de todas as partes do mundo. Satanás disse mais ou menos a Jesus: "Eu sei que você é um grande mestre e vai agora procurar discípulos para espalhar sua doutrina. Olhe para todas essas regiões esplêndidas, essas cidades poderosas... e olhe para esta pequena Judéia. É para onde tens de ir. Eu te quero entregar todas estas regiões, se você se prostrar e me adorar". Com esta adoração entendia esse obséquio e essa humilhação que era de uso entre os fariseus e judeus diante de Reis e de personagens poderosos, quando eles queriam obter algo deles. O diabo apresentou ali uma tentação semelhante, embora em maior escala, do que quando se apresentou na forma de um mensageiro do rei Herodes vindo de Jerusalém, convidando-o a ir à cidade e a viver no castelo sob sua proteção. Quando Satanás apontava com a sua mão, viam-se grandes países e vastos mares; depois as suas cidades, os seus reis e principes, as suas magnificências e triunfos, indo e vindo com seus guerreiros e soldados com toda majestade e esplendor. Tudo parecia tão claro como se estivesse próximo e ainda mais distinto. Parecia que um estava ali dentro dessa magnificência e cada figura, cada quadro, cada povo aparecia com diversos esplendores, com suas costumes, usos e maneiras peculiares. Satanás apontou de alguns povos suas particularidades principais e especialmente um país onde havia grandes homens e fortes guerreiros, que eles pareciam gigantes, acho que a Pérsia, e ele disse que lá ele tinha que ir ensinar. A Palestina foi representada muito pequena e desprezível. Foi uma representação maravilhosa: havia tantas coisas, tão claras e ao mesmo tempo tão esplêndidas e atraentes. Jesus não disse outra coisa senão: "Adorarás a Deus Teu Senhor e a ele somente servirás. Afasta-te de mim, Satanás". Então vi Satanás, em terrível aspecto, precipitar-se da montanha, cair no fundo e desaparecer como se tivesse sido engolido pela terra".

Os anjos servem a Jesus

Depois disso, vi uma multidão de anjos aparecer ao lado de Jesus, curvarem-se diante dele e levá-lo delicadamente em palmas para a caverna onde seu jejum de quarenta dias havia começado. Havia ali doze anjos e outros grupos de ajudantes em determinado número. Já não me lembro bem se 72, mas creio que sim, porque tive durante esta visão a lembrança contínua dos apóstolos e dos 72 discípulos. Celebrou-se na caverna uma festa de ação de Graças e de vitória com uma refeição. Vi os anjos adornarem o interior da caverna com folhas de videira da qual descia, sobre a cabeça de Jesus, uma coroa de folhas. Tudo isto aconteceu em uma ordem admirável e certa solenidade, e era luminoso e significativo, e não durou muito; pois o que foi enxertado numa intenção seguiu a intenção completamente viva e se espalhou de acordo com o seu destino.
Os anjos trouxeram desde o início uma mesa pequena com alimentos do céu, que se ampliou depois. Os alimentos e os recipientes eram como os que via sempre nas mesas do céu, e vi que Jesus e os doze apóstolos e os outros anjos eles tomavam parte da comida". Não era deles um comer com a boca, e, no entanto, era um tomar para si e uma transferência de frutas em que eles gostavam, que eram recriados e participavam da refeição. Era como se a íntima significação dos alimentos passasse a quem os tomava. Isso era inexplicável. No final da mesa havia um cálice grande e luminoso e pequenos vasos ao redor dele, na forma daquele que foi usado na última ceia; só que ali ele era mais espiritual e maior. Havia também um prato com pãezinhos redondos. Vi que Jesus jogava algo do grande cálice nos pequenos vasos e molhava pedaços de pães nos vasos e que os anjos recebiam deles e os eles usavam.
Enquanto via estas coisas, a visão se dissipou e Jesus saiu da caverna e foi descendo a montanha em direção ao Jordão. Os anjos fizeram isso em forma e ordem diferentes. Os que desapareceram com o pão e o vinho tinham vestes sacerdotais naquele mesmo momento vi toda espécie de consolo e de animação nos amigos de Jesus de agora e de mais tarde. Vi Jesus aparecer a Maria, em Caná, de modo admirável e confortá-la e consolá-la. Vi Lázaro e Marta tocados de amor por Jesus. Vi Maria, a Silenciosa, refrigerada na realidade com parte desse alimento: vi o anjo junto a ela e ela receber o alimento. Maria, a Silenciosa, contemplara sempre as dores e tentações de Jesus e estava nestas coisas admiráveis de tal maneira que não se maravilhava com nada. Ainda vi a Madalena comovida: estava naquele momento ocupada em enfeitar-se para uma festa, quando de repente lhe surpreenderam sua vida saudável e sua salvação e jogou seu adorno no chão, o que causou a zombaria dos que a rodeavam. A muitos dos que iam ser mais tarde seus discípulos, vi-os aliviados e consolados e com ânsia de Jesus. Vi Natanael em sua lida pensando nas coisas que ouvira a Jesus, muito comovido; mas logo ele afastava tudo de sua mente. A André, a Pedro e aos outros apóstolos vi-os fortalecidos e comovidos. Foi um espetáculo admirável.
Maria vivia no início do jejum de Jesus na casa perto de Cafarnaum.
Tive oportunidade de ouvir muitos que murmuravam dizendo que ele estava vagando e ninguém sabia onde; que ele abandonara sua mãe; que era seu dever, depois da morte de José, tomar um ofício para sustentar sua mãe. Agora, especialmente, havia muita conversa, tendo chegado notícias do que aconteceu em seu batismo, o testemunho de João e as coisas que contavam os discípulos dispersos em suas aldeias. Coisa semelhante só aconteceu novamente na ressurreição de Lázaro e em sua paixão e morte.
Maria se mostrava preocupada e sofria em seu interior. Nunca esteve isenta de visões, participações e sentimentos de compaixão para com Jesus.
No final dos quarenta dias Maria esteve em Caná da Galiléia junto aos pais da esposa de Caná. Eram essas pessoas distintas na cidade e como chefes dela; eles têm uma casa, quase no meio da cidade, que era bonita e limpa; uma rua principal passava por ela; creio que de Ptolomais se via chegando o caminho nessa direção da cidade que não era tão desalinhada e mal edificada como outras. O marido fez seu casamento em sua casa. Tinha outra casa na cidade, que arranjada entregaram à filha. Agora Maria estava morando lá. O esposo era mais ou menos da mesma idade que Jesus e era como o pai na casa de sua mãe, e levava a administração da mesma. Essas pessoas boas pediam conselhos a Maria para a educação de seus filhos e mostravam todas as suas coisas.

Jesus dirige-se ao Jordão e faz batizar ali

João estava por este tempo ainda ocupado nos batismos. Herodes esforçava-se em conseguir que fosse até ele: mandava mensageiros para lisonjeá-lo e elevá-lo sobre Jesus. João sempre o tratava com pouco apreço e repetia seu testemunho anterior sobre Jesus. De novo foram mensageiros a João para lhe pedir conta de seu proceder com Jesus. João repetia o mesmo: que antes não o tinha visto e que lhe tinham mandado preparar os seus caminhos. Desde o batismo de Jesus, João ensinava que a água, pelo batismo de Jesus e do Espírito Santo que desceu sobre ele, estava agora santificada e que dela saíram muitas coisas maléficas; que tinha sido como um exorcismo das águas". Jesus deixou-se batizar para santificar as águas. O batismo de João era agora mais puro e mais santo; por isso vi Jesus batizar num lugar separado, e desta fonte fazer correr ao Jordão e ao lugar comum do batismo, e via Jesus e os discípulos levarem consigo destas águas para outros batismos.
Ao clarear o dia passou Jesus o Jordão por aquele lugar estreito onde havia passado a há quarenta dias. Haviam jangadas lá. Não era aquela a travessia principal, mas uma passagem menos frequentada. Jesus caminhou pelo leste do Jordão até alcançar o local do batismo de João. Este ensinava e batizava; mas ao percebê-lo apontou para a outra margem e disse: "Eis alí o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo". Jesus partiu dali para Bethabara. André e Saturnino, que estavam com João, apressaram-se a passar o Jordão pelo mesmo lugar que Jesus havia passado. Ele foi seguido por um dos primos de José de Arimatéia e outros dois discípulos de João. Apressaram-se a seguir Jesus e ele foi ao encontro deles e perguntou-lhes o que procuravam. Então perguntou-lhe André, muito contente por tê-lo encontrado, onde habitava. Jesus disse-lhes que o seguissem e os levou a um abrigo perto de Bethabara, perto do mar, e ali se sentaram. Jesus permaneceu com esses cinco discípulos em Bethabara e participou de uma refeição em sua companhia. Ele disse que daria início à sua vida pública e que se associaria a alguns discípulos. André nomeou-o alguns conhecidos e elogiou alguns deles; nomeou Pedro, Filipe, Natanael Jesus falou do batismo no Jordão e que alguns deles deveriam batizar. Disseram eles que ali não havia lugar cômodo, senão lá onde João batizava; mas que não convinha que João fosse estorvado. Jesus falou da missão e do chamado de João, do seu próximo termo e confirmou todas as palavras que este pronunciara sobre o Messias. Falou também de sua preparação no deserto para seu ministério e da necessidade de uma preparação para as obras importantes. Ele mostrou-se terno e familiar com seus discípulos, porque estes estavam um tanto constrangidos e humilhados em sua presença.
Na manhã seguinte, Jesus foi com seus discípulos de Bethabara para o Jordão para as casas dos que passavam o rio e ensinou em uma reunião. Mais tarde, passou o Jordão e ensinou numa pequena aldeia de cerca de vinte casinhas, a uma hora de caminho antes de chegar a Jericó. Iam e vinham multidões de batizados por João para ouvir Jesus e voltavam depois a narrar o que foi ouvido a João. Era quase meio-dia quando o vi ensinando. Jesus ordenou a vários discípulos que fossem na festa do Sábado do outro lado do Jordão, a cerca de uma hora do caminho para cima do rio desde Betabara e preparassem ali uma fonte onde João, vindo de Ainom, batizara antes que passasse ao oriente do Jordão, defronte de Betabara. Eles queria preparar uma refeição para Jesus, mas ele saiu de lá e antes do Sábado passou novamente o Jordão para Bethabara, onde celebrou a festa do Sábado e ensinou na sinagoga. Ali comeu na casa do chefe da sinagoga e dormiu nela. O lugar do batismo que João havia usado algum tempo, antes do que tinha agora, foi restaurado pelos discípulos de Jesus. A fonte não era tão grande como a de João, perto de Jericó; tinha uma borda com espaços para estar o batizando e um pequeno canal ao redor por onde a água ia para a fonte à vontade, de acordo com a necessidade. Haviam agora três lugares de batismo: o que estava sobre Bethabara, o lugar onde Jesus foi batizado com a ilha que nasceu lá no Jordão e o mais usado onde João batizava na época. Quando Jesus chegou, lançou nesta fonte água da fonte da ilha onde ele mesmo foi batizado, que André havia trazido em um recipiente, e abençoou a água da fonte. Os ali batizados sentiram-se todos muito comovidos e admiravelmente mudados. André e Saturnino eram os que batizavam. Não se submergiam inteiramente na água; as pessoas se aproximavam da beira da fonte; colocavam-se-lhes as mãos sobre os ombros, e o batizador derramava com a mão três vezes a água, e batizava em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. No batismo de João vi que usavam um recipiente que tinha três aberturas por onde saíam três pingos de água. Ali muitas pessoas foram batizadas, especialmente da Peréia.
Jesus, de pé sobre um lugar elevado, cheio de erva, ensinava falando da penitência, do batismo e do Espírito Santo. Disse: "meu Pai enviou o Espírito Santo quando fui batizado e clamou: este é meu filho amado em quem me comprazo". Ele também diz isso sobre cada um dos que amam o Pai celestial e se arrependem de seus pecados. Sobre todos os que são batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo envia Ele O Seu Espírito Santo, e são aqueles em quem encontra ele as suas complacências; pois ele é o pai de todos os que recebem o seu batismo e que são renascidos para ele pelo batismo.
Eu me maravilhava de como estas e outras coisas estão tão brevemente no Evangelho; como por exemplo: Jesus, apenas André o segue, depois do testemunho de João, encontra-se logo com Pedro, o qual nem sequer estava ali, senão na Galileia. Mais admiração me causa que no Evangelho, quase depois da entrada triunfal em Jerusalém, segue-se em seguida a ceia pascal da quinta-feira e a paixão, enquanto eu ouvia tantos ensinamentos de Jesus neste intervalo e passavam tantos dias. Eu creio que Jesus parou ali ainda uns quinze dias antes de ir para a Galiléia. André ainda não havia sido recebido como apóstolo. Jesus não o havia chamado; ele mesmo se ofereceu, dizendo que queria de bom grado estar com ele Era mais prestativo e mais resoluto do que Pedro, o qual pensava com certa leveza:"Para isto não me sinto capaz, não teria forças". Por isso voltou às suas ocupações comuns. O próprio Saturnino e os dois primos de José de Arimatéia, Aram e Themeni, haviam sido adicionados dessa forma a Jesus.
Muitos mais discípulos de João haviam vindo a Jesus, Se não fosse por alguns discípulos de João, que, zelosos de seu mestre, não os tivessem retido. O lugar do batismo de João já não era tão frequentado. Estes zelosos queixaram-se a João dizendo que não era justo virem os discípulos de Jesus batizarem ali, que isto correspondia a João. Muito trabalho tinha João em fazê-los verem sua dificuldade de entender e seu egoísmo. Dizia-lhes que recordassem suas palavras, que sempre repetia: que ele tinha vindo para preparar os caminhos, que ele ia logo desaparecer quando esses caminhos estivessem prontos. Eles amavam muito João e não queriam entender essas razões. Já haviam se agrupado tantos ao batismo de Jesus, que ele disse a seus discípulos que convinha sair dali.
Jesus caminhou, acompanhado de cerca de vinte entre os quais estavam André, Saturnino, Arão e Themeni, de Bethabara, pela passagem comum, através do Jordão, e dirigiu-se a Gilgal, e deixando-a à direita, em direção à cidade de Ophra, que estava escondida em um vale entre montanhas.
Dali vinham sempre as pessoas dos lados de Sodoma e Gomorra, sobre camelos, com mercadorias que iam para o Oriente do Jordão e se deixavam batizar por João. Havia ali um caminho menos principal da Judéia ao Jordão. O lugar estava como esquecido, situado a cerca de três ou quatro horas do lugar de João, algo mais perto de Jericó e a cerca de sete horas de Jerusalém.
Esta cidade era fria porque não tinha muito sol, mas estava bem construída. Os habitantes tinham certo bem-estar que vinha de contrabandos, de comércios e de trocas como os publicanos faziam.
Viviam, em uma palavra, dos que transitavam pelo seu comércio. Não eram maus, mas sim indiferentes e com esse espírito que costumavam ter os comerciantes que vivem bem do seu negócio. Também não se preocupavam muito com o batismo de João; não ansiavam pela salvação espiritual e acontecia-lhes como aos que têm o necessário para a vida e não se preocupam mais.
Quando Jesus se aproximou, ordenou aos primos de José de Arimatéia que pedissem as chaves da sinagoga e chamassem as pessoas para o ensino.
Jesus confiava esses discípulos para esse fim porque eram gentis e hábeis no ofício de persuadir. Ao entrar na cidade gritavam-lhe os possessos e os furiosos: "ali vem o Profeta, O Filho de Deus, Jesus Cristo, nosso inimigo. Ele vem para nos expulsar daqui". Jesus mandou-os calarem-se e ficarem sossegados. Calaram-se todos e o seguiram dentro da sinagoga, para ir à qual Jesus teve que atravessar quase toda a cidade. Ensinou ali até a tarde e só saiu uma vez para tomar comida. Ensinou sobre a proximidade do reino de Deus, a necessidade do batismo e exortou com severas palavras aos habitantes a sairem de sua tibieza e sua falsa segurança antes que o juízo de Deus viesse sobre eles. Repreendeu com severas palavras as suas usuras, os seus negócios injustos, e todos os seus pecados, que eram como os dos publicanos e mercadores. Os homens não contradiziam; mas não eram muito acessíveis, porque estavam muito envolvidos em seus negócios obscuros. Alguns ficaram muito comovidos e melhoraram. À tarde vieram outros dos ilustres, como dos pobres, ao seu abrigo dispostos a ir ao batismo de João. De fato, desde a manhã seguinte, eles se dirigiram para onde João estava.
De Ophra partiu Jesus com seus discípulos de manhã para Bethabara e no caminho eles se dividiram. André com o maior número foi enviado adiante, no caminho que Jesus havia tomado, com Saturnino e os primos de José de Arimatéia; dirigiram-se ao lugar de João pelo caminho onde este dera testemunho Dele, depois do batismo. Indo de passagem, entrou em algumas casas e exortava as pessoas a irem ao batismo de João. À tarde, eles estavam novamente em Bethabara E Jesus ensinou, enquanto Saturnino e André batizavam. Como viessem novos batizandos, o ensinamento de Jesus era o de outras vezes: que seu Eterno pai dizia a todos os que fizessem penitência e se batizassem: "Este é o meu filho amado", pois todos eram filhos de Deus. Os mais batizados eram da jurisdição do tetrarca Filipe, que era um bom homem. Essas pessoas se consideravam felizes e pouco se preocupavam até então com o batismo.
De Bethabara, Jesus partiu com três discípulos, atravessando o vale, em direção a Dibom, onde estivera antes para as festas dos Tabernáculos.
Ensinou em algumas casas e na sinagoga que estava distante da cidade no meio do vale. Não entrou na cidade de Dibon, e retirou-se, chegada a noite, para um albergue isolado onde trabalhadores do campo dos arredores recebiam hospedagem e alimentação. Agora estava sendo semeado lá e eles tiveram que cavar a terra porque frequentemente encontravam pedras, areia e não podiam usar os instrumentos comuns para arar a terra. Eles acabaram de armazenar parte da colheita coletada. Os habitantes deste vale, que podia ter cerca de três horas de caminho, eram pessoas boas, simples e de vida modesta, e estavam bem dispostos a respeito de Jesus. Jesus ensinou-lhes com a parábola do semeador, tanto na sinagoga como no próprio campo, explicando-lhes a comparação. Nem sempre Jesus explicava as parábolas. Quando falava com os fariseus, costumava dizer uma parábola sem dar a explicação. André e Saturnino foram com outros discípulos a Ophra, porque as pessoas dali, já comovidas pela visita de Jesus, precisavam ser confirmadas e fortalecidas nessas boas disposições.
Tendo Jesus saído de Dibom, chegou a Eleale, que fica a cerca de quatro horas de Bethabara; caminhou por um caminho que estava a cerca de duas horas de distância do Jordão para o sul, em relação ao caminho que andara antes de Bethabara. Chegou com cerca de sete discípulos e entrou na casa do chefe da sinagoga. Dando início às festas do sábado ensinou na sinagoga com uma parábola dos ramos movidos pelo vento na árvore, da qual caem as flores e depois não produzem frutos. Queria dizer-lhes que eles, em sua maior parte, não se haviam melhorado com o batismo de João, e que se deixavam mover por todo vento, lançando os brotos e flores da penitência, e não davam fruto de conversão. Ele usou essa comparação porque ali eles viviam principalmente dos frutos de suas árvores. Costumavam levar longe os seus frutos, porque ali não havia estrada; vi que trabalhavam também em fazer mantas e em tecer diversos géneros em quantidade.
Até aquele momento Jesus não encontrara ali contraditores. As gentes de Dibom e, em geral, dos arredores, tinham-no afeto e diziam que nunca tinham ouvido tal mestre, e os anciãos compararam-no com os profetas, cujos ensinamentos tinham ouvido os seus antepassados.
Depois do sábado dirigiu-se Jesus para o Ocidente, cerca de três horas a caminho de Bethjesimoth, situado a uma hora do Jordão, a leste de uma montanha. Enquanto andavam, juntaram-se a Jesus André, Saturnino e outros discípulos de João. Jesus lhes contou como os filhos de Israel haviam acampado ali, e como Moisés e Josué falaram ao povo. Ele fez uma aplicação aos tempos presentes e ao seu próprio ensino. A cidade de Bethjesimoth não era grande, mas seu condado era fértil especialmente em vinhedos. Enquanto Jesus entrava na cidade, tinham levado e libertado alguns endemoninhados e furiosos que estavam trancados numa casa. Estes começaram a clamar:"agora vem ele, o profeta; ele nos expulsará". Jesus voltou-se para eles, mandou-os calar-se e que caíssem as suas amarras e disse-lhes que o acompanhassem à sinagoga. De repente caíram os suas amarras e ficaram tranquilos, deitaram-se aos pés de Jesus, deram-lhe graças e o seguiram à sinagoga. Ensinou-os ali com parábolas dos frutos e das vinhas. Depois visitou e curou muitos doentes em suas casas. Como a cidade não levava a nenhuma estrada real, as pessoas traziam seus frutos ao mercado para vendê-los.
Jesus curou aqui pela primeira vez desde a sua saída do deserto: por isso lhe rogavam a gente do lugar que ficasse. Mas Jesus dirigiu-se, acompanhado por André, Saturnino, os primos de José de Arimatéia, ao redor de cerca de doze discípulos, para o Norte em direção à passagem general ao qual levava o caminho de Dibom, o mesmo que fizera quando foi à festa dos Tabernáculos, desde Gilgal. Tiveram que gastar bastante tempo atravessando o rio, porque não tinham os lugares de embarque e desembarque por causa da montanha escarpada do outro lado do rio. Dali caminharam por espaço de uma hora em direção a Samaria, a um lugarzinho ao pé de uma montanha.
A cidade era composta por poucas casas e não tinha escola. Ali habitavam pastores e pessoas simples e boas que se vestiam quase como os pastores da gruta de Belém. Jesus ensinou ao ar livre em um lugar elevado onde havia um assento. Esse povo já havia recebido o batismo de João.

Jesus em Silo, Kibzaim e Thebez

Depois vi Jesus em Siló, na altura de uma montanha de suave encosta, por esse lado, enquanto os outros eram escarpados; tinha um extenso planalto. Nesta altura foi construída a cabana onde se guardava a Arca da Aliança nos primeiros tempos da saída do Egito. Havia um amplo lugar cercado por uma muralha derrubada em parte onde ainda se viam as ruínas das galerias que haviam sido feitas sobre a cabana do Arca. No lugar onde estava a Arca, uma coluna semelhante à que estava em Gilgal, sob teto, numa galeria aberta, perpetuava a lembrança. Havia ali, como também em Gilgal, uma gruta cavada na rocha.
Não muito longe havia um lugar para o sacrifício e junto a ele uma caverna coberta para os desperdícios, pois ainda hoje tinham permissão para oferecer sacrifícios duas ou três vezes no ano. Também a sinagoga estava localizada lá, com muralhas, de onde se desfrutava de uma bela vista das alturas de Jerusalém, do Mar da Galiléia e outros contornos montanhosos. A cidade de Siló estava em decadência e pouco habitada; havia ali uma escola de fariseus e saduceus. Os habitantes não eram bons: eram soberbos, cheios de suspeita e de falsa segurança. A alguma distância das portas da cidade se viam os muros ruinosos de um convento de essênios e perto existia ainda a casa onde os benjamitas tinham encerrado as moças  por ocasião das festas dos Tabernáculos.
Jesus entrou com seus discípulos, doze em número, numa casa onde os mestres viajantes e profetas tinham o direito adquirido de permanecer. Esta casa ficava junto à escola e aos aposentos dos fariseus e saduceus.
Eu vi cerca de vinte deles reunidos em torno de Jesus, vestidos com suas longas vestes com cintos e com longos trançados que pendiam de suas mangas. Fingiam não saber nada de Jesus e dirigiam perguntas capciosas, quais:"Como era isso"... Que que havia dois batismos: um de João e outro de um tal Jesus, filho de um carpinteiro da Galileia? Qual era o verdadeiro batismo? "Diziamn também que se juntavam outras mulheres à mãe desse Jesus, filho do carpinteiro, como uma viúva com seus dois filhos e que andavam de um lado para o outro fazendo novos capangas. Acrescentavam que eles, por outro lado, não necessitavam dessas novidades: bastava-lhes a lei e os profetas. Estas coisas as diziam, não abertamente, em tom ofensivo, mas com finura estudada e com certo sorna. Respondeu-lhes que era aquele de quem falavam, e, havendo falado também da voz ouvida no batismo, disse-lhes que essa era a voz de seu pai celestial, que é pai também de todos os que se arrependem de seus pecados e são renovados pelo batismo. Como não o queriam deixar ir ao lugar onde havia estado a Arca da Aliança, por ser lugar sagrado, ele foi para lá igualmente, e os lançou na cara que eles tinham, precisamente por seus pecados, perdido a Arca da Aliança, e que agora, estando vazio o lugar, continuavam em suas más obras como se faltassem à Lei. Ele acrescentou que, assim como a Arca se afastara deles, também se afastaria deles o cumprimento da Lei.
Como eles ainda quizessem disputar sobre a Lei, colocou-os dois a dois, como a escolares e começou a perguntar-lhes. Declarou-lhes todo tipo de coisas ocultas sobre a lei, fazendo-lhes perguntas que não souberam responder.
Ficaram envergonhados e zangados, e eles culparam um ao outro, murmuraram e começaram a se afastar dali. Jesus levou-os ao lugar da caverna coberta dos desperdícios, fez-a destapar e disse-lhes, numa comparação, que eles eram semelhantes a estas cavernas cheias de lixo e podridão por dentro, que não serviam para o sacrifício, e apenas limpas por fora e cobertas, e precisamente num lugar de onde, pelos pecados de seus pais, se afastara a Arca da Aliança. Ao ouvir estas coisas, todos se afastaram raivosos. Na sinagoga ensinou com palavras severas sobre o amor e respeito devido aos anciãos e pais. Repreendeu-os severamente porque estes povos de Siló tinham por costume na cidade de desprezar a seus pais quando se tornavam velhos, de negligenciá-los e expulsá-los de perto. De Betel, que ficava ao Meio-dia, desembocava uma rua ali. Lebona ficava nas proximidades. Até Samaria podia haver cerca de oito a nove horas de caminho. O profeta Jonas estava sepultado em Siló.
Quando Jesus deixou Siló, da parte da cidade voltada para o Noroeste, eles se separaram dele, André, Saturnino e os primos de José de Arimatéia e o precederam no caminho da Galiléia. Jesus chegou com os outros discípulos que o acompanhavam, antes do Sábado, à cidade de Kibzaim Kstá em um vale, entre ramificações da montanha, que se estendiam no meio dos vales. As pessoas ali eram boas, familiares e obsequiosas com Jesus. Esperavam-no. Era uma cidade de Levitas, e Jesus entrou na casa do chefe da escola do lugar. Chegaram até ali Lázaro, Marta e seu antigo criado; Joana Chusa e o filho de Simeão, funcionário do templo, e todos saudaram Jesus. Estavam a caminho das bodas de Caná e sabiam por um mensageiro que se encontrariam ali com Jesus. Este distinguiu Lázaro como um de seus queridos amigos; contudo, nunca o ouvi perguntar: "Que faz este ou aquele de teus parentes ou amigos?” Kibzaim estava escondido em um canto da montanha. Os habitantes viviam do comércio de frutas e faziam tendas, carpetes, tapetes e solas para sandálias. Jesus celebrou ali o sábado e curou vários doentes com a sua palavra. Eram doentes de gota e mentecatos que foram levados até sua presença em macas, em frente à escola. A refeição ocorreu na casa de um dos principais Levitas.
Depois do sábado foi Jesus até Sichar, onde chegou muito tarde e se abrigou em uma pousada preparada com antecedência. Lázaro e seus companheiros partiram de Kibzaim diretamente para a Galiléia.
Na manhã seguinte, dirigiu-se de Sichar, ao Norte, para Thebez, porque em Sichar ou Siquém não pôde ensinar. Não havia judeus, mas apenas samaritanos e uma classe de pessoas que, desde o cativeiro babilônico ou depois de uma guerra, se estabeleceram ali: ao templo de Jerusalém, mas não ofereciam sacrifícios. Em Siquém havia bons campos que Jacó comprou para seu filho José. Uma parte desta região já pertencia ao Galileu Herodes; por isso, via-se do meio do vale um limite marcado com um monte e alguns postes. Através de Thebez, que era uma cidade regular, passava uma estrada real e havia bastante comércio. Camelos muito carregados passavam. Causou-me admiração e estranheza quando vi aparecer estes animais carregados como torres através dos desfiladeiros da montanha, ou subindo e movendo seus longos pescoços e cabeças entre as cargas de seus lombos. Também se comercializava com seda crua. Os habitantes de Thebez não eram maus nem se opunham aos ensinamentos de Jesus; mas não eram sensíveis nem simples; eram bastante mornos, como costumavam ser os homens de negócios que se davam bem com o lucro. Os sacerdotes e os escribas mostraram-se mais seguros e neutros.
Quando Jesus se aproximou, os possuídos e os mentecatos clamaram: "Aí vem o profeta da Galiléia. Tem poder sobre nós. Temos que sair". Jesus mandou-os calar-se e aquietaram-se obedecendo. Jesus entrou na sinagoga e, trouxeram-lhe muitos enfermos, curou-os a todos. À tarde, ensinou na escola e celebrou a festa da consagração do templo que começava naquela tarde. Na escola e em todas as casas se acendiam sete luzes; também nos campos e nas ruas havia uma multidão de luzes que brilhavam sobre longos postes. Thebez estava situada no alto da montanha de modo estranho: de um lado e à distância podia-se ver como desciam os camelos carregados pelos estradas da montanha, e de perto você não podia vê-los. André, Saturnino e os sobrinhos de José de Arimatéia já haviam partido de Siló para a Galiléia. André tinha estado com os seus em Betsaida e tinha dito a Pedro que tinha encontrado o Messias, que agora vinha para a Galileia e queria levar Pedro na presença de Jesus. Todos estes partiram para Arbel, que também era chamada Betarbel, para a casa de Natanael Chased, que tinha negócios lá e foram chamá-lo para ir com eles a Gennebris e celebrar a festa, pois ali tinha Natanael sua residência em uma casa, junto com outras, à entrada da cidade. Falaram muito de Jesus e concordaram com André em ir à festa, sendo que André e os demais estimavam muito a Natanael.
Eles queriam ouvir seu parecer; mas este não se mostrou muito convencido de todas estas coisas. Lázaro levou Marta e Joana Chusa à casa de Maria, em Cafarnaum, para onde voltara depois de sua estada em Caná, e partiu para Tiberíades, com o filho de Simeão, onde se encontrariam novamente com Jesus. Também o noivo de Caná partiu dali ao encontro de Jesus. Esse namorado de Caná era filho de uma filha de Sobé, irmã de Anai também se chamava Natanael, mas não era de Caná, mas ia a Caná casar-se. A cidade de Gennebris era muito populosa e tinha uma estrada real no meio.
Havia muito comércio nela de várias coisas e de sedas. Estava a poucas horas de Tiberíades, mas separada por montanhas, de modo que era preciso virar o caminho para o sul e voltar entre Emaús e Tiberíades para entrar na cidade. Arbel estava entre Séforis e Tiberíades.

Primeiro apelo oficial de Pedro

Jesus saiu ao amanhecer de Tebez com seus discípulos e foi para o Oriente; depois para o Norte, seguindo o pé das montanhas, no Vale do Jordão, em direção a Tiberíades. Passou por Abel-Mehula, belo lugar onde a montanha torcia para o Norte; era a cidade natal do profeta Eliseu. Ela se estendia pelas encostas da montanha, e eu pude ver ali a fertilidade do lugar voltado para o sol e a do Norte. As pessoas eram muito boas e tinham ouvido as maravilhas de Kibzaim e de Thebez. Pararam-no no caminho e rogaram-lhe que ficasse ali para curar os enfermos: era um correr de gente; mas Jesus não se deteve muito tempo. O local ficava a cerca de quatro horas de Thebez. Jesus chegou lá através de Acitópolis e do Jordão. Quando Jesus saiu de Abel-Meula, André, Pedro e João vieram ao encontro dele, perto de uma cidade a seis horas de Tiberíades. Os outros já estavam em Gennebris. Pedro tinha estado com João na região dos pescadores por seus negócios. Queriam ir também a Gennebris; mas André persuadiu-os a irem primeiro ao encontro de Jesus. André levou seu irmão Pedro a Jesus, e este lhe disse:"Tu és Simão, filho de Jonas; doravante te chamarás Cefas".
Isso foi em breves palavras. João disse algo a respeito de que logo se veriam. Depois disso, Pedro e João foram a Gennebris. André permaneceu com Jesus, que andou pelos arredores de Tarichea.
João Batista tinha deixado seu antigo lugar, tinha passado o Jordão e ainda batizava a uma hora de Bethabara, onde Jesus havia mandado batizar e João havia batizado antes. Assim procedia porque muitas pessoas da jurisdição do tetrarca Filipe, que era bom homem, queriam fazer-se batizar, mas não passavam o Jordão, porque havia muitos pagãos e porque muitos se tinham determinado a batizar pela última estada de Jesus. Também, para demonstrar que ele não estava distanciado de Jesus, quis batizar neste mesmo lugar.
Quando Jesus com André chegou às cercanias de Tarichea, abrigou-se em uma casa de pescadores pertencente a Pedro, junto ao mar, onde André havia preparado abrigo. Não entrou na cidade. Os habitantes tinham muito de escuridão, de repelente e estavam dedicados à usura e aos lucros ilícitos. Simão, que tinha ali um emprego, tinha ido com Tadeu e Tiago O menor, seu irmão, à festa de Gennebris onde estavam também Tiago o Major e João. Lázaro, Saturnino e o filho de Simeão e o noivo de Caná se reuniram com Jesus. O noivo convidou Jesus e todos os seus companheiros para suas próximas bodas.
A principal razão pela qual Jesus passou alguns dias em Tarichea foi porque queria dar tempo aos seus futuros apóstolos para ouvir o que André e Saturnino contavam dele e se entendessem entre eles.
Eu vi que André, Enquanto Jesus estava na região, ficou em casa e escrevia com uma espécie de cana cartas sobre rolos de cascas. Podia-se enrolar o escrito por meio de uma madeira. Vi que homens e jovens vinham frequentemente à casa em busca de trabalho e que André os usava como mensageiros. Ele enviava estas cartas a Filipe e a seu irmão uterino, Jônatas, e a Pedro e aos outros em Gennebris, e anunciava-lhes que Jesus iria para o Sábado a Cafarnaum e os citava para aquele lugar.
Mas veio um mensageiro de Cafarnaum até André, pedindo a Jesus que fosse, pois o esperava desde dias um mensageiro de Kades que pedia ajuda. Jesus passou com André, Saturnino, Obede e outros discípulos de João para Cafarnaum. Esta cidade não estava junto ao mar, mas numa altura, e ao sul de uma montanha que ao Ocidente do mar formava um vale pelo qual o Jordão se lançava no mar da Galileia. Jesus e seus discípulos caminhavam separados uns dos outros. Andrew saiu ao encontro dele no caminho com seu irmão uterino Jônatas e com Filipe, que haviam acudido por causa de suas cartas; mas não encontraram Jesus. André disse-lhes com vivacidade tudo o que tinha visto e ouvido de Jesus e afirmava que era realmente o Messias que esperavam. Se quisessem segui-lo, não tinham que andar em muitas diligências. Se o escutassem e o desejassem de coração, ele mesmo lhes diria uma palavra ou um sinal e o seguiriam seguramente. Maria e as santas mulheres não estavam em Cafarnaum, mas na casa de Maria, que estava no Vale, diante da cidade para o mar, e celebraram lá a festa. Os filhos de Maria de Cléofas, Tiago, O mais velho, e seu irmão, João e Pedro já haviam chegado de Gennebris, como também outros que foram discípulos. Natanael Chased, Tomé, Bartolomeu e Mateus não estavam lá, em vez disso, havia outros parentes e amigos da Sagrada Família que foram convidados para as bodas de Caná e celebravam ali o Sábado, pois tinham ouvido falar de Jesus.
Jesus estava habitando com André, Saturnino, Lázaro, Obede e outros discípulos de João na casa que pertencia ao noivo de Caná, Natanael, cujos pais já haviam morrido, deixando-lhe uma copiosa herança. Os discípulos vindos de Gennebris se mostravam um pouco retraídos, porque estavam duvidosos entre a autoridade de Natanael Chased e as coisas admiráveis que André e os outros discípulos de Jesus narravam; em parte a corteza deles e em parte o dito por André de que bastava escutar sua doutrina para que se sentissem movidos a segui-lo. Dois dias esse homem esperou ali, em Kades, pelo Salvador. Aproximou-se de Jesus, lançou-se a seus pés e disse que era o criado de um homem de Kades; seu patrono rogava a Jesus que fosse a sua casa para curar seu filho doente, que tinha lepra e um demônio mudo. Era este um servo fiel, e expôs vivamente a dor de seu amo. Jesus disse-lhe que não podia ir com ele, mas que ao filho viria ajuda, porque era inocente. Ele disse ao servo que seu mestre se deitasse com os braços estendidos sobre o corpo de seu filho, dissesse algumas coisas orando, e que a lepra cairia e Jesus acrescentou que ele, o servo, também se deitasse sobre o menino e soprasse sobre ele, e que sairia um vapor azulado do menino e se veria livre da mudez. Tive então uma visão: o pai e o servo fizeram o que foi mandado e o menino se viu livre de sua enfermidade. Havia nesta ordem de Jesus razões especiais pelas quais o pai e o servo deviam deitar-se sobre o menino enfermo. O servo era na verdade o pai do menino, coisa que o senhor não sabia, Enquanto Jesus o sabia. Ambos deviam tirar dessa forma uma culpa que pesava sobre o inocente menino.
A cidade de Kades ficava a cerca de seis horas de Cafarnaum, nos confins de Tiro, a oeste de Paneas; tinha sido cidade capital dos cainitas e agora refúgio onde podiam esconder-se presos perseguidos pela justiça.
Fazia fronteira com um condado chamado Cabul e as aldeias que Salomão deu ao rei de Tiro. Vi esta região sempre escura, sinistra, que Jesus evitava, quando ia a Tiro ou Sidom. Ali se cometiam roubos e assaltos.
Quando Jesus ensinava na sinagoga estava reunida ali muita gente e parentes e amigos de Jesus. Para eles era seu ensinamento muito novo e atraente. Falou da proximidade do reino de Deus, da luz que não se deve pôr sob o alqueire, da parábola do semeador e do grão de mostarda. Não eram estas as parábolas que se lêem hoje no Evangelho: as aplicações eram muito diferentes, segundo os casos. As parábolas eram comparações breves, das quais Jesus estendia logo seus ensinamentos e sua doutrina. Já ouvi muitas outras parábolas, que não estão no Evangelho, e aquelas que estão as usava sempre com novas aplicações.
Depois da festa do sábado foi Jesus com seus discípulos a um pequeno vale que era como um lugar de recreio. Haviam árvores na entrada e no próprio vale. Foram com ele os filhos de Zebedeu, os filhos de Maria Cléofas e outros discípulos, Filipe, que era algo retraído e humilde, ficou perplexo e não eu sabia se ele poderia ir também. De repente, voltou-se para Jesus e ele disse-lhe: "Segue-me". Então Filipe, cheio de alegria, seguiu-o. Havia ali cerca de doze discípulos. Jesus falou debaixo de uma árvore sobre o seguimento e sobre a missão que esperava cumprir. André era muito ciumento, e estava tão entusiasmado e desejava que todos os demais estivessem tão persuadidos da messianidade de Jesus, que se alegrou muito de que a pregação de Jesus no Sábado tivesse agradado a todos: tinha o coração tão cheio de amor e zelo que voltava a contar aos demais o que tinha visto e ouvido no batismo de Jesus e as outras maravilhas que ele tinha testemunhado. Ouvi Jesus que lhes disse que veriam coisas ainda maiores, jurando-o pelo céu, e falou logo de sua missão e de seu eterno Pai.
Jesus lhes falou também de seu seguimento: que quando os chamasse deviam deixar tudo para segui-lo. Disse-lhes que ele cuidaria deles e não lhes faltaria nada. Por agora podiam continuar exercendo seus ofícios e ocupações; que ele, antes da Páscoa que se aproximava, tinha que fazer ainda outras coisas antes de chamá-los; que quando os chamasse estivessem prontos para deixar tudo sem preocupações. Estas coisas lhe disseram em resposta a certas perguntas que lhe haviam dirigido: como deviam comportar-se com seus parentes, Pedro, por por exemplo, ele disse que não poderia por enquanto deixar seu padrasto idoso, tio de Felipe. Todas estas dificuldades ele resolveu dizendo que não pensava chamá-los antes da Páscoa; que fossem se separando de seus empregos na medida que seu coração lho permitisse; que podiam continuar neles enquanto não os chamava e que buscassem desprender-se desde logo para estarem prontos. Depois saiu com eles pelo outro cabo do vale para a casa onde morava Maria, entre a fileira de casas que havia entre Cafarnaum e Betsaida. Os parentes mais próximos seguiram Jesus, porque suas mães também estavam ali com Maria.
No dia seguinte Jesus se dirigiu com seus discípulos e parentes, muito cedo, para a cidade de Caná. Maria e as santas mulheres seguiram o caminho mais curto nessa mesma direção: era uma senda estreita, às vezes entre montes. As mulheres preferiam caminhar por estes caminhos, porque podiam estar mais sozinhas; aliás, vi que não precisavam de caminhos largos porque caminhavam em fila, uma atrás da outra. Na frente e atrás, a alguma distância, estava um guia. Eles tinham que fazer um caminho de sete horas para o Meio-dia e o oeste.
Jesus fez uma volta com seus discípulos em direção a Gennebris, que era um caminho mais largo e mais cômodo para andarem unidos e poder ensinar. Às vezes Jesus calava, e apontava algo, ou explicava. O caminho de Jesus estava mais ao sul do que o de Maria, e exigia cerca de seis horas de Cafarnaum a Gennebris; virava dali para o Oriente cerca de três horas até Canaã da Galileia.
Gennebris era uma bela cidade; tinha uma sinagoga e uma escola e outra espécie de academia para ensinar a falar e havia lá muito comércio.
Natanael tinha seu escritório na entrada da cidade onde havia outras casas. Natanael não foi à cidade, embora os discípulos e amigos o instassem. Jesus ensinou na sinagoga e com parte de seus discípulos tomou algum alimento na casa de um rico fariseu. Outros discípulos já estavam no caminho.
Jesus disse a Filipe que fosse a Natanael e o trouxesse à sua presença, enquanto caminhassem. Ali em Gennebris trataram Jesus com muito respeito: pediam que ficasse mais tempo entre eles e se compadecesse dos enfermos, já que era compatrota. Mas Jesus partiu dali muito cedo para Caná.
Enquanto isso, Filipe havia chegado à casa de Natanael. Havia mais alguns dos escribas. Natanael estava sentado à sua mesa, em um quarto no topo da casa. Filipe nunca tinha falado de Jesus com Natanael porque não tinha estado com os outros em Gennebris. Era muito conhecido de Natanael e falou com muito entusiasmo de Jesus: que era o Messias do qual falavam as profecias; que finalmente haviam encontrado Jesus de Nazaré, filho de José. Natanael era um homem alegre, vivo, determinado e apegado ao seu modo de pensar, embora sincero e sem falsidade. Disse, pois, a Filipe: "o que pode vir de bom de Nazaré?"Sabia ele que Nazaré tinha fama de pessoas contraditórias, com pouco fundamento de ciência e suas escolas não gozavam de fama. Pensava Natanael: "um homem formado na escola de Nazaré poderá talvez contentar os pobres e simples habitantes daquela região, mas não satisfazer a ânsia de saber que ele sentia". Filipe disse-lhe que o melhor seria ir, ver e examinar; que agora ia encontrá-lo a caminho de Caná.
Então desceu Natanael com Filipe pelo caminho curto, que os separava do caminho principal que devia seguir Jesus, e, com efeito, ali encontrou Jesus, no meio de alguns discípulos, calado naquele momento. Filipe estava agora, depois que Jesus lhe disse: "Segue-me", muito contente e confiante, em comparação com antes, que se mostrava tímido, e assim clamou! a Jesus quando o viu: "mestre, aqui trago aquele que disse: "O que de bom pode sair de Nazaré?"
Jesus falou aos seus discípulos e disse-lhes: "aqui um verdadeiro israelita, em quem não há falsidade". Jesus disse isto com alegria e com amor e Natanael respondeu: "de onde me conheces?" Que era dizer: como sabes que sou sem falsidade e sem mentira já você nunca me viu antes de agora? Então disse Jesus: "antes que Filipe te chamasse, eu te vi, quando estavas debaixo da Figueira". Enquanto dizia isso, Jesus olhou para ele com um olhar que penetrou em sua consciência, fazendo-o se lembrar de algo. Então despertou nele a lembrança de que Jesus era aquele que passando lhe dirigiu antes um olhar de advertência que lhe infundiu estranha fortaleza para resistir a uma tentação que tinha tido enquanto estava debaixo de uma árvore de figos, num lugar de recreio de banhos quentes, quando ele olhou para o lado onde havia belas mulheres brincando com frutas de um lado do prado. A força do olhar e o convencimento de uma força estranha, que o havia feito vencedor da tentação, despertaram-lhe de repente na memória a imagem do homem se lhe apagara, ou, se reconhecia a Jesus, não podia coordenar seu olhar com aquele fato de então. Como agora voltava a ver esse olhar e se lembrava do fato, ficou perturbado e comovido profundamente: conheceu que Jesus, enquanto passava, havia leu seus pensamentos e tinha sido para ele um anjo avisador. Era de tão puros costumes que o simples pensamento de uma impureza o perturbava profundamente.
Viu, pois, de repente em Jesus o seu Redentor e Salvador e o conhecimento manifestado por Jesus de saber seu íntimo pensamento bastou a Natanael, que era de coração reto, sincero e grato, para reconhecer Jesus e confessá-lo, contentou-se diante de todos os discípulos. Humilhou-se ao ouvir as palavras de Jesus e disse prontamente: "Rabi, tu és o Filho de Deus. Tu és o Rei de Israel". Respondeu Jesus: "Crês, Porque te disse: Vi-te debaixo da Figueira. Em verdade, eu lhe digo: você verá coisas maiores". E depois, olhando para os outros discípulos, acrescentou: "Em verdade vos digo: vereis abrir-se o céu e os anjos descerem e ascenderem sobre o Filho do Homem". Os outros apóstolos não entenderam o significado das palavras de Jesus a respeito da figueira, e não puderam entendê-lo então porque Natanael Chased pôde mudar logo de idéia a respeito de Jesus, e aos demais ficou oculto como um caso de consciência. Só a João foi dito pelo próprio Natanael nas bodas de Caná. Natanael perguntou a Jesus ee ele deveria imediatamente deixar tudo e segui-lo: disse que tinha um irmão a quem queria, nesse caso, deixar o emprego. Jesus respondeu-lhe o que ontem havia dito aos demais apóstolos e, de repente, convidou-o a ir com ele às bodas de Caná.
Depois disso Jesus e os discípulos foram encaminhando para Caná, enquanto Natanael voltou para casa para se preparar para viajar para Caná, onde chegou na manhã seguinte.

As bodas de Caná

Caná estava situada a oeste de uma colina; era uma cidade bonita e limpa, um pouco menor que Cafarnaum. Há ali uma sinagoga com três sacerdotes. Nas cercanias estava a casa com um vestíbulo, adornada com folhas e ramos onde se devia celebrar o casamento. Desta casa até a sinagoga havia penduras de folhas e de arcos com ramos, flores e frutos.
Como sala de festa serviria o espaço que havia entre o vestíbulo e a lareira da casa. Esta casa, composta por uma parede alta, era adornada como um altar com vasos e presentes para os noivos, tinha ainda um prolongamento atrás, onde as mulheres realizariam as festas de casamento separadas dos homens. De lá se viam as vigas da casa adornadas com coroas e flores às quais se podia subir para acender as lâmpadas suspensas.
Quando Jesus chegou com seus discípulos e foi recebido por Maria, sua mãe, pelos pais da noiva, pelo noivo e por outros que o precederam, e tratado com muita reverência, saindo ao encontro dele a certa distância da casa. Jesus se hospedou com alguns de seus mais fiéis, que foram depois seus apóstolos, em uma casa separada que a irmã da mãe do noivo havia colocado à sua disposição; era esta mulher uma filha de Sobé, irmã de Santa Ana. Durante as festas de casamento ela foi lá na casa como mãe do noivo.

O pai da noiva chamava-se Israel e era da linhagem de Rute de Belém.
Este era um homem principal, com um grande comércio com casas de hospedagem, para alugar e dar comida a viajantes e seus animais, pois ocupava um lugar de trânsito frequentado por caravanas; e tinha outros empregados sob suas ordens. O bem-estar e as riquezas da cidade estavam quase todas nas mãos de Israel e de seus altos empregados, os demais viviam do trabalho que Israel lhes proporcionava. A mãe da noiva era um pouco baldeada, rengueava de um lado e precisava de ajuda para caminhar. Desde a Galiléia, todos os parentes de Ana e Joaquim se reuniram, cerca de cem pessoas. De Jerusalém vieram Maria Marcos, João, Marcos, Obede e Verônica. Jesus, por sua vez, trouxe cerca de vinte e cinco convidados para as bodas.
Quando Jesus Menino tinha doze anos, estando numa refeição na casa de Ana, quando voltava do templo, falou então com este noivo e disse-lhe umas palavras misteriosas sobre pão e vinho, e que ele um dia estaria presente às suas bodas; mas sua presença nesses casamentos tinha, além do misterioso e significativo como todas as suas obras sobre a terra, um senso de conveniência social e de consideração. Várias vezes tinha enviado Maria mensageiros, a Jesus rogando-lhe que assistisse a estas bodas. Corria um pouco a voz entre parentes e amigos da Sagrada Família: Maria, a mãe de Jesus, era uma viúva desolada e abandonada; Jesus ia andando por toda parte, e cuidava pouco ou nada da mãe e da família. Queria, pois, Jesus assistir àquela boda e dar-lhe ali o testemunho do seu amor e respeito. Este casamento, pois, foi considerado por Jesus como uma questão que olhava para sua mãe e como uma coisa Sua, e assim Maria esteve ali desde horas ajudando nos detalhes dos preparativos como uma coisa sua. Jesus participaria da festa por conta própria. Jesus havia se comprometido a prover o vinho aos convidados e assim se explica o pedido de Maria quando viu que faltava o vinho.
Jesus também havia citado Lázaro e Marta para estas bodas e Marta ajudava Maria nos preparativos. Lázaro era o que devia prover a parte à qual se tinha comprometido Jesus e isso só Maria sabia. Jesus tinha plena confiança em Lázaro. Jesus recebia agradecido tudo o que Lázaro dava e este sentia-se feliz em dar: por isso foi Lázaro, até o último momento, o tesoureiro da comunidade cristã. Ali era tido como um hóspede de honra pelos noivos, e Lázaro se esmerava por tudo o que pudesse ser necessário. Lázaro era fino e delicado em seu modo de ser, sério, calado e muito reservado em todas as suas manifestações; não falava muito, e olhava com afeto interior a Jesus para que nada lhe faltasse. Além do vinho, Jesus tinha assumido por conta própria fornecer alguns alimentos especiais, frutas, aves de vários tipos e legumes. Tudo isso já havia sido fornecido.
Verônica trouxe de Jerusalém um cesto de flores admiráveis e um trabalho artístico de confeitaria.
Jesus era ali o chefe e o principal da festa. Ele próprio dirigia os vários entretenimentos, animando-os com ensinamentos úteis. Fazia a distribuição da ordem naquela festa e disse que todos deviam alegrar-se segundo o costume e os usos divertindo-se, mas que de tudo deviam buscar extrair ciência e ensino. Entre outras coisas, ele disse que duas vezes por dia eles deveriam deixar a casa e se recriar em lugares abertos ao ar fresco. Por isso vi nestas festas os homens e as mulheres à parte, uns dos outros, irem a um belo jardim e ali entreterem-se em conversações e em amenos jogos. Vi, por exemplo, que os homens se acomodavam no chão, em roda, enquanto no meio havia todo tipo de frutas e, segundo certas regras, eles jogavam essas frutas umas nas outras para que caíssem em certos buracos, o que outros tentavam evitar. Vi o próprio Jesus tomar parte neste jogo das frutas com uma moderada alegria: dizia com frequência uma palavra cheia de significado, ainda que sorrindo, coisa que a todos causava admiração; umas vezes a recebiam em silêncio, outras com comoção e por certas palavras pediam explicação aos mais compreendidos. Jesus havia ordenado o modo destes jogos e determinava os vencedores, animando a todos com referências e advertências, segundo os casos.
Os mais jovens se divertiam correndo e pulando em sebes e galhos tecidos com frutas. As mulheres também se divertiam à parte com frutas, enquanto a noiva estava sentada com Maria e a tia do noivo. Mais tarde, uma espécie de dança foi organizada: as crianças tocavam instrumentos e cantavam coros. Todos os dançarinos tinham lenços nas mãos, com os quais os jovens e as meninas se tocavam enquanto dançavam algumas vezes em fileiras e outras em fileiras mais fechadas. Sem estes lenços nunca se tocavam. Para o noivo e a noiva eram esses lenços pretos; os outros, eles os tinham amarelos. Primeiro dançaram o noivo e a noiva, sozinhos, e depois todos unidos. As moças usavam véus, ainda que um pouco levantados; diante do rosto; suas vestes eram compridas por trás, e na frente as tinham algo recolhidas com uma trela. Estas danças não consistiam em saltos e brincadeiras, como entre nós: eram antes um caminhar acompanhado em linhas de várias classes, enquanto se moviam-se ao compasso da música com as mãos, cabeça e corpo. Lembrava-me dos movimentos dos fariseus, quando faziam oração; tudo era em conjunto decoroso e agradável. Nenhum dos futuros apóstolos dançou; mas Natanael Chased, Obede, Jônatas e outros discípulos o fizeram. As que dançavam eram todas jovens e tudo procedia em ordem e alegria com um feliz descanso.
Com os discípulos que seriam mais tarde seus apóstolos falou Jesus à parte, muitas vezes nestes dias, quando os outros não estavam presentes, às vezes caminhando ao redor com seus discípulos e com os convidados, enquanto ensinava, e estes futuros apóstolos comunicavam logo aos demais seus ensinamentos. Estas saídas e passeios serviam também para que pudessem fazer sem estorvo os preparativos das festas. Outras vezes ficavam os discípulos e ainda Jesus para os afazeres, ordenando isto ou aquilo, porque havia aqueles que tinham que dispor algumas coisas para o acompanhamento dos noivos. Jesus desejava que nesta festa solene se pudessem conhecer todos, parentes e amigos, e que todos os que até agora tinha escolhido estivessem reunidos e se conhecessem e tratassem abertamente.
Também na sinagoga, onde estavam reunidos os convidados, falou Jesus da alegria permitida e da alegria lícita, da sua significação, da sua medida, da sua seriedade, e da ciência que devia reger estes entretenimentos. Falou do matrimônio, do homem e da mulher, da continência e da pureza e das bodas espirituais. À conclusão deste ensinamento adiantaram-se os noivos e Jesus disse palavras de ensinamento e exortação a cada um em particular.
Ao terceiro dia da chegada de Jesus teve lugar o casamento, às 9 da manhã. A noiva foi vestida e adornada pelas moças: as suas vestes eram como as de Maria no seu casamento, como também a apresentação que lhe puseram, que era ainda mais rica. Seus cabelos não foram divididos em tranças finas, mas em linhas e grupos mais grossos. Quando seu ornamento estava completo, ela foi mostrada a Maria e às outras mulheres que estavam lá. Da sinagoga foram chegando as pessoas que deviam levar os noivos da casa à sinagoga. No cortejo haviam seis meninos e seis meninas que usavam coroas entrelaçadas; depois seis jovens e donzelas, mais crescidas, com instrumentos de música e flautas. Eles usavam nas costas algo como asas. Além disso, acompanhavam a noiva doze jovens como guias, e o noivo, doze jovens. Entre estes estava Obede, o filho de Verônica, os sobrinhos de José de Arimatéia, Natanael Chased e alguns dos discípulos de João; nenhum dos futuros apóstolos. O casamento foi realizado pelos sacerdotes diante da sinagoga. Os anéis que foram trocados foram recebidos pelo noivo como presente de Maria, e Jesus os abençoou nas mãos de Maria. Me causou admiração uma cerimônia que não vi nas bodas de Maria com José: o sacerdote feriu com um instrumento cortante no dedo anelar deixou pingar duas gotas do sangue do noivo e uma da noiva num copo cheio de vinho, que eles tomaram, dando depois o copo para os outros. Depois disso, algumas roupas de tecidos, vestidos e vários objetos foram distribuídos aos pobres.
Quando os casados foram acompanhados até sua casa, Jesus os recebeu ali mesmo. Antes da refeição do casamento eu vi todos os convidados novamente reunidos no parque. As moças e mulheres estavam sentadas sob um telhado de galhos e brincavam com frutas; tinham por sua vez um instrumento como uma tábua triangular sobre as saias com letras ou sinais nas bordas, e à medida que o sinalizador se movia como um ponteiro dos minutos sobre o quadro, eles tinham o direito de certos tipos e quantidades de frutas. (Uma espécie de roleta). Para os homens vi, disposto pelo próprio Jesus, uma espécie de jogo que me causava admiração. No centro da casa havia uma mesa redonda com muitas porções de flores, ervas e frutos dispostos nas bordas, em quantidade igual aos homens que jogavam. Estas frutas e ervas tinham sido ordenadas de antemão pelo próprio Jesus segundo a sua íntima significação para cada um dos presentes. Sobre a mesa havia um aparelho que consistia em um disco com um buraco. Quando o disco era movido por um jogador, onde o lugar marcado com o buraco era parado, sobre uma certa porção de fruta ou grama, esta era a ganho do jogador. No meio da mesa havia também uma videira cheia de uvas, sobre um feixe de espigas que a rodeava; quanto mais se girava a mesa, mais se levantava a videira e o feixe de trigo. Os futuros apóstolos não jogaram estes jogos, como tampouco Lázaro, e eu recebi a advertência e explicação: quem já tem vocação para ensinar ou sabe algo mais do que os outros, não deve jogar como os outros, mas observar o curso do jogo e animar os movimentos do jogo com úteis aplicações, para transformar o jocoso em algo útil e proveitoso. Mas havia neste jogo algo mais do que o acaso dos vencedores: as frutas ou objetos que tiravam na sorte correspondiam muito bem às suas qualidades boas ou más, E Jesus havia ordenado essas frutas de acordo com esse significado. Cada ganho estava ligado a um ensinamento de Jesus e eu via que realmente todos recebiam algo interior significado por esses frutos.
O admirável era que enquanto Jesus dizia essa palavra a cada um, este se sentia melhorado e advertido, seja pela Palavra de Jesus, seja pelo gosto do fruto que realmente passava com seu significado ao gustador; mas de tal maneira que os demais nada entendiam, e os comentários de Jesus só se festejavam como ditos para alegrar a concorrência. Cada um sentia um olhar profundo de Jesus em seu interior; da mesma maneira que Natanael o sentiu quando estava debaixo da árvore e que o feriu sem que os outros percebessem. Lembro-me bem que entre o que foi ganho por Natanael estava a planta reseda, e que Jesus disse a Natanael Chased: "Vês agora que eu estava certo em dizer que você é um verdadeiro israelita, sem falsidade?"
Um ganho me pareceu totalmente admirável e foi o do noivo Natanael, que ganhou uma sorte que consistia em um caule com dois frutos: um parecia mais um figo e o outro uma maçã serrilhada e oca. Era avermelhada, por dentro branca, com listras coloridas; destes frutos tenho visto no paraíso terrestre Lembro-me de que todos ficaram maravilhados quando o noivo ganhou este fruto, e que Jesus falou do casamento e da castidade, que era como um fruto múltiplo. Tudo isso ele disse de tal forma que ele não feriu as idéias que os judeus tinham do casamento, mas que alguns discípulos, incluindo Tiago, O Menor, que era essênio, entenderam mais profundamente. Vi que os presentes se maravilharam mais com esta sorte tocada aos recém-casados do que das demais. Jesus disse algo como:"poderiam esta sorte e estas frutas produzirem bens ainda maiores do que podem representar por si mesmas". Quando o noivo recebeu este fruto para si e para a sua noiva, e gostaram dele, vi que se comoveram no seu interior e empalideceram, e então vi uma nuvem escura sair de seus interiores, de modo que me pareceram então mais claros e transparentes em comparação com o que eram antes. A mulher, que estava um pouco longe dali com as mulheres, também empalideceu e teve como um desmaio ao saborear a fruta tocada em sorte, e vi sair também dela uma nuvem escura. Esse fruto dos recém-casados tinha relação com a virtude da castidade e continência. Neste jogo, além das sortes que cabiam a cada um, tinham os favorecidos que cumprir certas penitências ou satisfações. Assim vi que os recém-casados tinham que ir à sinagoga e trazer de lá algo cumprindo com a oração de algumas preces. A erva que Natanael chased contornou era uma planta azeda. Em todos os outros discípulos, que ganharam algumas dessas frutas ou ervas e gostaram delas, vi que suas próprias paixões se levantaram neles, resistiram algum tanto, e logo cederam em força ou encontraram-se com maior força as graças para resistirem a elas.

Reflexões sobre frutas e ervas. A comida do casamento.

Há um mistério sobrenatural em todas as frutas e ervas da natureza; mistério que depois da queda do homem se escureceu e ficou como um segredo natural para o homem. Desse mistério e de seus efeitos ficou nas frutas e ervas apenas uma ideia hoje em dia da importância, forma, sabor e efeitos naturais destas criações. Eu vi em minhas visões pôr sobre as mesas do céu estas frutas e ervas segundo a significação e propriedades que tinham antes da queda do homem; mas não o via tão claramente porque está tudo tão pervertido e transtornado em nosso ser e entendimento, que não podemos compreender estas coisas sobrenaturais em nosso presente modo de viver terreno.
Quando a mulher teve aquele desmaio causado pelo gosto da fruta, dela foram removidos alguns ornamentos do traje que eram muito pesados e também vários dos anéis que ela usava nos dedos. Entre outros, foi retirado um que tinha no dedo maior a forma de funil, que estava metido como um dedal. Também foram removidas correntes e broches dos braços e do peito para aliviá-la. Depois, não quis reter senão o anel que Maria lhe dera no dedo esquerdo e um pendente de ouro no pescoço que tinha a forma de um arco estendido. No meio deste ornamento havia uma massa um tanto escura, como no anel de Maria e José, e gravada uma figura lançada que olhava para um broto de flor que estava à sua frente.
Após esses jogos no jardim seguiu a refeição do casamento. O lugar era uma sala de luxo cujo interior havia sido dividido por divisórias em três departamentos, de tal forma que os convidados recostados nas mesas podiam ver uns aos outros. Em cada um desses departamentos havia uma mesa longa e estreita. Jesus estava na sala central, no topo da mesa, dando os pés para a lareira ornamentada. Nesta mesma mesa estavam Israel, o pai da noiva, os parentes de Jesus, da noiva e Lázaro. Nas mesas dos lados sentaram-se os outros convidados e os discípulos. As mulheres ocuparam um espaço atrás, para que pudessem ouvir todas as palavras de Jesus. O noivo servia nas mesas, embora houvesse um mestre-sala com um avental, que tinha sob seu comando vários servos. Nas mesas das mulheres serviam a noiva, ajudada por várias jovens. Quando os alimentos foram trazidos, apresentaram diante do Senhor um cordeiro assado: tinha as pernas amarradas em forma de cruz. Quando o noivo trouxe uma caixinha onde estava o trinchador, disse Jesus ao noivo que se lembrasse daquela refeição que haviam feito em sua infância depois da Páscoa, onde contou-lhe uma comparação de um casamento e disse-lhe que um dia estaria ele no seu próprio casamento. Isso se cumpriu, disse ele, no dia de hoje. O noivo ficou muito sério e pensativo com esta lembrança: tinha esquecido aquela lembrança de sua infância e as palavras ouvidas então. Jesus se comportou ali naequla refeição, como em todo o curso das festas, muito complacente e festivo, mas cheio sempre de ensinamentos. A cada cerimônia do banquete dava sua explicação espiritual. Falou da sã alegria e das expansões das festas: disse que um arco não deve estar sempre estendido e que a terra precisava de sua chuva para não secar. Ele disse isso em parábolas. Quando Jesus partiu o Cordeiro, disse coisas admiráveis. Falou, enquanto destrinchava, as partes do Cordeiro entre o redil, de sua eleição, não para o prazer, mas para morrer. Falou do assar-se, do deixar as impurezas pelo fogo da purificação e da seção de cada parte do Cordeiro; que assim deviam os que queriam seguir o Cordeiro despreender-se dos afetos carnais e dos parentes. Quando repartiu os pedaços e comeram, disse: "Para os que já estão afastados e separados das afeições da carne, será o Cordeiro um laço de ligação e uma refeição comum. Deve, aquele que segue o Cordeiro, renunciar ao seu campo, morrer às suas paixões, separar-se dos membros da sua família e tornar-se assim um alimento e uma refeição de união por meio do Cordeiro e com seu Eterno Pai".

Cada comensal tinha diante de si um prato e Jesus pôs uma fonte de cor escura com bordas amarelas que foi passando de um a outro. Eu via Jesus às vezes segurando uma erva na mão e dando algum ensino. Jesus tinha tomado a seu cargo a escolha do segundo prato da comida como também o vinho e tudo era preparado por Maria e Marta. Quando, pois, foi trazido o segundo prato, que consistia em aves, peixe e mel, frutas e uma espécie de bolos que Verônica trouxera, sobre elas levantou-se Jesus e repartiu estas em pequenas porções; depois voltou a sentar-se.
Os alimentos foram servidos, mas começou a faltar vinho. Jesus estava ocupado em ensinar. Quando viu, pois, a Virgem Maria, encarregada de procurar esta parte do banquete, que o vinho estava faltando, foi para onde estava Jesus e lembrou-lhe que Ele prometeu fornecer o vinho. Jesus, que naquele momento falava de Seu Pai celestial, respondeu a Maria: “Mulher, não se preocupe; não se preocupe e não traga isso a mim; ainda não chegou a minha hora”. Estas palavras não encerravam uma resposta dura a sua mãe Maria.
Ele disse "mulher" e não Mãe porque naquele momento, como Messias e filho de Deus, cumpria uma missão misteriosa diante dos discípulos e de todos os parentes e estava lá em sua grandeza divina. Nestes momentos em que Jesus como Verbo encarnado operava, aquele que foi nomeado pelo que era, era mais honrado e vinha a ser enfeudado em sua obra com ser chamado pelo que era, como uma dignidade e um cargo. Assim Maria era a mulher que tinha gerado aquele que ali estava e a quem se recorria pelo vinho, e queria dizer que ele era filho de Deus mais do que filho de Maria. Quando Jesus estava na cruz e Maria o chorava, disse ele: "Mulher, eis aí o teu filho", apontando para João. Quando Jesus disse que ele ia pensar no vinho, Maria fez seu ofício de mediadora e intercessora e lembrou-lhe a falta do vinho. O vinho que ele queria dar era mais do que o vinho em sentido natural: referia-se ao mistério do vinho que ele iria transformar em seu sangue. Por isso disse: "a minha hora ainda não é chegou"; primeiro, para dar o vinho que prometi; segundo, para que troque a água em vinho, e terceiro, para que mude o vinho no meu sangue.
A partir deste momento Maria já não se manifestou preocupada com a falta do vinho: tinha orado a Seu Filho e por isso disse aos servos: "Fazei tudo o que ele vos disser". Era o mesmo que quando a esposa de Cristo, A Igreja, pede: "Senhor, Teus filhos não têm vinho"; E Jesus responde a ela: "Igreja, não te preocupes; não percas a paz; a minha hora ainda não é vinda". Como se a Igreja dissesse aos seus sacerdotes: "Fazei tudo o que ele vos diz, pois ele vos há de ajudar". Maria, pois, disse aos servos que fizessem tudo quanto Jesus lhes dissesse.
Depois de um momento mandou Jesus aos servidores que o apresentassem recipientes vazios. Eles os trouxeram: eram três para a água e três para o vinho, e mostraram que estavam vazios, pois os viraram sobre uma fonte. Jesus mandou encher os seis com água; levaram-nos logo a um poço, que tinham numa espécie de caverna com uma piscina de pedra e uma bomba. Os recipientes eram grandes e pesados, de barro cozido. Se um estava cheio, eram necessários dois homens para levá-lo pelas alças. Eles tinham vários canos de cima para baixo cobertos com rolhas. Quando o líquido estava a uma certa altura, a outra rolha era aberta para aproveitar o restante. Estes recipientes não eram levantados para esvaziá-los, mas apenas um pouco inclinados, colocados sobre um pedestal. A resposta de Jesus foi em voz alta, assim como a ordem aos servos.
Quando estes vasos, cheios de água, foram levados à presença do mestre-sala, levantou-se Jesus e dirigiu-se para lá; abençoou os vasos, e quando se acomodou de novo em seu assento, disse: "servi-lhes e levai ao mestre um copo". Quando, pois, o mestre gostou do vinho, foi para onde estava o noivo e lhe disse: "É costume dar o melhor vinho no princípio, e quando os convidados são menos serenos, é dado do inferior; e agora é dado do vinho melhor". Ele não sabia que este vinho tinha sido provido por Jesus, Nem que tinha tomado a seu cargo toda esta segunda parte da refeição. Isto só sabiam os da Sagrada Família e a família dos casados. Quando tomaram do vinho o noivo e o pai da noiva, ficaram admirados, tanto mais que os servos disseram que eles tinham derramado só água nos vasos. Depois tomaram todos do vinho.
Não se produziu nenhum barulho pelo prodígio: só se notava uma silenciosa admiração em todos os convivas. Jesus ensinou muitas coisas a propósito deste prodígio. Ele disse, entre outras coisas: "o mundo dá aos seus seguidores primeiro vinho forte, para embebedar e privar de sentido ,e depois terminar com vinho ruim; mas o reino que meu Pai celestial me deu para fundar, não é assim. Aqui a água pura se converte em precioso vinho, ao modo que a tibieza do Espírito tem que se transformar em generosidade e zelo ardente". Falou também da comida que fez quando aos doze anos voltou do templo em companhia de alguns dos presentes e como então havia falado pão e vinho, e uma comparação sobre casamentos onde a água da tibieza se transformaria em vinho de entusiasmo e de fervor, e que isto acabava de se cumprir ali. Então ele disse a eles que veriam prodígios ainda maiores. Acrescentou que celebraria algumas páscoas e que na última delas se converteria o vinho em sangue e o pão em carne, e ele permaneceria com os homens até o último dos dias, para consolá-los e animá-los; também lhes disse que veriam nele coisas que, se as dissesse agora, não as podiam acreditar. Todas estas coisas ele não disse tão claramente, mas com parábolas veladas, que eu agora não me lembro, mas o sentido era o que eu disse. Eles ouviram com admiração e certa estranheza. Vi que todos, ao gostarem do vinho, ficaram como que mudados em seus sentimentos, não pela admiração ante o milagre, mas também por efeito do próprio vinho, como antes acontecera com o gosto das frutas: recebiam uma força interior e uma mudança saudável em seus afetos. Todos os seus discípulos, Seus parentes e todos os presentes estavam convencidos agora de seu poder, de sua dignidade e de sua missão sobrenatural eles acreditavam nele, e essa crença Nele se tornou geral. Todos se sentiram melhores e unidos aqueles que tinham gostado do vinho milagroso. Por isso foi considerada esta como sua primeira aparição solene em sua comunidade e este foi o primeiro prodígio e sinal que ele dava nela e para ela, fortificá-la na fé, e por isso se conta este prodígio como o primeiro em sua história, como a instituição da Eucaristia foi a última para aqueles que já acreditavam Nele.

Conclusão das bodas de Cana

Ao concluir a refeição de bodas, o noivo aproximou-se de Jesus sozinho, e falou com ele, cheio de humildade, e declarou-lhe: como todas as suas paixões se haviam apaziguado; e já não sentia desejos, e se propunha viver em continência com sua esposa, se ela o consentisse; e tendo vindo a esposa, dizendo o mesmo com Jesus, chamou-os a ambos e falou-lhes do matrimônio e da pureza que tanto agrada a Deus e dos frutos múltiplos da castidade e do Espírito. Falou de muitos profetas e de santos, pessoas que tinham vivido em castidade e tinham oferecido a Deus Pai a sua carne, e que estes adquiriam filhos espirituais, convertendo homens perdidos, os que haviam conduzido ao bem, e que esta descendência é santa e grande. Tudo isso ele explicou com parábolas de semear e colher. Eles fizeram então um voto de castidade e de viver como irmãos, pelo prazo de três anos. Ajoelharam-se diante do Senhor, que os abençoou.
Na noite do quarto dia das festas, ambos os cônjuges foram levados para sua casa com uma comitiva solene de convidados. Levavam uma espécie de candelabro com luzes diversas que formavam uma letra; à frente iam crianças carregando duas coroas de flores, uma fechada e outra as flores estavam abertas, e delas desprendiam flores diante da casa dos esposos. Jesus já estava na casa e os recebeu e os abençoou. Os sacerdotes estavam presentes, mas desde que viram a maravilha nos casamentos, mostraram-se humildes.
No sábado, Jesus ensinou na sinagoga de Caná por duas vezes.
Falou referindo-se às festas de casamento, à obediência e aos piedosos sentimentos dos esposos. Quando deixou a sinagoga, viu-se rodeado de pessoas que lhe pediam de joelhos que se compadecesse dos enfermos.
Ele operou aqui duas curas milagrosas. Um homem tinha caído de uma torre, tinha morrido, e teve todos os membros despedaçados. Jesus aproximou-se dele, ordenou-lhe os membros, tocou nas rupturas que apresentavam, e mandou-o levantar-se e ir à sua casa; o que ele fez muito alegre, depois de ter dado graças ao seu Salvador. Este homem tinha mulher e filhos. Foi levado também a um possuído do demônio que, estando furioso, tinha sido amarrado a uma pedra. Jesus o livrou do demônio e de suas amarras. Curou também vários gotosos e uma mulher hidrópica, pecadora. Foram sete os que ele curou. As pessoas não tinham podido vir antes para as festas de casamento e como ouviram dizer que depois do sábado se ia retirar dali, já não eles queriam parar mais. Os sacerdotes, depois que viram o milagre das bodas, deixaram-no agir, e estas curas se fizeram na presença deles. Os discípulos não estavam presentes.

Jesus em Cafarnaum e no Mar de Genesaré

Depois do sábado foi Jesus com seus discípulos de noite a Cafarnaum.
O marido de Caná, seu pai e outros o acompanharam por um trecho de caminho. Os pobres do lugar tinham recebido muito nas bodas de Caná: nada do que uma vez se apresentava à mesa era guardado, mas ia em seguida aos pobres. Vi que se cozinhava antes do sábado porque vinham dois dias de jejum. Apagava-se todo fogo e as janelas não absolutamente necessárias eram fechadas. As pessoas abastadas tinham lugares em casa onde mantinham os alimentos quentes sob as cinzas. Estes jejuns foram observados por Jesus em Cafarnaum, onde também ensinou na sinagoga. Duas vezes por dia lhe eram trazidos os enfermos, aos quais curava e consolava. Os discípulos de Betsaida voltaram para suas casas e em parte retornaram.
Jesus andava pelos arredores e ensinava; o resto do tempo passava com a mãe. André, Saturnino, Arão, Themeni e Eustáquio foram enviados por Jesus para onde João havia batizado, na grande fonte junto ao Jordão, para que ali batizarem. Jesus acompanhou-os um pedaço de caminho e dirigiu-se depois a Betúlia, onde ensinou e curou os enfermos. Dali foi caminhando sete ou oito horas na direção Noroeste de Cafarnaum até Hanathon, onde havia uma colina com lugar para ensinar. A colina tinha uma encosta que ia subindo por espaço de uma hora; sobre ela estava instalado um lugar para ensinar: um assento de pedra, rodeado de paliçadas, sobre as quais se podiam estender lonas para se proteger do sol e da chuva. Sob este teto cabia uma multidão de pessoas. Depois de cada aula, novos ouvintes vieram. Na encosta da colina havia outras três colinas, entre elas a das Bem-Aventuranças. De onde Jesus ensinava agora se descobria um grande panorama: o mar da Galiléia a seus pés e as proximidades de Nazaré. Esta montanha era parcialmente cultivada e semeada; a maior altura, onde Jesus ensinava, sem cultivo algum. Os arredores eram cercados por muralhas cujos restos estavam descobertos ainda naquela época: pareciam restos de torres. Nos arredores da montanha estavam as aldeias de Hanathon, Bethanat e Nejel, que davam a ideia de que em outros tempos podiam ter formado uma grande cidade.
Jesus tinha apenas três discípulos: um filho da tia do marido de Caná, um filho da outra viúva e um irmão uterino de Pedro, chamado Jonatan.
Estes chamaram as pessoas à montanha para que ouvissem a Jesus. Jesus falou dos diversos espíritos dos homens, de cada lugar, de cada família e do Espírito que receberiam pelo batismo, pelo qual eles estariam unidos em penitência, mortificação e reparação para se unirem ao Pai celestial. Disse-lhes como podiam saber em que grau receberiam o Espírito Santo no batismo. Ensinou também sobre o Pai Nosso. Admirou-me que tenha explicado cada um dos pedidos, sendo que ainda não tinha ensinado esta oração. Esses ensinamentos duraram do meio-dia até a tarde, quando ele desceu de lá e foi para Bethanat, onde passou a noite. A noite anterior foi passada em Hanathon.
No dia seguinte, seguiu em direção ao mar. Em Bethanat foram acrescentados outros cinco discípulos de João, que eram de Apheka, cidade natal de Tomé, no Mediterrâneo. Eles estavam há muito tempo com João. Ao meio-dia, vi Jesus com seus discípulos sobre uma colina, entre a foz do Jordão e Betsaida, a cerca de meia hora do lago. Eles tinham a vista do lago à sua frente e olhavam para Pedro, João e Tiago, sobre seus barcos no lago. Pedro tinha um barco grande, onde estavam vários de seus peões e ele navegava em outro menor governado por ele mesmo. João e Tiago tinham um barco grande e outros menores e estavam com o pai. Vi a pequena embarcação de André, entre as barcas do Zebedeu.
André estava neste momento no Jordão. Quando os discípulos viram os amigos no lago, quiseram ir chamá-los. Jesus disse-lhes para não irem.
Ouvi que diziam: "Como estes homens podem andar navegando e pescando, quando viram as tuas obras e ouviram os teus ensinamentos?"Jesus respondeu-lhes:" ainda não os chamei; eles têm um grande negócio e ocupação, especialmente Pedro, e muitos homens e famílias vivem desse emprego. Eu lhes disse que fizessem assim e se preparassem até que eu os chamasse. Ainda tenho muitas coisas para fazer até então e tenho que ir para a Páscoa em Jerusalém".
Na parte ocidental da montanha haviam vinte e seis quartos, a maior parte de pescadores e de camponeses. Quando Jesus entrou ali, clamou um possuído, que o seguia: "lá vai ele Lá vai aquele diante do qual teremos que fugir. Esse é o Profeta". Logo outras pessoas possuídas o cercaram, clamando e ficando com raiva. A multidão aumentou com os acompanhantes desses possuídos. Jesus ordenou-lhes que se calassem e o seguissem. Assim subiu a montanha e começou a ensinar. Havia mais de cem pessoas entre os possuídos e seus acompanhantes. Ele falou dos espíritos malignos, de como eles deveriam ser combatidos e da melhoria da vida. Os possuídos foram libertados: Eles se acalmaram, choraram, agradeceram e disseram que não sabiam o que havia acontecido com eles. Essas infelizes foram trazidas de vários lugares desta região, porque o povo tinha ouvido falar que o Profeta estava chegando, tão santo quanto Moisés. Eles teriam perdido Jesus se um deles não tivesse se soltado e gritado com o Profeta.
Jesus voltou para onde estava Sua santa Mãe, entre Betsaida e Cafarnaum. A primeira dessas cidades estava perto desta montanha, um pouco mais ao Norte.
À tarde, como se aproximava o sábado, Jesus ensinou na sinagoga de Cafarnaum. Celebraram outra festa especial referente a Tobias, que havia estado lá e tinha feito muito bem à região. Tinha deixado bens à sinagoga e à escola; por isso Jesus falou também do dever da gratidão.
Depois do sábado, reuniu-se novamente com sua mãe, com quem se divertiu a sós ainda parte da noite. Ele falou de suas futuras viagens; que agora estava indo para o Jordão, para Jerusalém para a Páscoa, e que mais tarde chamaria os apóstolos e começaria sua vida pública abertamente. Disse que em Nazaré o perseguiriam. Aludiu à sua futura obra e missão, e de que modo ela e as outras santas mulheres deveriam tomar parte em tudo. Havia então na casa de Maria uma velha, a mesma pobre viúva que fora enviada por Santa Ana à gruta de Belém. Ela já era tão velha que, em vez de servir a Maria, era cuidada por ela.
Com oito discípulos, Jesus foi para o Jordão. Começaram a caminhar antes do nascer do sol para o leste do lago e chegaram de novo à colina de onde viram os barcos dos futuros apóstolos. Para passar o Jordão, que corria em um leito profundo, eles atravessaram uma ponte íngreme meia hora antes do rio se lançar no lago. Do outro lado, em um canto em direção ao mar, havia uma pequena vila de pescadores, onde se via muitas redes estendidas: era chamada de pequena Corazín. Uma hora de caminho para o Norte era Betsaida-Julias. Corazín a Grande ficava a algumas horas a leste do mar. Lá vivia o publicano Mateus. Jesus andou pelo leste do rio para cima e ficou em Hippos naquela noite. Na manhã seguinte, passou por Gadara; livrou um endemoninhado perto da cidade. Ele havia sido trazido para lá arrastado, amarrado com cordas; este soltou-se e clamou furioso atrás de Jesus: "Jesus, Filho de Davi; Jesus, Jesús para onde queres ir? Queres expulsar-nos?"Jesus ordenou ao demônio que se calasse e saísse do homem e para onde deveria ir.
A poucas horas de Gadara, Jesus se aproximou do Jordão, passou para o outro lado e dirigiu-se para o Ocidente, deixando Scythopolis à esquerda. Chegou, através do monte Hermom, a Jezrael, cidade a oeste da planície de Esdrelon.
Ali Jesus curou publicamente muitos enfermos diante da sinagoga; contudo, parou apenas algumas horas. Madalena, que a súplicas de Marta tinha chegado a esse lugar para ver Jesus, já não o encontrou. Só ouviu apregoar as maravilhas pela boca dos enfermos curados. Lá as duas irmãs se separaram, e Madalena voltou para seu castelo de Magdala. Depois vi Jesus em Hay, não muito longe de Betel e do lugar do batismo, distante nove horas. Esta aldeia havia sido destruída e depois reconstruída, menor; estava bastante escondida. Jesus ensinou e curou alguns doentes.
Entre os fariseus do lugar havia alguns dos que estavam presentes quando Jesus, Menino de doze anos, se divertiu no templo. Estes falavam do caso e interpretavam como uma hipocrisia de que ele então se colocara em terra entre os discípulos numa sinagoga de sábios e disputado com eles, perguntando aos mestres como se quisesse saber o que devia fazer contra seus contrários; por exemplo: "O que pensais vocês disto?
Ensinem-nos. Quando virá o Messias?" Que com essas e outras perguntas ele os atraiu e bajulou, e então fingiu saber tudo melhor do que eles.
Lhe perguntaram se por ventura não era ele aquele menino de então.

Jesus manda batizar no Jordão

De Hay partiu Jesus para o antigo lugar do batismo de João, a três horas de Jericó, junto ao Jordão. André e outros discípulos saíram ao encontro dele a cerca de uma hora do caminho. Estavam alguns discípulos de João e outros vindos de Nazaré. Alguns foram ao pequeno lugar chamado Ática, a uma hora do lugar do batismo, para avisar que Jesus celebraria o Sábado ali e curaria os doentes. Diziam ao povo que Jesus completava os ensinamentos de João fazendo-o com mais força e clareza, depois de João ter posto os fimdamentos da doutrina.
Diante de Ono tinha Jesus preparado um albergue próprio a meia hora de distância do lugar do batismo. Lázaro o tinha comprado, pondo um homem para que recebesse a Jesus e aos seus e lhes preparasse a comida.
Este albergue servia para quando Jesus andasse por estes contornos e dali podia ir pelas comarcas vizinhas para ensinar e batizar.
Quando chegou no Sábado a Ono, ensinou na sinagoga e curou muitos enfermos, entre eles uma mulher contraída e com fluxo de sangue. Herodes tinha encontrado com frequência nestes últimos tempos com João, o qual sempre o tratou como adúltero, não dissimulando seu pecado. Herodes sentia sua culpa em seu interior; mas a mulher estava raivosa contra João. O Batista falava sempre de Jesus: não batizava mais ninguém, e os mandava para o outro lado do Jordão, onde estavam Jesus e seus discípulos. Pelos discípulos mandados de Caná ao lugar do batismo, por ordem de Jesus, haviam-se mudado ali muitas coisas, e em tudo se procedia agora com maior solenidade e ordem do que nos tempos de João. A passagem do rio tinha sido feita por outro lugar mais afastado pela multidão que acudia e a fonte e o resto feito por João tinha sido removido. O lugar onde André, Saturnino e outros discípulos batizavam agora por ordem de Jesus, era o mesmo onde Jesus foi batizado, a pequena ilha surgida no Jordão, na qual se erguera um amplo pavilhão. Enquanto Jesus ensinava e preparava as pessoas, esses apóstolos batizavam. Também a fonte onde Jesus tinha sido batizado, tinha sido reformada: os cinco canais ocultos que traziam a água do Jordão, estavam agora descobertos, e as quatro grandes pedras, removidas, como também a pedra triangular erande, com veios avermelhados, onde Jesus estivera parado durante Seu batismo, quando o Espírito Santo desceu sobre ele. Todas essas pedras foram transferidas para o novo local.
Só Jesus e João sabiam que o lugar do batismo assinalava o lugar da Arca da Aliança e que as pedras que estavam na fonte eram aquelas onde a Arca havia descansado no Jordão. Nem Jesus nem João falaram disso aos discípulos. Da mesma maneira só Jesus sabia que as pedras eram as que formavam agora o fundamento do novo Batistério. Os judeus haviam esquecido há muito tempo o local exato onde essas pedras estavam e nada foi dito aos discípulos. André tinha cavado naquela pedra triangular uma fonte redonda, que repousava sobre as quatro pedras num poço cheio de água, rodeando a pedra triangular como uma cerca de água. Nestas águas havia se misturado a água do batismo de Jesus. A água da pedra triangular era da mesma procedência, e Jesus a abençoara. Quando os batizandos desciam à água, na cerca ao redor da pedra triangular, a água chegava até o peito. Ao lado deste Batistério havia uma espécie de altar e em cima vestes brancos para os batizandos. Dois discípulos colocavam as mãos no ombro do batizando, e André ou Saturnino, e às vezes outro dos discípulos batizava com a água retirada da bacia da pedra com a mão oca, derramando-a por três vezes, sobre a cabeça do batizando, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.
Os que batizavam e os que colocavam as mãos sobre os ombros, usavam longas vestes brancas, com correias; dos ombros deles pendiam longas faixas brancas, uma espécie de estolas. O batismo com trina imersão eu vi começar apenas no Lago de Bethesda. Sobre a fonte do batismo no teto havia uma abertura; o batizador e os padrinhos estavam colocados no ângulo da pedra; o batizando para os lados. Jesus ensinava, entretanto, num sitial levantado, e quando o calor o tornava necessário, erguia-se um toldo no lugar. Pregava sobre o batismo, a penitência, a proximidade do reino de Deus e do Messias; e onde tinham que procurá-lo e reconhecê-lo, não entre os grandes e poderosos, mas entre os pequenos e os pobres. Chamava a este batismo, uma purificação; ao batismo de João, de penitência; e falou de outro batismo, de fogo e do Espírito, que seguiria a estes. As árvores e arbustos que João plantara ao redor da ilha do batismo de Jesus haviam crescido: suas folhas se uniam em forma de pavilhão. A árvore da fonte emergia bonita e crescida. Sobre o cálice do mesmo vi que tinham posto uma figura que representava um menino, com os braços estendidos, que parecia nascer de uma videira, e que com uma mão distribuía maçãs amarelas e com a outra, flores cor-de-rosa. Era um resto dos adornos do batismo de Jesus.
Jesus dirigiu-se com alguns discípulos para o Meio-dia, a oeste do Mar Morto, e ele internou em uma região onde Melquisedeque havia parado quando mediu o Jordão e as montanhas circundantes. Melquisedeque tinha trazido para este lugar antepassados de Abraão muito antes de ele nascer. Sua cidade afundou com Sodoma e Gomorra. Ainda podiam serem vistas as ruínas das muralhas e torres do que foi a sua cidade destruída de Hazezon-Thamar. Toda esta região era agora um condado, com rochas negras e cavernas escuras, lugares estéreis, que se estendiam a cerca de meia hora do Mar Morto, dentro da comarca. Onde agora o Mar Morto estava, antes do afundamento daquelas cidades perversas, o Rio Jordão. Sua largura era de cerca de um quarto de hora. As pessoas que habitavam este lugar não eram judeus de raça, mas escravos de outros povos que passaram por ali, ocupados agora nos trabalhos do campo; habitavam em cavernas entre os muros ruinosos. Eram muito pobres, desprezados, abandonados pelos outros, e mostravam-se humildes. Consideravam uma graça não merecida a visita de Jesus. Receberam-no cheios de afeto e de amor, E Jesus curou muitos doentes.
Atualmente vi esta região em melhor estado do que nos tempos de Jesus Cristo; mas primitivamente era uma região fértil e sobremaneira formosa. Nos tempos de Abraão tornou-se, com o aparecimento do Mar Morto, uma região desolada e deserta o que era uma das regiões mais belas da Palestina. Uma fileira de aldeias estava alinhada nas margens do então Rio Jordão, contido por muralhas de pedra, e belas colinas eram vistas. Tudo estava coberto de vegetação: vinhas, tamareiras, árvores frutíferas e campos de trigo. Não era possível descrever a beleza daquela região antes do Mar Morto. O Rio Jordão estava dividido em dois braços antes que existisse o Mar Morto, debaixo dessas desaparecidas cidades: um se dirigia para o todo tipo de águas, e o outro para o deserto, onde ocorreu a fuga para o Egito, fluindo até a região de Mará, onde Moisés adoçou as águas e de onde eram os antepassados de Santa Ana. Entre aquelas cidades havia minas de sal; mas as águas eram doces e brotavam muitas fontes naturais. Longe, no deserto, eram bebidas as águas do Jordão e tidas em honra e reverência. Os antepassados de Abraão, que Melquisedeque havia transferido para lá, já estavam bastante decaídos, e Abraão foi por outra graça de Deus tirado de entre seus parentes e levado para a terra prometida. Vi aqui Melquisedeque, antes que existisse o Jordão: ele tudo media e determinava os lugares e as lcgalizações. Eu o via ir e vir; às vezes ele trazia alguns homens que eram como seus servos.
Depois disso, vi Jesus caminhando com seus discípulos em direção de Belém, através de um trecho do Vale dos pastores, em direção a Bethabara, a três horas do local do batismo. Ele já havia estado neste lugar quando visitou os pastores, depois de Seu batismo. Os habitantes viviam dos viajantes que em caravanas atravessam a região; ficava a quatro horas de Betânia, nos confins de Judá e Benjamim. Havia neste lugar muitos endemoninhados, que corriam clamando, quando Jesus se aproximou. Jesus ordenou-lhes que se cobrissem, e em poucos minutos todos se vestiram de folhas. Jesus curou-os, livrou-os e mandou as pessoas do lugar que lhes trouxessem vestes para se cobrirem melhor. Entre estes endemoninhados vi alguns que eram subidos ao alto por força invisível. André e outros cinco discípulos haviam chegado antes a este lugar e anunciado que Jesus celebraria o sábado com eles. Ele foi alojado em uma pousada para si e para os seus, como havia frequentemente certos lugares para professores e rabinos que passavam ensinando. Lázaro, José de Arimatéia e outros chegaram de Jerusalém.

Jesus ensinou na sinagoga, em um lugar aberto e em vários caminhos. Havia muitas pessoas que não podiam frequentar o ensino da escola. Curou também muitos enfermos de diversas classes. Os discípulos os traziam e lhes faziam lugar no meio da multidão. A certa distância estavam Lázaro e José de Arimatéia. Para a conclusão do sábado foi Jesus com os seus até Ono. Seguiu o caminho do pequeno povo Betagla, o mesmo que fizeram os filhos de Israel quando passaram o Jordão; pois não andaram por um só lugar, mas eles passaram a uma grande largura através do leito do rio enxuto. Quando chegaram, arrumaram os vestidos, prendendo as correias.
Jesus chegou à Pedra da Arca, onde João havia celebrado a festa dos Tabernáculos. Lázaro e José de Arimatéia voltaram para Jerusalém. Não estava Nicodemus: mantinha-se mais oculto por causa do seu emprego; servia em segredo a Jesus e aos seus discípulos, e avisava-lhes tudo o que tramavam os inimigos do Senhor.
Um dia depois vi que era a festa do novilúnio. Em Jerusalém todos os trabalhadores e empregados tinham um feriado e de alegria; como era dia de descanso também não se batizou. Nos telhados das sinagogas penduravam, durante o novilúnio, bandeirinhas em longas varas. Eram tecidos que tinham nós em determinados lugares para que o vento pudesse soprar para dentro e inchá-los como balões. Pelo número dos nós das bandeiras avisava-se aos distantes em que número do novilúnio se estava.
Bandeiras semelhantes vi também erguidas em sinal de vitória ou de algum perigo. Jesus preparou para o batismo muitas pessoas que se tinham reunido desde o dia anterior, e se estabeleceram nos arredores. Hoje também não foi batizado porque foi ordenado um dia de festa pela morte de um rei ímpio (Alexandre Janeu). O Batistério pareceu ornamentado e bonito.
No dia seguinte, André e os outros discípulos começaram a batizar aqueles que Jesus havia preparado no dia anterior. Jesus caminhou com Lázaro, que havia voltado com Obede, filho de Simeão, desde o dia anterior à tarde e com este desde o lugar do batismo, pela manhã cedo para a comarca de Belém, entre Bethagla e Ophra, mais a oeste. Jesus tomou este caminho porque Lázaro queria dizer-lhe o que em Jerusalém se dizia dele, e porque queria dar-lhe normas e por meio dele aos outros. Assim chegaram ao caminho de José e Maria, quando iam a Belém, a cerca de três horas até uma fileira de cabanas de pastores em uma região isolada. Lázaro referiu-se a Jesus o que se dizia dele em Jerusalém; o que falavam, em parte irritados, em parte zombando, e em parte curiosos; queriam ver se para a Páscoa ia às festas; se então seria tão ousado com seus milagres em uma grande cidade, como o fazia entre os ignorantes das aldeias. Contou-lhe também o que osr fariseus de diversos lugares diziam dele e da espionagem que exerciam. Jesus tranquilizou-o de todas estas coisas e apontou-lhe nos profetas as passagens em que tudo isto estava predito. Disse-lhe que ele ainda estaria oito dias pelo Jordão e depois voltaria para a Galiléia, e que na Páscoa iria a Jerusalém e chamaria logo aos seus discípulos.
Falando de Madalena, consolou-o, dizendo-lhe que já uma centelha de salvação havia acesa nela, que logo a inflamaria completamente. Passaram o dia entre as cabanas dos pastores, que os festejaram com pão, mel e frutas. Viviam cerca de vinte mulheres idosas, viúvas dos pastores, com alguns filhos já crescidos que as ajudavam. Seus aposentos eram celas separadas por ramagens que ainda cresciam, e entre elas estavam algumas pessoas que haviam ido à manjedoura de Belém para adorar o Menino Jesus e oferecer-lhe dons. Jesus ensinou ali e visitou as várias dependências curando algumas doentes. Uma delas era muito velha e magra; morava em uma pequena cabana e estava deitada sobre um jargão. Jesus a levou pela mão para fora. Essas velhinhas tinham um lugar comum para comer e rezar.
Lázaro e Obede voltaram para Jerusalém. Jesus visitou e curou alguns doentes na região e por volta das três da tarde voltei a vê-lo no lugar do batismo.

Jesus em Adummim e Nebo

Jesus andou com a maioria de seus discípulos através de Bethagla até Adummim. Este lugar era como se escondido em um condado selvagem cheio de ravinas e rochas, onde a estrada às vezes era tão estreita que mal podia passar por ela um burro. Estava a cerca de três horas de Jericó, nos confins de Benjamim e de Judá; tão oculto é o lugar que eu não o tinha visto antes. A cidade é construída em uma encosta íngreme. Tinha sido um refúgio de criminosos que podiam procurar ali proteção contra sentenças de morte. Eram vigiados até a sua melhoria ou empregados como escravos nas obras públicas. Chamava-se por isso o lugar dos réus ou dos sanguinários. Estas cidades de refúgio existiram desde os tempos de Davi. Terminaram de sê-lo depois de Jesus Cristo, nas primeiras perseguições dos fiéis. Mais tarde existiu ali um convento edificado pelos irmãos do Santo Sepulcro. As pessoas viviam ali da vinha e da fruta. Apresentava o aspecto de uma região selvagem, com rochas nuas de vegetação; às vezes caíam grandes pedaços de pedras arrastando os vinhedos das encostas. O caminho próprio de Jericó para Jerusalém não passava por ali, mas para o Ocidente de Adummim, por cujo lado não se podia entrar na cidade. Um caminho do Vale dos pastores para Jericó, a cerca de meia hora de Adummim, atravessava o caminho de Betagla para Adummim. Nas proximidades desta trilha havia uma passagem muito perigosa e estreita. Via-se um lugar assinalado com um assento de pedra, onde muito antes de Cristo havia acontecido na realidade o que Jesus contou como uma parábola do samaritano caridoso e do homem caído nas mãos dos ladrões.
Quando Jesus estava indo para Adummim, afastou-se um pouco do caminho e sobre aquele assento de pedra ensinou aos discípulos e aos que se haviam reunido o fato que ali havia acontecido há muito tempo. Ele celebrou o sábado em Adummim e ensinou na sinagoga com parábolas que se referiam à província das cidades de refúgio para os criminosos e aplicou-a ao tempo de penitência para os homens durante a vida. Ele curou vários doentes, especialmente hidrópicos. Depois do sábado voltou com seus discípulos ao lugar dos batismos. Pela tarde do dia seguinte foi para a cidade de Nebo, que ficava do outro lado do Jordão, ao pé do monte Nebo, que tinha uma encosta de várias horas a caminho. Haviam chegado mensageiros pedindo a Jesus que fosse ensinar e curar os enfermos. Ali viviam pessoas de todas as partes: egípcios, israelitas que se tinham manchado com a idolatria e moabitas. Tinham reagido com a pregação de João; mas não ousavam passar ao lugar do batismo de Jesus. Creio que não lhes era permitido ir para lá: eram desprezados pelos demais israelitas, não me lembro por qual dos pecados de seus antepassados, e por isso não podiam ir a qualquer lugar, mas apenas a alguns lugares. Eles vieram humildemente a Jesus e pediram que ele os batizasse. Os discípulos levaram consigo água da fonte batismal num odre; no batistério ficaram alguns para vigiar. Nebo era separado por uma montanha de meia hora do Jordão e de Macherus, cerca de cinco ou seis horas. Tinha um terreno estéril. Para chegar lá era preciso subir pela outra margem do Jordão. A margem em frente ao lugar do batismo era íngreme, como uma montanha, e não havia como descer. Além desta montanha era Nebo. Existia ali um templo de ídolos, mas estava fechado e parecia mal construído. Jesus preparava ao ar livre os batizandos de um assento de ensino e os discípulos batizavam. A banheira estava colocada sobre uma cisterna de banho onde os batizandos entravam; estava cheia de água até uma certa altura. Os discípulos tinham levado consigo as vestes brancas para os batizandos: levaram-nas embrulhadas e enroladas em torno do corpo.
No batismo as colocavam aos neófitos e as camisolas flutuavam na água.
Depois do batismo, pendurava-lhes uma espécie de manto. Onde João batizava era esta uma espécie de estola, larga como um guardanapo. Aqui era mais um cobertor ao qual uma estola com franjas era costurada. A maioria dos batizados eram crianças e anciãos, porque muitos foram rejeitados para que se melhorassem primeiro.
Jesus também curou vários doentes de febres e hidrópicos, que haviam sido trazidos em macas. Não havia entre os pagãos tantos endemoninhados como entre os hebreus. Jesus abençoou a água que tomavam, que não era boa, mas turva e salobra, recolhida nas rochas da montanha. Havia um recipiente que era preenchido com mangueiras. Jesus o abençoou em forma de cruz e parou com a mão sobre alguns pontos da superfície.
Na volta ao albergue de Ono permaneceram Jesus e seus discípulos a maior parte do dia no caminho de Nebo para a passagem do Jordão. Jesus ensinou ali onde havia muitas cabanas, cujos habitantes tinham seus frutos e seu vinho espremido para vender aos transeuntes. Jesus voltou à tarde com seus discípulos para seu abrigo perto do local do batismo. Foi depois passando pelos arredores vários grupos de camponeses e reunia as pessoas para doutriná-las. Havia boas pessoas que, durante o tempo em que João estava lá batizando, forneciam alimentos aos que vinham de longe. Pareceu que Jesus desejava visitar até os lugares mais pequenos desta região, pois logo se ausentaria para a Galiléia. Esteve também com um rico camponês, a meia hora de Ática, cujas posses cobriam quase todo o monte. Ali estava um campo em um dos lados do qual ainda estava sendo colhido, enquanto no outro estava começando a ser semeado. Ali Jesus expôs uma parábola sobre a semeadura e a colheita. Havia uma cadeira muito antiga para ensinar nos tempos dos profetas. Os camponeses a organizaram muito bem, e sobre esse assento estava agora Jesus ensinando. Outros lugares semelhantes de pedra foram restaurados ali desde a pregação de João. João o impusera às nações, pois isso também pertencia à sua missão de preparar o caminho do Messias. Estas tribunas de ensino do tempo dos profetas tinham ficado em desuso e em ruínas, como entre nós acontece com muitas estações da Via Crucis. Elias e Eliseu tinham estado muitas vezes nestes lugares.
Jesus queria celebrar o sábado na amanhã. A esta festa seguia outra que se referia aos frutos da terra, porque vi levar às sinagogas e às casas dos tribunais muitos cestas de frutas. No lugar do batismo tudo estava sendo ordenado e as coisas eram guardadas para o descanso dessas festas. Onde estava a pedra que assinalava o lugar da Arca, ergueram-se cerca de vinte casinhas. Bethabara não ficava à beira-mar, mas a meia hora de distância; mas dali ela erae vista muito bem. Da passagem do rio até o lugar onde João batiza agora, sobre Bethabara, havia uma hora e meia de caminho. Vi Jesus andar de casa em casa. Não sabia eu porquê, mas mais tarde ouvi que tinha este andar relação com os dízimos, exortando ele às pessoas a darem as esmolas que se costumavam fazer nas festas dos frutos.
À tarde, ele celebrou a festa de sábado na sinagoga, onde ensinou.
Depois começaram os preparativos para a festa dos novos frutos do ano. Era uma festa tripla; primeiro, porque entrava agora a seiva nas árvores; segundo, porque se entregava o dízimo dos frutos, e terceiro, agradecia-se pelos frutos recebidos. Sobre estas coisas versou a pregação de Jesus. Comiam-se muitas frutas e ofereciam-se aos pobres diversas figuras formadas com frutas dispostas sobre as mesas. Até ali, haviam mais vinte discípulos que seguiam Jesus.

Jesus em Phasael. Cura a filha de Jairo. Primeiro encontro com Madalena

Ao fim da festa Jesus deixou Ono com cerca de vinte discípulos e foi para a Galiléia. Entrou naquelas cabanas de pastores onde José e Maria em sua viagem a Belém haviam sido duramente rejeitados. Ali Jacó tinha seus campos de pastoreio. Jesus visitou os albergues dos bons e ensinou lá. Nos maus, passou a noite admoestando-os. A mulher ainda vivia e Jesus a curou de sua enfermidade. Passou então por Aruma, onde já havia estado antes.
Jairo, um descendente do essênio Chariot, que vivia na aldeia de Phasael lugar desprezada pelos demais, e que tinha pedido a Jesus que curasse a sua filha enferma, enviou um mensageiro para recordar a Jesus a sua promessa de ajuda.
Sua filha havia morrido. Jesus mandou seus discípulos continuarem seu caminho e os citou para se encontrarem em um determinado lugar. Ele seguiu o mensageiro à casa de Jairo, em Phasael quando Jesus chegou à casa estava a filha, já falecida, preparada para o enterro, envolta em tecidos e ligaduras e rodeada de todos os familiares, que se lamentavam. Jesus fez reunir outros do lugar e mandou desatar as ligaduras e os tecidos, tomou a morta pela mão e mandou-a levantar-se. De repente, levantou-se viva e ergueu-se em seu leito. Era uma jovem de dezesseis anos. Não tinha sido boa; não amava seu pai, que a amava sobre todas as coisas; queixava-se dele porque socorria os pobres e se juntava aos desgraçados. Jesus a ressuscitou de corpo e alma. Mudou de vida e juntou-se mais tarde com as santas mulheres.
Jesus exortou a todos a não falar deste prodígio; por isso não quis ter ao seu lado os seus discípulos. Este Jairo não era o de Cafarnaum, cuja filha ressuscitou mais tarde Jesus, segundo narra o evangelho.
Jesus deixou este lugar, dirigiu-se ao Jordão, passou o caminhou pela Pereia, ao Norte; chegou a Sukkote, ao Ocidente do rio, e foi a Jezrael. Em Jezrael ensinou e operou muitos prodígios na presença das grandes multidões que se tinham reunido. Todos os discípulos da Galiléia tinham vindo ao seu encontro. Natanael Chásed, Natanael De Cana, Pedro, Tiago, João, os filhos de Maria de Cléofas, todos estavam ali.
Lázaro, Marta, Seráfia (Verônica) e Joana Chusa, que tinham saído de Jerusaien, tinham visitado Maria Madalena em Magdala e lhe tinham dito que fosse a Jezrael para ver, se não para ouvir o prodigioso, sábio, eloquente e admirável Jesus, de quem todo o país estava falando com admiração.
Madalena quis agradar as santas mulheres e com muito adorno e muita pompa as acompanhara até ali auando, através de uma janela da pousada, onde se hospedava, viu Jesus caminhando pelo caminho com seus discípulos, Jesus dirigiu-lhe um olhar sério, que entrou em sua alma e a cobriu de tanta vergonha e confusão, que saiu do albergue e foi para uma casa de leprosas onde havia mulheres com fluxo de sangue, numa espécie de hospital a cargo de um fariseu. Ele fez isso impulsionado por uma sobrenatural repulsa de sua pessoa e a visão interior de sua miséria. As pessoas do albergue que a conheciam disseram: "ali cabe a ela estar, entre leprosas e doentes de fluxo de sangue". Madalena tinha corrido para a casa das leprosas para se humilhar, tanto lhe tinha ferido o olhar de Jesus! Pediu para si, por vaidade e para não se juntar a outros pobres, um albergue especial e não o comum das outras mulheres. Lázaro, Marta e as outras mulheres voltaram com ela a Magdala e celebraram ali o sábado, pois havia ali uma sinagoga.

Jesus em Cafarnaum e Gennebris

Por volta da tarde, Jesus chegou a Cafarnaum para o sábado. Antes tinha visitado sua mãe Maria. Ensinou e abrigou-se na casa que pertencia ao noivo de Caná. Todos os discípulos estavam reunidos. No sábado ensinou até a conclusão da festa. Muitos doentes e endemoninhados haviam-lhe sido trazidos de todos os lugares do país. Ele os curou em público, diante de seus discípulos, e expulsou os demônios assediados pelas multidões. Os mensageiros de Sidom vieram suplicar-lhe que fosse visitá-los. Ele recusou. As pessoas de Cesárea de Filipe vieram e convidaram-no com instância.
Ele os consolou com esperança para mais tarde. A multidão cresceu tanto que Jesus deixou Cafarnaum depois do sábado com alguns discípulos e se escondeu na montanha, quase uma hora ao Norte da cidade, entre o mar e a entrada do Jordão, onde havia muitos barrancos. Ele permaneceu escondido, entregue à oração. Era a mesma montanha onde ele, vindo de Betanate com seus discípulos, tinha visto no mar os barcos de Pedro e do Zebedeu de uma colina. Os discípulos que tinham estado com Jesus entraram nas casas dos pescadores e contaram coisas de Jesus.
André permaneceu em Cafarnaum e contou e ensinou o que ouvira de Jesus às multidões que se tinham reunido.
À tarde, Jesus foi à casa de sua mãe, entre Cafarnaum e Betsaida. Tinham-se reunido Lázaro, Marta e as outras mulheres que vinham de Magdala: vinham despedir-se e marchar para Jerusalém. Jesus os consolou a respeito de Madalena. Disse que Marta estava desolada demais; que Madalena já estava comovida; que ainda cairia miseravelmente. Não deixara ainda seus adornos vãos; declarara que não podia resolver-se a vestir-se tão pobremente como as outras mulheres, mas que devia fazê-lo de acordo com sua condição.
Quando, depois, veio um dia de jejum pela mueta de um homem que, contra a proibição, tinha feito colocar figuras no templo, ensinou Jesus de novo em Cafamaum. De novo trouxeram - lhe muitos enfermos, dos quais curou muitos. Novos Mensageiros vieram para convidá-lo a ir com eles para outras regiões. Havia ali alguns fariseus maliciosos que o contradiziam e lhe perguntavam aonde ia parar tudo isto. "Todo o país está alvoroçado por sua causa e não deixa de ensinar em público e se estende a cada dia sua fama". Jesus rejeitou-os com severidade e disse-lhes que ensinaria publicamente e começaria também a agir à vista de todos. À tarde, começou um dia de jejum pela extirpação da tribo de Benjamim pelas outras tribos por causa de uma maldade e escândalo. Vi que este dia de jejum foi observado com mais rigor na região de Phasael, onde Jesus havia estado há pouco tempo pela ressurreição da filha de Jairo, também em Aruma, Gibeia, porque o fato tinha ocorrido por ali. Vi que as santas mulheres ofereciam um sacrifício especial e tomavam parte no ato com mais esmero.
De Noite, Jesus foi levado por Natanael Chased, com André, Pedro e os filhos de Maria de Cléofas e de Zebedeu, para Gennebris, onde Natanael residia. Lá ele havia preparado um albergue para ele. Ele não entrou na casa de Natanael, embora eles passaram por ele e estava fora da cidade. Natanael, o de Cana, e sua mulher estavam neste momento em Cafarnaum e Jezrael. O local do batismo em Ática, era vigiado por turno pelos habitantes do local.
Jesus ensinava e curava os endemoninhados em Gennebris. Atravessou o lugar um caminho de mercadores. As pessoas não eram tão simples como as da margem do lago; que, embora não contradisessem abertamente, recebiam com frieza os seus ensinamentos. Además dos futuros apóstolos esteve em Gennebris também Jônatas, irmão uterino de Pedro; os demais foram distribuídos por Cafarnaum e Betsaida, para contar tudo o que tinham visto e ouvido de Jesus de Nazaré. De Gennebris foi Jesus com seus futuros Apóstolos a Betúlia, a três horas de Gennebris, a cinco de Tiberíades e não muito longe de Jezrael. A cidade estava situada na encosta do Monte íngreme que parecia querer cair e se via ruínas tão largas de antigas muralhas que podiam passar carros sobre eles. O caminho dali para Nazaré passava pelo monte Tabor, do qual ficava a poucas horas de distância a Sudeste. Natanael Chased entregou seu emprego em Gennebris a seu primo-irmão e quis seguir Jesus. Entrando em Betúlia, os endemoninhados saíram ao caminho, clamando. Ao chegar ao mercado da cidade, Jesus parou em um assento de ensino e ordenou a alguns discípulos que pedissem ao chefe da sinagoga que abrisse por todos os lados as portas, enquanto outros discípulos iam de casa em casa chamando o povo para o ensino. A sinagoga tinha várias portas entre colunas que costumavam ser abertas nas grandes multidões. Jesus ensinou ali sobre o verdadeiro grão de trigo que deve ser colocado na terra para germinar e dar fruto.
Foi alojado em uma pousada organizada com antecedência. Os fariseus não o contradiziam abertamente, mas murmuravam. Jesus sabia que temiam que ele celebrasse ali o sábado. Jesus disse aos discípulos: queria ir para o sábado a um lugar um par de horas mais longe, entre o Ocidente e o Norte, em direção ao Tabor, a um aldeia cujo nome não me lembro e cujos habitantes viviam de colorir sedas para franjas e borlas.
Jesus curou ali vários doentes. Todos os discípulos que ficaram voltaram a reunir-se. Quando Jesus deixou a cidade de Betúlia pelas murmurações dos fariseus, ensinou um quarto de hora ao ar livre, fora da cidade sentado em um assento de pedra. Restos de muralhas eram vistos e parecia que isso fazia parte da cidade em outros tempos.
Depois chegou por volta das três da tarde a Kisloth, cerca de três horas dali, no sopé do monte Tabor. André e outros apóstolos o haviam precedido para preparar-lhe abrigo. Reunira-se ali uma grande multidão de gente dos arredores, entre eles muitos pastores que tinham seus cajado e muitos mercadores de Sidon e Tiro. Os ensinamentos e os prodígios de Jesus já haviam se tornado conhecidos nos arredores. Todos se atropelavam ao chegar ao lugar, porque se tinha espalhado a notícia de que Jesus pensava celebrar ali o sábado. Também os que andavam de caminho e de viagem se reuniram nesta ocasião. Onde Jesus aparecia suscitava-se sempre um grande movimento. Clamava-se à sua chegada; tratava-se de chegar onde ele estava; alguns se punham de joelhos a seus pés; queriam tocá-lo. Por isso se mostrava às vezes algo contrariado pela multidão, e procurava desaparecer de súbito quando o tumulto crescia demais. Às vezes, nos caminhos, ele enviava seus discípulos para outro lugar, ou se afastava deles, para ficar sozinho. Chegando às populações, muitas vezes tinham que abrir caminho entre a turfa. Alguns, a quem permitia tocá-lo ou aproximar-se dele, sentiam logo uma comoção interna, uma melhora no espiritual e a cura de seus doenças.

Jesus em Kisloth-Tabor

À tarde, Jesus chegou a um albergue preparado já com antecedência pelos discípulos fora da cidade de Kisloth-Tabor, local onde já havia estado duas vezes. Esta cidade ficava a sete horas de caminho de Nazaré, pelos desvios, e a cinco horas em linha reta. Os caminhos iam ali, na Palestina, entre desvios e caminhos tortos entre vales e montanhas. Era por isso que os cálculos de distância eram frequentemente muito diversos. Muitos povoados enchiam a Palestina, embora das alturas não se chegasse a ver senão os principais e melhores situados. Kisloth-Tabor era uma cidade de mercadores e traficantes; haviam muitos ricos e abastados e muitos pobres que viviam da tintura de sedas cruas e do trabalho de franjas, borlas e outros adornos semelhantes para as vestes dos sacerdotes. Estas tinturarias estavam antes a maior parte junto ao mar, em Tiro; agora muitos destes tintureiros internaram-se no país. Os ricos empregavam os pobres em suas oficinas e fábricas. Vi pessoas que trabalhavam como escravas.

Diante da pousada, os discípulos cercaram um lugar com grossas cordas, que passavam através de paus enterrados no chão, formando uma barreira contra o impulso das multidões que se apertavam para ouvir os ensinamentos de Jesus. Ali Jesus se instalou fora da cidade para ensinar as multidões que vinham de todas as partes. Vieram também homens ricos e mercadores da cidade; e foi então que falou das riquezas e dos perigos da avareza e da cobiça. Disse-lhes que sua condição era mais perigosa do que a dos publicanos, dos quais muitos se convertiam. Foi então que olhando para as cordas que o separavam do impulso do povo disse as palavras severas do Evangelho: uma corda (como a que estavam vendo) entram mais fácil pelo olho de uma agulha que um rico no reino dos céus", aquelas cordas de pelos de camelo eram grossas como um braço e passavam por quatro fileiras através dos varas ou estacas em frente ao albergue. Estes ricos pretendiam defender-se dizendo que eles davam esmola dos seus lucros. Jesus respondeu-lhes que as esmolas que espremiam do suor dos pobres não lhes podiam trazer nenhuma bênção. Kisloth era uma cidade de levitas, separada de Zebulom, e dada aos levitas da tribo de Merari tinha a melhor escola da região; era bastante erande e tudo se fazia ali com muita solenidade. Quando Jesus ensinava nas sinagogas no sábado, os sacerdotes do lugar serviam entregando os rolos da Escritura ou Liam por turno os passagens que ele desejava. Sobre o Lido perguntava Jesus e instruía. Também se cantava, mas não à maneira farisaica. Eu ouvia a voz de Jesus sobressair, mais harmoniosa, sobre as dos outros. Não me lembro de tê-lo ouvido cantar sozinho. Jesus ensinou de manhã na escola de Kisloth, enquanto André ensinava nas enfermarias adjacentes às crianças e exortava os forasteiros a chegavam, dizendo-lhes as coisas ouvidas e vistas de Jesus. O tema de Jesus versava sobre a soberba e a vaidade. Não fez ali curas porque, como disse, os via inchados: porque tinha ensinado ali na sua cidade, achavam-se melhores que os outros, que por isso Jesus tinha vindo a eles; em vez de reconhecer que se vinha a eles era porque precisavam dele mais do que os outros e que se humilhassem para poder melhorar seus hábitos. Depois do ensino, ele parou em frente à sinagoga em um espaço livre onde haviam várias fileiras de pequenas celas que pertenciam à sinagoga e formavam-se como uma antessala. Ali curou várias crianças que sofriam de convulsões e outros males e que tinham sido trazidas pelas mães. Ele as curou porque eram inocentes. Curou também várias mulheres que se humilharam diante dele e lhe disseram:"Senhor, tira-nos os nossos pecados e transgressões". Lançaram-se aos pés de Jesus e confessaram as suas culpas. Sofriam algumas de fluxo de sangue e outras padeciam de más paixões das quais pediam para se ver livres. À tarde, celebrou o sábado na escola e comeu na pousada. Os futuros apóstolos e mais íntimos amigos estavam com ele à mesa, enquanto outros discípulos estavam em outra mesa ou serviam aos comensais. No dia seguinte, celebrou o sábado na sinagoga e curou muitos diante dela; foi à casa de vários que não puderam ser trazidos, e os curou. Os discípulos ajudavam, trazendo ou levando enfermos, fazendo lugar na multidão, indo ou vindo com mensagens e cuidando da ordem. As despesas dessas viagens e pousadas eram por conta de Lázaro. Obede, filho de Simeão, era o encarregado de fazer os pagamentos. As pequenas celas que eu tinha visto diante da sinagoga estavam agora ocupadas por mulheres que através de uma treliça falavam com Jesus a sós. Essas celas eram destinadas a mulheres pecadoras, penitentes ou impuras legalmente, elas tinham que lidar com os sacerdotes. Acima, no monte Tabor, não havia população, mas se viam fortalezas, muralhas e parapeitos onde antigamente haviam soldados estacionados. À tarde, Jesus foi com seus mais íntimos, futuros apóstolos, para a casa de um fariseu para a refeição. Este fariseu tinha ouvido o ensinamento de Jesus e tinha-se comovido e melhorado. Dias depois estava Jesus com seus discípulos numa grande refeição que lhe davam os principais do lugar, numa sala preparada para o evento. Tinha ensinado e na mesma tarde deixou a cidade e dirigiu-se a Jezrael, que ficava a cerca de três horas de caminho de Kisloth-Tabor. Em Jezrael, os seus mais íntimos com André e Natanael e os de Betsaida se afastaram de Jesus para visitar os seus. Jesus disse-lhes onde deveriam voltar a encontrar-se. Cerca de quinze discípulos mais jovens ainda estavam com Jesus. Ensinou e curou alguns doentes. Ali existiam várias escolas de letras e de religião, porque era um grande centro. Jesus falou da vinha de Nabote. De Jezrael partiu uma hora e meia para o Oriente, para um campo que estava num vale largo, com cerca de duas horas de caminho e de igual comprimento. Havia muitas árvores frutíferas com sebes baixas e divisões. Era um vale bonito, cheio de frutas e vegetação. Os habitantes de Kisloth-Tabor e de Jezrael tinham ali suas posses e prados. Hania muitas lojas, duas a duas, espalhadas pelo vale, onde as pessoas de Sichar eram encarregadas de guardar, vigiar e colher os frutos. Pareceu-me que eram obrigadas a fazê-lo como um tributo que deviam pagar. Eles se revezavam no comércio e viviam quatro em cada uma das lojas. Além viviam as mulheres que cozinhavam para os trabalhadores. Jesus ensinou essas pessoas reunidas em uma tenda. Muitas fontes e poços de água eram vistos fluindo para o Jordão. Uma dessas correntes principais vinha do lado de Jezrael e ali era captada em uma bela fonte sobre a qual fizeram uma cúpula como se fosse uma capela. Desta fonte principal partiam vários braços que corriam pelo vale e juntavam-se outras correntes que iam finalmente parar no Jordão. Os ouvintes eram cerca de trinta desses guardiões que ouviam Jesus; as mulheres estavam um pouco afastadas. Falou-lhes da pior escravidão, que era a do pecado, da qual deviam livrar-se eles mesmos. Estes homens estavam fora de si de contentamento porque Jesus se dignara visitá-los. Jesus mostrou-se tão compassivo e tão terno com estas pobres pessoas que eu mesma tive que chorar de ternura. Eles apresentaram a Jesus e seus discípulos vários tipos de frutas, dos quais comeram. Em alguns desses lugares já haviam frutas maduras, enquanto em outros haviam apenas flores. Vi ali uns frutos de cor castanha, como figos, que nasciam em cachos como as uvas; havia também umas plantas amarelas das quais faziam lama. Neste vale estava a montanha de Gelboe, onde Saul pereceu em sua guerra contra os filisteus.

 

Jesus em Sunem e em Ulama

Pela tarde partiu Jesus, através de Jezrael, para Sunem, povoação aberta situada sobre uma montanha. Alguns discípulos o tinham precedido para preparar albergue falando a um hoteleiro na entrada da cidade. O Vale das árvores frutíferas, de onde partiu, ficava ao sul de Jezrael, perto de Sunem, havia duas outras cidades a uma e duas horas de distância, uma das quais Jesus deixou de lado em seu caminho de Kisloth-Tabor a Jezrael, as pessoas de Sunem viviam do trabalho de tecelagem. Eles teciam com fios de seda fitas estreitas com bordas, simples e adornadas com flores.
Este lugar não estava mais no Vale de Esdrelon, mas mais nas alturas. Houve ali um concurso extraordinário em torno de Jesus que foi aumentando. As pessoas o rodeavam por toda parte; curvavam-se a seus pés; gemiam e clamavam ao novo Profeta, ao enviado de Deus; muitos o faziam com reta intenção, outros por imitação e curiosidade e para fazerem tumulto. O concurso foi ali tão grande, que parecia uma revolta popular, e como isto foi aumentando na Galiléia, logo se devia retirar Jesus. Deste lugar era a bela Abisague, que Davi tomou por esposa em sua velhice. O profeta Eliseu também teve ali um albergue para onde ia com frequência e onde ressuscitou o filho do estalajadeiro. Eu tive uma visão desse fato. Havia nesta cidade uma pousada livre para viajantes e transeuntes, precisamente em memória do profeta Eliseu e de sua estadia. Não sei se estava na mesma casa ou pelo menos no lugar onde se erguia o albergue.
Jesus ensinou naquele dia na escola e entrou em muitas casas de enfermos, para consolá-los e curá-los. A aldeia estava um pouco espalhada entre alturas e no meio da cidade erguia-se a crista da montanha. Havia um caminho que levava até lá; à medida que subia, as casinhas eram menores e apenas algumas cabanas. Num lugar vazio do cume havia uma poltrona de pedra para ensinar; para defender-se do sol puseram uma tenda de pano estendida sobre paus. Quando Jesus, na manhã do dia seguinte, subiu à altura com seus discípulos para ensinar, promoveu-se um grave tumulto na cidade. A multidão havia levado para cima, ao longo do caminho, muitos doentes em macas. Jesus pôde apenas subir entre os gritos, o tumulto e os clamores dos enfermos. Havia gente sobre os telhados das casas para poder ver e ouvir melhor suas palavras. De cima, onde estava o assento, uma vista esplêndida estava descoberta ao redor do monte Tabor. Jesus falou ali com severidade contra o orgulho, a jactância e as conversas das pessoas que, em vez de buscar a conversão em silêncio, fazendo penitência e cumprindo os mandamentos de Deus, eles gritavam e clamavam em vão: "profeta o profeta; o enviado de Deus!"acreditando que a vinda de Jesus fosse por tê-lo merecido e por ser uma honra do enviado ter vindo a eles. Disse-lhes claramente que tinha vindo para que reconhecessem seus pecados e se convertessem.
Às três da tarde, Jesus dirigiu-se para o Nordeste, a cerca de três horas de distância, para uma cidade que parecia um conjunto de aldeias, maior, embora não tão antiga quanto Sunem. Esta cidade tinha muros grandes e largos, sobre os quais cresciam árvores. Chamava-se Ulama e ficava a cerca de cinco horas a leste de Tabor. A duas horas de lá ficava a cidade de Arbela, ao Norte. Havia ali caminhos entre montanhas, cheios de pedras pontiagudas, que quebravam e gastavam as solas, e por isso se fabricavam nessa aldeia solas para os pés. A cidade estava sobre uma altura, numa região escabrosa; contudo, viam-se as alturas plantadas de vinhedos quase até os cumes. Vi ali uma planta alta como uma árvore, de ramos emaranhados, grossos, como um braço que tinha frutos como cabaças, com os quais faziam garrafas e recipientes. (Possivelmente uma variedade de abóboras). A cidade não era tão antiga como outras e tinha algo que manifestava que ainda não havia sido terminada. Os habitantes não tinham a simplicidade dos antigos israelitas: queriam aparecer mais esperientes e entendidos do que seus vizinhos. Acho que deviam ter estado ali por algum tempo romanos ou outros soldados estrangeiros.
Também ali houve grande multidão de pessoas, porque Jesus disse que queria celebrar o sábado. Tinham-se reunido a Jesus alguns dos seus discípulos, entre eles Jônatas e os filhos da viúva; eram cerca de vinte. Entre eles estavam Pedro, André, João, Tiago, O Menor, Natanael Chased e o Natanael das bodas de Caná. Jesus os havia citado para que ouvissem seu ensinamento e o ajudassem nas curas dos enfermos, por causa da grande multidão que ia por toda parte. O povo o recebeu, saindo ao encontro dele, porque se tinham dado a voz que chegava. Traziam ramos das árvores e plantas que lançavam em seu caminho, e puseram diante de seus pés faixas longas e estreitas para que passasse sobre elas, e clamavam: "Profeta, o Profeta, o Profeta!"
Havia alguns homens principais que mantinham a ordem e o cumprimentaram na chegada. Muitos endemoninhados que estavam na cidade o seguiam por detrás gritando e anunciando ao que vinha. Jesus os mandou calar. Ao chegar ao abrigo não teve descanso; chegaram os endemoninhados clamando, até que de novo lhes mandou calar e se afastassem de lá.
Em Ulama havia três pontos de reunião: uma escola de letrados, uma de crianças e uma sinagoga. Jesus foi a várias casas consolando e curando; Depois falou na escola, tratando da simplicidade e do respeito aos pais.
De ambas as coisas faltavam especialmente neste lugar, e em sua pregação lhes reprovou seu orgulho e sua vanglória, visto que, tendo vindo o Profeta no meio deles, eles desperdiçavam o tempo em vãos clamores em vez de aproveitá-lo para o arrependimento, a penitência e a conversão.
Após o sábado os principais da cidade lhe deram uma refeição em uma sala de festas. Os apóstolos, que tinham ido a suas casas, saudaram os seus e conversaram e visitaram Maria. As mulheres também se mantinham mais unidas a Jesus por meio de Maria. O Batista ainda permanecia em seu posto, embora seus discípulos diminuíssem dia a dia.
Herodes ia vê-lo com frequência e enviava-lhe mensageiros.
No dia seguinte ao Sábado foi Jesus pela manhã, às nove, com seus discípulos a um quarto de hora fora da cidade, onde junto a uma montanha havia um lugar como um parque infantil ou de banho. Este lugar era quase tão grande quanto o cemitério de Dúlmen, e ao redor tinha galerias, edifícios, um belo poço e um local para ensinar. Jesus havia citado ali os muitos enfermos que havia na cidade, pois não quis curar na cidade por causa do tumulto que gerava. Os apóstolos ajudavam, guardando a ordem. Os doentes haviam sido trazidos em macas e estavam nas galerias esperando sua passagem. Havia tantas pessoas que nem todas puderam se aproximar. Os sacerdotes e os principais mantinham a ordem.
Jesus curou muitos doentes enquanto ia de um para o outro. Quando digo curou a muitos, entendo cerca de trinta; quando digo a alguns, entendo cerca de dez. Jesus falou da morte de Moisés, cuja recordação era celebrada com um dia de jejum. Os alimentos eram mantidos quentes sob as cinzas. Comiam pães diferentes dos comuns. Jesus falou da terra prometida e da sua fertilidade, dizendo que esta fertilidade não devia ser entendida apenas dos frutos materiais, mas da abundância dos bens espirituais, pois o seu país foi fértil em profetas e enviados de Deus, e o fruto era nestes casos a salvação prometida e a penitência daqueles que a queriam receber de coração. Depois disto, vi-o ir para outro edifício onde tinham levado os endemoninhados. Eles ficaram furiosos e gritaram quando ele chegou. A maior parte eram jovens e ainda crianças. Ele os colocou em linha e os mandou calar e ficar quietos, e com uma palavra ele os livrou de uma só vez. Alguns desmaiaram, quando os demônios saíram. Pais e parentes estavam lá. Jesus ensinou E admoestou os presentes. Depois que ele ensinou na sinagoga, ele deixou esta cidade, sem ser notado. Os discípulos tinham saído antes. Creio que o próprio Jesus o havia ordenado assim. Deixando muitas cidades, dirigiu-se para Cafarnaum.

Jesus em Cafarnaum

Jesus caminhou durante toda a noite com seus discípulos e chegou ao amanhecer aonde estava Sua santa Mãe. Ali, na casa de Maria, estavam a mulher de Pedro e uma irmã desta, a mulher das bodas de Caná e outras. A casa que Maria ocupava ali era como as outras do lugar e bastante ampla, porque nunca estava sozinha: várias viúvas viviam e paravam ali. As mulheres de Betsaida e Cafarnaum vinha frequentemente e também um ou outro dos discípulos. Vi que estavam observando um dia de jejum, que estavam lamentando e que as mulheres estavam veladas. Jesus falou em Cafarnaum na escola, onde haviam se reunido os discípulos e as santas mulheres.
Cafarnaum estava situada em linha reta, sobre a montanha, em direção ao vale, rumo ao Meio-dia. Cerca de meia hora a caminho de Cafarnaum, no caminho para Betsaida, viam-se algumas casas, uma das quais era a que Maria habitava. De Cafarnaum corria um belo riacho para o Jordão, que se dividia em Betsaida em vários braços fertilizando toda aquela região.
Maria não tinha ali horta nem campo nem animais para cuidar. Vivia da generosidade, como viúva, dos amigos, e ocupava-se de fiar, costurar e tecer com uns pauzinhos; o resto do tempo empregava-o na oração e em consolar e ensinar outras mulheres que vinham a ela no dia da sua chegada. Maria chorava pelo grande tumulto que se formava em torno de Jesus, que trazia um perigo, por Seus ensinamentos e seus prodígios. A ela chegavam todas as murmurações das nações, todos os pareceres tortuosos que se formavam sobre Jesus. Não ousando dizê-lo ao próprio Jesus, diziam-no à mãe. Jesus disse à sua santa mãe que havia chegado o tempo em que deixaria a Galiléia para ir para a Judéia, onde, depois das festas pascais, levantaria ainda mais comoção por sua causa.
À tarde começou em Cafarnaum uma festa de ação de graças pela beneficente chuva. As sinagogas e os edifícios públicos eram adornados com ramos verdes e plantas, formando pirâmides e vários adornos, e dos telhados das sinagogas e de outras casas principais com galerias superiores, instrumentos de sopro estranhos eram tocados. Os que tocavam estes instrumentos eram os encarregados da sinagoga, como são os sacristãos entre nós. Este instrumento é semelhante a um tubo flexível ou uma pele de cerca de quatro pés de comprimento, ao qual estão ligados vários pitos de cor escura e buracos como nas flautas, os quais, quando o instrumento não estava inchado, ficavam colados e aderidos; quando, ao contrário, inchava, soprando dentro por um homem, outros dois o seguravam alto, e estes tinham o encargo de enchê-lo de ar, soprando também ou dando fole. Com o fechamento ou abertura dos vários buracos, o instrumento dava sons muito agudos de vários tons. Os dois homens ao lado se revezavam soprando.
Jesus falou na sinagoga de um modo impressionante sobre a seca e a chuva. Narrou como Elias suplicou no Carmelo a chuva, e como por seis vezes enviou seu servo para ver se vinha chuva, e como pela sétima vez anunciou que uma pequena nuvem se levantava do mar e se tornava cada vez maior, e que logo feita chuva refrescou todo o país; acrescentando que Elias percorreu depois o país. Jesus explicou que essas sete perguntas de Elias significavam o tempo até o cumprimento da promessa; Ele acrescentou que apontava o tempo presente, e a chuva era o Messias, cujo ensinamento devia refrescar e fazer esverdear todas as coisas secas. "Quem tiver sede, pode saciar-se agora e beber, e quem tiver o seu campo preparado, receberá a chuva benéfica". Disse tudo isto de modo tão tocante e terno que os ouvintes choravam de emoção, e choravam Maria e as santas mulheres que o escutavam.
As pessoas de Cafarnaum eram mais atentas a Jesus. Hania três sacerdotes nesta sinagoga, e Jesus tomava sua comida com frequência com seus discípulos em uma casa onde viviam os sacerdotes da sinagoga. Pareceu que hania como um direito adquirido ali de que os professores que ensinvaam tinham livre abrigo. No dia anterior à tarde e naquela manhã voltaram os músicos a soprar seus raros instrumentos, e ainda hoje tocavam os jovens e crianças que encontravam seu contentamento nisso. Jesus havia despedido seus discípulos, parentes e os de Betsaida, porque queria deixar esta manhã a região da Galiléia e partir para a Judéia. Partiram com ele apenas onze discípulos, que eram de Nazaré, de Jerusalém e outros que vinham do lado de João.

Jesus ajuda uns náufragos

Depois da festa de ação de graças partiu Jesus de Cafarnaum na direção sudeste, como quem ia entre Caná e Séforis. Maria e outras oito mulheres o acompanharam por um trecho; entre elas estavam Maria de Cléofas, as três viúvas, a mulher das bodas de Caná e uma irmã de Pedro. Acompanharam-no até uma pequena povoação, onde tomaram alimento juntos e despediram Jesus. Nas proximidades estava o poço onde José havia sido abaixado por seus irmãos. O lugar era chamado Dothaim.
Hania outra Dothaim maior do que esta aldeia, no Vale de Esdrelon, cerca de quatro horas ao Norte de Samaria. Este Dothaim era uma pequena aldeia onde os seus habitantes viviam de tráfico com os mercadores que passavam pelas suas estradas; ficava no final de um vale com pradaria para oitenta animais. Do outro lado estava o grande edifício onde Jesus em outra ocasião fez calar uma multidão de endemoninhados que gritavam ao vê-lo. Desta vez não entrou neste lugar, que ficava a uma hora e meia entre o Norte e o leste de Séforis, e a quatro ou cinco horas do monte Tabor. Os discípulos o precederam para procurar abrigo. Saíram ao encontro de Jesus e das santas mulheres uns oito homens e sacerdotes que os acompanharam a uma casa que ninguém habitava e onde a comida estava pronta. Diante da entrada estenderam um tapete por onde devia passar ali lavaram-lhe os pés do pó da estrada. As mulheres comeram à parte, atrás da casa.
Jesus e seus discípulos estavam à mesa. Comia-se apenas alimentos frios: pequenos pães, mel, ervas verdes que se sopravam e frutas; a bebida era água misturada com bálsamo, da qual deram a Jesus e às mulheres pequenos recipientes para levar. Os sacerdotes da cidade serviam de pé com admirável humildade e amor. Jesus falou de José, que neste lugar tinha sido vendido por seus irmãos. Foi uma cena terna e comovente que me fez chorar. Para mim era isso estranho: tudo acontecia tão perto de mim que eu queria participar, faziam isso ou aquilo e eu não podia fazer. Depois desta refeição, as santas mulheres tomaram o caminho de volta para suas casas. Jesus despediu-se a sós de sua mãe e depois passou a cumprimentar as outras mulheres. Vi que Jesus também abraçava a sua mãe quando se despedia e se encontrava, estando a sós. Em outros casos, ele apenas apertava a mão ou se inclinava acenando carinhosamente. Maria chorava nessa ocasião. Maria apresentava um aspecto jovem: estava crescida, embora de delicados traços. Tinha testa alta, nariz proeminente, olhos grandes, embora sempre inclinados para o chão, boca rosada muito atraente, tez um tanto morena com bochechas rosadas e aveludadas.
Jesus ficou algum tempo no albergue ensinando. Os homens que não quiseram nenhum pagamento pelas refeições o acompanharam até o poço de José, que ficava a cerca de meia hora de caminho no vale. Este poço não era mais como era no tempo em que José foi trancado dentro. Então era uma cisterna seca, com borda verde; agora o fizeram um recipiente quadrado, bastante amplo, quase um pequeno lago e lhe fizeram colocar um telhado apoiado por colunas. Estava cheio de água e conservava nele variedades de peixes. Vi ali peixes curiosos que tinham as cabeças erguidas e não em ponta como os nossos: não eram tão grandes como os que vi no mar da Galileia. Não se via exteriormente por onde fluía a água para o lago; estava cercado, e viviam algumas pessoas ao redor para cuidar de sua conservação.
Jesus foi com seus companheiros a este lugar e durante todo o caminho falou da história de José e de seus irmãos. Ensinou também, ali, junto ao poço. Vi que abençoou o poço, quando se afastou dali.
O povo de Dotaim virou-se, e Jesus com seus discípulos partiu, fazendo uma hora de caminho, para Séforis, onde se abrigou com os filhos de uma irmã de Santa Ana. Séforis estava sobre uma montanha, por sua vez cercada por montanhas, e era maior que Cafarnaum. Havia muitas granjas ao redor da cidade, que pertenciam a ela. Jesus foi recebido não tão bem pelos chefes da sinagoga. Havia na cidade gente má que murmurava contra Jesus, dizendo que andava vagando pelo país em vez de ficar com sua mãe e cuidar dela. Não curou ali os enfermos e manteve-se reservado; ensinou o sábado na sinagoga e ficou junto à mesma. Em contrapartida, ele visitou muitos, em particular, especialmente certos essênios, para consolá-los e exortá-los, já que as más línguas dos perversos zombavam e incomodavam-nos pelo amor que manifestavam a Jesus.
Nestas casas disse também a vários homens e a alguns primos deles que por agora não o seguissem, mas permanecessem amigos dele em segredo, fazendo o bem que podiam, enquanto ele estivesse em vida e cumprisse o seu missão. Seus parentes faziam ali todo o bem que podiam e ajudavam Maria, enviando-lhe o necessário. Vi Jesus tratando com tanto amor e familiaridade com diversas famílias deste lugar, que fiquei comovida, e não o posso expressar: só o lembro-me com lágrimas nos olhos.
Eu vi uma coisa naquela noite que me impressionou de uma maneira especial. Um vento muito impetuoso se levantou na Terra Santa, e eu vi Jesus orando junto com outras pessoas. Orava com os braços estendidos pela libertação das desgraças. No mesmo momento tive uma visão do que se passava no mar da Galileia: havia-se levantado ali uma grande tempestade e os barcos de Pedro, de André e Zebedeu estavam em gravíssimo perigo de naufragar e romper-se. Via-os dormir tranquilamente, em Betânia, e sobre os barcos estavam os seus criados. De repente eu via a figura de Jesus, enquanto orava, ali, e ao mesmo tempo sobre os barcos e no mar; já sobre um e sobre outro, ajudando, afastando o perigo ou sugerindo meios de evitá-lo.
Não estava ele em pessoa, porque não o vi ir para lá: estava algo mais elevado que as outras pessoas; parecia que flutuava sobre eles. As pessoas dos barcos não o viam; era como se seu espírito estivesse ali enquanto seu corpo estava longe. Ninguém sabia como ele ajudava. Creio que os ajudou porque esses criados acreditavam nele e o haviam invocado no perigo.

Jesus em Nazaré. Os três jovens. A festa de Purim.

Desde Séforis foi caminhando Jesus por caminhos extraviados até algumas fazendas, onde consolou e exortou, em direção a Nazaré, que ficava a duas horas de distância. Tinha entre seus discípulos dois ou três jovens filhos de viúvas de essênios. Ao chegar a Nazaré, abrigou-se entre gente amiga e visitou alguns em particular, sem chamar a atenção. Os fariseus vieram vê-lo, exteriormente respeitosos, mas cheios de prevenções contra ele, perguntaram-lhe o que pensava fazer; por que não se ficava com a mãe. Jesus respondeu com seriedade e determinação.
Ali tudo era preparativo para um dia de jejum por Ester e para a festa do Purim, que se seguia imediatamente. Jesus ensinou na sinagoga muito severamente. À noite, vi-o novamente orando, com os braços estendidos. Eu o vi aparecer no mar da Galiléia durante uma tempestade. O perigo foi desta vez maior e vi muitos barcos prestes a afundar. Vi que Jesus colocava as mãos no leme, sem que o timoneiro se desse conta.
Depois vi que os três jovens ricos que tinham estado antes com Jesus voltaram a pedir-lhe que os tomasse como discípulos; quase se curvaram diante Dele. Jesus não os admitiu. Disse-lhes várias coisas que deviam observar se quisessem ser Seus discípulos. Jesus via que esses jovens tinham apenas visões humanas e não entendiam outros motivos. Queriam segui-lo como se seguiria a um filósofo, a um famoso rabino, para com a ciência aprendida com tal sábio dar honra à cidade natal de Nazaré. Doía-lhes porque viam que jovens de humilde condição e pobres da cidade o seguiam e os recebia; e eles eram rejeitados. Depois vi Jesus até altas horas da noite com o ancião essênio Eliud de Nazaré. Este velho parecia estar nas últimas, e estava sempre em sua cama. Jesus estava junto a ele e, apoiando-o no seu braço, falava-lhe. O homem estava todo absorto em Deus.
Com o início da festa de Purim ouviam-se sons de um instrumento que tocavam sobre a sinagoga. O instrumento estava apoiado sobre um tripode: era oco, com vários apitos, que entravam e saiam, e emitia uma melodia de vários tons. Havia crianças que tocavam em harpas e pifanos. Em honra da heroína Ester que naquele dia gozavam de grandes liberdades e direitos mulheres e jovens na sinagoga: eles não estavam, como de costume, afastadas dos homens, e até podiam aproximar-se do recinto dos sacerdotes. Vieram à sinagoga procissões de crianças com várias vestes: umas de branco, outras de colorido.
Entrou também uma jovem que trazia um molho estranho na garganta: tinha uma faixa vermelha de sangue, figurando a garganta cortada, e dessa faixa pendiam fitas coloridas com botões sobre o vestido branco, como se caísse sangue do pescoço sobre a vestimenta. Era uma espécie de encenação, pois marchava com um esplêndido manto cujos extremos sustentavam outras jovens; seguia-a uma multidão de jovens, crianças e meninas.
Ele usava um boné alto e pontudo e um véu muito longo; na mão ele trazia algo como um cetro. A jovem era linda e alta. Não pude compreender o que se representava: pareceu-me que representava Ester, e lembrava-me por outro lado de Judite; mas não parecia a que matou a Holofernes, pois vinha com uma criada que trazia um cesto com preciosos presentes para o primeiro sacerdote.
Oferecia-lhe placas de preciosa feitura, que trazia às vezes sobre a testa, às vezes sobre o peito.
Num canto da sinagoga via-se, atrás de uma cortina, o simulacro de um homem deitado sobre um leito do qual essa jovem, tirava-lhe a cabeça e a apresentava ao sacerdote principal e também dava aos sacerdotes, por uma antiga tradição, uma advertência sobre as principais faltas que haviam sido notadas no ano; depois disso, ele se retirava. Vi que em outras festas semelhantes certas mulheres tinham o direito de fazer admoestações aos sacerdotes.
Na sinagoga estava aberto o livro de Ester e desse rolo ia-se lendo por turno. Jesus também leu. Os judeus, especialmente as crianças, tinham madeirinhas e pequenos martelos com eles. Puxando um fio, batia o martelo sobre determinado nome, enquanto diziam algo ao mesmo tempo. Isso era feito sempre que o nome de Aman aparecia na leitura.
Também foram realizadas refeições solenes. Jesus estava com os sacerdotes na grande sala. Durante esta festa, os ornamentos eram vistos como na festa dos Tabernáculos: muitas coroas de flores, lindas rosas tão grandes quanto cabeças e pirâmides de flores, ervas, folhas, galhos e muitos frutos. Um cordeiro inteiro estava sobre a mesa e fiquei maravilhada com o esplêndido equipamento que eles usavam no serviço. Havia fontes de várias cores, transparentes, como pedras preciosas. As pessoas naquele dia davam muitos presentes umas às outras: jóias, vestidos de festa, túnicas, manípulos, véus, correias com borlas e vários ornamentos. Jesus recebeu uma veste de festa, com borlas na parte inferior; mas ele não quis aceitá-la e deu-a a outros. Muitos davam seus presentes aos pobres, os quais eram nestes dias muito lembrados.
Depois da refeição, Jesus caminhou rodeado de seus discípulos e de sacerdotes em uma espécie de parque de recreação perto de Nazaré. Tinha consigo três rolos escritos e o livro de Ester e, por sua vez, liam alguns pedaços. Grupos de jovens e donzelas seguiam atrás; as donzelas ouviam a leitura a certa distância. Eu vi alguns homens, indo de casa em casa, cobrando algo como uma contribuição.
De Nazaré dirigiu-se Jesus com os seus discípulos para a cidade de Apheke, a quatro horas de distância; mas voltou a Nazaré para a festa do sábado, e depois visitou o moribundo Eliud. Os sacerdotes de Nazaré não podiam compreender como Jesus pôde adquirir uma ciência tão grande depois de sua curta ausência de Nazaré. Não podiam contradizer seu ensinamento com sucesso e alguns tinham verdadeira inveja dele. Quando deixou Nazaré, acompanharam-no por um trecho de caminho.

Jesus em uma posse de Lázaro em Thirza

Jesus caminhou pelo caminho que fez a Sagrada Família em sua fuga para o Egito, e chegou com seus discípulos para um pequeno lugar, não muito longe de Legião, onde a Sagrada Família se refugiara e onde viviam homens desprezados que trabalhavam como escravos. Jesus comprou ali pães, repartiu-os e multiplicou-os, distribuindo-os a muitos. Não se produziu por isso muito tumulto, porque Jesus não se deteve muito ali: foi como de passagem. Prosseguindo o seu caminho, saíram-lhe ao encontro Lázaro, João Marcos e Obede. Em companhia dos três, prosseguiu para uma propriedade de Lázaro, em Thirza, a cinco horas de caminho. Embora tenham chegado à noite sem serem avisados, tudo estava preparado para recebê-los. Esta propriedade estava situada em uma montanha na direção de Samaria, não muito longe dos campos de Jacó. Um velho judeu que andava descalço e cingido era o zelador: estava desde que Maria e José haviam passado e se abrigaram neste mesmo lugar em sua viagem a Belém. Neste lugar tinham Marta e Madalena servido ao Senhor no último ano da vida de Jesus, quando ensinava e lhe rogaram que fosse ver a seu irmão Lázaro, que estava doente. Perto dessa posse de Lázaro estava a aldeia de Thirza, em uma bela situação, a cerca de sete horas de Samaria.
Em condições de receber muito o sol, era esta localidade muito rica em trigo, vinho e toda espécie de frutas; por isso a maior parte de seus habitantes trabalhavam a terra e vendiam os frutos. Antigamente era uma cidade grande e bonita, habitada por reis; agora se via o castelo queimado e a cidade muito danificada pelas guerras. O rei Amri havia habitado na casa que pertencia a Lázaro até que ele pudesse se mudar para Samaria. As pessoas eram muito piedosas; mantinham-se silenciosas e reservadas. O lugar era como se escondido e diminuído. Acredito que em nossos tempos deve haver vestígios de sua existência. Os habitantes não se comunicavam com os de Samaria.
Jesus ensinou na sinagoga, mas não curou os enfermos. No Sábado começou a festa da dedicação do templo por Zorobabel, embora não tão solenes como as dos Macabeus. Nas casas, nas ruas, nos campos de pastoreio e nas sinagogas se viam luzes e fogos tradicionais.
Jesus passou a maior parte do dia com seus discípulos na sinagoga de Thirza. Comeu na casa de Lázaro, mas muito parcamente: a maior parte dos alimentos era distribuída aos pobres, numerosos neste lugar. As repartições já se acostumavam a ter Jesus se hospedando ali. Da grandeza da cidade ficavam estes vestígios de muralhas e torres derrubadas.
Parecia que a casa de Lázaro, que ficava a um quarto de hora do caminho, fazia parte da cidade pelos restos de muralhas que se viam no que hoje eram jardins e prados cultivados. Lázaro tinha herdado esta posse de seu pai. Ali, como em toda parte, Lázaro era honrado, considerado um homem não só rico, mas piedoso, prudente e iluminado; sua conduta era por outro lado, muito diferente da dos outros: tinha um proceder sério, falava pouco e era muito compassivo, bondoso e em tudo muito medido. Quando as festas terminaram, Jesus deixou Thirza com seus discípulos e Lázaro, e foi para a Judéia. O caminho era o mesmo de José e Maria, quando foram a Belém, através das montanhas, ao lado de Samaria e pelas mesmas comarcas.
Eu o vi subir uma montanha alta à noite. Era uma noite tranquila e sobre a região se estendia uma leve névoa. Acompanham-no uns dez e oito discípulos: iam dois a dois pelo caminho; uns à frente, Outros atrás de Jesus. Este, por momentos, calava-se; umas vezes, orava, e outras, falava. A noite convidava à oração e à quietude. Andaram a noite toda e pela manhã descansaram um pouco, tomando algum alimento; depois continuaram por uma montanha fria, evitando as cidades do caminho.
Não muito longe de Samaria vi o Senhor com uns seis discípulos, quando de repente se apresentou um jovem que, lançando-se a seus pés, disse-lhe:"salve este homem, pois você vai livrar a Judéia e restaurá-la". Este homem acreditava num reino temporal de Cristo; pedia para ser tomado como discípulo, e desejava um emprego nesse reino. Este jovem era órfão, mas herdou grandes posses de seu pai e estava empregado em Samaria. Jesus mostrou-se muito familiar com ele; disse-lhe que, quando voltasse, lhe diria o que lhe convinha fazer: agradava-lhe a sua humildade e a sua boa vontade; que não havia nada a dizer sobre seu pedido. Soube que o jovem gostava muito das suas riquezas e que Jesus queria dizer-lhe o que desejava quando tivesse escolhido os seus discípulos para lhes dar a eles um ensinamento. Este jovem voltou, de fato, de novo, e o que então lhe disse Jesus está no Evangelho.
À tarde, vi-os chegar ao albergue dos pastores, entre os dois desertos, a cinco ou seis horas de Betânia, onde outrora Maria e as santas mulheres pernoitaram quando foram a Betânia, onde Jesus estava antes de Seu batismo. Os pastores ao redor se reuniram e trouxeram presentes e comida. O albergue foi transformado em local de oração. Uma lâmpada estava queimando e eles dormiram ali. Jesus ensinou e celebrou o sábado.
Neste caminho difícil e solitário Jesus passou por onde Maria, em sua viagem a Belém, teve tanto frio e onde logo encontrou alívio. Jesus passou todo o sábado com seus discípulos entre pastores, que se consideravam muito felizes e ficaram comovidos. O próprio Jesus pareceu-me mais alegre e jovial entre estes simples pastores. Depois do sábado, dirigiu-se para Betânia, a quatro horas de caminho.

A primeira Páscoa em Jerusalém

Jesus estava alojado na casa de Lázaro na mesma parte que ocupou outras vezes. Era organizada como uma sinagoga e era o oratório da família.
No meio havia um púlpito, sobre o qual estavam colocados os rolos das escrituras. A parte de Jesus era separada do oratório por um septo. Na manhã seguinte, Marta partiu para Jerusalém para ir à casa de Maria Marcos e das outras mulheres e dizer-lhes que Jesus e Lázaro, seu irmão, eles iriam para a casa de Maria Marcos. De fato, Jesus e Lázaro chegaram lá por volta do meio-dia. Na refeição estavam Verônica, Joana Chusa, Susana, os discípulos de Jesus e de João, de Jerusalém, João Marcos, os filhos de Simeão, o filho de Verônica, os primos de José de Arimatéia, cerca de nove homens. Não estavam Nicodemus nem José de Arimatéia. Jesus falou da proximidade do reino de Deus, da sua missão, do seu seguimento e ainda obscuramente da sua paixão. A casa de João Marcos estava em frente à cidade, na parte oriental, em frente ao Jardim das Oliveiras: Jesus não precisou atravessar a cidade para ir até lá.
À tarde, voltou com Lázaro para Betânia. Em Jerusalém já se estava falando de Jesus, do novo profeta que estava agora em Betânia. Alguns se alegraram com sua proximidade; outros se escandalizaram com o Profeta de Nazaré. Nos jardins e no caminho do Jardim das Oliveiras, as pessoas eram vistas. Alguns fariseus estavam ali esperando Vê-lo de passagem: tinham ouvido dizer que talvez entraria na cidade. No entanto, ninguém o deteve ou o interrogou. Vi que alguns se escondiam atrás das sebes para continuar observando, e diziam:"lá vai o Profeta de Nazaré, o filho do carpinteiro". Havia muita gente trabalhando nos jardins e parques com a proximidade das festas, limpando, arrumando, podando e cortando as sebes e as plantas. Também se viam operários e pobres trabalhadores que iam a Jerusalém buscar ocupação, na cidade e nos jardins: iam com os seus instrumentos de trabalho, montados em asnos. Um deles era aquele Simão, que mais tarde carregou a cruz de Cristo.

Dias depois vi Jesus de novo em Jerusalém e na casa de Obede, o filho de Simeão, não muito longe do templo; depois em outra casa onde a antiga família de Simeão costumava habitar, em frente ao templo. Lá, ele tomou uma refeição preparada e enviada por Marta e as outras mulheres. Os discípulos de Jerusalém, cerca de nove, estavam ali com Jesus. Este falou com muita ternura da proximidade do reino de Deus. Ele ainda não tinha ido ao templo. Ele ia sem medo de um lado para o outro. Ele usava uma longa vestimenta branca, que os profetas costumavam usar. Muitas vezes aparecia à vista dos outros, sem chamar a atenção, e desaparecia. Contudo, às vezes sua aparência era extraordinária: seu rosto era resplandecente e seu aspecto nada comum.
À tarde, voltou para Betânia, vieram alguns discípulos de João, entre eles Saturnino. Saudaram a Jesus e lhe falaram de João: como agora já não iam a ele tantos para serem batizados; que Herodes tratava muito ao Batista. Nicodemos veio naquela tarde a Betânia, na casa de Lázaro, e ouviu o ensinamento de Jesus. Na manhã seguinte, Jesus foi à casa de Simão, o fariseu, que tinha uma sala de festa em Betânia. Havia ali uma refeição: estavam reunidos Nicodemos, Lázaro, os discípulos de João, os discípulos de Jerusalém. Marta e as mulheres de Jerusalém estavam à parte.
Nicodemos quase não falava na presença de Jesus, e só escutava atentamente o seu ensinamento. José de Arimatéia perguntava algumas vezes. Simão, o fariseu, não era mau homem, mas ainda estava duvidoso: estava do lado de Jesus pela amizade que tinha com Lázaro e Nicodemos; mas gostava de andar bem com os outros fariseus. Jesus falou muito nesta ocasião dos profetas e do cumprimento das profecias. Falou da maravilha da concepção de João, como Deus o livrou da matança dos inocentes e como foi sua missão de preparar o caminho. Falou também do pouco caso que as pessoas faziam do cumprimento do tempo das profecias e disse, entre outras coisas: "são apenas trinta anos, e recordou quem se lembrava agora, fora de algumas piedosas e simples pessoas, que três reis vieram com seu séquito do Oriente, seguindo uma estrela e procuraram um menino recém-nascido, Rei dos judeus, e o encontraram como filho de pobres pais?... Três dias estiveram lá. Se tivessem vindo buscar um príncipe, ninguém teria esquecido tão cedo a sua vinda". Ele não disse, no entanto, que essa criança era ele mesmo.
Depois, acompanhado por Lázaro e Saturnino, foi visitar as casas dos pobres doentes e humildes operários, curando uns seis. Esses doentes eram estropiados, gotosos e melancólicos. Mandou-os sair de suas casas para tomarem sol. Não se notava em Betânia nenhum aglomerado de gente por causa de Jesus. Mesmo nestas curas procedeu-se sem chamar a atenção. Lázaro, a quem todos respeitavam, era a favor de que não se produzissem os tumultos e a concorrência desordenada de outros lugares. À tarde, que começava o primeiro dia de Nisã, houve uma festa na sinagoga: pareceu-me a festa do novilúnio, porque vi uma iluminação na escola em forma de uma lua, que no decorrer da oração se ia iluminando cada vez mais, porque um homem ia acendendo atrás mais luzes.
Alguns dias depois vi Jesus com Lázaro, Saturnino, Obede e outros discípulos ao templo, tomando parte nos cultos que ali se faziam; oferecia-se ali um carneiro. A presença de Jesus no templo trazia uma comoção entre os judeus. O estranho é que cada um sentia esta comoção e não a manifestava aos demais, que também se sentiam movidos de secreta admiração. Isto era providencial, para dar a Jesus o tempo de cumprir toda a sua missão: se tivessem comunicado uns aos outros o seu parecer, teriam posto obstáculos ao seu desenvolvimento. Agora combatiam em alguns corações o ódio e a ira com a íntima admiração e emoção. Em outros, despertava-se um desejo de conhecer melhor Jesus e se informavam e perguntavam para conhecê-lo melhor. Houve também nesta ocasião um dia de jejum pela morte dos filhos de Arão.
Na casa de Lázaro estavam reunidos os discípulos de Jesus e outras pessoas piedosas. Jesus ensinou em uma sala espaçosa onde haviam colocado uma cadeira para ele da mesma forma como quando falou recentemente da vinda dos três Reis Magos, assim ali falou de coisas passadas. Disse: "não fazem dez ou oito anos apenas desde que um pequeno Bachir (escolar) disputava com os doutores da lei, quando eles tanto se enfureceram contra Ele?". Disse também o que aquela criança lhes tinha ensinado.
Jesus esteve novamente com Obede, que tinha um emprego no templo e com outros discípulos no sagrado recinto para a festa do sábado. Estavam dois entre os outros homens de Jerusalém. Jesus tinha uma veste branca com faixa e um manto também branco, à maneira dos essênios. Havia nele sempre algo que impunha e admirava: suas vestes eram sempre limpas e chamavam a atenção, porque ele as usava. Ele cantou algo dos rolos, e orou com os outros alternadamente. Alguns precederam a oração e o guiaram. Notava-se que os presentes olhavam maravilhados e comovidos, sem lhe dizer nada, e conversavam entre si em segredo. Eu vi em muitos, choques e mudanças admiráveis. Houve três pregações sobre os filhos de Israel, sobre a saída do Egito e sobre o cordeiro pascal. Acima de um altar havia incenso. Os sacerdotes não podiam ver-se: só se via o fogo e a fumaça do incenso. O fogo era visto através de uma grade sobre a qual estava o ornamento de um cordeiro pascal com raios: através deste ornamento brilhava o fogo para dentro. Este altar estava perto do Sancta Sanctorum, cujas pontas pareciam penetrar até ele.
Eu vi os fariseus, orando, envolvendo os braços em uma faixa longa e estreita, como um véu. Por volta das duas da tarde, Jesus foi com seus companheiros ao templo, a uma parte na ante-sala de Israel, onde se preparara uma refeição de frutas trançadas como tranças. Tinham designado o mestre-sala que devia prover à ordem. Nos locais adjacentes, se podia comprar tudo o que era necessário para esta refeição. Os estrangeiros tinham esse direito de vender. O templo era como uma cidade pequena; tudo se poderia conseguir lá. Durante a refeição, Jesus ensinou. Quando os homens foram embora, as mulheres comeram no mesmo lugar. Descobri uma novidade: Lázaro tinha um ofício no templo, assim como entre nós o leigo pode ter influência na igreja. O vi passar com uma caixa na mão recolhendo esmolas ou pagando impostos. Jesus e os seus permaneceram no templo a tarde toda. Depois, só o vi em Betânia por volta das nove da noite. Por ocasião deste sábado, inúmeras lâmpadas acenderam no templo.

Maria e os futuros apóstolos vão a Jerusalém

Maria e as santas mulheres partiram de Cafarnaum para Jerusalém.
Caminhavam nas proximidades de Nazaré e de Tabor, porque ali se ajuntariam outras mulheres, e através de Samaria. Os discípulos da Galiléia as haviam precedido e alguns criados iam atrás delas levando fardos e pacotes. Entre os homens vi Pedro, André e seu irmão uterino Jônatas, os filhos de Zebedeu, os filhos de Maria de Cléofas, Natanael Chased e Natanael, o das bodas de Caná.
Ao quarto de Nisã esteve Jesus toda a manhã com uns vinte discípulos no templo. Depois ensinou na casa de Maria Marcos e tomou algum alimento. Então o vi em Betânia, na casa de Simão, o fariseu, com seu amigo Lázaro. Em todos os lugares eles estavam ocupados em escolher os cordeiros para a Páscoa. Jesus esteve de novo no templo à tarde, e depois ensinou na casa de José de Arimatéia. Esta casa ficava perto da de João Marcos, perto de uma oficina de escultura de pedras. O lugar estava um pouco afastado da passagem comum e os fariseus não frequentavam muito este lugar; além disso, nenhum dos inimigos se atrevia a aproximar-se Jesus: os que o odeiavam o faziam em segredo e não davam sinal disso em público. Jesus, por sua vez, operava livremente em Jerusalém e no templo. Ele avançou com Obed entre o altar dos sacrifícios e o templo onde houve uma pregação sobre a festa Pascal e os usos dos sacerdotes. Seus discípulos ficaram para trás, na antessala de Israel. Os fariseus ficaram muito zangados ao vê-lo ali. Andando pelos caminhos, falava com as pessoas que iam e vinham. Mais e mais pessoas vinham a Jerusalém para as festas, especialmente trabalhadores, peões, servos e comerciantes com provisões. Ao redor da cidade e nos locais livres, tendas e cabanas eram erguidas para abrigar as pessoas que chegavam; eles também traziam para a cidade muitos cordeiros e outros animais, e as pessoas escolhiam seus cordeiros para a Páscoa. Chegavam também infiéis e pagãos.
Em Betânia Jesus ensinava e curava os doentes publicamente. Trouxeram-lhe alguns doentes de outros lados e chegaram alguns parentes de Zacarias de Hebrom para convidá-lo a ir lá com eles. Jesus estava de novo no templo; e à tarde, quando a maioria dos sacerdotes tinha deixado o templo, ensinou no lugar onde haviam discípulos, falando a eles e a outros piedosos israelitas da proximidade do reino de Deus, da Páscoa, do cumprimento das profecias e das figuras do Cordeiro Pascal falou com muita severidade, e alguns sacerdotes que ainda estavam ali ocupados que se sentiram comovidos por suas palavras, embora guardassem rancor interior contra ele.
Depois voltou Jesus a Betânia e dali, com os homens que tinham vindo procurando-o, dirigiu-se na mesma noite para Hebrom com alguns de seus discípulos. Hebron estava a quatro horas de distância. No templo se trabalhava nos preparativos da Páscoa. No interior, várias coisas eram alteradas para aquela ocasião. Passagens e galerias eram abertas e limpas, e as divisórias eram removidas para dar espaço. Agora se podia ir para o altar em várias partes e toda a aparência interior estava completamente mudada. Enquanto isso, Jesus caminhava para Hebrom com alguns de seus discípulos e com o povo que o veio buscar, parentes de Zacarias. Ia pelo caminho entre Jerusalém e Belém. Teria que andar umas cinco horas. Através de Juta, ele chegou a Hebrom, onde ensinou livremente e curou muitos doentes. Ele voltou para Betânia para a festa de sábado. O caminho passava pela parte alta da montanha.
Começava a ficar quente. Alguns discípulos de João, que tinham vindo com Jesus, voltavam agora a ver João. No Sábado ele estava no templo e foi até o vestíbulo com Obede, onde havia uma cadeira para ensinar; mais tarde ele ensinou lá onde estavam sentados sacerdotes e levitas em círculo ao redor da cadeira de ensino, a partir da qual se desenvolvia um tema sobre a festa Pascal. A aparição de Jesus motivou uma grande agitação entre os presentes, especialmente quando fazia uma pergunta que ninguém podia responder, ou fazia algum esclarecimento sobre a pregação. Entre outras coisas, disse que havia chegado o tempo em que o tipo e a figura do Cordeiro Pascal teriam sua realização; que esta cerimônia e o próprio templo teria seu fim. Falou de modo figurado, mas com tanta exatidão e clareza, que eu pensei, sem querer, naquela passagem do Pange lingua, que diz: Et antiquum documentum novo cedat ritui. Quando os fariseus lhe perguntaram quem lhe dissera essas coisas, ele respondeu que seu pai as havia dito, sem dizer mais nada sobre seu pai. Jesus falava em geral, e os fariseus, embora muito irados contra ele, não ousaram incomodá-lo; estavam cheios de ira e de admiração ao mesmo tempo, o que eles não sabiam explicar. Não era permitido entrar naquela parte do templo, mas ele, como Profeta, foi permitido. No último ano de sua vida Jesus ensinou neste lugar.
Depois do sábado, voltou novamente para Betânia. Até ali não o vi falar novamente com Maria, a Silenciosa. Achei que o fim estava próximo. Pareceu-me que nela havia se operado uma mudança. Estva deitada no chão, sobre cobertores escuros, sustentada nos braços pelas criadas: sofreu uma espécie de desmaio. Pareceu-me como se estivesse agora mais em contato com a terra, pois devia sofrer ali e devia permanecer algum tempo mais sobre ela. Até ali esteve como ausente da terra; não sabendo o que nela se passava. Devia saber que esse Jesus, que estava em sua casa em Betânia, era aquele que deveria sofrer tanto, e ela devia ficar algum tempo mais nesta terra para sofrer com ele por compaixão. Logo morreria. Na noite de Sábado, Jesus visitou a Silenciosa e falou-lhe por muito tempo. Às vezes estava deitada em seu leito, e às vezes passeava.
Se encontrava agora em seus momentos finais: se dava conta do que era a terra, o que era a vida do outro mundo e que Jesus era o Cordeiro de Deus, O Salvador, que por essa causa teria que padecer muito. Ela estava triste por causa desse pensamento e o mundo pesava sobre ela de forma esmagadora. De um modo especial lhe contristava a ingratidão dos homens, que conhecia de antemão.
Jesus falou longamente com ela da proximidade do reino de Deus e de seus sofrimentos; depois a abençoou e a deixou. Estava agora muito bonita e esbelta, pálida, como transparente; tinha as mãos como de marfim e dedos finos. Pela manhã, Jesus curou em Betânia muitos que lhe haviam trazido de lugares ainda distantes e também estrangeiros que tinham ido às festas, estropiados e cegos. Ele fez tudo abertamente e em público. Vieram também alguns homens do templo, a pedir-lhe conta de seu proceder, perguntando-lhe quem o havia autorizado ontem a misturar-se e falar durante a explicação. Jesus respondeu-lhes com serenidade e falou de novo de seu pai. Os fariseus não ousavam confrontar-se diretamente com ele: sentiam como um temor em sua presença e não sabiam explicar o que lhes acontecia. Jesus não se deixou atemorizar e ensinou novamente no templo.
Todos os discípulos da Galileia, que tinham estado nas bodas de Caná, tinham se reunido ali. Maria e as santas mulheres moravam na casa de Maria Marcos. Lázaro comprou muitos cordeiros escolhidos, e depois de tê-los preparado, repartiu-os entre os trabalhadores e peões.

Jesus expulsa os mercadores do templo

Quando Jesus, acompanhado de seus discípulos, chegou ao templo, fez sair do círculo da oração, com toda amabilidade muitos vendedores de mantimentos, de ervas, de aves e cordeiros, e indicou-lhes o lugar na antessala chamada dos gentios. Ele os admoestou amigavelmente dizendo que era muito inconveniente o balido dos cordeiros e a presença de animais naquele lugar. Ajudou com seus discípulos a transportar as mesas e gavetas e lhes fez lugar no novo local. No mesmo dia curou muitos enfermos dos estrangeiros vindos a Jerusalém, especialmente os pobres trabalhadores estropiados que costumavam viver nas proximidades do Cenáculo no monte Sião.
Havia em Jerusalém um afluxo extraordinário de pessoas. Ao redor da cidade se via grandes extensões de cabanas e lojas, e nas praças e lugares abertos fileiras de edifícios e lojas longas, como ruas, onde se podia obter o que era necessário em grande abundância para levantar lojas e fornecê-las e para a venda dos cordeiros de Páscoa. Nesses negócios, algumas coisas eram compradas e outras eram alugadas. Grandes massas de operários e de pobres de todo o país estavam ali ocupados em trazer e levar objetos. Estes operários há muito limpavam os lugares e afastavam tudo o que pudesse obstruir os lugares onde se instalavam as lojas e os postos; outros operários cortavam e ajuntavam as cercas, limpavam as estradas, preparavam lugares retirando escombros e instalando casinhas e tendas. Nos últimos dias, as estradas foram melhoradas. Todos estes trabalhos referiam-se aos preparativos para a Páscoa, quando os cordeiros eram sacrificados, como os preparativos do Batista foram dirigidos a preparar os caminhos para o Cordeiro de Deus que havia de ser sacrificado pelos pecados do mundo.
Ao voltar mais tarde Jesus ao templo teve que expulsar novamente aos mercadores que haviam invadido os lugares proibidos, porque estando agora pela grande afluência de gente todas as passagens e portas abertas, muitos deles haviam se internado até o lugar de oração. Jesus os expulsou dali, empurrando suas mesas, procedendo com mais energia e decisão do que da primeira vez. Os discípulos o ajudavam na obra; mas havia ali gente estúpida e atrevida que, com gesto irado e esticando o pescoço contra Jesus, o resistiam, de modo que o próprio Jesus teve que empurrar com uma mão as mesas que ali se viam. Não puderam fazer-lhe nada, apesar da ira que tinham contra ele, o lugar de oração encontrou-se logo desocupado. Os mercadores foram afastados para a parte externa do templo. Disse-lhes claramente que por duas vezes os tinha afastado dali às boas; que se voltassem pela terceira vez ia proceder com violência. Por este motivo alguns dos mais ousados gritaram contra ele: o que se pensava esse Galileu, esse discípulo de Nazaré acrescentando que não o temiam. Apesar disso, eles saíram do local. Havia muito público ao redor e os judeus piedosos lhe davam razão e o louvavam, embora a certa distância. Alguém clamou também: "o profeta de Nazaré". Os fariseus estavam escandalizados e envergonhados. Nos dias anteriores tinham dito secretamente ao povo que durante as festas se abstivessem de juntar-se a esse homem estranho; que não lhe continuassem e não falassem tanto dele e de suas coisas. Mas o povo mostrava cada vez maior interesse por ele, especialmente agora haviam chegado muitas pessoas curadas por ele e que ouviram em outros lugares seus ensinamentos. Quando Jesus saiu do templo, estando numa ante-sala, clamou a ele um aleijado pedindo-lhe a cura, e, havendo-o curado, começou este, contente, a gritar no templo, contando a sua cura; de modo que se levantou ali um grande tumulto e admiração.
O Batista não veio às festas da Páscoa; não obedeceu às exigências exteriores da lei, como os demais homens. Era uma voz que devia clamar; uma voz revestida de carne humana com um destino superior. Havia agora de novo grande afluência em seu batismo, pois iam chegando muitos forasteiros para as festas de Jerusalém. À tarde, fez-se silêncio na cidade; todos se ocupavam dentro de suas casas em varrer as leveduras para preparar o pão sem fermento; viam-se os objetos cobertos com colchas. O mesmo acontecia na casa que Lázaro tinha no monte Sião, onde Jesus e os seus se preparavam para comer o cordeiro pascal. Jesus também andava nestes preparativos, ensinando de passagem. As coisas eram feitas com ordem sob sua direção. Não se procedia ali com esse temor como entre os demais judeus. Jesus lhes declarava o que havia de símbolo nestes preparativos e o que os fariseus haviam acrescentado por conta própria.

A celebração da Páscoa por jesus, Lázaro e seus discípulos

Alguns dias depois Jesus estava em Betânia. Quando vi novamente muitos mercadores nos lugares de oração do templo, pensei que se estivesse Jesus ali, esses ousados passariam mal. À tarde, os cordeiros foram sacrificados no templo. Faziam isso com uma ordem e destreza admiráveis. Cada um trazia o seu cordeiro sobre os ombros; todos avançavam em ordem e havia lugar para todos. Viam-se três pátios ao redor do altar para esperar; entre o altar e o templo havia grande multidão. Diante dos sacrificadores havia grades e aparelhos com todas as comodidades; contudo, estavam tão próximos uns dos outros, que o sangue de um cordeiro salpicava ao lado, e assim as vestes destes encarregados estavam cheias de sangue. Os sacerdotes estavam em fileiras até o altar e os recipientes, vazios ou cheios de sangue, passavam de uma mão para outra. Antes que os judeus desmembrassem esses cordeiros, eles os amarravam de tal maneira que as entranhas podiam ser facilmente retiradas com um instrumento, ajudado por outro.
A operação de remover a pele procedia com facilidade: levantavam-na um pouco e prendiam-na a um bastão redondo; colocavam o cordeiro diante de seu peito pendurado e preso ao pescoço do sacrificador; e logo com as duas mãos enrolavam a pele com muita destreza. À tarde, haviam terminado a tarefa de sacrificar cordeiros. Era um pôr do sol avermelhado.
Lázaro, Obede e Satumnino sacrificaram os três cordeiros que Jesus e os seus comeram. A refeição aconteceu na casa que Lázaro possuía no monte Sião. Era um grande edifício com duas alas. Na sala onde comeram estava instalado o brazeiro onde assaram os cordeiros; era, porém, muito diferente do que vi no Cenáculo. Este era mais elevado, como o lugar que tinha visto na casa de Ana e de Maria e em Caná da Galileia. Nas grossas paredes haviam lugares vãos onde os cordeiros foram colocados: eles estavam presos em madeiras, como crucificados. A sala estava bem adornada e comeram em mesas que, com grande maravilha minha, estavam colocadas em forma de cruz. Lázaro estava sentado onde a cruz termina, cercado por muitas fontes e pratos para servir com ervas amargas, e os cordeiros estavam como ele em torno de Jesus havia parentes, amigos e discípulos da Galiléia; em torno de Obede e de Lázaro estavam os discípulos de Jerusalém, e em torno de Saturnino, os discípulos do Batista. Eram uns trinta.
Esta primeira Páscoa foi muito diferente da última de Jesus, que procedeu de acordo com o cerimonial judaico. Todos tinham os seus báculos na mão; estavam cingidos e comeram apressados. Na outra Páscoa, Jesus teve dois paus em forma de cruz. Eles cantaram salmos ali e comeram em pé, não deixando nada sobrando. Mais tarde, sentaram-se mais confortavelmente à mesa. Ao todo, Havia algumas coisas diferentes do que os judeus costumavam fazer. Jesus lhes declarava as coisas e eles deixavam de lado certas práticas que os fariseus haviam introduzido por conta própria. Jesus colocou os três cordeiros e serviu à mesa e disse que ele fazia isso como servo de todos. Depois ficaram juntos até a noite, e cantaram salmos e rezaram.
Hoje estava tudo silencioso e misterioso em Jerusalém. Os judeus que não sacrificavam, estavam quietos em suas casas, que costumavam adornar com plantas e ervas de verde escuro. A multidão que, depois de sacrificar os cordeiros, tinha ficado em suas casas, estva hoje ocupada com diversos afazeres, e toda a cidade tinha um aspecto de tristeza avassaladora. Hoje vi onde se assavam tantos cordeiros para os forasteiros acompanhados em torno da cidade. Ergueram-se fora e dentro da cidade, nos lugares livres, largas paredes sobre as quais se podia andar confortavelmente e sobre estas tinham-se erguido, um ao lado do outro, uma multidão de fornos. De distância em distância havia um capataz que vigiava a ordem e dava, por uma modesta retribuição, o necessário para assar os cordeiros. Nestes brazeiros e fornos costumavam cozinhar em outras ocasiões os forasteiros e estrangeiros que iam à cidade. A queima da gordura dos cordeiros durou até tarde da noite; então o altar foi purificado, e na manhã seguinte abriram-se de novo as portas do templo.
Jesus e seus discípulos passaram a maior parte da noite em orações na casa de Lázaro. Os discípulos da Galiléia dormiram em lugares que haviam se levantado junto ao edifício. Ao raiar do dia, dirigiram-se ao templo, já iluminado com muitas lâmpadas. Em toda parte se viam pessoas que subiam ao templo com seus sacrifícios. Jesus e os seus estavam numa antecâmara, onde ele ensinava. De novo viam-se ali uma multidão de mercadores, instalados a poucos passos do lugar de oração e das mulheres. Como viessem ainda mais, Jesus ordenou que se retirassem e ordenou que os que estavam ali saíssem; mas eles resistiram e chamaram os guardas pedindo ajuda. Estes avisaram o Sinédrio, porque se sentiram impotentes. Jesus ordenou aos mercadores que se retirassem dali, e, resistindo, tirou das suas vestes um cinto tecido de juncos finos; fez uma volta, de modo que o cinto se abriu na forma de um chicote de várias partes e com este instrumento atacou os mercadores, virou as mesas e atropelou os mais ousados à frente, enquanto os discípulos faziam o mesmo em ambos os lados, e assim desocuparam todo aquele espaço. Nisto chegou um grupo de sacerdotes do Sinédrio, e lhe pediram conta de seu proceder: quem lhe dava o direito de fazer isso. Respondeu-lhes que, embora o Santo dos Santos já não estivesse no templo e este caminhasse para a sua ruína, ainda era um lugar sagrado; que a oração de tantos fiéis se levantava do templo; que o templo não era lugar de comércio, de armadilhas e enganos de bolsas e de vil tráfico e usura. Como lhe pediam conta em nome de quem trabalhava, disse-lhes que era em nome de seu pai. Quando lhe perguntaram quem era seu pai, respondeu que não era o momento de explicá-lo e que também não o entenderiam. Dizendo isto, afastou-se deles, seguindo em sua tarefa de expulsar os mercadores. Vieram também dois grupos de soldados, e os sacerdotes nada ousaram fazer contra Jesus, porque eles mesmos estavam envergonhados da desordem. Havia muitos do povo que davam razão ao Profeta; os próprios soldados ajudaram a afastar as mesas dos vendedores e a tirá-las com as mercadorias espalhadas. Assim, Jesus e seus discípulos expulsaram os mercadores do templo. Somente para aqueles que vendiam pombas, pequenos pães e refrigerantes nas lojas instaladas na ante-sala, ele os deixou, porque eles não incomodavam e vendiam coisas mais ou menos necessárias.
Depois disso, ele saiu com seus discípulos para o vestíbulo. Seriam sete ou oito da manhã quando tudo isso aconteceu. À tarde, uma espécie de procissão saiu ao longo do Vale do Cedron, para cortar os primeiros feixes da colheita. Num destes dias, Jesus curou uns dez deficientes no vestíbulo do templo e outros que eram mudos. Isso levantou um murmúrio de admiração, porque os curados gritavam publicando o fato, cheios de contentamento. Novamente se apresentaram, os fariseus, para pedir conta a Jesus de seu proceder; Mas Jesus lhes respondeu com tom severo, e nada puderam fazer porque o povo estava muito entusiasmado com Ele. Depois das cerimônias do culto ouviu a explicação numa sala do templo com seus discípulos:  explicava o livro de Moisés. Jesus fez diversas perguntas, porque era esta uma espécie de escola pública, onde se podia discutir e perguntar; ao fim reduziu a silêncio a todos, e deu uma explicação muito diferente da que davam os fariseus acerca do ponto que se lia de Moisés.
Durante estes dias Jesus não esteve quase com sua mãe, que estava sempre na casa de Maria Marcos, cheia de angústia e lágrimas e em oração, temerosa do alvoroço que se levantava por causa de seu proceder no templo.
Depois do tumulto maior que se levantou por ter curado os enfermos, Jesus retirou-se para Betânia e celebrou o sábado na casa de Lázaro.
Depois do sábado, os fariseus foram à casa de Maria Marcos buscar Jesus para prendê-lo. Como não o encontraram, disseram a Maria e às outras mulheres, que eram asseclas de Jesus, que deixassem a cidade e saíssem dela. Maria e as outras mulheres ficaram muito aflitas e foram para Betânia, para a casa de Marta. Maria, chorosa, foi para o quarto de Marta, naquele momento ao lado de sua irmã Maria, a Silenciosa, que estava muito doente, novamente fora de si, num mundo superior, onde já via o que tinha entrevisto durante a sua vida mortal em espírito. Assim, não podendo mais com sua angústia e sua tristeza, esta Maria a Silenciosa morreu nos braços de Maria, de Marta, de Maria Cléofas e das outras santas mulheres.
Nicodemos veio durante o dia por intermédio de Lázaro, apesar da perseguição contra Jesus, que na noite anterior a passou ensinando. Antes de raiar o amanhecer, Jesus dirigiu-se com Nicodemos à casa de Lázaro, no monte Sião. Chegou também José de Arimatéia junto a Jesus. Ele lhes falou e eles se humilharam diante de Jesus. Eles disseram que sabiam quem ele era, que ele era mais do que um homem comum e fizeram votos de servi-lo até a morte. Jesus ordenou-lhes que se mantivessem reservados e eles pediram-lhe que os conservasse em seu amor. Depois disso vieram os outros discípulos que haviam comido a Páscoa com ele, E Jesus lhes deu ensinamentos e advertências para o futuro próximo. Cumprimentaram-se apertando as mãos e enxugaram as lágrimas com o pano estreito que costumavam levar ao pescoço e com o qual às vezes cobriam a cabeça.